Acórdão nº 1527/18.3GBABF.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelLAURA GOULART MAUR
Data da Resolução24 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório No Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Albufeira, Juiz 1, no âmbito do Processo nº 1527/18.3GBABF foi o arguido AAA submetido a julgamento em Processo Comum e Tribunal Singular. Após realização da audiência de discussão e julgamento, o Tribunal, por sentença de 21 de dezembro de 2021 decidiu condenar o arguido AAA pela prática de um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art. 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 2, al. c) do Código Penal, na pena de 26 (vinte e seis) meses de prisão.*Inconformado com a decisão, o arguido interpôs recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: I. Por sentença proferida a 21-12-2021, com intervenção de Tribunal Singular, nos autos de Processo Comum nº 1527/18.3GBABF, no Tribunal Judicial da Comarca de Faro, Juízo Local Criminal de Albufeira- Juíz 1, o Arguido AAA foi condenado pela prática, como autor material, de um crime de burla qualificada p. e p. pelo artº 217º, nº 1 e 218º, nº 2, alínea c) do Código Penal, na pena de 26 (vinte e seis) meses de prisão. II. O presente recurso versa sobre matéria de Direito, nos termos previstos no artº 428º do Código de Processo Penal, visando a apreciação da seguinte questão: - Se a pena aplicada ao Arguido em vez de ser de execução efetiva, deve antes ser suspensa na sua execução, com sujeição a regime de prova. III. Considerando que a medida concreta da pena de prisão fixada ao Arguido se situa abaixo do limite até ao qual é possível aplicar a pena de substituição prevista no artº 50º do Código Penal, encontra-se preenchido o pressuposto formal para a aplicação da suspensão da execução da pena, pelo que cumpre equacionar se, no caso concreto, se encontram, também, preenchidos os seus pressupostos matérias. IV. Os pressupostos materiais subjacentes à escolha das penas de substituição, designadamente a pena de suspensão da execução da prisão, são os mesmos que encontramos para a determinação da medida da pena e da realização das finalidades próprias de punição: a tutela necessária dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, como consignado no artº 40º do Código Penal; O critério de escolha é-nos dado pelo artº 70º do Código Penal que estabelece a obrigatoriedade do tribunal dar preferência à pena não privativa da liberdade, sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades de punição. V. Consignando-se as finalidades da punição, à protecção dos bens e jurídicos e à reintegração do agente na sociedade, conforme previsto no artº 40º do Código Penal, é em função de considerações de natureza exclusivamente preventivas – prevenção geral e especial – que o julgador tem conduzir a sua escolha para aplicação ou não de pena de substituição que, no caso em apreço, consiste na suspensão da execução da pena de prisão. VI. O Tribunal “a quo” decidiu não suspender a pena de prisão de 26 (vinte e seis) meses, porque duvidou da capacidade do Arguido de se reger pelas regras jurídicas, tecendo, assim, um juízo de prognose negativo, no que se reporta à reintegração do mesmo em liberdade. VII. Salvo devido respeito, que é muito, perfilha-se opinião contrária, por se acreditar que ainda existe fundada esperança de que a socialização do Arguido possa ser feita em liberdade, pois a simples censura do facto e a ameaça de prisão serão o bastante para dissuadi-lo de praticar quaisquer outros crimes no futuro, desde modo se realizando de forma adequada e suficiente as finalidades de punição. VIII. Entende-se, sempre salvo melhor respeito, que não é demasiado arriscado, face à factualidade constante do caso concreto, designadamente à personalidade do Arguido, suas condições de vida, conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias do mesmo, conceder-lhe uma derradeira oportunidade, optando-se por um juízo de prognose favorável sobre o seu futuro comportamento e consequente aplicação da suspensão da execução da pena de prisão, prevista no artº 50º do Código Penal, ainda que sujeita ao regime de prova, nos termos do nº 2 daquele artigo e artº 53º nº 2 e 3 do Código Penal. IX. O Arguido confessou integralmente e sem reservas os factos constantes da acusação, que se mostrou de enorme relevância para a prova dos factos em que assentou a sua condenação, o que bem comprova