Acórdão nº 1002/17.3BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução10 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO C…, LDA (doravante C… ou Recorrente), interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Leiria, a qual julgou improcedente a impugnação deduzida contra o despacho de indeferimento expresso da reclamação graciosa apresentada contra os atos de liquidação de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e de Juros Compensatórios (JC), do exercício de 2011, no montante global de €69.994,68.

A Recorrente formulou as conclusões que infra se descrevem: “A) – Salvo o devido respeito, a Recorrente discorda do julgamento da matéria de facto contido na douta sentença recorrida, ou seja, o Tribunal “a quo” efetuou um errado e incorreto julgamento da matéria de facto, dando como não provados factos em contradição com a prova testemunhal efetuada e com os demais documentos juntos aos autos.

  1. – Ao dar como provados os factos dos pontos 6., 9., 10., 13. e 14., não poderá ser extraída a conclusão de que a “W…” não prestou os serviços que se encontram registados na contabilidade da ora Recorrente.

  2. – Face à prova testemunhal produzida, resulta provado que o fornecedor “W…” prestou à Recorrente os serviços faturados, apenas havendo divergência apontada por esta quanto ao número de horas despendidas em cada um dos clientes onde foram prestados os serviços, a qual não se mostrou sanada, conforme, aliás resulta do facto provado no ponto 15.

  3. – Prova testemunhal que resulta do depoimento da testemunha L… (aos minutos 00:05:10 e seg., minuto 00:08:30 e seg., minuto 00:16:00 e seg., minuto 00:16:29 e seg., minuto 00:19:15 e seg., minuto 00:22:30 e seg., minuto 00:28:30 e seg. e minuto 00:30:00 e seg.) e da testemunha S… (aos minutos 00:49:55 e seg., minuto 00:53:00 e seg. e minuto 01:21:00 e seg.).

  4. – Ademais, embora tenha sido confirmado pelas testemunhas acima identificadas que havia algumas divergências quanto às horas faturadas pela “W…” alocadas a cada uma das ações desenvolvidas nos clientes, tal facto não é suficiente para afastar a materialidade e efetividade dos serviços prestados, apenas relevando para efeitos de quantificação dos serviços prestados.

  5. – De facto, a materialidade dos serviços prestados resulta ainda do depoimento de I…, legal representante da sociedade “U…, Lda,” aos minutos 02:06:20 e seg. e minuto 02:08:47 e seg.

  6. – Relativamente à motivação da matéria de facto, e em concreto nas declarações de parte prestadas por J…, não é feita qualquer menção de desconsideração das mesmas declarações por falta de isenção ou rigor ou por imparcialidade notória, logo, a douta sentença deveria ter tido em consideração tais declarações na sua íntegra, para efeitos de factos provados e não provados.

  7. – Designadamente, deveriam ter sido valoradas as declarações de parte entre os minutos 02:23:50 e 02:28:29; entre os minutos 02:29:15 e 02:31:15; entre os minutos 02:38:00 e 02:42:00, e ainda aos minutos 02:43:00 a 02:45:30.

  8. – Dos transcritos depoimentos, conjugados com os documentos juntos à p.i. (documentos 14 a 34, que documentam os serviços prestados em cada um dos clientes), aliados aos factos provados nos pontos 6., 9., 10., 13. e 14. do probatório, resulta, assim, que deveria ter sido considerado provado o seguinte facto: “A “W…” prestou os serviços cujos custos se encontram registados na contabilidade da Impugnante”.

  9. – Quanto ao facto dado como não provado relativo ao fornecedor “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000”, importaria uma decisão diversa na douta sentença recorrida, face às declarações de parte prestadas por J…, as quais, como supra se disse, não devem ser desconsideradas por não se lhe poder assacar indícios de inveracidade ou falta de rigor (minutos 02:4:30 a 02:50:00).

  10. – As declarações prestadas, supra identificadas, conjugadas com os documentos 35 a 37 juntos com a p.i. (de cujo teor resulta a prova dos orçamentos e das subsequentes faturas e a prova dos meios de pagamento), impunham que fosse dado como provado o seguinte facto: “A sociedade “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000” forneceu à Impugnante material publicitário, cujo custo se encontra registado na contabilidade da Impugnante.” L) – Por último, entende-se também como desacertada a decisão recorrida ao dar como não provado os custos dos serviços fornecidos por C….

  11. – Por um lado, a valoração deste facto como não provado está em contradição com o facto provado no ponto 21. do probatório.

  12. – Por outro lado, foram desconsiderados os documentos 39 e 40 juntos à p.i., meios de prova estes aptos a confirmar este facto, sem ter sido apresentada motivação justificativa para esta omissão de aceitação/rejeição dos mesmos.

  13. – Foram também desconsiderados o testemunho de V…, representante da sociedade “S…, Lda.” e as declarações de parte de J… e de C….

