Acórdão nº 01962/18.7BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução09 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por A............, SA, com os sinais dos autos, visando a revogação da sentença de 24-03-2021, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou parcialmente procedente a impugnação intentada contra as liquidações oficiosas de direitos anti-dumping [€320.431,24], de direitos de compensação [€1.053.182,09], e de imposto sobre o valor acrescentado [€315.931,07], acrescidos dos correspondentes juros compensatórios, perfazendo a quantia global de € 1.921.178,80, quanto aos anos de 2013, de 2014 e de 2015, tendo sido determinada a anulação das liquidações impugnadas na medida em que se mostram influenciadas pela aplicação da taxa que não a reduzida, prevista nos regulamentos de execução nºs 214/2013 e 215/2013.

Irresignada, nas suas alegações, formulou a recorrente A............, SA, as seguintes conclusões: A) O prazo de que a Autoridade Tributária e Aduaneira dispõe para proceder à liquidação de tributos aduaneiros, designadamente direitos de importação, é por regra o prazo de três anos, nos termos, à data dos factos, do então previsto no n.º 4 do artigo 221º do Código Aduaneiro Comunitário (CAC), constante do Regulamento (CEE) n.º 2913/92; B) O regime do CAC estipulava que o legislador nacional podia criar uma norma interna que permitisse a aplicação de um prazo mais dilatado de caducidade do direito de liquidação de tributos aduaneiros nas situações que envolvam a prática de infrações aduaneiras; C) Na ordem jurídica portuguesa, essa norma é o artigo 99º da Reforma Aduaneira (RA), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 46 311, de 27 de Abril de 1965, o qual dispõe um prazo de 8 anos; D) No entanto, o disposto no artigo 99º da RA não é suficiente para definir todos os aspetos que, na prática, a sua aplicação suscita, nomeadamente no que respeita aos pressupostos de facto que permitem o recurso ao prazo de oito anos nele previsto e às regras de contagem do mesmo.

  1. Para o efeito, é necessário integrá-lo devidamente na ordem jurídica portuguesa, à luz do princípio da coerência sistemática, e densificá-lo através de uma compatibilização, em particular, com o n.º 5 do artigo 45º da Lei Geral Tributária (LGT).

  2. A interpretação do artigo 99º da RA de acordo, especificamente, com o n.º 5 do artigo 45º da LGT é uma obrigação imposta ao aplicador da lei para todos os factos ocorridos após a entrada em vigor deste segundo preceito, em 1 de janeiro de 2006; G) A compatibilização entre as duas normas em causa não ofende nem é contraditada pelo comando de fonte europeia que habilita a vigência do artigo 99º da RA – à data dos factos subjacentes aos autos, o congénere n.º 4 do artigo 221º do CAC.

  3. Bem pelo contrário, estes preceitos, quanto à matéria em questão, dão grande liberdade ao legislador dos Estados-Membros; I) O legislador nacional, no n.º 5 do artigo 45º, determinou que a ampliação de prazo estipulada no n.º 5 do artigo 45º da LGT é, verdadeiramente, um alargamento do prazo regra de quatro anos.

  4. Isto é, que para a norma excecional se aplicar é preciso que o prazo inicial de não tenha ainda sido ultrapassado, sob pena de se fazer tábua rasa do instituto da caducidade, com cuja razão de ser a possibilidade de reabertura de prazos ou renascimento de direitos é perfeitamente incompatível.

  5. Haverá que concluir que não é incompatível com o n.º 4 do artigo 221º do CAC um regime nacional que, nos casos de atos passíveis de procedimento judicial repressivo, faça depender a ampliação do prazo regra de caducidade do direito de liquidação de direitos aduaneiros das condições previstas no n.º 5 do artigo 45º da LGT, em tudo aquilo que não encontre regulação própria na norma habilitante de fonte europeia; L) Deve entender-se que a Autoridade Tributária e Aduaneira só pode recorrer ao prazo de oito anos previsto no artigo 99º da RA se o procedimento administrativo tendente à liquidação do tributo aduaneiro, que se legitima naquele prazo, se iniciar antes de ultrapassado o prazo regra de três anos; M) A Autoridade Tributária e Aduaneira não pode, pois, invocá-lo em momento posterior ao decurso do prazo normal de 3 anos, reabrindo o prazo de caducidade e fazendo renascer o seu direito de liquidação.

  6. No caso dos autos, a Autoridade Tributária e Aduaneira apenas determinou o início do procedimento de inspeção, na sequência do qual invocou o alargamento do prazo e procedeu à liquidação dos tributos em causa, em 21.07.2017 (Cfr. facto provado 22 da sentença recorrida); O) Ou seja, mais de 3 anos volvidos desde a apresentação dos 5 DUA respeitantes às importações, que ocorreu entre 24.06.2013 e 19.11.2013 (Cfr. facto provado 6 da sentença recorrida).

  7. Por estas razões, a sentença recorrida enferma de erro de julgamento, por violação do disposto no n.º 5 do artigo 45º da LGT, conjugado com o disposto no artigo 221º do CAU e 99º da Reforma Aduaneira.

