Acórdão nº 0935/19.7BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelADRIANO CUNHA
Data da Resolução10 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I. Relatório 1. A…………..

, Oficial de Justiça, integrado na carreira dos serviços do Ministério Público como Técnico de Justiça Auxiliar, interpôs a presente ação administrativa, no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (“TAC/Lx.”), contra o Conselho dos Oficiais de Justiça (“COJ”) e contra o Conselho Superior do Ministério Público (“CSMP”), impugnando (cfr. p.i. a fls. 4 e segs. SITAF): «- O Acórdão do Conselho de Oficiais de Justiça (COJ) «de 22.11.2018, proferido nos autos de Inspeção Ordinária ao Núcleo de ………..», nos termos do qual foi decidido, «no período de ……… a …………, atribuir a classificação de BOM COM DISTINÇÃO»; - E, necessariamente, o Acórdão do Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, de 19 de Março de 2019 que decidiu “indeferir o recurso hierárquico apresentado”».

Terminou a sua p.i. pedindo que: «Nestes termos, e nos melhores de direito, com o Douto suprimento de V.ª Exa., deverá a presente ação ser considerada procedente, por provada, e em consequência, ser os actos administrativos impugnados, Acórdão do COJ de 22/11/2018, e Acórdão do Plenário do Conselho Superior da Magistratura [“rectius”, do Conselho Superior do Ministério Público] de 19/03/2019, por via dos quais foi atribuída ao Autor a classificação de “Bom com Distinção”, serem revogados e, em seu lugar, ser proferido outro onde se reconheça e declare o direito do Autor à classificação de “Muito Bom”, pois só assim se fará JUSTIÇA!» 2.

Citados os Réus (“COJ” e “CSMP”), vieram, ambos, entre o mais, invocar a incompetência do TACLx., em razão da hierarquia, indicando como tribunal competente o Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) - cfr. fls. 183 e segs. e 214 e segs. SITAF, respetivamente.

Na sequência, o “TACLx.”, por seu despacho de 17/9/2020 (cfr. fls. 252/253 SITAF), declarou-se hierarquicamente incompetente para conhecer da presente ação administrativa, ordenando a remessa dos autos a este STA, em decorrência do disposto no art. 24º nº 1 a) ix e e) do ETAF, que prevê a competência da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal para conhecer dos processos em matéria administrativa relativos a ações ou omissões, entre outros, do Conselho Superior do Ministério Público bem como dos pedidos aí cumulados.

  1. Já neste “STA”, foi ordenada (cfr. fls. 265 SITAF), nos termos do art. 85º-A nºs 1 e 3 do CPTA, a notificação das contestações ao Autor, e para, querendo, se pronunciar, em 20 dias, sobre a matéria das exceções suscitadas pelo co-réu “COJ” (para além da já referida incompetência hierárquica do “TACLx.”), a saber: - impropriedade do meio processual (cfr. artigos 10º e segs. da contestação do “COJ”); - inimpugnabilidade do Acórdão do “COJ” de 22/11/2018 (cfr. artigos 18º e segs. da mesma contestação); e - ilegitimidade passiva do “COJ” (cfr. artigos 37º e segs. da mesma contestação).

    O Autor, notificado (cfr. fls. 266 SITAF), nada veio dizer.

  2. Ficou dispensada a realização de audiência prévia, nos termos do art. 87º-B nº 3 do CPTA com referência ao art. 87º-A nº 1 d) do mesmo CPTA.

  3. Foi, então proferido despacho saneador (cfr. fls. 270 e segs. SITAF) onde, para além de se ter mantido o valor já fixado à ação (despacho de fls. 252/253 SITAF), foram apreciadas e decididas aquelas três exceções suscitadas pelo co-Réu “COJ”.

    Assim, decidiu-se aí julgar improcedente a suscitada exceção da “impropriedade” do meio processual utilizado «já que, independentemente da questão do tribunal competente, o meio utilizado – “ação administrativa” (para impugnação de Acórdãos, do “COJ” ou do “CSMP”) – é o meio processual próprio, como decorre do art. 37º nº 1 a) [e eventualmente b)] do CPTA».

    De seguida, apreciaram-se e decidiram-se ali as restantes duas exceções, também invocadas pelo co-Réu “COJ” (a inimpugnabilidade contenciosa do seu Acórdão de 22/11/2018 e a sua ilegitimidade passiva) logo se tendo salientado que: «Estas exceções são, na verdade, incindíveis, na medida em que a alegada ilegitimidade passiva do “COJ” se apresenta como uma mera consequência da alegada inimpugnabilidade contenciosa da sua deliberação: se o seu Acórdão de 22/11/2018 não for contenciosamente impugnável, o “COJ” não deve ser parte na ação; mas já não assim, se essa sua deliberação for contenciosamente impugnável. Ou seja, a sua (i)legitimidade passiva depende da questão, que passaremos a analisar, da (in)impugnabilidade do seu Acórdão de 22/11/2018».

