Acórdão nº 71/20.3KRMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 25 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelPEDRO VAZ PATO
Data da Resolução25 de Maio de 2022
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 71/20.3KRMTS.P1 Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto I – AA veio interpor recurso da douta sentença do Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim do Tribunal Judicial da Comarca do Porto que o condenou, pela prática de um crime de violência doméstica, p. e p. pelos artigos 152.º, n.º 1, a) e c), e n.º 2, do Código Penal, na pena de dois anos e três meses de prisão.

Da motivação do recurso constam as seguintes conclusões: 1) A aliás Douta Sentença que está por detrás do presente Recurso, interpretou e aplicou erroneamente a prova que consta dos autos.

2) A sua não concordância advém, em 1º lugar, da qualificação jurídica que foi dada aos factos em apreciação.

3) O Recorrente, no âmbito do processo 143/19.7GAPVZ, foi sujeito a primeiro interrogatório judicial e foram-lhe aplicadas as medidas de coação: proibição de frequentar, permanecer e se aproximar da residência da ofendida num raio de 200 metros; proibição de contactar a ofendida por qualquer meio e proibição de frequentar e permanecer nos locais onde a ofendida estivesse ou a que se deslocasse, bem como a proibição de dela se aproximar, o que este não acatou.

4) Os factos em apreciação nestes autos, não constituem mais do que uma violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo art.353.º do CP.

5) A qualificação do crime cometido pelo Arguido, resulta da errada interpretação dos factos provados e das normas legais do Código Penal, nomeadamente, art.º 152.º n.º 1 a) e c) e n.º 2 a), do C.P.

6) A correta interpretação e aplicação destas disposições legais, implicará a condenação do ora Recorrente, pelo crime de Violação de imposições, proibições ou interdições, numa pena que nunca poderá ultrapassar os 2 anos de prisão ou 240 dias de multa, nos termos do art.º 353.º do Código Penal.

7) Sem prescindir, o Tribunal a quo deu como provado, facto provado 7, que a ofendida, por receio do Arguido, deixou de fazer as compras no mercado perto de sua casa, pedindo aos filhos que o fizessem por ela, porém, o filho da ofendida, BB, no seu depoimento veio dizer que o normal era ser ele ou a irmã a fazer as compras, ou seja, isto já fazia parte da rotina da família.

8) Também foi dado como provado factos 8, 9 e 10 da sentença recorrida, por valoração de depoimento indireto, que num dos telefonemas à filha, o Recorrente terá dito a esta que tinha arranjado alguém para matar o namorado da mãe e que por este facto, a menor e a ofendida terão ficado assustadas e com medo, porém, a filha do Recorrente recusou-se a prestar depoimento, nos termos do art 134.º n.º 1 a) do CPP e a própria ofendida no seu depoimento disse “Eu acho que aquilo está um bocado estranho porque eu não sei se dizia verdade ou mentira, mas isto é ideia dele, porque eu não tinha namorado nenhum nem tenho agora”, ou seja, a própria ofendida duvidou na veracidade daquela ameaça e em consequência não ficou com medo, pelo que mais uma vez, mal andou o Tribunal à quo ao considerar estes 3 factos como provados.

9) A aliás Douta Sentença ora em Recurso, enferma do vício da errada interpretação e apreciação das provas, ao dar os factos 7, 8, 9 e 10 da Sentença, como provados, em clara violação dos artgs.º 129.º 134.º n.º 1 a) do CPP.

10) A correta interpretação destes factos, sempre deveria ter colocado os mesmos na parte da sentença a quo que trata da matéria dos factos não provados.

11) O Recorrente discorda ainda da medida da pena, pois os factos provados sempre terão que ser considerados de diminuta gravidade, e tendo em conta a sua dependência etílica despoletada pelo acidente de trabalho, que fez com que bebesse com frequência, o que não agradou à esposa, causando discussões e a consequente acusação por violência doméstica. Nesta sequência, o Recorrente que até então tinha uma vida considerada normal, com família, casa e emprego, deixou de ter onde morar, pernoitando na sua viatura e depois passou a viver na casa de um amigo, que se localizava demasiado perto da casa da sua família, para que ele pudesse cumprir com as obrigações de afastamento que lhe foram impostas.

12) O Recorrente discorda também da decisão de não suspensão da pena aplicada. O Recorrente está detido à ordem do processo 143/19.7GAPVZ, a cumprir a pena de 2 anos e 3 meses, sendo que apenas lhe faltam cumprir 3 meses. Nunca teve qualquer hipótese de saída para poder demonstrar que a pena quase cumprida na integra, lhe serviu de lição e que a simples ameaça de poder passar outro tanto tempo naquele lugar é suficiente para o levar novamente ao caminho da ordem e da justiça. O Recorrente tem ainda uma motivação acrescida para cumprir todas as imposições que lhe sejam impostas, a filha menor encontra-se atualmente a frequentar o 12º ano de escolaridade e em Setembro irá ingressar no Ensino superior, no curso de Direito. Porém, tal só será possível se ele puder trabalhar e ajudar financeiramente a filha, pois o vencimento da ex-mulher, empregada fabril, não será suficiente para que a filha consiga seguir o seu sonho que tanto orgulha o Recorrente.

13) Ora a pena aplicada e nomeadamente a sua não suspensão, em nada preconiza a integração do Recorrente na sociedade, antes pelo contrário, antes o deixará mais revoltado, pois não lhe permitirá auxiliar a filha a seguir o seu sonho.

14) Violando assim também os artigos 40º, 51º, 71º, do Código Penal, por errada interpretação e apreciação das provas, o que levou a uma errada aplicação da medida da pena, e da decisão de não suspensão.

15) A errada interpretação e aplicação das provas que redundou na errada determinação da medida da pena e condenação na pena de 27 meses de prisão, nos termos dos artigos art.º 152.º n.º 1 a) e c) e n.º 2 a), do C.P.

16) A correta interpretação e aplicação destas disposições legais, na modesta opinião do Recorrente e salvo melhor entendimento, implicará a condenação do ora Recorrente, pelo crime de violência doméstica, numa pena que nunca poderá ultrapassar os 2 anos de prisão, suspensa na sua execução.

O Ministério Público junto do Tribunal da primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso.

O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, pugnando pelo não provimento do recurso.

Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.

II – As questões que importa decidir são, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, as seguintes: - saber se não poderão considerar-se provados os factos descritos nos pontos 8 e 9 do elenco dos factos provados constante da sentença recorrida, por se basearem em depoimento indireto; - saber se a prova produzida impõe decisão diferente da que foi tomada n sentença recorrida, no que se refere aos factos descritos nos pontos 7 e 10 do elenco dos factos provados constante dessa sentença; - saber se a factualidade provada não integra a prática do crime de violência doméstica por que o arguido e recorrente foi condenado, mas antes a prática de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo art.353.º do Código Penal; -saber se, face aos critérios legais, dever ser reduzida, e suspensa na sua execução, a pena de prisão em que o arguido e recorrente foi condenado.

III – Da fundamentação da douta sentença recorrida consta o seguinte: «(…) II – Fundamentação de facto A – Factos provados Com relevo para a presente decisão provaram-se os seguintes factos: 1) O arguido e CC iniciaram um relacionamento amoroso, com coabitação em 2003 e contraíram casamento em 29.05.2005.

2) Desse casamento nasceu, a .../.../2004, DD.

3) Pelo menos desde 2017, o casal, a filha DD e BB, fruto de um anterior casamento de...

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