Acórdão nº 787/13.0TACTB.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | ALCINA DA COSTA RIBEIRO |
Data da Resolução | 18 de Maio de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA I. RELATÓRIO 1.
Em processo comum e perante o tribunal singular, foram pronunciados os arguidos: AA, casado, médico, nascido a .../.../1954, em ..., ..., filho de BB e de CC, e residente na Rua ..., ... – ...; DD, casado, farmacêutico, nascido a .../.../1938, em ...l, ..., filho de EE e de FF, residente na Rua ..., ...; GG, divorciado, médico, nascido a .../.../1963, em ..., ..., filho de JHH e de II, residente na Rua ..., ..., ..., e JJ, casado, médico, nascido a .../.../1955, em ..., ..., filho de KK e de LL, residente na Praceta ... – ..., imputando-lhes a prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos artigos 103º nº 1 als. a) e c) e 104º nº 2 do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de junho, na redacção dada pela Lei nº 60-A/2005, de 30 de dezembro.
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Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença datada de 11 de outubro de 2021, onde consta a seguinte Decisão: Altera-se a qualificação jurídica dos factos descritos na acusação – para a qual se remete no despacho de pronúncia – nos termos e para os efeitos previstos no artigo 358º nºs 1 a 3 do Código de Processo Penal, subsumindo-se tais factos, relativamente a cada arguido, a um crime de fraude fiscal simples, p. e p. pelo artigo 103º nº 1 als. c) do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, na redacção dada pela Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro, por força do disposto no artigo 2º nº 4 do Código Penal, e declara-se a extinção do procedimento criminal contra os arguidos AA, DD, GG e JJ, por força da prescrição do procedimento criminal, nos termos previstos no artigo 21º do referido diploma e no artigo 118º nº 1 al. c) do Código Penal.
Em consequência, não se determina a perda de vantagens requerida pelo Ministério Público em sede de acusação (artigo 110º nºs 1 al. b) e 4 a contrario do Código Penal).
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Inconformado, recorre o Ministério Público, concluindo (após convite ao abrigo do disposto no artigo 417.º, n.º 3, do Código de Processo Penal) 1. A sentença recorrida limita-se a apreciar a questão prévia da prescrição, sem apreciar o fundo ou mérito da questão, não constando da mesma nem a fundamentação, com os factos provados e não provados, nem tão pouco o dispositivo com as disposições legais aplicáveis e a decisão condenatória ou absolutória, pelo que incorreu a mesma na falta de cumprimento do disposto no art. 374º, n.ºs 2 e 3 do C. P. Penal, sendo nula, nos termos do art. 379º, n.º 1, al. a) do C. P. Penal.
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A sentença recorrida não podia ter conhecido da prescrição sem conhecer do mérito da causa, elencando os factos provados e não provados, para então, a partir dos primeiros, aferir se aquela se verifica ou não.
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A sentença recorrida errou ao considerar que os factos em causa seriam apenas suscetíveis de integrar o crime de fraude fiscal simples, e não do crime de fraude fiscal qualificada, p. e p. pelos arts. 103º, n.º 1, als. a) e c) e 104º, n.º 2 do RGIT, como constava na acusação e do despacho de pronúncia.
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A sentença recorrida não poderia ter declarado o procedimento criminal extinto por prescrição, uma vez que a contagem do respetivo prazo apenas se iniciou com o recebimento dos valores que os negócios simulados pretendiam ocultar às autoridades fiscais, sendo que a sentença não é omissa relativamente à data em que tal recebimento ocorreu.
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Em qualquer caso, considerando a factualidade constante do despacho de pronúncia, a data em que os arguidos foram notificados do despacho de acusação e o disposto pelos arts. 118º, nº 1, alínea b) e 121º, nº 1, al. b), ambos do Cód. Penal, e art.º 21º, nº 4, do RGIT, o procedimento criminal não se encontra prescrito.
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A sentença recorrida, ao fundamentar a decisão sobre a prescrição em factos que não considerou como provados, nomeadamente os relativos às datas dos contratos simulados e a forma como a fraude foi concretizada, incorreu em contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, vício previsto pelo art.º 410º, nº 2, al. b), do C.P. Penal.
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Além disso, constata-se que estamos perante um vício por insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, na medida em que o Tribunal “a quo” não fez um juízo crítico e minimamente entendível sobre a forma como chegou a dar como não provados a maioria dos factos constantes da decisão instrutória, além de que a decisão de considerar os crimes prescritos não se fundamenta nem baseia na matéria de facto provada, a qual não existe, por não existir decisão de mérito, nos termos do disposto no art. 410º, n.º 1, al. a) do C. P. Penal.
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A sentença recorrida violou, assim, o disposto pelos arts. 374º, nº s 2 e 3, 410º, nº 2, alíneas a) e b), ambos do C.P. Penal, arts. 21º, nº 4, 103º, n.º 1, als. a) e c) e 104º, n.º 2 do RGIT, e arts. 118º, nº 1, alínea b) e 121º, nº 1, al. b), ambos do Cód. Penal, devendo ser declarada a nulidade da referida sentença, e ser ordenado a repetição do julgamento ou, sem conceder, caso assim não se entenda, deve ser revogada e substituída por outra que considere os arguidos autores materiais da prática dos crimes de que vinham acusados, e que lhe aplique uma pena que considere adequada à gravidade do ilícito e à situação pessoal dos arguidos, anterior e posterior à prática dos factos.
