Acórdão nº 261/22 de Tribunal Constitucional (Port, 05 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Vice-Presidente
Data da Resolução05 de Abril de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 261/2022

Processo n.º 1040/20

Plenário

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Por decisão de 3 de setembro de 2018, a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos (doravante, “ECFP”) julgou prestadas, com irregularidades, as contas apresentadas pelo CDS – Partido Popular (CDS-PP), relativas à campanha eleitoral para a eleição, realizada em 16 de outubro de 2016, dos deputados para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores – cf. artigos 27.º, n.º 4, da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho (Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais, doravante, “LFP”) e 43.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 2/2005, de 10 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos, doravante, “LEC”).

As irregularidades apuradas foram as seguintes:

a) Ações e meios não refletidos nas contas de campanha – subavaliação de despesas e receitas, em violação do artigo 12.º da Lei n.º 19/2003, ex vi artigo 15.º n.º 1, do mesmo diploma;

b) Não disponibilização ao Tribunal Constitucional da prova do encerramento da conta bancária, situação atentatória do artigo 15.º, n.º 3, da Lei n.º 19/2003;

c) Existência de movimentos na conta bancária sem reflexo direto nas contas da campanha e movimento no mapa da despesa sem reflexo na conta bancária – receitas e despesas subavaliadas/sobreavaliadas, situação atentatória do artigo 15.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003;

d) Existência de cedência de bens a título de empréstimo, com impossibilidade de conclusão pela sua razoabilidade e valorização, situação atentatória do artigo 15.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003;

e) Consideração de despesas inelegíveis, em violação do disposto no artigo 19.º, n.º l, da Lei n.º 19/2003;

f) Existência de despesas valorizadas abaixo do valor de mercado, em violação do disposto no artigo 15.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003;

g) Inexistência ou existência com deficiência de suportes documentais de algumas despesas, atentando contra o artigo 12.º, aplicável ex vi artigo 15.º, n.º 1, e contra o artigo 19.º, n.º 2, todos da Lei n.º 19/2003;

h) Deficiência na apresentação dos elementos de prestação de contas e não apresentação de todos os elementos, atentando contra o artigo 12.º, aplicável ex vi artigo 15.º, n.º 1, ambos da Lei n.º 19/2003.

2. Na sequência da referida decisão relativa à prestação das contas, a ECFP levantou dois autos de notícia e instaurou os correspondentes processos de contraordenação, um contra o CDS-PP (Processo n.º 9/2019) e outro contra Pedro Gabriel Correia Nunes Teixeira Pinto, enquanto mandatário financeiro da campanha em questão (Processo n.º 10/2019), tendo os arguidos sido notificados, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 44.º, n.ºs 1 e 2, da LEC e 50.º do Regime Geral das Contraordenações (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, doravante “RGCO”), e tendo cada um deles apresentado a sua defesa.

No âmbito dos referidos procedimentos contraordenacionais, a ECFP, aplicou as seguintes sanções:

a) No processo n.º 9/2019, por decisão de 31 de julho de 2020, aplicou ao arguido CDS – Partido Popular (CDS-PP), uma coima no valor de 13 (treze) SMN de 2008, perfazendo a quantia de € 5.538,00 (cinco mil quinhentos e trinta e oito euros), pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 31.º, n.ºs 1 e 2, da LFP;

b) No processo n.º 10/2019, por decisão de 31 de julho de 2020, aplicou ao arguido Pedro Gabriel Correia Nunes Teixeira Pinto, enquanto mandatário financeiro, uma coima no valor de 3 (três) SMN de 2008, perfazendo a quantia de €1.278,00 (mil duzentos e setenta e oito euros), pela prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 31.º, n.º 1, da LFP.

3. Inconformados, cada um dos arguidos impugnou a respetiva decisão sancionatória, junto do Tribunal Constitucional, nos termos dos artigos 23.º e 46.º, n.º 2, da LEC, e do artigo 9.º, alínea e), da LTC.

O arguido Pedro Gabriel Correia Nunes Teixeira Pinto fez assentar a impugnação nos seguintes fundamentos:

«I. EXCEPÇÃO PEREMPTÓRIA

Da exceção de prescrição:

1. Dispõe o artigo 27.º do RGCO que “o procedimento por contraordenação extingue-se por efeito de prescrição logo que sobre a prática da contraordenação hajam decorrido […] três anos, quando se trate de contraordenação a que seja aplicável uma coima de montante máximo igual ou superior a €2.493,99 e inferior a €49.879,79”.

2. Ressalve-se que a matéria aqui em causa é atinente ao ano de 2016.

3. Ou seja, entre os factos e o presente recurso passaram 4 (quatro) anos.

4. Portanto, superior ao tempo indicado no preceito supramencionado.

5. Assim, por factos que remontam a 2016, entendeu a ECFP aplicar ao Arguido uma coima no valor de €1.278,00 (mil duzentos e setenta e oito euros).

