Acórdão nº 030/21.9BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução23 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – AAA…….., com os sinais dos autos, vem, nos termos do nº 2, do artigo 25º do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT) com remissão para a tramitação estabelecida no artigo 152º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos (CPTA), interpor para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida no processo n.º 142/2020-T, por alegada contradição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com o decidido na decisão arbitral no processo n.º 235/2018-T, de 3 de janeiro de 2019, transitada em julgado.

O recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: I. O presente recurso para uniformização de jurisprudência é tempestivo, pois foi intentado dentro do prazo de 30 dias contados a partir da data da notificação da decisão arbitral.

  1. O presente recurso incide sobre a questão fundamental de direito: – Atendendo à sucessão no tempo das diferentes redacções dadas ao artigo 63.º do CPPT (nas sucessivas versões dadas pelo Decreto-Lei n.º 433/99 de 26/10, Lei n.º 64-A/2008 de 31/12 e Lei n.º 64-B/2011 de 30/12), no que respeita à fixação (e por fim, eliminação) de um prazo de caducidade de 3 anos para aplicação da norma fiscal anti-abuso constante do artigo 38.º da LGT, determinar qual o momento factual relevante para considerar a aplicabilidade do prazo de caducidade e para o início da respectiva contagem.

    - Nomeadamente obter definição jurisprudencial sobre se, quando a norma anti-abuso é aplicada a um conjunto de actos que se encadeiam e sucedem no tempo, qual é o último negócio jurídico relevante para efeitos de determinação da lei aplicável e, sendo aplicável a lei que estabelece o prazo de caducidade, quando deve ele iniciar a sua contagem.

  2. A decisão recorrida está em contradição com a decisão do mesmo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), tirada no P.º n.º 235/2018-T, datado de 03/01/2019 (de Jorge Lopes de Sousa, Tomás Cantista Tavares e Jónatas Machado) – eis a decisão fundamento, cuja cópia se anexa; IV. A decisão recorrida está em manifesta contradição com a decisão fundamento quanto à definição do momento factual que deve relevar para efeitos do início da contagem do prazo de caducidade do direito da AT aplicar a cláusula anti-abuso – o que releva também quanto à versão da redacção do n.º 3 do artigo 63.º que deve ser aplicada atenta a sucessão de leis no tempo.

  3. Na decisão recorrida, o pagamento do crédito resultante da transmissão de acções é o momento a partir do qual de conta o prazo de caducidade.

  4. Na decisão fundamento, a letra da lei centra-se no negócio jurídico, ainda que complexo e múltiplo, e não no pagamento do crédito.

  5. Sobre esta questão não se conhece a existência de jurisprudência uniformizada do Supremo Tribunal Administrativo.

  6. A douta jurisprudência ínsita na decisão arbitral recorrida viola o n.º 3 do artigo 63.º do CPPT na redacção que deve aplicar-se, ou seja, a introduzida pela Lei n.º 64-A/2008 de 31/12.

  7. Estão verificados os requisitos de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência.

  8. Deve ser adotada a jurisprudência da decisão fundamento, pois é aquela que assegura a justa qualificação do facto tributário e interpretação da lei.

  9. O invocado esquema abusivo tem, assim, como momento determinante o da constituição do crédito (o direito ao reembolso de prestações acessórias de capital) através da transmissão de acções que geraram mais valias não tributadas por virtude da exclusão de tributação que vigorava no momento. – Este negócio jurídico ocorreu em 27.08.2007.

  10. O recebimento de € 1.400.000,00 em 2014 e 2015 não representa mais do que o pagamento do crédito já existente. Não ocorreu nesta data nada que ampliasse o património do Recorrente ou reconfigurasse ou disfarçasse qualquer forma jurídica, acto ou negócio jurídico.

  11. A lei vigente em 2007 e 2008 mandava contar o prazo de caducidade para aplicação da norma anti-abuso, a contar da data de realização do negócio jurídico ou da prática do acto, e não a contar da data de obtenção da vantagem fiscal.

  12. Só quando o negócio, só por si, não tivesse potencialidade de criar as condições para obtenção de vantagens fiscais que não advinham do negócio alternativo, e essas condições só ficassem preenchidas com a conjugação de negócios ou actos ulteriores, é que se poderia considerar incindível a cadeia de operações e considerá-las como um só acto continuado para efeitos de início da contagem do período de caducidade.

  13. Constatando-se que a data de referência para início da contagem do prazo de caducidade é a data de 27/08/2007, deve considerar-se aplicável a redacção original do n.º 3 do artigo 63.º do CPPT, ou seja, 3 anos após a realização do acto ou da celebração do negócio jurídico.

  14. Porém, com a entrada em vigor, em 01/01/2009 da nova redacção desta norma introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, constata-se que o prazo passou a ser contado a partir do início do ano civil seguinte ao da realização do negócio jurídico.

