Acórdão nº 0156/03.0BTLRS 01249/17 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | ISABEL MARQUES DA SILVA |
Data da Resolução | 26 de Maio de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – Z…………, S.A., com os sinais dos autos, não se conformando com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 23 de março de 2017 vem, nos termos dos artigos 280.º n.º 2 e 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário - CPPT (na redacção anterior à actual), dele interpor recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste STA por alegada oposição daquele aresto: - com o decidido por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 05/02/2012, proc. n.º 0895/11, “na parte relativa ao ajuste de revenda prevista no § 2 do artigo 2.º do CIMSISSD“; - com o decidido por Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 15/06/2016, proc. n.º 01101/15, “na parte relativa à invalidade da liquidação de SISA” ambos transitados em julgado.
Admitido o recurso, a Recorrente apresentou a sua alegação, concluindo do seguinte modo: 1. O presente recurso por oposição de Acórdãos, cuja oposição foi já em exame preliminar afirmada pelo próprio Tribunal a quo, vem interposto do Acórdão do TCA Sul que julgou improcedente o recurso interposto pela Recorrente e, ao assim ter decidido, o Acórdão ora recorrido encontra-se, com o devido respeito, em flagrante e clamorosa oposição com outros Acórdãos já proferidos pelo STA, a saber: i. Em oposição com o Acórdão do STA, Secção de CT, proferido em 02/05/2012, no processo n.º 0895/11 (publicado em www.dgsi.pt), já transitado em julgado, quanto a errada aplicação do § 2 do artigo 2.º do CIMSISSD; ii. Em oposição com o Acórdão do STA, Secção de CT, proferido em 15/06/2016, no processo n.º 01101/15 (publicado em www.dgsi.pt), já transitado em julgado, quanto ao erro respeitante ao ano da liquidação.
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A Recorrente entende que, caso o Tribunal a quo tivesse acolhido a jurisprudência vertida nos dois referidos Acórdãos-fundamento do STA, com os quais o Acórdão Recorrido se encontra em manifesta oposição, a sua pretensão teria sido - como deve ser - julgada totalmente procedente e, em consequência, teria sido anulada a liquidação de SISA em crise.
1.ª QUESTÃO: DA ERRADA APLICAÇÃO DO N.º 2 DO ARTIGO 2.º DO CIMSISSD E DA OPOSIÇÃO COM O ACÓRDÃO DO STA, PROFERIDO EM 02/05/2012, NO PROCESSO N.º 0895/11 3.
No presente processo discute-se a (i)legalidade da liquidação de SISA emitida pela AT por referência ao exercício de 1996 através do oficio n.º 15544, processo 6-A, datado de 18.11.2002, no qual foi efectuada uma liquidação em sede daquele imposto no montante de € 5.500.159,35, acrescida de €4.129.037,43, a título de juros compensatórios (cfr doc. 1 junto com a P1 e ponto 14 da matéria de facto provada no Acórdão Recorrido).
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Em síntese, entendeu a AT que tendo havido ajuste de revenda entre o promitente comprador (Z............) e um terceiro (Y............), o qual veio a celebrar escritura pública com o promitente vendedor (X............), a operação em causa consubstanciaria, por força da presunção estabelecida no § 2 do artigo 2.º do CIMSISSD, uma transmissão sujeita a SISA.
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A Recorrente invocou que, todo este diferendo não tem qualquer razão de ser, na medida em que aquele preceito legal, como resulta da sua letra, apenas seria objectivamente aplicável quando tivesse na base uma PROMESSA DE VENDA (e não a contratos-promessa de compra e venda como provado nos autos) e que as “cessões de posição contratual” não estavam sequer previstas no âmbito das normas de incidência objectiva do CIMSISSD.
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Porém, a Recorrente alegou que mesmo que fosse entendido ser aplicável à situação em apreço a disposição prevista no § 2 do artigo 2.º do CIMSISSD, e que se verificava a presunção de “tradicio jurídica”, sempre deveria ter sido decidido que a Recorrente a ilidiu, porquanto carreou e provou nos autos factos que demonstram que NÃO OBTEVE QUALQUER GANHO com a cessão da posição contratual à Y............, que NÃO FEZ QUALQUER AJUSTE DE REVENDA COM A Y............ e que os motivos que assistiram àquela cessão de posição contratual consistem numa DESISTÊNCIA DO NEGÓCIO por parte da Recorrente.