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Os arguidos, AA, GG e JJ, em reposta, concluem: 1. Nas suas conclusões agora renovadas, o Recorrente converte dois pedidos contraditórios em pedidos subsidiários (nascendo ambos da mesma alegada nulidade da sentença): 2. Pugna para que a sentença seja declarada nula, ordenando-se, em consequência, a repetição do julgamento.
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Subsidiariamente, pede que a sentença seja revogada e substituída por outra que que condene os Recorridos! 4 Este pedido subsidiário é feito apesar de o Recorrente assinalar, como uma das falhas da sentença e determinante a sua nulidade, a falta de indicação dos factos provados e dos factos não provados.
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Pelo que, salvo melhor leitura, o Recorrente entenderá que esse Venerando Tribunal poderia condenar os Recorridos mesma na ausência de factos provados e não provados! 6. Preterindo as regras relativas à impugnação da matéria de facto, como melhor se explicita na página 4 desta resposta.
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O que, reitere-se, coexiste, de forma inexplicável, com o pedido formulado no sentido de que a sentença seja declarada nula! 8. Pelo que os pedidos continuam a ser contraditórios e incompatíveis, o que os torna ininteligíveis na sua convivência.
Por outro lado: 9. O Recorrente não indica, de forma inequívoca, o momento no qual entende que se deverá iniciar a contagem do prazo de prescrição.
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Havendo, como se assinalou, contradição entre excertos da motivação e a conclusão exarada a este respeito, como melhor se detalha nas páginas 4 a 6 desta resposta.
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O que corresponde à violação do disposto na alínea b), do n.º 2, do artigo 412.º do CPP.
Por último cabe dizer que: 12. A Sentença recorrida procedeu à correta interpretação e aplicação do direito, quando decretou a prescrição do procedimento criminal.
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Para o que dispunha de todos os elementos necessários, os quais foram retirados da Acusação.
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A Sentença recorrida utilizou como ponto de partida para a contagem do prazo de prescrição, aquele que foi também considerado como relevante no despacho de pronúncia.
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O despacho de pronúncia transitou em julgado, sendo que o Recorrente com ele se conformou.
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Uma vez julgada a prescrição enquanto questão prévia, o Tribunal “a quo” não deve julgar as questões que só teria de conhecer se a prescrição não tivesse ocorrido.
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O facto de a prescrição ter sido conhecida na Sentença recorrida, isto é, após o julgamento, não lhe retira a natureza de questão prévia.
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É manifesto o lapso em que incorre o Recorrente quando refere ser qualificado o tipo previsto no artigo 103 n.º 1 alíneas a) e c) do RGIT aprovado pela Lei 15/2001 de 5 de junho, na redação dada pela Lei 60-A/2005 (redação aqui aplicável, como o próprio Recorrente admite).
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A constatação de que a conduta dos Recorridos não foi enquadrável no disposto no artigo 104 do RGIT, na redação aqui aplicável, resulta da própria Acusação, pelo que não carece de mais detalhe.
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Para conhecer, como conheceu, da prescrição, o Tribunal recorrido precisou apenas de constatar a inexistência da utilização de faturas ou documentos equivalentes por operações inexistentes ou por valores diferentes, ou a intervenção de pessoas ou entidades diversas das da operação subjacente.
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Sendo que a conduta dos Recorridos nada tem de criticável, pois não praticaram qualquer crime, inclusivamente o previsto no artigo 103 do RGIT.
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O arguido DD, respondendo, ao Recurso, conclui: 1) (…) 2) (…) 3) (…) 4) (…) 5) Em resumo, o recorrente assenta o recurso que interpôs na premissa, errada, de acordo com a qual não é possível concluir pela prescrição do procedimento penal contra o arguido, sem que, antes, se aprecie a questão de mérito.
6) Ao não apreciar a questão prévia da prescrição em momento anterior ao da realização do julgamento, o Tribunal a quo não ficou impedido de o fazer, depois do julgamento realizado, previamente ao conhecimento do mérito da factualidade levada à acusação.
7) Como, aliás, a decisão recorrida deixa claro, constituindo a prescrição uma questão prévia, deve a mesma ser apreciada previamente ao mérito da acusação, visto que as questões devem ser organizadas na sentença por uma ordem de precedência lógica, não carecendo o Tribunal «de conhecer o mérito da factualidade objeto do processo para poder analisar se se verifica, ou não, a prescrição invocada pelos arguidos».
8) A prescrição advém dos próprios termos da acusação, sendo que é apenas da factualidade contida na acusação (e não de qualquer outra) que o Tribunal a quo se serve para concluir pelo acerto da prescrição arguida pelos arguidos.
9) Em face da factualidade do libelo acusatório, o...
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