  15. Atendendo a que o prazo de caducidade ainda não estava decorrido com a entrada em vigor da lei nova, esta aplica-se imediatamente ao caso concreto, pelo que o prazo de caducidade passou a contar-se a partir de 01/01/2008 e viu-se diferido para 01/01/2011.

  16. A lei que eliminou este prazo de 3 anos apenas entrou em vigor em 1/01/2012, já não se aplicando, pois nessa data o prazo de caducidade já tinha decorrido.

  17. As liquidações adicionais impugnadas foram emitidas com data de 12/12/2018 e 17/12/2018, quando já tinha sido ultrapassado o prazo de caducidade previsto no n.º 3 do artigo 63.º do CPPT.

  18. Pelo que as liquidações deveriam ter sido anuladas, por caducidade do direito à aplicação da norma anti-abuso.

    Termos em que, deve o presente recurso ser admitido, e - Deve ser julgado procedente e em consequência ser verificada a existência de contradição jurisprudencial; - Deve ser revogada a decisão recorrida e substituída por outra que decida fixando jurisprudência no sentido da decisão fundamento; - Consequentemente, devem ser anuladas as liquidações impugnadas.

    Como é de inteira JUSTIÇA! 2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

    3 – A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta junto deste STA emitiu douto parecer no sentido da verificação dos pressupostos para prosseguimento do recurso para uniformização de jurisprudência e, quanto ao mérito, no sentido do não provimento do recurso, com a seguinte fundamentação específica: É objecto deste parecer, o pedido de admissão e apreciação de Recurso para Uniformização de Jurisprudência apresentado por AAA……., que impugna a decisão proferida no processo n.º 142/2020-T, por Tribunal Arbitral Colectivo, em matéria tributária, constituído sob a égide do CAAD, na sequência de pedido de pronúncia arbitral apresentado ao abrigo do regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011 (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, RJAT) e supra identificado.

    A questão que vem colocada pelo recorrente e para a qual solicita resposta de uniformização é a de saber se, quando uma norma anti-abuso é aplicada a um conjunto de actos (complexos) que se encadeiam e sucedem no tempo, qual é o último negócio jurídico relevante para efeitos de determinação da lei aplicável e, sendo aplicável, qual a lei que estabelece o prazo de caducidade de elaboração das liquidações a que se refere o art.º 63.º do Código de Procedimento e Processo Tributário e ainda quando deve ele iniciar-se a sua contagem.

    Concretizando, alega o recorrente que, “a questão chave neste caso passa por saber se a criação de um direito de crédito (in casu, prestações acessórias de capital) a favor do Contribuinte na sequência de um encadeamento de operações deve ser qualificada como o culminar dos negócios e/ou actos jurídicos relevantes para a aplicação da norma (e base para a determinação da aplicabilidade, e início da contagem, do prazo de caducidade) ou se o momento relevante será, … o pagamento do crédito ao Contribuinte”.

    Alega o recorrente que no caso sob recurso, entendeu o CAAD que o momento relevante para aferir da referida questão da caducidade seria o momento do reembolso em dinheiro das prestações acessórias e, no caso da Decisão fundamento se entendeu que o momento relevante seria o da constituição do crédito e não o do seu reembolso em dinheiro.

    Entendeu-se, na decisão recorrida que “(…) não basta, … para se iniciar a contagem do prazo de caducidade do direito à liquidação que for devida, tomar como ponto de referência a data em que foi efectuada a transmissão de acções através de prestações acessórias em espécie (…) o esquema negocial que é objecto da cláusula geral anti-abuso apenas se completa com o acréscimo patrimonial que é obtido indevidamente por esse meio” sendo que, com esta última expressão, a douta decisão pretende referir-se ao reembolso de prestações acessórias de capital.

    A decisão recorrida considerou que “o artigo 63.º n.º 3 do CPPT determinava, na sua redacção originária, que o procedimento de aplicação da cláusula anti abuso poderia ser aberto no prazo de 3 anos após a realização do negócio jurídico objeto das disposições anti abuso, que, por efeito da alteração introduzida pela Lei n.º 64-A/2008, passou a ser contado a partir do início do ano civil seguinte à realização do negócio.

    Pelo art.º 153.º da Lei n.º 64-B/2011 foram revogados os n.ºs 2, 9 e 10 do art.º 63.º do CPPT e deixou de existir preceito com conteúdo semelhante ao primitivo n.º 3 referido, razão por que deve entender-se que o prazo de caducidade do direito à liquidação, mesmo nesse caso, é agora o prazo geral de 4 anos constante do n.º 1 do artigo 45.º da LGT, cujo n.º 4 estatui dever contar-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário.

    Mais considerou a decisão recorrida que...

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