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Com relevo para a apreciação desta questão, o Acórdão Recorrido partiu da seguinte factualidade dada como provada (vide páginas 11 e 12 do Acórdão ora em crise): 3. “Em 30/11/1996 com o consentimento da promitente vendedora, X............, SA foi celebrado um contrato de cessão de posição contratual entre a impugnante e a sociedade “Y............, SA pelo qual aquela cedeu a esta a sua posição contratual no contrato-promessa e adicional, identificado nos n.ºs 1 e 3, obrigando-se a Y............, designadamente, a reembolsar a impugnante na quantia de Esc.:7.877.349.406$00, que esta já entregara a título de sinal e princípio de pagamento, acrescido de IVA, no valor de Esc.:1.339.149.400$00, até 31/12/1996”; 4. ‘No referido contrato de cessão de posição contratual refere-se, nos considerandos iniciais: “(..) a primeira contraente tem por objecto a compra e venda de imóveis para revenda ou arrendamento e no exercício desta sua actividade tem vindo a adquirir imóveis que destina ao arrendamento para a instalação de Centros Comercias (...) encontra-se já envolvida em avultado número de empreendimentos comerciais, que sobrecarregam fortemente a sua estrutura financeira, sendo aconselhável a sua transferência para outra entidade. (...)“ 5. A impugnante cedeu a posição contratual no contrato-promessa de compra e venda dos autos à Y............ por razões estratégicas (vg. depoimento das testemunhas identificadas na acta junta a fls.298 a 301 dos presentes autos) O TEOR DO ACÓRDÃO Recorrido: 8. O Acórdão Recorrido considerou verificar-se o suposto “ajuste de revenda”, para efeitos do § 2 do artigo 2.º do CIMSISSD, e assim manter a liquidação na ordem jurídica porquanto julgou que (pág. 21): “[m]ais se dirá que não foi alegado e, por maioria de razão, também não resultou provado, factos que apontem para uma qualquer impossibilidade da sociedade impugnante em outorgar o contrato definitivo, isto é a escritura de compra e venda, sendo certo que, nem o avultado número de empreendimentos comerciais referido no contrato de cessão, desacompanhado de qualquer elemento de prova documental, nem a decisão “estratégica” referida pelas testemunhas, como determinante da celebração do contrato de cessão da posição contratual, só por si, invalidam o ajuste de revenda, pelo contrário, até o confirmam” (realce nosso).
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Porém, a interpretação jurídica proferida pelo Tribunal a quo, segundo a qual só a impossibilidade de outorga do contrato definitivo (o de compra e venda) é que seria suficiente para invalidar a existência de um qualquer ajuste de revenda, consiste, salvo o devido respeito, numa interpretação [senão intolerável] frontalmente oposta à que ficou consagrada no Acórdão-fundamento (bem como em outros Acórdãos dos nossos Tribunais Superiores).
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O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito ao ter ignorado a jurisprudência do STA assente, que conformou a desistência da celebração do contrato-promessa, bem como a inexistência de ganho por motivo da cessão da posição contratual, como factos demonstrativos da não verificação de qualquer ajuste de revenda e que indiscutivelmente ilidem a presunção de tradição jurídica” ínsita no § 2 do artigo 2.º do CIMSISSD.
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Neste aspecto, salienta-se (e louva-se) justamente o teor do VOTO DE VENCIDO, subscrito no Acórdão ora recorrido, de acordo com o qual: “Mesmo que assim fosse entendido, considero, ainda, que o recurso obteria provimento, já que a matéria de facto aponta, numa análise de conjunto (pontos 4 e 6 do probatório e restante matéria de facto expressamente impugnada), no sentido de se poder concluir que, não obstante a celebração da escritura entre o promitente vendedor e o terceiro, não existiu qualquer ajuste de revenda. Na minha perspectiva, há elementos que sustentam a alegada desistência do negócio inicial e, bem assim, que permitem concluir pela não obtenção de vantagens económicas com a cessão da posição contratual.” (realce nosso).
O TEOR DO ACÓRDÃO Do STA, DE 02/05/2012, PROCESSO N.º 0895/11 — ACÓRDÃO-FUNDAMENTO 12. De acordo com o Acórdão-fundamento (Acórdão do STA, de 02/05/2012, Processo n.º 0895/11), quando não haja qualquer motivo perceptível para justificar o “porquê” de o sujeito passivo ter cedido a posição contratual, é que se poderá inferir que existiu um ajuste de revenda, mas tal consubstancia tão só uma presunção natural e não uma presunção legal.
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Considera o douto Acórdão-fundamento que, verificando-se um ajuste de revenda, presume-se a tradição jurídica, prevista no § 2 do artigo 2 do CIMSISSD, a qual, a verificar-se, é ilidida mediante o esclarecimento feito pelo sujeito passivo das razões que o levaram a ceder a posição contratual no contrato-promessa de compra e venda.
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Por outro lado, esclarece o Acórdão-fundamento que são essas razões justificativas, não só a impossibilidade de celebração do contrato definitivo, como também a DESISTÊNCIA do contrato-promessa e a INEXISTÊNCIA DE LUCRO/GANHO ou de finalidade especulativa com a cessão da posição contratual.
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Para alcançar tais conclusões, o Acórdão-fundamento suporta-se também na constatação de que a figura do “ajuste de revenda” assenta em actividades que foram susceptíveis de gerar rendimentos para os contribuintes em causa, os quais utilizaram contratos-promessa de compra e venda como “instrumentos de realização de investimentos e de especulação imobiliária, que têm por base uma transmissão puramente económica dos bens, proporcionadora de rendimentos” (cfr. Acórdão-fundamento).
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É, assim, notória e flagrante a oposição entre o entendimento do Acórdão Recorrido e do Acórdão-fundamento. De facto, o Acórdão Recorrido afronta a jurisprudência do Acórdão-fundamento, porquanto inferiu de uma da cessão da posição contratual um ajuste de revenda e, consequentemente, presumiu uma tradição jurídica do bem, apesar do contribuinte ter alegado e provado...
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