Acórdão nº 1003/10.2BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO C… (doravante Recorrente), veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 352………….. e apensos, instaurado originariamente contra a sociedade “U… Lda”, tendo por objeto a cobrança coerciva de dívidas referentes a Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) dos períodos de 2002, 2003, 2004 e 2005, Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares-Retenção na Fonte (IRS-RF) dos anos de 2004, 2005 e 2006, Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) dos exercícios, de 2002, 2003, 2004 e 2005 e coimas, tudo no montante global de €542.550,89, a qual julgou extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide relativamente às dívidas de coimas e improcedente no demais.

O Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem: “1ª Ao contrário do disposto no art. 659° n° 2 do CPC, que apenas impõe que o Tribunal discrimine os factos que considera provados, o art. 123° n° 2 do CPPT impõe que o Tribunal discrimine a matéria provada da não provada e fundamente a respetiva decisão, pelo que, não tendo havido uma seleção da matéria considerada relevante para a decisão da causa, apenas indicar quais os factos julgados provados e não referir que factos foram julgados não provados com relevância para a decisão da causa, consubstancia uma violação do referido art. 123° n° 2 do CPPT e, consequentemente, a nulidade prevista no art. 125° n° 1, 2a parte, do CPPT (feita de discriminação dos factos relevantes para a decisão da causa julgados não provados), o que expressamente se argui para todos os devidos efeitos.

  1. Sobre a questão de saber se, no caso dos presentes autos, em que não houve sequer identificação e muito menos penhora dos bens ainda da propriedade da devedora principal, se pode operar a reversão contra o devedor subsidiário ou se, pelo contrário, em tal hipótese, se mostra, em concreto, abusiva qualquer reversão, por não ter sido, na verdade, feito qualquer juízo fundado sobre a suficiência ou não dos bens propriedade da devedora originária para pagamento da quantia exequenda, não se verificando portanto os pressupostos de que o legislador a faz depender a reversão, nos termos do art. 23° da LGT, o Tribunal a quo não se pronunciou, quando se impunha que o fizesse, razão pela qual se mostra verificada a nulidade de feita de pronúncia sobre questão que o juiz deva apreciar, prevista no art. 125° n° 1, 4a parte, do CPPT, o que expressamente se argui para todos os devidos efeitos.

  2. A sentença recorrida deveria ter recaído expressamente sobre os seguintes factos, considerados pelo próprio Tribunal a quo, e bem, relevantes para a decisão da causa, os quais devem ser julgados provados: a. A devedora principal era, à data da reversão contra o ora oponente (e ainda é atualmente) proprietária de bens penhoráveis; b. Tais bens não foram objeto de qualquer penhora no âmbito do processo de execução fiscal no qual foi operada a reversão contra o ora oponente; c. Não foi assim sequer ponderada a suficiência ou insuficiência de tais bens penhoráveis propriedade da devedora principal para a satisfação da dívida exequenda; d. Não tendo havido penhora de tais bens no âmbito do processo de execução fiscal onde foi operada a reversão, não foi atribuído a tais bens qualquer valor, o que impossibilita a ponderação sobre a sua suficiência para satisfação da dívida.

  3. A matéria fáctica vertida na al. AB) dos factos provados deveria ter sido julgada não provada, devendo, em sua substituição, ser dado como provado que: - o Oponente, enquanto gerente da devedora originária, Apenas tinha a alternativa de optar entre o não pagamento dos salários líquidos e não pagamento ao fornecedor único, C……, com o consequente inevitável encerramento da sua atividade e inerente irrecuperabilidade das dívidas já vencidas e, por outro lado, a não entrega ao Estado dos valores correspondentes ao cumprimento das obrigações tributárias e para-fiscais da sociedade de molde a conseguir manter a sociedade em atividade (factos vertidos nos artigos 122° e 123° da petição inicial de oposição); e que -o Oponente acabou por pagar os salários líquidos aos trabalhadores e pagar ao seu fornecedor único para a continuação da atividade da Univícola, como única forma de impedir o encerramento da atividade da devedora originária e, consequentemente, como única forma de tentar recuperar os montantes necessários para o pagamento das dívidas vencidas (fectos vertidos no artigo 124° da petição inicial de oposição).

  4. Caso se considere que não se verifica a nulidade de falta de pronúncia sobre questão que o juiz deva apreciar, pelas razões expostas no capítulo III supra, ainda assim não poderia o recorrente deixar de discordar do Tribunal a quo, por este ter considerado que não se mostrava violado o art. 23° n° 2 da LGT, já que não se pode deixar de considerar que este preceito legal impõe que se apure quais os concretos bens da propriedade do devedor principal e qual o seu valor e apenas com tais elementos se possa concluir pela fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor originário, o que não foi feito no caso sub iudice, pelo não é possível concluir, como concluiu o Tribunal a quo, pela fundada insuficiência de bens do devedor originário.

