Acórdão nº 1442/13.7 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução10 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 06.12.2017, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por S… (doravante Recorrida ou Impugnante, entretanto incorporada por San…), que teve por objeto o deferimento parcial da reclamação graciosa que, por seu turno, versou sobre a retenção na fonte de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), do exercício de 2010.

    O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

    Nesse seguimento, a Recorrente apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I - A douta sentença a quo entendeu que tendo sido retida a totalidade do imposto devido aquando do vencimento do cupão, e beneficiando a Recorrida da isenção do imposto, nos termos do artigos 4º e 5º do regime especial de tributação dos rendimentos de valores mobiliários representativos de divida, na sequência da sua qualidade de não residente, a mesma tem direito a restituição total do imposto retido, pelo que a decisão administrativa não poderá manter-se na parte em que indeferiu o pedido.

    II - Da sentença podemos formular a convicção de que é entendimento do douto Tribunal a quo que a distinção estabelecida pela AT entre os juros atinentes ao período de detenção dos títulos - relativamente aos quais o titular beneficiaria de isenção - e aqueles que correspondem a um período antecedente a essa titularidade, os quais já não beneficiariam daquela detenção, não encontra no regime jurídico em causa previsão legal.

    III - Não decorrendo do regime jurídico em causa que a isenção de tributação não abranja a totalidade dos juros vencidos, por ali não se prever uma isenção proporcional a titularidade efectiva do valor mobiliário.

    IV - Destarte, assentou a douta sentença a quo que na data do vencimento do cupão, era a impugnante a titular efectiva dos rendimentos, pelo que tinha o direito a isenção da tributação incidente sobre a totalidade dos juros percebidos.

    V - Dissente esta RFP da decisão e respectiva fundamentação em que se baseou a douta sentença a quo, porquanto, em face ao regime legal aplicável, verifica-se que, contrariamente ao ali decidido, ficam apenas abrangidos pela isenção de tributação os juros corridos, isto é, os juros que o titular percebeu relativamente ao período em que deteve os títulos de dívida pública, in casu, o valor correspondente a € 30.487,67.

    VII - Com efeito, o que está em causa no Regime Especial de Tributação dos Rendimentos de Valores Mobiliários Representativos de Divida, aprovado pelo Decreto-Lei n° 193/2005, de 7/11 não é uma isenção objectiva (do rendimento em si), mas sim uma isenção subjectiva (atendendo as caracteristicas particulares dos beneficiários do rendimentos), pelo que só o beneficiário efectivo do rendimento pode beneficiar da referida isenção.

    VIII - Ora, o beneficiário efectivo será o que detém a titularidade dos valores mobiliários representativos da divida, razão pela qual, os juros são contabilizados dia a dia e pagos no momento da transmissão dos títulos ao cedente, sendo ele o beneficiário efectivo dos rendimentos relativamente ao período em que foi o titular dos valores mobiliários.

    IX - Assim, no momento da maturação dos valores mobiliários ou do vencimento de juros, o titular que recebe os rendimentos só e o beneficiário efectivo dos rendimentos relativos ao período em que deteve os valores mobiliários, recebendo os restantes rendimentos por conta dos anteriores detentores dos valores mobiliários, uma vez que já pagou esses rendimentos aos mesmos, incluído no preço de aquisição dos valores mobiliários.

    X - Neste termos, a entidade requerente apenas e beneficiaria efectiva dos rendimentos relativos ao período de tempo compreendido entre a data de aquisição dos títulos e o respectivo vencimento dos juros, e, como tal só deveria ter direito ao reembolso do imposto relativo aos rendimentos correspondentes a esse lapso temporal.

    XI - Razão pela qual, e levando em linha de conta que, de acordo com o disposto no Regime Especial de Tributação dos Rendimentos de Valores Mobiliários Representativos de Divida aprovado pelo Decreto-Lei n° 193/2005, de 7/11, a isenção de tributação de tais rendimentos apenas beneficia o juro corrido, ou seja, o sujeito passivo representado pelo requerente apenas pode beneficiar da isenção de tributação relativamente aos juros que recebeu correspondentes ao período de tempo em que deteve os títulos de divida, o que, no caso em apreço corresponde ao reembolso no valor de € 30.487,67.

    XII - É certo que o imposto retido na fonte na data do pagamento dos juros no presente caso incidiu sobre a totalidade dos juros pagos a entidade requerente (ora impugnante), apesar da mesma ter sido detentora dos valores mobiliários em apenas 107 dias, razão pela qual a mesma requer a restituição da totalidade do imposto.

