Acórdão nº 591/20.0T8FAF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07 de Abril de 2022
Magistrado Responsável | MARIA CRISTINA CERDEIRA |
Data da Resolução | 07 de Abril de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. RELATÓRIO R. F. intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra X Seguros, S.A., actualmente designada X Seguros, Compañia de Seguros Y Reaseguros, S.A. – Sucursal em Portugal, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe: a) a quantia de € 1.732,21 acrescida de IVA, para a reparação do veículo UO; b) a quantia de € 4.650,00 a título de compensação pela privação do uso e fruição do veículo UO desde a data do acidente até à entrada da presente acção; c) a quantia que vier a ser fixada posteriormente para compensação da privação do uso e fruição desde a data de entrada da acção até efectivo e integral pagamento da indemnização para reparação do veículo UO; d) juros de mora sobre cada um dos pedidos, desde a data do acidente até efectivo e integral pagamento; e) custas de parte.
Para tanto, alega, em síntese, que no dia 8/09/2019, pelas 20H45, ocorreu um acidente de viação no entroncamento da Rua ... com a Rua ..., na freguesia de ..., concelho de Fafe, no qual foram intervenientes os veículos automóveis com as matrículas UO, propriedade do A. e por ele conduzido, e FV, conduzido pelo seu proprietário J. F., estando este veículo seguro na Ré.
Após descrever o acidente, que consistiu no embate entre os dois veículos, alega que o mesmo ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do veículo FV, por não ter realizado devidamente a manobra de execução da curva à esquerda (atento o seu sentido de marcha) e ter precipitado o FV contra a frente do UO que se encontrava parado no entroncamento na Rua .... Por outro lado, se fosse sua intenção mudar de direcção, deixando de circular pela Rua ... e iniciar a circulação na Rua ..., não abrandou a marcha ao aproximar-se do entroncamento, não sinalizou a mudança de direcção e não executou a manobra encostado à berma do seu lado direito por forma a não embater no veículo UO.
Acrescenta que, em consequência do acidente, sofreu os danos patrimoniais que descrimina na petição inicial – relativos ao custo da reparação do veículo UO orçamentada em € 1.732,21 conforme peritagem realizada pela Ré, e à privação do uso e fruição do mesmo desde a data do acidente até à da propositura da acção, que quantifica em € 4.650,00 atentos os dias já decorridos (160) e o valor diário de aluguer de uma viatura de idênticas características (€ 58,13), com a equidade necessária - e cujo ressarcimento peticiona naquele articulado.
Refere que o veículo UO não está reparado, dado o Autor não ter capacidade financeira para efectuar a reparação pelos seus próprios meios, nem para adquirir outro veículo. O Autor utilizava o UO nas suas deslocações diárias de casa para o trabalho e vice-versa e nas demais deslocações da sua vida privada, vendo-se obrigado a depender de familiares e amigos e a utilizar transportes públicos para se deslocar.
Não estando o veículo UO ainda reparado, os danos decorrentes da privação do uso e fruição continuaram a suceder, pelo que relega para momento posterior a liquidação dos demais danos que, entretanto, venha a suportar.
A Ré contestou, impugnando os factos alegados pelo Autor relacionados com a dinâmica do acidente e o dano de privação do uso do veículo que ele alega ter sofrido, dando uma versão distinta do modo como ocorreu o acidente, da qual resulta que a culpa na ocorrência do mesmo decorreu da condução do veículo levada a cabo pelo Autor.
Mais alega que procedeu à avaliação dos danos do veículo UO, ainda que a título condicional, tendo sido detectados danos no valor de € 1.732,21 e que o montante peticionado a título do alegado dano de privação do uso é excessivo, além de que não estão demonstrados factos que revelem a sua existência.
Refere, ainda, que não tendo sido o condutor do veículo seguro o responsável pelo embate, não pode ser assacada à Ré qualquer responsabilidade, não se verificando, por isso, qualquer nexo de causalidade entre a conduta do condutor do veículo seguro e os danos produzidos no veículo UO.
Conclui, pugnando pela improcedência da acção, com a sua absolvição de todos os pedidos.
Foi proferido despacho saneador, no qual se fixou o valor da causa, se procedeu ao saneamento da acção, verificando-se a validade e regularidade da instância, definiu-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas de prova, que não sofreram reclamações.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo.
Após, em 6/01/2021, foi proferida sentença que julgou a presente acção procedente e condenou a Ré no pagamento à Autora:
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Da quantia de € 1.732,21 acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento; b) Da quantia de € 4.000,00 e de € 25,00 por dia, contados desde 1-7-2020 até integral pagamento da quantia referida em a), montantes acrescidos de juros de mora à taxa legal calculados sobre os mesmos desde a data da presente sentença até efetivo e integral pagamento.
Absolveu a Ré do demais peticionado.