  14. – Designadamente relevam para a correta apreciação dos factos as declarações credíveis e isentas de C…, atinentes a factos pessoais por si praticados enquanto fornecedora da Recorrente com a designação comercial de “R…”, aos minutos 03:02:50 e seg., minutos 03:03:40 e seg..

  15. – Das passagens dos minutos 03:08:03 a 03:09:00 resulta afastada a presunção errónea da AT de falta de estrutura empresarial, que serviu para fundamentar a correção fiscal, o que, claramente se conclui não ter suporte fáctico e, portanto, não corresponder à verdade.

  16. – No depoimento prestado por V…, representante da sociedade “S…, Lda.”, foram confirmados em concreto quais os produtos de design adquiridos à Recorrente, e da autoria dos mesmos por “R…” (aos minutos 01:52:42 a 01:57:00).

  17. – Acresce, também, considerar como meio de prova as declarações de parte de J… que asseveram os anteriores depoimentos (aos minutos 02:50:45 a 02:56:14).

  18. – Em suma, a prova efetuada nos autos permite concluir, com certeza, que os serviços concretamente descritos nas faturas foram efetivamente efetuados pela fornecedora C…, que usa o nome comercial “R…”; que foram objeto de posterior apresentação e contratação por parte dos clientes da Recorrente, nomeadamente da S…; e que foram pagos, pelo menos parcialmente.

  19. – Pelo que, na douta sentença recorrida deveria ter sido dado como facto provado que: “C… prestou os serviços cujos custos se encontram registados na contabilidade da Impugnante.”.

  20. – Em suma, as provas apresentadas pela Recorrente, sejam documentais sejam testemunhais, permitem aferir, por um lado, a materialidade e efetividade dos serviços e bens adquiridos, cujos custos foram contabilizados e que concorreram para a formação da matéria tributável do período 2011.

  21. – Donde, dando-se como provado que a “W…”, a “V…, Lda.”, “VCL” ou “RIP 2000” e C… prestaram os serviços e venderam os bens que se encontram registados na contabilidade da Recorrente, não poderia ser afastado o direito à dedução dos custos fiscais em sede de IRC, como erroneamente se concluiu na sentença recorrida, por força da errónea apreciação da prova e da errónea valoração de factos como não provados.

  22. – O TJUE tem vindo a produzir jurisprudência, em sede de IVA, no sentido em que a administração fiscal, para recusar a dedução, tem de demonstrar uma situação de fraude e a ausência de boa-fé por parte da empresa que adquiriu os bens em causa, e que esse direito à dedução não pode ser negado pelo facto do adquirente não possuir uma certificação documental de que o fornecedor/prestador de serviços dispunha dos bens em causa e estava em condições de os fornecer e tinha cumprido as suas obrigações de declaração e pagamento do imposto sobre o valor acrescentado.

  23. – Ora, a interpretação efetuada nas normas fiscais do IVA é passível de se adequar aos custos, suportados em sede de IRC.

  24. – A douta sentença não entendeu que era exigível à AT a prova de que a adquirente dos serviços foi parte ativa do acordo simulatório do negócio ou de uma parte do negócio ou que atuou de forma negligente em relação à atuação que lhe é imposta pela lei e pelos costumes comerciais, contudo, tal posição, é contrária ao entendimento da jurisprudência comunitária no que toca ao direito à dedução do IVA, e por maioria de razão, à dedução dos custos suportados com a aquisição de bens e serviços essenciais à obtenção do rendimento.

AA) – Como ficou provado, a Recorrente adquiriu os serviços e bens dos identificados fornecedores e as faturas emitidas por estes titulam prestações de serviços e aquisição de bens efetivas, daí conclui-se ser ilegal a desconsideração dos custos suportados, o que significa que a douta decisão recorrida não poderá manter-se, devendo ser revogada e consequentemente anulada a liquidação de IRC e juros compensatórios, do ano de 2011.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se a liquidação de IRC e juros compensatórios, relativas ao exercício de 2011.” *** A Recorrida DRFP optou por não apresentar contra-alegações.

*** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

*** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

*** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “Com relevância para a decisão a proferir, resultam provados os seguintes factos: 1. A coberto da ordem de serviço n.º OI20…, os serviços de inspeção tributária da Direção de Finanças de Leiria realizaram uma ação de inspeção à Impugnante, C…, Lda. que incidiu sobre o ano de 2011 – cf. fls. 1 e 2 e Relatório de Inspeção Tributária, adiante RIT, a fls. 48 a 79 do Volume I do processo administrativo apenso aos autos, em suporte físico, adiante PA.

  1. A ação de inspeção decorreu inicialmente para controlo declarativo, em sede de IVA e posteriormente passou a ter âmbito geral - cf. fls. 1 e 2 e RIT, a fls. 48 a 79 do PA- Volume I.

  2. A Impugnante dedica-se à atividade de prestação de serviços de consultoria, apoio à gestão, conceção e desenvolvimento de novos produtos e formação...

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