Acórdão nº 10000/19.1T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | RIJO FERREIRA |
Data da Resolução | 05 de Maio de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NOS AUTOS DE ACÇÃO DECLARATIVA ENTRE TERRIMINAS – SOCIEDADE INDUSTRIAL DE CARVÕES, SA(aqui patrocinada por AA, adv.) Autora / Apelante / Recorrente CONTRA EDP – GESTÃO DE PRODUÇÃO DE ENERGIA, SA(aqui patrocinada por BB, adv.) Ré /Apelada / Recorrida I – Relatório A Autora intentou a presente acção pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 2.205.865,96 €, a título de juros de mora comerciais, desde 12FEV2012 até 25OUT2017, relativos à quantia em que a mesma foi condenada em anterior sentença arbitral.
A Ré contestou invocando a impossibilidade legal de cumulação de actualização do capital e juros moratórios; e excepcionando o caso julgado e a prescrição.
Foi proferido saneador-sentença que, «considerando que a decisão arbitral determinou, em conformidade com o pedido deduzido no processo arbitral pela aqui Autora, o critério de atualização das quantias em cujo pagamento a aqui Ré foi condenada até ao momento do pagamento, nunca este tribunal poderia condenar a Ré no pagamento de juros de mora, a contar do trânsito em julgado da sentença arbitral até ao pagamento, calculados entre 03/12/2012 e 12/05/2017, acrescida de juros de mora calculados à taxa legal comercial, contados desde a citação até efetivo e integral pagamento, sob pena de se verificar uma duplicação de indemnização pelo mesmo dano decorrente do atraso na entrega das quantias em que a Ré foi condenada», julgou verificada a excepção da autoridade do caso julgado e, em consequência, absolveu a Ré da instância.
Inconformada, apelou a Autora concluindo, em síntese, estar a sentença arbitral destituída de autoridade de caso julgado relativamente à obrigação de juros de mora por não ter decidido essa questão e por relativamente a tal ser totalmente omissa a sua fundamentação.
A Relação, considerando ocorrer excepção de caso julgado uma vez que a questão “relativa à actualização e a sua incompatibilidade com o arbitramento de juros de mora” se encontrar já apreciada e decidida na sentença proferida nos autos de oposição à execução da sentença arbitral, julgou a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida.
Irresignada, vem a Autora interpor recurso de revista (subsidiariamente, revista excepcional) concluindo, em síntese, por estar vedado à Relação conhecer da excepção de caso julgado, quer por violação do contraditório quer por se tratar de questão nova, e por erro de julgamento uma vez que se não verificam as invocadas excepções de autoridade de caso julgado e de caso julgado.
Houve contra-alegação onde se propugnou pela inadmissibilidade da revista (nos termos gerais e excepcional) e pela manutenção do decidido.
II – Da admissibilidade e objecto do recurso A situação tributária mostra-se regularizada.
O requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC).
Tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões (art.º 639º do CPC.
A dupla conformidade decisória é, nos termos do art.º 671º, nº 3, do CPC, obstativa do recurso de revista, a menos que a fundamentação das decisões conformes seja essencialmente diferente.
De acordo com a jurisprudência consolidada do STJ, o conceito de fundamentação essencialmente diferente não se basta com qualquer modificação ou alteração da fundamentação no iter jurídico que suporta o acórdão da Relação em confronto com a sentença de 1.ª instância, sendo antes indispensável que, naquele aresto, ocorra uma diversidade estrutural e diametralmente diferente no plano da subsunção do enquadramento normativo da mesma matéria litigiosa. Assim, na formulação do Acórdão do STJ de 20FEV2020 (proc. 1003/13.0T2AVR.P1.S1), “só pode considerar-se estarmos perante uma fundamentação essencialmente diferente quando ambas as instâncias divergirem, de modo substancial, no enquadramento jurídico da questão, mostrando-se o mesmo decisivo para a solução final: ou seja, se o acórdão da Relação assentar num enquadramento normativo absolutamente distinto daquele que foi ponderado na sentença de 1.ª instância. Ou, dito ainda de outro modo: quando o acórdão se estribe definitivamente num enquadramento jurídico perfeitamente diverso e radicalmente diferenciado do perfilhado na 1.ª instância” (pode consultar-se resenha jurisprudencial sobre a matéria em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2021/01/dupla-conforme.pdf).
No caso dos autos, embora o enquadramento normativo se refira a um mesmo instituto – o caso julgado – o certo é que ele foi considerado em diferentes perspectivas desse mesmo instituto – a autoridade de caso julgado e a excepção de caso julgado – que gozam de autonomia conceptual e diferenciação de requisitos e efeitos, pelo que se haverá de considerar que há uma diferença essencial entre elas, e, consequentemente, não há impedimento à admissibilidade da revista nos termos gerais.
E ainda que se entendesse não ser claro estarmos perante uma fundamentação essencialmente diferente sempre se haveria de resolver essa dúvida por recurso ao brocardo ‘odiosa restringenda, favorabilia amplianda’.
Dessa forma o acórdão impugnado é, pela sua natureza, pelo seu conteúdo, pelo valor da causa e da respectiva sucumbência, recorrível (artigos 629º e 671º do CPC).
Mostra-se, em função do disposto nos artigos 675º e 676º do CPC, correctamente fixado o seu modo de subida (nos próprios...
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