Acórdão nº 119/20.1T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução19 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES 1. Relatório J. S.

intentou acção declarativa de condenação contra M. O.

pedindo seja declarada a resolução do contrato de arrendamento existente entre o mesmo e a Ré e esta condenada a proceder à desocupação do imóvel locado, devendo o mesmo ser entregue livre de pessoas e bens.

Alegou para tanto e em síntese que: - é proprietário de um prédio urbano, em propriedade total com andares ou divisões susceptíveis de utilização independente; - em 1975 deu de arrendamento o 1º Dt.º do referido prédio ao marido da Ré, que entretanto faleceu, tendo-se o arrendamento transmitido para aquela, sendo a renda actual de € 768,00 anuais e € 64,00 mensais, a qual devia ser paga no domicílio do senhorio, mas desde março de 2004 que se encontra a ser paga por depósito liberatório na Caixa … por a inquilina ter declarado que o senhorio se encontrava ausente temporariamente, facto que não ocorre há vários anos e é conhecido daquela; - no dia que indica, o A. foi chamado ao prédio por outros inquilinos devido ao facto de a aqui Ré estar a fazer desacatos nessa manhã e ter colocado uns blocos de cimento a dividir o jardim que os inquilinos do r/c costumam tratar, chegados ao local, o A. e a esposa começaram a retirar os blocos que estavam a dividir o logradouro do caminho cimentado e a colocá-los encostados à parte posterior do r/c, por baixo da sacada posterior do arrendado da Ré, onde a mesma assomou e sem dizer nada, atirou com água sobre a esposa do A., não a tendo atingido, tendo atirado água que atingiu o A. e acto contínuo começou a atirar vasos com plantas e terra sobre o A. e a esposa, tendo um deles atingido o A. na cabeça, provocando-lhe dois cortes, um com 2 cm e outro com 5 cm, dos quais verteu sangue, tendo sido tratado na urgência; - no mesmo dia e lugar a Ré dirigiu-se ao A. e chamou-lhe “palhaço” e “corno” e disse “os filhos haviam de lhe cortar o pescoço porque anda a comer o que é deles”; - ao agir da forma descrita a Ré praticou os crimes de ofensas corporais e injúrias, tendo o A. apresentado queixa-crime; - posteriormente, no dia que também indica, na rua e localidade que também refere, apareceu a Ré no outro lado da estrada e mudou para o lado em que seguia o A. e dirigiu-lhe as seguintes expressões: “Ó velho, estás quase a morrer, filho da puta”, “Estás ficar velho, filho da puta”; - ainda posteriormente, no dia que também indica, a Ré, sabendo que os inquilinos do r/c Dt.º tinham ido á missa, sujou a entrada e a porta da entrada com água suja com terra, que entrou na casa daqueles; - anteriormente, em data que indica, o A. e a esposa foram chamados ao prédio para retirar um plástico que a Ré tinha colocado na parte do terreno que faz parte do arrendado pelos inquilinos do r/c e que costumam tratar, a Ré, a partir do 1º Dt.º, dirigiu-se à esposa do A. e disse: “és uma puta”, “és uma cabra” e “arranjaste um homem para te manter”, expressões que constituem injúria; - os insultos deste género são habituais e repetem-se sempre que o A. e a esposa se dirigem ao local seja porque razão for; - os restantes inquilinos têm receio da Ré; - invoca o disposto no art.º 1083º do CC.

*A Ré citada contestou, impugnando os factos.

*Foi proferido despacho saneador em que foi consignado, além do mais, o objecto do litigio - “consiste em aferir se deve ser resolvido o contrato de arrendamento em causa nos autos e, nessa sequência, condenada a Ré a desocupar o locado, entregando-o ao Autor” – e os temas da prova – “aferir dos comportamentos da Ré em relação ao Autor e a terceiros que, pela sua gravidade, tornem inexigível ao Autor a manutenção do contrato de arrendamento.”*Realizou-se o julgamento, tendo vindo a ser proferida sentença que decidiu julgar a acção improcedente, absolvendo a Ré do peticionado.

*Inconformado veio o A. interpor recurso, pedindo a alteração da matéria de facto e se considere que se encontra verificado o incumprimento da Ré no sentido de conduzir à procedência dos pedidos, tendo terminado as suas alegações com as seguintes conclusões: A - Atenta a prova produzida dos factos dados como provados da petição inicial e os que foram conhecidos no decurso da produção e prova além dos factos dados como provados devem ainda ser dados como provados que “A Ré tentou espetar um garfo nos olhos do senhorio aquando do episódio ocorrido em 09 de dezembro de 2018, tendo tal facto não acontecido em virtude de o J. R. se ter interposto entre a Ré e o senhorio e ter sido atingido com o garfo no seu braço esquerdo.” Uma vez que são factos relevantes para a boa decisão a causa e aplicação a justiça material.

Pelo que já se pode concluir que se verifica a necessidade de ampliar a matéria de facto, devendo a decisão ser anulada nos termos da alínea c), do n.º 2, do artigo 662 do CPC.