a sua colaboração ativa na realização da justiça e descoberta de verdade material, tendo também demonstrou arrependimento daquela sua conduta, com tal comprovando capacidade de tecer juízos de autocensura e desvalor da sua conduta criminosa. X. A personalidade do Arguido não revela uma qualquer tendência criminosa ou carreira criminosa; Conforme Certificado de Registo Criminal, o Arguido foi condenado pela prática de 4 (quatro) crimes de condução sem habilitação legal e 1 (um) crime de condução perigosa, que ocorreram em 23-04-2012, 18-01-2012, 11-05-2013 e 20-04-2013, o que perfaz 5 (cinco) condenações pela prática de ilícitos da mesma natureza, tendo, ainda, sido condenado pela prática, em de 1 (um) crime de burla qualificada, ocorrido em 30-05-2013 e 1 (um) crime de burla simples, ocorrido em 10-11-2016; De relevar que a pena suspensa com regime de prova (a única de que beneficiou o Arguido), aplicada no âmbito do Proc. nº 633/13.5GAMTA que correu termos no 3º Juízo do Tribunal Judicial da Moita, pela prática do crime de burla qualificada, foi cumprida, encontrando-se extinta a respectiva pena de 2 anos e 2 meses de prisão desde 15-03-2016; Sendo, também, de considerar que a prática do crime de burla simples que o Arguido foi condenado a 6 (seis) meses de pena de prisão, recentemente transitado em julgado, em 08-11-2021, remonta a 10-11-2016; De notar, ainda, que o ultimo ilícito criminal que o Arguido praticou foi em 10-11-2016 (crime de burla simples), não tendo, até ao presente momento registada, qualquer outra condenação. XI. Todos os ilícitos criminais que perfazem 7 (sete) crimes, os dois últimos da mesma natureza do constante dos presentes autos, foram praticados pelo Arguido, nascido em 22-07-1995, quando ainda era muito jovem, numa faixa etária compreendida entre os 16 e os 21 anos de idade. XII. Antes da sua detenção, o Arguido exercia a atividade de vendedor ambulante, auferindo semanalmente entre € 80,00 a € 90,00, dispõe de suporte familiar, vivendo com os pais e pertencendo ao agregado familiar destes. XIII. O crime de burla cometido pelo Arguido não foi em valor excessivamente elevado, acarretando um prejuízo para o ofendido de € 400,00. XIV. As adversidades das condições pessoais, familiares, económicas e sociais do Arguido e que constam do relatório social (reduzido nível de escolaridade, défice ao nível de desenvolvimento cognitivo e emocional, etnia cigana, condição sócio económica humilde e estilo de vida predominantemente desestruturado, falta de apoio familiar, no sentido contentor da prática de ilícitos criminais), são completamente alheias à vontade do Arguido, pelo que não devem ser consideradas como circunstâncias agravantes e impeditivas de uma socialização em liberdade, sob pena de violação Principio de Igualdade e Proporcionalidade. XV. O Arguido é um jovem de 26 anos que merece uma oportunidade para ser redimir do mal social que cometeu, com ajuda de técnicos especializados, mas também sem perder os laços familiares e inserção que a socialização em liberdade seguramente permitirá, razão pela qual a pena deverá ser suspensa por 26 (vinte e seis) meses, com sujeição a regime de prova, assente num plano individual de readaptação social, a definir e a acompanhar pelos serviços de reinserção social, conforme nº 2 do artº 50º, nº 2 e 3 do artº 53º do Código Penal; Trata-se de uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, mostrando-se adequada aos crimes de pequena e média gravidade, tal como o dos autos. XVI. Tal medida, para além de evitar a exposição do Arguido ao contágio sempre nefasto do ambiente prisional, não defraudará as expetativas comunitárias de reposição da ordem jurídica, merecendo a aceitação por parte da comunidade, pelo que os fins das penas serão acautelados, também nessa vertente da prevenção geral. XVII. As exigências de prevenção geral positiva que, no caso do ilícito em apreço corresponde a um crime de burla, cujo bem jurídico protegido é o património, na sua concessão alargada, são significativas. É inegável a necessidade de desincentivar eficazmente esse tipo de comportamentos que causam alarme e insegurança na comunidade, por colocarem em causa valores de particular relevo social como é o património. Todavia, as necessidades de prevenção geral não serão descuradas, como também a comunidade não encarará como impunidade a aplicação da suspensão da pena...

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