Acórdão nº 229/13.1TAELV.1.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução07 de Abril de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. n. º 229/13.1TAELV.1.E1.S1 Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.

No Tribunal Judicial da Comarca ... (Juízo Central Cível e Criminal ... — Juiz ...) foi julgado (entre outros), em audiência de discussão e julgamento, ao abrigo do disposto no art. 472.º, do CPP, o arguido AA e, por acórdão de 14.10.2021, foi condenado na pena única conjunta de 12 (doze) anos e 6 (seis) meses de prisão, resultante do cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos n.ºs 229/13.... (estes autos), 20/14...., 743/13...., 479/06.... e 192/12.....

  1. Inconformado, o arguido interpôs recurso do acórdão cumulatório para o Tribunal da Relação ...; o recurso foi admitido por despacho de 23.11.2021.

    O recorrente concluiu a motivação nos seguintes termos: «1. No âmbito dos presentes autos, foi o arguido condenado em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas no âmbito dos processos 229/13...., 20/14...., 743/13...., 479/06...., 113/09.... e 192/12...., na pena única de 12 (doze) anos e 6 (seis) meses de prisão.

  2. O Recorrente pretende nesta sede ver sindicado o cúmulo alcançado pelo Tribunal a quo, isto porque, o processo 479/06.... não poderia ter sido englobado no cúmulo jurídico, atento o decurso do prazo da suspensão da pena aplicada no processo 479/06...., não tendo o Tribunal recorrido aferido da sua extinção ou revogação.

  3. Ademais, porque foi proferido despacho, datado de 22-10-2021, que declarou a pena suspensa aplicada no âmbito do processo supra identificado, extinta.

  4. Nessa sequência e atentas as condições pessoais do arguido, não poderia o Tribunal recorrido ter alcançado tal pena única de 12 anos e 6 meses de prisão.

  5. Entendeu o Tribunal a quo que “Assim, conclui-se que o primeiro trânsito relevante ocorreu a 30/01/2017, referente ao processo n.º 479/06...., sendo todos os factos que originaram as condenações supra expostas, ocorreram antes dessa ata. Estão assim numa relação de concurso, as condenações sofridas nos processos com os n.ºs 229/13...., 20/14...., 743/13...., 479/06.... 192/12.....” 6. Olvidou o Tribunal recorrido, que já havida findado o prazo da pena suspensa aplicada ao arguido no processo 479/06...., na data em que foi proferida a decisão ora recorrida.

  6. Não existia à data da prolação do acórdão, despacho que ordenasse a sua extinção ou revogação, pelo que a mesma nunca poderia ser englobada no presente cúmulo.

  7. A condenação sofrida no âmbito do processo 479/06...., transitou em julgado em 30/01/2017, data em que começou a correr o período de 4 anos e 6 meses de suspensão da execução da referida pena de prisão, tendo-se esgotado o seu prazo no dia 30/07/2021.

  8. O que serve por dizer que, não existindo qualquer despacho que recaísse sobre a extinção ou revogação da pena suspensa, deveria o Tribunal de 1.ª instância procurar esclarecer sobre o estado da mesma, ou, não o fazendo, nunca poderia a mesma ter sido englobada no cúmulo de que ora se recorre.

  9. Ademais, em caso de concurso de superveniente de penas, pode o tribunal “do cúmulo” converter uma pena de prisão suspensa em efetiva para efeitos da determinação e aplicação do dito cúmulo, tal já não sucede quando se achar já esgotado o respetivo período de suspensão.

  10. Atendo o teor do acórdão recorrido, o Tribunal recorrido não se pronuncia sobre esta questão, tendo erradamente considerando a pena suspensa para efeitos de aplicação do cúmulo jurídico.

  11. O que serve por dizer que, o tribunal recorrido englobou, no cúmulo que efetuou, uma pena parcelar suspensa na sua execução, cujo prazo de suspensão já se encontrava esgotado, sem apurar qual a consequência da verificação do decurso do dito prazo de suspensão.

  12. Assim, nos termos da alínea c) do n.º 1 do art. 379º do C.P.P., a decisão recorrida é nula por omissão de pronúncia.

  13. Na decisão ora sob escrutínio, o Tribunal recorrido, englobou no cúmulo, as penas parcelares de 9 meses +1 ano e 6 meses + 9 meses + 1 ano e 6 meses +3 anos e 6 meses, suspensa na respetiva execução por 4 anos e 6 meses de prisão idêntico período, que em que o Recorrente foi condenado no âmbito do supra identificado processo.

  14. Sucede que, no âmbito do processo 479/06...., foi proferido despacho datado de 22-10-2021 que julgou extinta a pena de quatro anos e seis meses de prisão aplicada ao arguido e, consequentemente determinou o arquivamento daqueles autos.

  15. O que serve por dizer que as penas parcelares aplicadas ao arguido no processo 479/06...., não podem englobar o cúmulo jurídico aplicado ao Recorrente.

  16. Entende o recorrente que o cúmulo jurídico não poderá ter em conta as penas parcelares de 9 meses +1 ano e 6 meses + 9 meses + 1 ano e 6 meses +3 anos e 6 meses, aplicadas no processo 479/06...., cuja pena suspensa já foi declarada extinta.