6. Ademais, os presentes autos têm origem na Deliberação da ECFP de 03 de Setembro de 2018, relativo às contas da campanha à eleição para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em 2016, como, aliás, se verifica através da leitura da origem do processo na decisão da ECFP.

7. Também aqui, entre a Decisão e a presente data, correram mais de 2 (dois) anos.

8. Ora, salvo melhor opinião, tais factos, prescrição, constituem uma causa extintiva da contraordenação aplicada ao Arguido, com efeito, é nosso entendimento que determinam a improcedência total da decisão.

9. Caso ainda assim não se entenda, o n.º 3 do artigo 28 do RGCO dispõe que “A prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade”.

10. Com o devido respeito, o procedimento prescreveu em Outubro de 2020, precisamente 4 (quatro) anos após o seu início.

11. O que significa, para todos os efeitos, que já decorreu o prazo máximo de prescrição e que, desde já, se invoca.

12. Atendendo a que a moldura penal abstrata aplicável à infração em causa é de coima de €2.493,99 e inferior a €49.879,79, e que, no limite, seria este máximo de coima o valor atendível para decidir da prescrição do procedimento, com o devido respeito, há que concluir que esta (prescrição) já decorreu, por o máximo da coima abstrata ser afinal, no caso, inferior a €49.879,79 (e atenta ainda a concreta operância de circunstâncias interruptivas e suspensivas da prescrição - art. 28º, nº 1 - a), e) e d), nº 3 e 27º nº 1-a) e nº 2 do RGCO.

13. Pelo que, desde já, se invoca expressamente a prescrição do procedimento.

II. DA AUDITORIA

14. O procedimento de auditoria às Contas da Campanha Eleitoral para eleição para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em 2016, visou a observação do cumprimento dos preceitos legais vigentes por parte do Partido, designadamente, a análise dos procedimentos de controlo interno adotados pelo Mandatário Financeiro.

15. Em respeito ao Artigo 25.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, retificada pela Declaração de Retificação n.º 17/2018, de 18 de Junho, pode, de facto, “A Entidade das A Entidade das Contas e Financiamentos Políticos pode requisitar ou destacar técnicos qualificados de quaisquer serviços públicos ou recorrer, mediante contrato, aos serviços de peritos ou técnicos qualificados exteriores à Administração Pública, a pessoas de reconhecida experiência e conhecimentos em matéria de atividade partidária e campanhas eleitorais, a empresas de auditoria ou a revisores oficiais de contas”. (…).

16. Nesse sentido, o relatório da ECFP teve por base as conclusões do trabalho realizado pela Sociedade de Revisores de Contas ANA GOMES & CRISTINA DOUTOR, SROC, Lda.

17. Não questionando, de todo, a competência e experiência dos técnicos exteriores destacados pela ECFP, não pode o Signatário deixar de levantar a questão no que respeita ao conhecimento que estes detêm em matéria de atividade partidária e campanhas eleitorais.

18. Sendo certo que, para todos os efeitos, desconhece.

19. É certo que um Partido, cada vez mais, assume uma gestão profissional e empresarial das suas contas, todavia, não podemos omitir ou deixar de considerar a essência e as diferentes dinâmicas que distinguem um Partido de uma Empresa.

20. Desde logo, em sentido contrário ao sector empresarial, “os Partidos concorrem para a livre formação e o pluralismo de expressão da vontade popular e para a organização do poder político” e apresenta como fins, entre outros, “contribuir para o esclarecimento plural e para o exercício das liberdades e direitos políticos dos cidadãos”, “em geral, contribuir para a promoção dos direitos e liberdades fundamentais e o desenvolvimento das instituições democráticas”, conforme plasmado na Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de Agosto, Lei dos Partidos Políticos.

21. Portanto, assumem um posicionamento distinto e fins diferentes.

22. Perante isto, a verdade é que o Signatário desconhece a experiência e o conhecimento dos técnicos exteriores no que respeita à atividade e dinâmica partidária,

23. Ademais, quer o Partido, quer o Signatário, não foram notificados pela ECFP da designação dos peritos/técnicos, nem, aliás, da existência de uma ordem de serviço, em que constasse a: i) identificação dos técnicos responsáveis com competência para a prática de atos inspetivos; ii) a credenciação dos peritos/técnicos; iii) carta-aviso com notificação prévia referente ao início do procedimento; iv) atos materiais da auditoria.

24. Pese embora a existência de um conjunto de emails remetidos pela Sociedade de Revisores Oficiais de Contas supramencionada ao Partido, que sugerem o início do procedimento, a verdade é que nunca foi comunicada qualquer ordem de serviço ou ainda identificados os técnicos responsáveis pela auditoria.

25. Ao contrário do que era feito no passado, em que o Partido era convocado para uma reunião e aí informado, quer da ordem de serviço da auditoria, quer dos peritos/técnicos responsáveis...

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