Acórdão nº 76/16.9GAVVD-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA VARIZO MARTINS
Data da Resolução04 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam os Juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I. RELATÓRIO No processo comum, com intervenção de Tribunal Singular nº 76/16. 9 GAVVD do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de ..., por despacho proferido no dia 04/09/2021, a Mmª Juiz a quo revogou a suspensão da execução da pena de prisão de três anos e seis meses de prisão, sujeita a regime de prova, aplicada ao arguido A. G..

Inconformado com esse despacho, o arguido A. G., dele veio interpor o presente recurso, apresentando a respectiva motivação, que finaliza com as conclusões que a seguir se transcrevem: “1. O Tribunal recorrido por despacho de 07 de setembro de 2021, decidiu: revogar a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao condenado nos presentes autos e, consequentemente, determinou que A. G. cumpra a pena de três anos e seis meses de prisão em que foi condenado no âmbito destes autos.

  1. Com o devido respeito, que é merecido, o Arguido não se pode conformar com o douto despacho proferido merecendo o mesmo censura.

  2. Na verdade, não deve ser revogada a suspensão da execução da pena aplicada, porquanto julga o arguido que ainda é de concluir que a simples censura do facto e ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

  3. O arguido foi condenado pela prática de um crime de detenção de arma proibida previsto e punido no artigo 86.º n.º 1 c) e d) da Lei n.º 5/2006, de 23-2 na pena de dois anos de prisão, de um crime de ameaça revisto e punido pelo artigo 153.º n.º 1 e 155.º n.º 1 a) do Código Penal na pena de seis meses de prisão e, de um crime de violência doméstica, previsto e punido no artigo 152.º n.º 1 a) e n.º 2, n.º 4 e n.º 5 do Código Penal na pena de dois anos e seis meses de prisão e, em cúmulo jurídico, na pena principal única de três anos e seis meses de prisão, suspensa por três anos e seis meses, sujeita a regime de prova, cujo plano individual de readaptação social será determinado e acompanhado pelo Instituto de Reinserção Social e Serviços Prisionais, devendo nomeadamente o arguido responder a convocatórias do técnico de reinserção social, receber visitas do técnico de reinserção social e comunicar-lhe ou colocar à sua disposição informações e documentos comprovativos dos seus meios de subsistência, informar o técnico de reinserção social sobre alterações de residência e de emprego, bem como qualquer deslocação superior a 8 dias e sobre a data do previsível regresso, com obrigação do arguido se submeter a tratamento ao alcoolismo e nas sanções acessórias de proibição de contacto com R. M., incluindo afastamento da sua residência e do seu local de trabalho e obrigação de frequência de um programa de prevenção de violência doméstica.

  4. O arguido prestou declarações, respondendo a todas as questões que lhe foram colocadas, e apresentou justificações para os “incumprimentos” que lhe foram apontados, mantendo uma postura conforme e arrependido.

  5. Cabe referir que o arguido compareceu na audição sem que para tal estivesse notificado, o que demonstra o interesse e respeito que tem pelas instâncias judiciais, o que já sucedeu em diligências anteriores.

  6. O arguido demonstra ainda interesse nos presentes autos, porquanto fez TIR espontâneo em 30.04.2019 – referência 163230104, e em 30.01.2020 – referência 167016484, após alterar a sua morada, pelo que a sua morada era conhecida nos autos.

  7. Em relação às consultas, dúvidas não existem da existência das dificuldades, fruto do estado de pandemia decretado pela OMS em 13 de março de 2020, de toda a estrutura da saúde, nestes termos verificam-se as dificuldades relatadas pelo arguido, desde logo a falta de resposta dos centros de saúde, que chegaram a fechar portas, precisamente quando este aguardava o agendamento de uma consulta por mensagem.

  8. Não podemos esquecer ainda que as consultas visavam o controlo do consumo etílico do arguido, porém cabe aludir que a médica de família do arguido referiu que o arguido “ estava num baixo risco de consumo abusivo de álcool e também baixa probabilidade de dependência alcoólica” em comunicação datada de 08.05.2018 (conforme documento – Carta de Acompanhamento - junto a fls. 601), e de 11.10.2017 refere a “inexistência de problemática de alcoolismo”, tendo pedido análises com função hepática (ofício de 14.09.2018), pelo que revogar a pena suspensa por esta questão seria um contrassenso. Pelo que se pode concluir que o poder judicial se está a imiscuir em questões médicas face ao declarado pela médica de família – Dra. I. F..

  9. No entanto, no dia 22 de abril de 2021, o arguido comunicou aos autos o agendamento de consulta presencial no projecto SORRIR para o dia 26 de abril de 2021, conforme comprovou nos autos em requerimento com referência 11357487, demonstrando o interesse em cumprir o regime de prova. Todavia aquando do preenchimento do Boletim de Ficha de Inscrição o médico comunicou-lhe que não tinha competência para a consulta porquanto o arguido não reside na área de residência daquele serviço de saúde, pelo que tinha que ser seguido no Centro de Saúde de .... (vide documento já junto aos autos) 11. Perante as dificuldades encontradas na inscrição em ..., o arguido dirigiu-se ao CRI de Braga e procedeu à sua inscrição, aguardando o agendamento da consulta, conforme se verifica pela declaração de presença com data de 17 de agosto de 2021, junta aos autos.

