Acórdão nº 721/13.8TBLGS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução24 de Março de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 721/13.8TBLGS.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Comércio de Olhão – J2 * Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: (…) foi declarada insolvente e requereu o procedimento de exoneração do passivo restante. Não se conformando com a decisão de cessação antecipada do período de cessão, a insolvente veio interpor o competente recurso.

* Foi admitido liminarmente o incidente de exoneração do passivo restante relativamente à insolvente (…). *O período de cessão de rendimentos iniciou-se em 01/07/2017.

* A 03/08/2021, a senhora fiduciária informou que a insolvente acumulou uma dívida a título de quantias disponíveis no montante de € 20.064,01, com referência apenas no período compreendido entre Julho de 2020 e Junho de 2021.

* A dívida global de cessão de rendimentos ascende a € 60.862,10.

* Nessa sequência, a “Caixa Geral de Depósitos, SA” requereu que, em face da reiterada falta de entrega das quantias disponíveis, fosse decretada a cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante.

* Foi dado cumprimento ao disposto no n.º 3 do artigo 243.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

* A insolvente veio informar que, no decorrer dos anos de 2017-2019, as despesas de saúde e a situação clínica da aqui Requerente e seu agregado familiar, composto pelo seu marido e pelo seu tio agravaram-se bastante, tendo implicado gastos extras, tendo culminado com o internamento do seu tio num lar, várias deslocações para consultas deste e do marido da aqui Requerente e internamentos em Hospitais.

A insolvente invoca ainda que foi nesse contexto que teve que escolher entre fazer face a essas despesas com a sua saúde e a saúde dos seus entes queridos e/ou entregar o rendimento disponível à Administradora de Insolvência, tendo optado por fazer face às despesas de saúde * Na parte que interessa o despacho recorrido tem o seguinte conteúdo: «Conforme decorre dos factos de que partimos, a Insolvente, a quem foi fixado um rendimento indisponível e dispensado de cessão no montante de Euros 700,00 por mês, em termos práticos, nunca cumpriu tal decisão, tendo gasto mensalmente todos os rendimentos que aufere e que ascendem a não menos do que Euros 2.212,83 mas que nos meses de julho e novembro ascendem a Euros 4.427,66. Atentas as próprias declarações da Insolvente, as suas despesas mensais ascendem, a Euros 1.600,00 pelo que não existe qualquer explicação para, sucessivamente, não ter procedido a qualquer entrega à fidúcia.

Por persistir no incumprimento, a dívida ascende atualmente a Euros 60.862,10 não sendo possível à Insolvente assegurar o pagamento até ao termo do período de cessão de rendimentos. De resto a Insolvente nem apresentou qualquer plano para fazê-lo, ainda que parcialmente e apenas alegou circunstâncias de saúde, que não documentou, que não constituem justificação para o sucessivo incumprimento.

(…) No caso em apreciação, pese embora a Devedora tenha auferido um rendimento considerável, que no final ascendia a Euros 2.212,83 por mês, e apesar de ter indicado despesas mensais que ascenderiam a cerca de Euros 1.600,00 apenas entregou no total 5.852,12, encontrando-se em dívida para com a massa insolvente no valor de Euros 60.862,10.

Em face do exposto, pese embora as várias diligências nesse sentido, a Devedora não cumpriu com rigor, com exceção dos meses iniciais, o despacho inicial com vista à exoneração do passivo restante. Esta conduta não apresenta qualquer justificação pois a Insolvente não indicou quaisquer despesas supervenientes ou extraordinárias, ainda que tivesse oportunidade de fazê-lo.

(…) Nestes termos, julga-se que a conduta omissiva da Devedora documentada grave negligência, optando por utilizar praticamente todo o rendimento auferido, daí resultando o necessário prejuízo para os credores – que por via do presente procedimento, se encontram impedidos de solicitar a penhora de rendimentos da Insolvente – pelo que se julga plenamente integrada a previsão legal da alínea a) do n.º 1 do artigo 243.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas. Conforme a este respeito afirma a credora “Caixa Geral dos Depósitos, S. A.” exigia-se à Devedora um sacrifício proporcional às suas capacidades económicas, o que nunca se evidenciou.

Pelo exposto, encontram-se reunidos todos os pressupostos exigidos pela lei para a cessação antecipada da exoneração do passivo restante, pelo que abrigo do disposto no artigo 243.º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, declaro a cessação antecipada do procedimento de exoneração e, em consequência, recuso a exoneração do passivo restante quanto à Devedora (…).

Notifique.

Publique e registe (artigo 247.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas).

* A insolvente não se conformou com a referida decisão e as suas alegações continham as seguintes conclusões: «

  1. A lei exige que o requerimento dos credores a solicitar a cessação da exoneração do Passivo restante, seja fundamentado, o que significa que o requerente deve invocar ali e provar as causas justificativas da cessação antecipada do procedimento.

  2. Devendo, o juiz decidir segundo a prova produzida e o seu prudente arbítrio, na verificação de fundamento legal justificativo da recusa de exoneração.

  3. Pelo que teria o Mmº. Dr. Juiz “a quo” que ter indeferido o Requerimento em vez de ter decretado a cessação da exoneração do passivo restante.

  4. Por outro lado, não atentou bem, o Mmº. Dr. Juiz “a quo” no estatuído no artigo 243.º do CIRE.

  5. Em virtude do alegado supra e sua consequência, temos de concluir que atenta toda prova carreada aos autos, não se encontram preenchidos os 3 (três) requisitos essenciais para a cessação antecipada do procedimento de exoneração: 1. Prevaricação dolosa ou com grave negligência; 2. Que tenha prejudicado, a satisfação dos credores da insolvência (artigo 243.º, n.º 1, alínea a), do CIRE).

    1. Existência de um nexo causal entre a conduta dolosa da Insolvente e o dano para a satisfação daqueles créditos.

      Ora como infra se conclui: f) A Recorrente/Insolvente não actuou de forma dolosa ou com grave negligência, porquanto: 1 – Das Declarações que esta prestou, nos autos, resulta claramente que a Recorrente / Insolvente não conseguia viver com o rendimento indisponível de € 700,00, pois as suas despesas de sobrevivência são muito superiores a esse montante, só a renda da casa consome praticamente todo esse montante.

      2 – Dos Documentos juntos aos autos resulta que a Recorrente despendeu durante o período da Cessação de rendimentos disponível, com o marido, com o tio, consigo própria e com as vendas no Processo de Insolvência em mais valias, facturas juntas em 21/12/2020, no total de € 33.944,28 (trinta e três mil, novecentos e quarenta e quatro euros e vinte e oito cêntimos).

      3 – Tendo ainda efectuado o pagamento dos Impostos, nada devendo às Finanças, cfr. Doc. que se junta e se dá aqui por integralmente reproduzido, pois recebia as cartas e não queria deixar de cumprir com o pagamento dos impostos, pensando que o tinha de fazer.

      4 – O Tribunal não se pode alhear do facto, da aqui Insolvente/Recorrente padecer de doença por doença (perturbações angro-depressivas severas, tendo por esse motivo sido aposentada da Função pública, por motivo de invalidez.

      5 – No entender da Insolvente/ Recorrente, esta agiu em estado de necessidade, ao canalizar o seu rendimento para fazer face ao bem-estar dos seus entes queridos, marido e tio, e canalizando alguns montantes para fazer face ás suas despesas com a sua saúde de molde a poder ajudar esses entes queridos.

      6 – A Insolvente/ Recorrente na sua boa fé e tendo em conta o seu quadro clínico, e atento o teor e espírito legislativo dando preponderância ao...

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