Acórdão nº 234/22 de Tribunal Constitucional (Port, 31 de Março de 2022
Magistrado Responsável | Cons. José Eduardo Figueiredo Dias |
Data da Resolução | 31 de Março de 2022 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO Nº 234/2022
Processo n.º 147/2022
2.ª Secção
Relator: Conselheiro José Eduardo Figueiredo Dias
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, A. interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, doravante designada por LTC), do acórdão proferido por aquele Tribunal da Relação, em 16 de dezembro de 2021, que, negando provimento ao recurso, manteve a sentença proferida pelo Juízo Local Criminal de Benavente – Juiz 2, que condenou o ora recorrente na pena de dois anos e seis meses de prisão pela prática de um crime de fraude fiscal qualificada, previsto e punido pelos artigos 103.º, n.º 1, alíneas a) e c), e n.º 3 e 104.º, n.º 1, alíneas d) e e) e n.º 2, alíneas a) e b), do Regime Geral das Infrações Tributárias, «com exceção da parte em que deve ser eliminada dos factos o provado sob o ponto 22., relativo à condenação do arguido Romão no processo n.º 215/01.4GEBNV.1».
2. Pela Decisão Sumária n.º 166/2022, decidiu-se, nos termos do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não conhecer do objeto do recurso interposto, pelos seguintes motivos:
«4. Volvendo ao caso dos autos, verifica-se que o recorrente, no requerimento de interposição do recurso, e como seu objeto, limitou-se a indicar os preceitos legais do Código de Processo Penal cuja sindicância constitucional pretende, ou seja, os artigos 379.º, n.º 1, alínea c) e 127.º, acrescentando, quanto ao primeiro, tão só «[quando] o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar…», o que corresponde à transcrição da primeira parte da referida alínea c).
Daqui resulta, pois, que o recorrente não enuncia a concreta norma ou dimensão normativa cuja sindicância pretende, incumprindo o disposto no n.º 1 do artigo 75.º-A da LTC, preceito do qual decorre, como tem defendido este Tribunal, que sobre a parte que pretenda questionar a constitucionalidade de uma norma ou de determinada interpretação normativa impende o ónus de a enunciar expressamente, reportando-a ao específico segmento de um preceito legal ou conjugação de preceitos legais, de tal modo que o Tribunal Constitucional, no caso de concluir pela sua inconstitucionalidade, possa reproduzi-la, assim possibilitando que os respetivos destinatários e operadores do direito em geral fiquem cientes do concreto sentido normativo julgado desconforme com a Lei Fundamental.
Em rigor, observa-se uma completa omissão quanto ao sentido normativo que extrai das disposições enumeradas.
Note-se que, pese embora esta omissão seja suscetível, em abstrato, de ser alvo de convite ao aperfeiçoamento (cfr. artigo 75.º-A, n.ºs 5 e 6, da LTC), in casu, tal revelar-se-ia inútil, porquanto, verificando-se que está também em falta o preenchimento de pressuposto de admissibilidade do recurso que não pode ser suprido por essa via, em vez de proferir um convite ao aperfeiçoamento – que determinaria a produção de processado inútil, em prejuízo dos princípios da economia e celeridade processuais – deve o relator proferir de imediato decisão sumária, no sentido do não conhecimento do recurso (cfr., neste sentido, os acórdãos deste Tribunal Constitucional n.ºs 99/00, 397/00, 264/06, 33/09 e 116/09, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Ora, isso mesmo sucede no caso dos autos, porquanto a revelada omissão por parte do recorrente observou-se igualmente junto do tribunal a quo, o que conduz ao incumprimento do ónus de suscitação prévia e adequada de uma questão de constitucionalidade de natureza normativa.
5. Com efeito, por força do artigo 72.º, n.º 2, da LTC, impunha-se que a questão de constitucionalidade que se pretendesse ver apreciada nesta instância tivesse sido apresentada em momento processual prévio à prolação da decisão recorrida, junto do tribunal a quo, de uma forma expressa, direta e clara, criando para esse tribunal um dever de pronúncia sobre tal matéria. Para que se considerasse cumprido este ónus, era necessário que o recorrente tivesse identificado o critério normativo cuja sindicância pretenderia, reportando-o ao específico segmento legal ou conjugação de segmentos legais de que o mesmo seria extraível, e enunciando-o de forma que, caso o Tribunal Constitucional concluísse por um juízo de inconstitucionalidade, pudesse limitar-se a reproduzir tal enunciação, assim permitindo que os destinatários da decisão e os operadores do direito em geral ficassem esclarecidos sobre o específico sentido normativo considerado desconforme à Constituição (vide Acórdão n.º 367/94).
Sucede que, compulsada a peça processual na qual o recorrente deveria ter dado cumprimento ao requisito em análise – concretamente, as conclusões do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Évora –, constata-se que, em tal momento, não foi formulada uma questão de constitucionalidade de natureza normativa reportada aos preceitos legais que identificou como base legal dessa questão. De facto, o recorrente, no recurso interposto, limitou-se a atribuir inconstitucionalidades à própria decisão recorrida (vide conclusões n.ºs 11, 24, 37 e 41 do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Évora), sustentando que a mesma viola, além de preceitos de Direito ordinário, os artigos 13.º e 32.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, o direito a um processo justo e equitativo, o princípio in dubio pro reo, o princípio da presunção da inocência e o princípio da igualdade, ligado ao princípio da...
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