  10. Mais, o arguido justificou a sua ausência da zona de residência com o processo n.º 1334/19.6JABRG – que corre termos no Juízo Central Criminal de Braga, em que foi vítima de um crime de tentativa de homicídio, estando o arguido nos referidos autos a cumprir pena de prisão, todavia já fez chegar ameaças ao aqui arguido, pelo que o mesmo teme constantemente pela sua vida, ausentando-se regularmente com medo da concretização de tais fitos, encontrando-se mais em …. (Sessão de 09- 04-2021, CD Faixa 1, inicio 09:30:21 e termo 10:08:13 passagem de 06:02 a 06:24) 13. A continuação de tais ameaças afastou o arguido da sua zona residência por medo.

  11. A Sra. Técnica também salientou que o arguido após ter alta hospitalar, de imediato se deslocou aos serviços de reinserção entregar documentos comprovativos do seu internamento e da sua situação de saúde, o que demonstra o interesse do arguido, sendo um factor relevante a sopesar. De evidenciar, ainda que a Sra. Técnica declarou que as informações e justificações que o arguido ia apresentando eram confirmadas quer pela filha quer pelos contactos colaterais. (Sessão de 09-04-2021, CD Faixa 1, inicio 09:30:21 e termo 10:08:13 passagem de 23:48 a 26:00) 15. É digno ainda de relevância que a Sra. Técnica refere que o arguido para além de consequências físicas da agressão de que foi alvo, ficou com danos psicológicos, pelo que tal deve ser relevado.

  12. E conforme refere o próprio despacho, citando a Sra. Técnica de Reinserção, foi no último ano que não conseguiu contacto com o arguido, ou seja, posteriormente à referida agressão com arma branca. (Sessão de 09-04-2021, CD Faixa 1, inicio 09:30:21 e termo 10:08:13 passagem de 27:05 a 27:35) 17. O arguido assumiu perante o tribunal através de documento manuscrito (fls 845), datado de 12.04.2021, que “ (…) tenho noção que tenho que cumprir o plano que me foi aplicado, sei que já falhei algumas vezes, mas estou arrependido e disposto a cumprir tudo que o tribunal e a Sra. Técnica me mandar fazer até au fim, também vou marcar consulta no Sorrir para continuar os tratamentos.” 18. Temos ainda de salientar que o arguido nunca mais procurou a ofendida, pelo que não podemos deixar de referir que não há qualquer comunicação de conflito entre a vítima e o arguido, não mantendo os mesmos qualquer contacto, atente o tempo decorrido desde os factos nos presentes autos, conforme confirmou a Sra. Técnica – Dra. A. P.. O que é crucial, dado que tal facto revela que a pena 19. O arguido esclareceu ainda, que está inserido profissionalmente, dado que mantém a actividade de trabalhar como ajudante de motorista, no transporte e comércio de carros. E que iniciou um relacionamento, estando a companheira inserida social e laboralmente.

  13. Entendemos ainda, salvo o devido respeito, que dando-se-lhe assim uma derradeira oportunidade, para que possa reflectir em liberdade sobre o seu passado e procurar um novo processo de vida adequado à sua reinserção na sociedade, estarão asseguradas as necessidades de prevenção geral e especial e realizadas de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

  14. Neste sentido, entendemos existirem sérias razões para crer que da não revogação da suspensão da execução da pena de prisão, resultam vantagens para a reinserção social do recorrente.

  15. Assim, é de pressupor que o cumprimento de uma pena de prisão afectará irremediavelmente o arguido e a sua reintegração, acresce o facto de o arguido ter 49 anos de idade, pelo que a integração em ambiente prisional será um factor dessocializador, que criará um sentimento de revolta com efeito contrário ao objectivo das penas.

  16. O arguido justificou o seu comportamento omissivo, o processo de ressocialização do condenado sairá beneficiado se a pena de prisão se mantiver suspensa na sua execução, uma vez que o condenado demonstrou claramente que pretende cumprir o Plano de reinserção, e ainda é possível que as finalidades nas penas sejam alcançadas.

  17. O arguido mostra-se inserido na sociedade e o fator gerador do perigo, que era a manutenção da relação afetiva com a ofendida está debelada nesta data, uma vez que estão separados e ambos refizeram os seus relacionamentos amorosos com terceiras pessoas e ambos (arguido e ofendida) não voltaram a contactar-se.

  18. Pelo que a revogação da suspensão da execução da pena de prisão viola o Princípio da proporcionalidade, adequação e necessidade previsto no artigo 18º da Constituição da República Portuguesa.

  19. O arguido tem 49 anos de idade e padece de problemas de saúde, e não cometeu mais qualquer crime.

  20. “In casu, e...

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