    Sem prescindir, Q) Quanto às Regras Gerais de Interpretação da NC, importa para o presente caso, considerar o disposto nas regras 1 e 3 a).

  8. Nos termos da regra 1, dispõe-se que “Os títulos das Secções, Capítulos e Subcapítulos têm apenas valor indicativo, sendo que para os efeitos legais, a classificação é determinada pelos textos das posições e das Notas de Secção e de Capítulo e, desde que não sejam contrárias aos textos das referidas posições e Notas, pelas Regras seguintes” S) O mesmo é dizer que a classificação deve primacialmente obedecer aos dizeres expressos daquelas Notas, e sendo esse o caso, não sejam contrários ao espírito e à letra das posições e das Notas em conformidade com o disposto nas regras 2, 3, 4, 5 e 6.

  9. Efetivamente, em muitos casos, atentas as características e especificações técnicas das mercadorias, podem as mesmas ser classificadas de imediato se necessidade de recurso a outras regras.

  10. Contudo, quando se mostre indispensável apelar as demais regras, tal exercício, ainda assim, não pode ter como resultado a obtenção de uma classificação que seja contrária aos textos das posições e das Notas, os quais prevalecerão sempre em relação a qualquer outra consideração.

  11. Já nos termos da regra 3 a), prevê-se que “A posição mais específica prevalece sobre as mais genéricas. Todavia, quando duas ou mais posições se refiram, cada uma delas, a apenas uma parte das matérias constitutivas de um produto misturado ou de um artigo composto, ou a apenas um dos componentes de sortidos acondicionados para venda a retalho, tais posições devem considerar-se, em relação a esses produtos ou artigos, como igualmente específicas, ainda que uma delas apresente uma descrição mais precisa ou completa da mercadoria”.

  12. Consagra-se aqui o princípio da prevalência da especificidade em relação à generalidade, isto é, se as mercadorias em discussão forem passiveis de se classificarem em duas diferentes posições, mas o texto de uma delas, em comparação com outras (de natureza mais vaga) apresenta dizeres que estão mais em linha com as suas especificações intrínsecas, será esta a posição a considerar devendo, consequentemente, desconsiderar-se a posição com carácter mais genérico.

  13. A regra 3 b), por sua vez, prescreve que “Os produtos misturados, as obras compostas de matérias diferentes ou constituídas pela reunião de artigos diferentes e as mercadorias apresentadas em sortidos acondicionados para venda a retalho, cuja classificação não se possa efetuar pela aplicação da Regra 3 a), classificam-se pela matéria ou artigo que lhes confira a característica essencial, quando for possível realizar esta determinação”.

  14. Nos termos desta regra de interpretação, a classificação pautal das mercadorias deve ser realizada em função da matéria ou artigo que lhe confira a característica essencial, desde que, naturalmente, tal determinação seja possível.

  15. O fator que melhor permite a verificação da característica essencial da mercadoria pode ser a sua matéria constitutiva, ou seus componentes, o seu volume, quantidade, peso ou valor, importância de uma das matérias constitutivas tendo em vista a utilização final das mercadorias.

    AA) No caso em apreço, atendendo às especificações e características técnicas das mercadorias importadas, entendeu a Recorrente atribuir-lhes a posição pautal SH 7210 49, com a designação chapa de aço galvanizada.

    BB) A equipa inspetiva da AT, por sua vez, considerou que teriam aquelas mercadorias cabimento no âmbito da posição pautal 7210 70, ou seja, na família da chapa de aço pintada, envernizada ou revestida de plástico.

    CC) Por esta razão, e para que se pudesse, de uma vez por todas, esclarecer quais eram as caraterísticas e especificações técnicas relevantes para efeitos do correto exercício de classificação pautal, a Recorrente solicitou ao INEGI (Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Engenharia Industrial da Universidade do Porto) um estudo técnico que fosse capaz de dar resposta aquela questão.

    DD) O mencionado estudo técnico concluiu, em suma, o seguinte: “a chapa de aço diz respeito a um aço de construção ao carbono, ferrítico, com uma % de carbono de 0,08, contendo silício, manganés, fósforo e enxofre, e percentagens residuais de outros elementos que estão abaixo dos teores mínimos para serem considerados elementos de liga (ver ref. [2] página 25), sendo classificado como um aço de construção não ligado” (páginas 14 e 15), EE) Prosseguindo, “Os baixos teores de elementos de liga, nomeadamente, crómio, níquel e cobre, fazem com que este aço seja considerado não ligado, e que tenha uma baixa resistência à corrosão atmosférica (oxidação superficial) ([4], pág. 265). Para se melhorar a resistência à corrosão atmosférica destes aços é frequentemente realizada uma galvanização (aplicação de um revestimento de liga de zinco)” (página 15), FF) Acrescentando que “O aço tem revestimentos em cada uma das faces. O revestimento em contacto com o aço é de alumínio-zinco (aço galvanizado). Este...

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