  5. Tendo o Tribunal a quo reconhecido na fundamentação da decisão, a fls. 10 da douta sentença, que «perante a prova produzida, quando muito afigura- se-nos, que o Oponente não tem culpa pela actual situação de insuficiência patrimonial da empresa para responder pelas dívidas exequendas e que foi um gestor cuidadoso (...)», não se pode deixar de reconhecer que o Oponente e ora Recorrente geriu da melhor forma possível a sociedade devedora originária, com o maior zelo e diligência, embora as circunstâncias do mercado em que a atividade da sociedade se inseria e particularmente as alterações impostas pela Sociedade C…, de quem esta dependia economicamente, a tenham impedido de ter ganhos suficientes para cumprir todas as obrigações societárias para com os credores, entre os quais o Estado, pelo que se deve concluir que a falta de pagamento dos impostos em causa não é imputável ao Recorrente, julgando-se procedente o presente recurso, assim se fazendo JUSTIÇA!” *** A Recorrida Fazenda Pública, devidamente notificada não apresentou contra-alegações.

*** A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

*** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

*** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “Com interesse para a decisão da causa segundo as várias soluções de direito resulta assente a factualidade que se passa a subordinar por alíneas: A) No dia 30.07.1998 foi constituída a sociedade por quotas “U… Lda”, tendo sido nomeados gerentes C… e E…. (Doc. a fls.162/164 do PEF) B) A sociedade obriga-se com a assinatura conjunta de ambos os gerentes. (Doc. a fls.162/164 do PEF) C) Corre termos no Serviço de Finanças de Oeiras - 3 o processo de execução fiscal n.º 35……….. e apensos, contra «U… Lda», tendo por objecto a cobrança coerciva de dívidas de referentes IVA (2002, 2003, 2004 e 2005), IRS (2004, 2005 e 2006), IRC (2002, 2003, 2004 e 2005) e Coimas no montante de € 542.550,89.(PEF) D) No dia 03.04.2006, a Policia de Segurança Pública lavrou os “Autos de Apreensão” relativos aos veículos de matrícula …….., ……, ……, …… e ….., propriedade da devedora originária, tendo sido designado fiel depositário o Oponente. (Doc. fls. 391/395 dos autos) E) No dia 22.07.2008, o Chefe de Finanças do Serviço de Finanças de Oeiras 3, proferiu despacho determinando a notificação para exercício do direito de audição prévia do Oponente, para efeito da reversão da execução por dívidas no processo de execução fiscal a que alude a al.C) do probatório. (Doc. fls. 115 do PEF) F) No dia 06.08.2008, o Oponente exerceu o direito de audição prévia, nos termos documentados a fls. não paginadas do PEF.

G) No dia 27.08.2008, o Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 3 proferiu despacho de reversão, do qual consta designadamente o seguinte: “De acordo com as diligencias efectuadas e a informação disponível nas aplicações informáticas da “ Justiça Fiscal”, cujos extractos se juntam a estes Autos a folhas 220 e seguintes, verifica-se que a devedora principal, U… Lda (…) não tem bens ou valores susceptíveis de penhora. (…) Constatada a inexistência de bens da originária devedora tendo como fundamento legal o disposto no artigo al.b) do n.º1 do artigo 24º da LGT, artigo 153º, n.º2 al.a) do CPPT e ainda al.b) do n.º1 do art.8º do RGIT ORDENO A REVERSÃO DA EXECUÇÃO contra os subsidiários responsáveis gerentes (…) C… (…) pela divida supra identificada e que esteve na origem do presente processo (…).” (Doc. a fls.237/238 do PEF) H) No dia 02.01.2011, o Oponente foi citado na execução. (Doc. a fls. 247/251 e 252 do PEF) I) Por despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Oeiras 3 de 22.06.2011, foram excluídos da reversão os processos de execução relativos as coimas fiscais no montante de € 63.479,42, tendo sido determinado o prosseguimento da execução apenas quanto ao valor da quantia exequenda remanescente de € 479.071,47. (Doc. fls.249 dos autos) J) A devedora originária foi distribuidora oficial dos produtos produzidos e comercializados pela Sociedade C….., S.A., em regime de exclusividade. (Doc. n.º1 junto à p.i. e prova testemunhal) L) A devedora originária realizou investimentos em frota de veículos pesados, em recursos humanos e em outros meios materiais, que não podiam sequer ser usados para a comercialização de outros produtos. (Prova testemunhal) M) Os investimentos a que alude a al.L) do probatório foram realizados para conseguir exercer a referida actividade de distribuidora exclusiva da C…...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT