Acórdão nº 2949/15.7T8VFX-B.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução05 de Abril de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 2949/15.7 T8VFX-B.L1.S1 6.ª Secção Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório Por apenso à ação especial de insolvência – em que foi declarada em tal situação, por sentença de 25/09/2015, transitada em julgado, AA, com os sinais dos autos – veio a Administradora de Insolvência apresentar a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, nos termos do art. 129.º do CIRE.

Após o que – e no que aqui interessa – foi apresentada impugnação pelo credor BB, contestando a qualificação, como comum, dada pelo AI ao crédito que por este lhe foi reconhecido (no montante de € 400.000,00, emergente dum CPCV e correspondente ao dobro do sinal pago pelo impugnante à insolvente) e sustentando que o mesmo deve ser classificado como garantido, por beneficiar de direito de retenção (sobre o imóvel apreendido para a massa e objeto do CPCV celebrado entre a insolvente e o impugnante).

Impugnação a que responderam, opondo-se, quer a credora CGD (com créditos garantidos por hipoteca sobre o imóvel objeto do CPCV), quer a Sr.ª. Administradora de Insolvência.

Foi designada e realizada tentativa de conciliação, infrutífera, após o que foi proferido saneador, em que a instância foi declarada totalmente regular, estado em que se mantém.

Tendo logo sido julgados verificados os seguintes créditos: - «Agrogarante – Sociedade de Garantia Mútua, S.A.», no montante de 57.279,22 €; - «Banif – Banco Internacional do Funchal, S.A.», no montante de 33.584,98 €; - «Caixa Geral de Depósitos, S.A.», garantido, no montante de 830 141,66 € ; e comum, no montante de 3.250,29 €; - «Caixa Leasing – Instituição Financ. Crédito, S.A.», no montante de 48.270,64 €; - Estado – Fazenda Nacional, comum, no montante de 3.134,29 €; e privilegiado, no montante de 1.046,25 €; - «Galp Power, S.A.», no montante de 2.397,14 €.

- «Grazicar – Comércio e Indústria de Carnes, Lda.», no montante de 885.343,04 €; - «Instituto da Segurança Social, I.P.», no montante de 63.276,72 €; - «Suinicomércio – Comércio de Suínos, Lda.», no montante de 585.088,81 €.

E tendo sido determinado o prosseguimento dos autos para apreciação da impugnação apresentada pelo credor BB, identificando-se, a seu propósito, o objeto do litígio e enunciando-se os temas da prova.

Instruído o processo e realizado o julgamento, a Exma. Juíza proferiu sentença em que – a propósito da questão da “qualificação do crédito reclamado pelo credor BB, reconhecido como crédito comum, na lista do artigo 129.º do CIRE, e que havia sido reclamado como gozando de direito de retenção, nos termos do artigo 755.º do Código Civil” – se julgou procedente a impugnação, sendo reconhecido ao credor reclamante e impugnante BB um crédito no valor de € 400.000, com direito de retenção; após o que, passando-se à graduação, se graduaram os créditos sobre a insolvente da seguinte forma: “A. do produto da venda do prédio misto, sito em ..., freguesia ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...02 e inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...01 urbano e rústico artigo ...10, secção ...

  1. Estado – Fazenda Nacional € 1 046,25 2.º BB € 400 000,00 3.º Caixa Geral de Depósitos, S.A. € 830 141,66; 4.º rateadamente Agrogarante – Sociedade de Garantia Mútua, S.A. € 57 279,22 Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A. € 33 584,98 Caixa Geral de Depósitos, S.A. € 3 250,29 Caixa Leasing – Instituição Financ. Crédito, S.A. € 48 270,64 Estado – Fazenda Nacional € 3 134,29 Galp Power, S.A. € 2 397,14 Grazicar – Comércio e Indústria de Carnes, Lda. €885 343,04 Instituto da Segurança Social, I.P. €63 276,72 Suinicomércio – Comércio de Suínos, Lda. € 585 088,81 B. Do produto da venda de todos os bens e direitos apreendidos e a apreender para a massa insolvente, incluindo os valores da cessão Rateadamente Agrogarante – Sociedade de Garantia Mútua, S.A. € 57 279,22 Banif - Banco Internacional do Funchal, S.A. € 33 584,98 Caixa Geral de Depósitos, S.A. € 3 250,29 € 830 141,66 Caixa Leasing – Instituição Financ. Crédito, S.A. € 48 270,64 Estado – Fazenda Nacional € 3 134,29 Galp Power, S.A. € 2 397,14 Grazicar – Comércio e Indústria de Carnes, Lda. €885 343,04 Instituto da Segurança Social, I.P. €63 276,72 BB 400 000,00€ Suinicomércio – Comércio de Suínos, Lda. € 585 088,81.” Inconformada, interpôs recurso a credora «Caixa Geral de Depósitos», tendo o Tribunal da Relação ..., por Acórdão de 27/04/2021, julgado procedente o recurso, “declarado que o crédito reconhecido ao recorrido BB não beneficia do direito de retenção e que, consequentemente, deve o mesmo ser reconhecido, graduado e pago como crédito comum, assim se alterando a alínea A) da parte dispositiva da decisão recorrida.” (mantendo-se, no mais, a Sentença recorrida nos seus precisos termos).