  17. Nestes termos, deverá a pena aplicada em sede de cúmulo jurídico ao recorrente ser revogada por incluir uma pena suspensa que foi declarada extinta e ser substituída por outra que não englobe as penas parcelares aplicadas no aludido processo.

  18. Ainda que V. Exas. entendam não se verificar a nulidade acima mencionada, sempre se dirá, por cautela de patrocínio, que a pena de 12 anos e 6 meses aplicada, em cúmulo, ao Recorrente é manifestamente excessiva.

  19. Entendeu o Tribunal recorrido que o limite mínimo da pena única/cumulada seriam 5 anos e 6 meses de prisão (a mais gravosa das penas aplicadas ao Recorrente) – entendimento perfilhado pelo tribunal recorrido e com o qual o Recorrente concorda.

  20. Achando-se o limite máximo nos 25 anos.

  21. O acórdão recorrido, condenou o arguido na pena única de 12 anos e 6 meses de prisão.

  22. Tal condenação acha-se manifestamente excessiva não proporciona ao arguido a sedimentação das capacidades que já demonstra alcançar, por forma à sua reintegração na sociedade.

  23. Ora, o acórdão cumulatório não teve em conta os elementos constantes do art. 77.º do Código Penal.

  24. A formação de uma nova decisão, para reformulação do cúmulo jurídico é realizada de acordo com os factos e a personalidade do agente (artigo 77.º, nº 1).

  25. [[1]] 27. No caso em epigrafe, encontram-se preenchidos os elementos para que exista a aplicação do cúmulo jurídico, ainda que não seja nos presentes autos, como alegado supra.

  26. Na determinação da pena única tem de se atender, por um lado, a princípios estruturantes do sistema penal e processual português, ponderando sempre a necessidade e adequação da determinação da pena (artigo 71.º do Código Penal), por outro lado, à personalidade do agente, os factos praticados e a gravidade dos mesmos.

  27. Na verdade, a conduta do arguido não representou uma tendência/carreira criminosa, mas sim uma pluriocasionalidade que não radica da personalidade do arguido.

  28. Não pode o recorrente concordar que o seu comportamento revele um “quadro de reiteração de violação de bens jurídicos patrimoniais”.

  29. Isto porque os ilícitos criminais praticados pelo recorrente cingem-se a um determinado momento da vida do Recorrente.

  30. Resulta precisamente da factualidade relativa a cada uma das condenações parcelares que os crimes de falsificação de documento praticados pelo Recorrente foram instrumentais (embora juridicamente autonomizáveis) do crime de burla – o que, necessariamente, diminui a intensidade do dolo e a gravidade da ilicitude dos factos atinentes a tais ilícitos.

  31. Tendo em conta a exclusiva natureza patrimonial dos crimes em apreço não concordamos que os mesmos denotem elevadas necessidades de prevenção geral, visto que o seu impacto comunitário é manifestamente menos gravoso quando comparado com outros tipos de ilícito – por exemplo, crimes de tráfico de estupefacientes ou crimes contra a integridade física.

  32. Pelo que se entende que o Tribunal a quo não ponderou de forma autónoma os elementos a que o art. 70º C.P. manda atender em caso de concurso de crimes, o tribunal recorrido errou ao referir que o Recorrente havia demonstrado “egoísmo e continua indiferença pelos prejuízos causados a terceiros.”.

  33. Aliás, basta ter em atenção que a última pena de prisão (efectiva) que o Arguido sofreu transitou em julgado a 05-05-2021, sendo que os últimos factos praticados datam de 2014 - ou seja, mais de 7 anos após a prática dos últimos factos criminosos.

  34. A verdade é que desde março de 2014, 2015, 2016, 2017, 2018, 2019, 2020 e 2021, o Arguido ainda não mais voltou a praticar crimes – pelo que é duma injustiça e imprecisão extremas referir-se uma qualquer indiferença pelos “prejuízos causados a terceiros”! 37. Apesar de serem vários os crimes em concurso, ao crime considerado mais grave foi atribuída uma pena de prisão de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses, o que é elucidativo da média/pequena gravidade dos delitos.

  35. Estes factos não podem deixar de ser ponderados para a aplicação da pena em sede de cúmulo jurídico.

  36. Ademais, o relatório social constante dos autos encontra-se desatualizado, isto porque o arguido para além de já ter concluído o curso, assinou contrato de trabalho com a CPJ, estando atualmente a trabalhar no Estabelecimento Prisional.

  37. O recorrente encontra-se a frequentar um curso promovido pelo S... com uma duração de 100 horas.

  38. O curso tem o nome de Formação Modular Certificada, com vários módulos de unidade de formação de competências, fundamentais para a reintegração do recorrente na sociedade.

  39. Ao sofrer uma condenação numa pena única tão pesada, todo o seu esforço e percurso serão postos em causa.

  40. Pelo exposto, face aos factos e à personalidade do arguido, necessidade de tutela dos bens jurídicos ofendidos e das finalidades das penas entendemos ser de aplicar, em cúmulo, a pena única de 10 anos de prisão.» 3.

    No Tribunal Judicial da Comarca ..., respondeu o Ministério Público tendo concluído nos seguintes termos: «1.A decisão do Tribunal “a quo” não violou qualquer norma legal, designadamente não se observa qualquer violação do disposto nos artigos 77º e 78º do Código Penal.

  41. Revelando o acórdão recorrido cuidadosa fundamentação, quer quanto à matéria de facto quer no que...

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