B - No que diz respeito à matéria dada como não provada e relativamente à alínea a) que não ficou provado que foi dito pela Ré “Arranjaste um homem pare te manter” a mesma foi reproduzida pela Testemunha: E. P. – (…) (07:37) (…) A dona M. O. Veio de cima veio de cima desceu as escadas veio pelas escada abaixo e provocou o meu marido puxou para ele com um garfo que lhe queria arrancar os olhos e eu disse-lhe a Senhora deia me o garfo que eu antes quero ver a Senhora a matar-me a mim do que a matar a ele, pronto ela voltou a subir para cima para as escada encheu, foi lá para a varanda, encheu “ò sua puta sua vaca (08:04) arranjaste um homem para te manter ele é um corno um palhaço os filhos haviam de lhe corar o pescoço pela puta que arranjou (…) pelo que não restava ao tribunal a quo considerar que a mesma foi produzida pela Ré e considerar como provado esse facto a acrescentar aos factos provados.

Pelo que já se pode concluir que se verifica a necessidade de ampliar a matéria de facto, devendo a decisão ser anulada nos termos da alínea c), do n.º 2, do artigo 662 do CPC.

C - Quanto ao facto não provado b), não se pode dizer que tenha sido feita prova para que o mesmo fosse dado como provado da forma como está formulado, ma atenta a prova que de seguida se vai indicar expressamente deveria ter sido dado como provado que o autor sofreu cortes na cabeça que lhe levaram a ter de ser socorrido no hospital e levar 15 pontos, tendo o mesmo vertido sangue no momento em que foi atingido pelos vasos atirado pela Ré da sua varanda sobre a cabeça do senhorio.

D - Por sua vez o ponto d) da matéria dada como não provada devia ter sido dada como provada pelos testemunhos seguintes Advogado do Autor – (06:29) E em relação a deitar uma água suja quando vocês foram pá uma vez pá igreja? Testemunha: J. B. – Fomos á missa quando chegamos tínhamos a varanda do lado da frente toda cheia de terra e água que ela tem um vaso com terra e deitava água por cima dos vasos e depois borrávamos tudo em baixo Advogado do Autor – (07:36) Mas entre si e ela ou entrei e outros inquilinos a Senhora tem conhecimento de algum episódio alguma situação que terá acontecido que ela tenha feito habitualmente sei lá sujar coisas deitar coisa abaixo? Testemunha: M. C. – Deitar coisa aquilo é quase diariamente Advogado do Autor – Mas diga alguma que saiba? Testemunha: M. C. – Bota água pelas varandas a baixo com terra de vasos e tudo eu limpo e ela depois (…) se eu limpar à sexta feira ela anda no Domingo a deitar terra a botar água nos vasos os vasos estão carregados de terra até cima e a água cai abaixo tenho sempre as minhas entradas todas todas sujas? O que deve ser feito nos termos do n.º 1 do artigo 662.º do CPC.

E - Quanto ao ponto e) da matéria dada como não provada relativamente ao facto de os insultos serem habituais e se repetirem diariamente e em relação não só ao senhorio e sua esposa quando vão ao local do arrendamento mas também quanto ao restante inquilinos é transversal a todos os depoimentos das cinco testemunhas apresentadas pelo autor e não se diga que é por causa de todos não se darem bem com a ré, uma vez que isso é uma consequência da má vizinhança que produz e não podia dar outra resultado, seno o facto de quase todos se não todas estas testemunhas terem referido não se darem bem com a Ré um fundamento que justifica a causa de pedir e o pedido.

O que deve ser feito nos termos do n.º 1 do artigo 662.º do CPC.

F - os factos que integram objetivamente as normas invocadas se como causa da resolução do contrato de arrendamento nos termos do artigo 1083.º do Código Civil foram provados, seja com a matéria dada como provada sem a alteração que aqui se invoca e se requer seja conhecida e mais ainda com a matéria dada como provada além da já incluída na sentença que aqui se invoca.

Sendo que a inexigibilidade da manutenção do contrato se presume, não tendo a Ré conseguido ilidir tal presunção não restava ao tribunal a quo outra alternativa que declarar o contrato resolvido e cessado o arrendamento com base da presunção.

O que deve ser feito nos termos do artigo 1083.º do Código Civil.

*A Ré contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, tendo concluído as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª) Não padece a douta sentença ora em crise de qualquer vício, razão pela qual a decisão recorrida se deverá manter nos seus precisos termos.

  1. ) Não há razão para alterar a matéria de facto nos termos pretendidos pelo Recorrente, não merecendo qualquer censura a decisão que julgou totalmente improcedente a acção, à luz dos preceitos legais invocados nessa mesma douta decisão.

  2. ) É com base na apreciação crítica da prova testemunhal carreada para os autos que se formou a convicção do tribunal, dando-se particularmente como não provado que “os insultos deste género são habituais e repetem-se sempre que o autor e a sua esposa se dirigem ao local seja porque razão for” (sublinhado nosso).

  3. ) Posto isto, e considerando esta ocorrência esporádica de expressões injuriosas, o Tribunal tinha necessariamente de entender que não existe causa de resolução do contrato de arrendamento...

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