Agora inconformado, interpõe o credor reclamante/impugnante BB o presente recurso de revista, visando a revogação do acórdão da Relação e a sua substituição por outro que, repristinando o decidido na sentença da 1.ª Instância, “reconheça que o recorrente é considerado consumidor, nos termos do artigo 2º/1 da Lei 24/96 de 31/7 e em consequência ver reconhecido o seu direito de retenção sobre o imóvel apreendido nos autos, nos termos do disposto no Artigo 755º n.º 1 alínea f) do Código Civil, sendo pago como credor privilegiado”.

Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: “(…) I. Vem o presente Recurso interposto do Douto Acórdão proferido nos autos pelo Tribunal da Relação ..., que erroneamente, veio revogar a sentença proferida pelo Tribunal da 1ª instância, considerando que o crédito do Recorrente BB, não beneficia do direito de retenção, por não ter logrado fazer prova de ser consumidor final nos termos do artigo 2º n.º 1 da Lei 24/96 de 31/7.

  1. Sucede que, o Tribunal da Relação ..., faz uma má aplicação do artigo 2º n.º 1 da Lei 24/96 de 31/7, tendo em conta os factos que foram dados como provados.

  2. E para além da má interpretação da Lei, o Tribunal da Relação ... ignorou factos essenciais que foram dados como provados, que demonstram que o Recorrente é consumidor final – como aliás não poderia deixar de ser – face a toda a factualidade dada como provada e não impugnada.

  3. Assim, os factos e fundamentos pelos quais a Douta Sentença proferida em 1ª instância e que reconheceu o Direito de Retenção ao ora Recorrente – são mais do que apenas os factos 20, 21 e 22 que o Tribunal da Relação ... se baseia para referir que o Recorrente não logrou fazer prova da sua qualidade de consumidor final.

  4. Pelo que, o presente Recurso, cinge-se a uma única questão: Saber se face aos factos dados por provados pelo tribunal a quo, o Recorrente BB é considerado consumidor final, e em consequência deve ser-lhe reconhecido o direito de retenção, tal como fez o pelo Tribunal a quo.

  5. Ora, contrariamente ao que o Douto Tribunal da Relação refere não são apenas os factos 20, 21 e 22 que demonstram que o Recorrente BB é considerado um consumidor final.

  6. A este respeito, veja-se o facto dado como provado n.º 23 “A 04.02.2013, a aqui Insolvente deduziu, no Processo executivo n.º 4803/12.... em que era Exequente o credor Suinicomércio – Comércio de Suínos, Lda., oposição à penhora do recheio do imóvel sito na Rua ..., ..., sito em ..., freguesia ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...02 e inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo ...01 urbano e rústico artigo ...10, secção ....” VIII. Tal facto foi provado, pela oposição à penhora do recheio da casa, deduzida nos autos de execução n.º 4803/12...., onde ficou desde logo demonstrando que os bens (recheio da casa) que estavam a ser penhorados, era[m] do ora Recorrente BB.

  7. Este facto dado como provado com n.º 23 é fundamental, visto que para além do facto ter sido provado por prova documental, foi face ao princípio do imediatismo e da inquirição das testemunhas demonstrado que o Recorrente vivia no imóvel.

  8. No que diz respeito ao facto dado como provado como n.º 23 – veja que foram juntos aos autos os seguintes documentos: a) auto de penhora junto aos autos na qual consta lavrado que estava presente a empregada de limpeza CC, que de imediato informou o agente de execução de que os bens eram do Recorrente BB; b) Oposição à penhora do recheio do imóvel em causa nos autos.

  9. Pelo que, a este respeito, veja-se o que foi dito acerca do facto dado como provado como n.º 23: “DD, (…. ). Acrescentou que esteve na festa de anos do Sr. BB, em Janeiro de 2013, que se realizou na casa, a qual estava mobilada pelo Sr. BB, depois com as penhoras “ficou desolado”, não se sentia bem na casa e a testemunha disse que se afastou, deixando de falar do assunto com o Sr. BB.” A testemunha CC, empregada de limpeza ao serviço de BB, prestou depoimento que valoramos pela objectividade, precisão e circunstanciado, ou seja, a versão por si apresentada além de ser corroborada por documentos juntos é, por si mesma coerente. Declarou que trabalha na casa que fica na ... para o Sr. BB, desde Outubro de 2012 para fazer as limpezas à casa, esclareceu que arranjou aquele trabalho através da nora que deu o seu contacto. Actualmente vai à casa ... horas/semana – abre as janelas, limpa o chão, limpa o jardim com a ajuda do marido, mantendo a casa limpa. Acrescentando que mantém a chave da casa consigo e sempre que lhe é solicitado, a pedido do Sr. BB, incluindo por este processo abre a porta. Acrescentou que até finais de 2015 era diferente, pois o Sr. BB deixou de viver na casa com a D. EE, a sua companheira. A casa agora não tem mobília, não tem nada. Acabou por se ir embora porque iam lá à casa para levar as coisas, referindo-se a processos judiciais da Insolvente, que disse conhecer por ser da mesma aldeia e da mesma idade. Referindo-se a uma das idas à casa, esclareceu que os bens que existiam na casa eram do Sr. BB, pois a D. AA já tinha tirado os seus bens. Afirmou ainda que a D. AA não tem chave da casa, dizendo «O Sr. BB não lhe ia dar uma chave.»...

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