Na mesma data da notificação da sentença às partes (em 7/01/2021), foi apresentado um “Requerimento de Transacção” (refª. 37646752), subscrito pelos mandatários de ambas as partes, nos seguintes termos: 1.º O Autor reduz o pedido para o valor de € 4.000,00 (quatro mil euros), que a Ré aceita pagar.
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A Ré procederá ao pagamento da referida quantia, por meio de transferência bancária para o IBAN do Autor PT50 …………….. 1, contra recibo a enviar para o escritório da Ilustre Mandatário do Autor, no prazo de 30 dias, a contar da sentença homologatória da presente transação.
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Com o recebimento de tal quantia, o Autor considera-se integralmente ressarcido de todos os prejuízos patrimoniais e não patrimoniais advenientes do sinistro em apreço nos autos, nada mais tendo a exigir da ora Ré, seja a que título for.
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As custas eventualmente em dívida a juízo serão suportadas em partes iguais, prescindindo-se de custas de parte.
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Mais requerem a V. Exa se digne homologar a presente transação nos precisos termos em que é exarada, obstando assim o prosseguimento dos autos.
Em 10/01/2021 foi proferida sentença homologatória da mencionada transacção, na qual foi ordenado o cumprimento do disposto no artº. 291º, n. 3 do CPC relativamente ao Autor (refª. 171272806).
Notificado o Autor nos termos e para os efeitos do disposto no artº. 291º, nº. 3 do CPC, veio este, por requerimento de 13/01/2021, declarar que não ratificava o acto praticado pelo seu mandatário (refª. 10987274).
Em 28/01/2021, a Ré apresentou um requerimento (refª. 37872139), manifestando a sua surpresa com o conteúdo do requerimento do Autor, alegando que, após a audiência de julgamento, foi celebrada uma transacção entre o Autor e a Ré, nos termos da qual aquele reduziu o pedido formulado para a quantia de € 4.000,00, quantia essa que a Ré aceitou liquidar, tendo em 13/01/2021, em cumprimento do acordado, procedido à transferência de € 4.000,00 para a conta bancária do Autor, juntando aos autos documento comprovativo do pagamento daquela quantia.
Refere, ainda, que apesar de não ter ratificado a transacção e de a Ré ter informado o Autor, na pessoa do seu mandatário, de que pretendia interpor recurso da decisão proferida nos autos, o Autor não devolveu aquela quantia à Ré, o que demonstra que o Autor actua em manifesta litigância de má fé.
Conclui, pedindo a condenação do Autor como litigante de má fé, no pagamento de uma indemnização à Ré num montante que se afigurar razoável e em multa, cujo montante deverá ser fixado pelo Tribunal.
O Autor veio responder em 3/02/2021 (refª. 37985390), pugnando pela improcedência do pedido de condenação como litigante de má fé, alegando, para tanto, que a Ré, depois de notificada da sentença proferida em 6/01/2021, juntou aos autos o requerimento de transacção, sem previamente auscultar o A. e o seu mandatário sobre se consideravam a prolação daquela sentença uma alteração das circunstâncias sobre as quais as partes fundaram a negociação, mais se apressando a proceder à transferência bancária da quantia de € 4.000,00 apesar de, nos termos da transacção que juntou aos autos, ter 30 dias para o fazer, manifestando, ainda, a sua intenção de restituir à Ré a quantia “que esta injustificadamente lhe transferiu”, o que não fez até àquela data devido à doença de que padece e à situação pandémica que “desaconselha e até desautoriza deslocações necessárias”. Requereu, por fim, que fosse dada sem efeito a sentença homologatória proferida em 11/01/2021 (refª. 37917658).
Em 9/02/2021 veio a Ré dar conhecimento ao Tribunal do facto de o Autor não ter procedido à devolução da quantia em causa, requerendo que o mesmo fosse notificado para juntar aos autos comprovativo da sua situação de doença (refª. 37985390).
Em 17/03/2021 foi proferida decisão a considerar a transacção realizada e homologada ineficaz relativamente ao Autor, determinando a prossecução dos presentes autos e a notificação daquele para informar sobre “se procedeu já à devolução do montante de € 4.000,00 que lhe foi transferido pela Ré em face do acordo homologado nestes autos, comprovando a mesma em caso de resposta positiva, e justificando a sua não realização no caso contrário” (refª. 172279660).
Por requerimento apresentado em 19/03/2021 (refª. 38328797), veio o Autor alegar que, tendo em atenção os fundamentos que emergem da sentença proferida em 6/01/2021 e face à posição assumida pela Ré no recurso que interpôs daquela sentença, em que não coloca em causa a sua responsabilidade civil e a obrigação de ressarcir o A. pelos prejuízos que sofreu, reconhecendo-lhe um crédito no valor de € 4.000,00, e sem prejuízo da decisão que vier a recair sobre o aludido recurso, não procedeu à devolução da quantia transferida pela Ré e considera que a sentença proferida é exequível, conferindo-lhe, desde já, o direito a exigir da Ré, pelo menos, aquele montante, pelo que o mesmo será tomado em consideração para efeito de acerto de contas entre as partes.
A Ré, por...
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