    XIII - Acontece, porém que o regime criado pelo Decreto-Lei n° 193/2005, de 7/11, prevê que o reembolso ou a liquidação do imposto vá ocorrendo sempre que há uma transmissão dos títulos, levando-se em linha de conta o estatuto dos intervenientes da transação (artigo 11°), o qual é eficaz se os intervenientes tiverem estatuto diferente, mas se acontecer que os valores mobiliários sejam alienados por um beneficiário do regime de isenção a outro beneficiário do mesmo regime, não haverá nem retenção, nem reembolso.

    XIV - O mesmo poderá ocorrer no caso de aplicação do disposto no artigo 17° daquele regime legal, uma vez que a Central de Liquidação Internacional se compromete a não efectuar serviços de registo a entidades não isentas.

    XV - Ora, numa situação destas, se não for efectuada a prova do estatuto de entidade isenta pelo titular dos valores mobiliários no momento do pagamento dos juros há lugar a retenção do imposto sobre a totalidade dos rendimentos, acabando por ser este último titular a suportar a totalidade do imposto apesar dos anteriores detentores dos valores também terem beneficiado do regime de isenção.

    XVI - Nestes casos, até seria legitima a pretensão do titular dos valores mobiliários de que lhe seja restituída a totalidade do imposto retido na fonte, uma vez que não era só ele que beneficiava do estatuto de entidade isenta, mas também os anteriores detentores dos valores mobiliários.

    XVII - Mas, para tanto, tornar-se-ia indispensável que fosse efectuada a prova de que durante todo o período que decorreu desde a emissão dos valores mobiliários ou desde o último vencimento de rendimentos e a data em que ocorre a retenção na fonte, os titulares dos valores mobiliários foram sempre sujeitos passivos beneficiários do regime de isenção.

    XVIII - Porem, não se afigurando ter sido efectuada esta prova nos autos, isto é, de que os anteriores detentores dos valores mobiliários geradores do rendimento também beneficiavam do regime de isenção, mostra-se legalmente correcta a decisão da AT de autorizar apenas o reembolso do montante de € 30.487,67, correspondente aos 107 dias de detenção dos títulos por parte da ora impugnante.

    XIX - Motivo pelo qual, não padecendo a decisão administrativa de indeferimento do pedido da ora impugnante, proferida em sede de procedimento de reclamação graciosa, de qualquer ilegalidade, devera a mesma manter-se na ordem jurídica.

    Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação totalmente improcedente, tudo com as legais e devidas consequências”.

    A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: “1.ª O presente recurso foi interposto pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública contra a sentença proferida no âmbito da impugnação judicial deduzida pelo ora Recorrido contra o despacho de deferimento parcial, datado de 25.06.2013, proferido no âmbito do procedimento de reclamação graciosa n.º 308…….. (processo DJT 22…/12) pelo Exmo. Senhor Chefe da Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa e, bem assim, contra o ato de retenção na fonte respeitante ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) referente ao ano de 2010, incidente sobre os juros auferidos no território nacional referentes a títulos de dívida não pública com o ISIN ……….; 2.ª A douta sentença julgou procedente a impugnação judicial deduzida, considerando que os rendimentos auferidos na data do vencimento do cupão ou do reembolso dos valores mobiliários em causa são atribuídos ao beneficiário efetivo, tendo por referência todo o período temporal considerado, sendo que, estando o Recorrido isento do pagamento de IRC nos termos dos artigos 4.º e 5º, ambos do Decreto-Lei n.º 193/2005, de 7 de novembro, eslte tem direito ao reembolso da totalidade do imposto indevidamente retido e ainda não reembolsado; 3.ª Invoca o Ilustre Representante da Fazenda Pública que a sentença recorrida assenta a sua fundamentação numa errónea valoração da matéria de facto e incorre numa incorreta interpretação das normas legais aplicáveis, alegando que, contrariamente ao que resulta da sentença recorrida, só é beneficiário efetivo dos rendimentos nos termos do Decreto-Lei n.º 193/2005 o titular que aufere os rendimentos respeitantes ao período em que deteve os valores mobiliários; 4.ª Não assiste, com o devido respeito, qualquer razão ao Ilustre Representante da Fazenda Pública, devendo manter-se a sentença recorrida; 5.ª Em primeiro lugar, refira-se que este Tribunal Central Administrativo é incompetente para o conhecimento deste recurso, porquanto as alegações de recurso da Recorrente não encerram qualquer discordância relativamente à matéria de facto, não sendo invocado qualquer erro ou omissão quanto à factualidade dada como provada e não provada e quanto ao julgamento emitido em face da mesma; 6.ª Acresce que, quisesse a Recorrente realmente impugnar a matéria de facto e/ou a valoração que da mesma foi feita na sentença, incumbia-lhe...

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