    E, tendo-se passado a analisar a exceção da inimpugnabilidade do Acórdão do COJ de 22/11/2018, decidiu-se: «julgar improcedentes as suscitadas exceções de inimpugnabilidade do Acórdão do “COJ” de 22/11/2018 (por reporte ao Acórdão, do mesmo “COJ”, de 18/10/2018) e de ilegitimidade passiva do “COJ”, julgar consequentemente inimpugnável o Acórdão do “CSMP” de 19/3/2019 e, em consequência, absolver o “CSMP” da instância. E, em decorrência desta última decisão, julgar este “STA” incompetente para o conhecimento e julgamento da presente ação, sendo competente o TACLx. (art. 44º nº 1 do ETAF), para aí se remetendo os autos (art. 5º nº 2 do ETAF), após trânsito do presente despacho (arts. 628º do CPC e 27º nº 2 e 29º nº 1 do CPTA)».

  4. Transcreve-se, de seguida, o teor do despacho saneador, na parte alvo da presente reclamação: «(…) 4. O co-Réu “COJ” defende, na sua contestação, que o seu Acórdão de 22/11/2018 é contenciosamente inimpugnável (e, por via disso, ele próprio não deve ser parte na ação), pois que o Autor recorreu administrativamente daquele seu Acórdão para o Conselho Superior do Ministério Público, como legalmente previsto. Assim sendo, o ato final do procedimento, que definiu a situação do Autor – com que este se não conforma (a classificação de “bom com distinção”) -, foi o Acórdão do “CSMP” de 19/3/2019, pelo que, a seu ver, é este o ato administrativo (único ato) contenciosamente impugnável.

  5. Sucede, porém, que a questão não se afigura tão simples como o co-Réu “COJ” a apresenta.

    Desde logo porque, acaso se configure o recurso da deliberação do COJ para o CSMP como “necessário”, o art. 198º nº 4 do CPA dita precisamente a solução contrária à aqui defendida pelo “COJ”: «O indeferimento do recurso hierárquico necessário (…) confere ao interessado a possibilidade de impugnar contenciosamente o ato do órgão subalterno (…)». Logo, se aplicável esta regra, o ato contenciosamente impugnável será o do “COJ”, e não o do “CSMP”.

    Há, então, que caracterizar e qualificar o recurso administrativo em causa.

  6. O recurso das deliberações do “COJ” para o “CSMP” (ou para o “CSM” ou para o “CSTAF”, conforme o tribunal ou local de exercício de funções dos oficiais de justiça) encontra-se previsto no já citado art. 118º do “EFJ”, aprovado pelo DL 343/99, de 20/8 (artigo reformulado pelo DL nº 96/2002, de 12/4), cujo nº 2 refere: «Das deliberações do Conselho dos Oficiais de Justiça proferidas no âmbito do disposto nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 111.º [apreciação do mérito profissional e exercício do poder disciplinar], (…) cabe recurso, consoante os casos, para o Conselho Superior da Magistratura, para o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais ou para o Conselho Superior do Ministério Público, a interpor no prazo de 20 dias úteis».

    Ora, da constatação da fórmula legalmente empregue – “cabe recurso” – é de retirar a conclusão, imposta pelo art. 3º nº 1 do DL nº 4/2015, de 7/1 (que aprovou o atual CPA), de que o recurso em causa não é configurável como uma “impugnação administrativa necessária”, visto que não se deteta, na sua previsão, nenhuma das expressões listadas nas três alíneas daquela norma (“é necessária”, “existe sempre” ou “suspende” ou “tem efeito suspensivo do ato impugnado”).

    Em consonância, aliás, com o sentido da reforma do CPA de 2015.

    Ver, a propósito da norma do nº 2 do art. 185º do atual CPA (“as reclamações e os recursos têm carácter facultativo, salvo se a lei os denominar como necessários”), o comentário de Vieira de Andrade in “”Comentários à revisão do CPA”, Fausto de Quadros et al., Almedina, Maio/2016, pág. 399: «(…) A opção legislativa é completada no nº 2, ao estabelecer a “regra” do carácter “facultativo” das reclamações e recursos, salvo se a lei os “denominar” como necessários – uma formulação que exigirá que a lei utilize expressamente a palavra “necessário”. (…) De resto, o Decreto-Lei nº 4/2015 regulou, no artigo 3º, as impugnações administrativas necessárias existentes à data da sua entrada em vigor num sentido fortemente restritivo (…)».

    Estamos, pois, no caso, perante uma impugnação administrativa facultativa, que o Autor entendeu utilizar, sendo certo que poderia ter, desde logo, impugnado contenciosamente o Acórdão do “COJ”, sem interpor recurso administrativo para o “CSMP” (ou durante a pendência deste – cfr. art. 190º nº 4 do CPA).

    Veja-se, aliás, perante situação paralela, o decidido por este “STA” no seu Acórdão de 23/4/2020 (proc. 0102/19): «(…) as disposições legais do EMP de 1986...

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