Acórdão nº 168/18.0GAACB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelISABEL VALONGO
Data da Resolução02 de Março de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório Por despacho de 08-12-2020, proferido nos autos de instrução com o número acima identificado, do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo de Instrução Criminal de Leiria - Juiz 3, a Exma. Juiz julgou procedente a nulidade invocada prevista no art. 120º, nº2, al. d), do CPP e em consequência declarou a nulidade parcial da acusação pública por referência ao facto 3º e da acusação particular por referência aos factos 1º a 4º., e por isso, não pronunciou o arguido pela prática de um crime de ameaça agravada, previsto e punido pelo art.º 155.º, n.º 1, al. a) e 153.º, nº 1 do Código Penal e de um crime de injúria p. e p. pelo artigo 181º do Código Penal.

* Inconformada, a assistente interpôs recurso, tendo concluído a motivação do seguinte modo: 1. A Douta Decisão Instrutória julgou verificada, como “questão prévia”, «a nulidade sanável prevista no artigo 120º, nº. 2, al. d) do CPP, decorrente da verificação da omissão apontada e em conformidade declara-se a nulidade parcial da acusação pública por referência ao facto 3º e da acusação particular por referência aos facos [sic] 1º a 4º.», por entender que as acusações continham factos que apenas chegaram ao processo após o interrogatório do arguido, sendo que este foi apenas ouvido pelos factos que constavam do processo aquando desse interrogatório.

  1. As questões a apreciar são quatro, sendo identificadas autonomamente nos quatro pontos seguintes, relegando-se os argumentos para o corpo deste recurso.

  2. A decisão carece de fundamentação de direito, pois apenas menciona o art. 120.º, n.º 2, al. d) do CPP, o qual pressupõe que haverá nulidade quando for violada uma norma jurídica, norma essa que o despacho não identifica, violando assim o art. 374.º, n.º 2 do CPP, ou, assim não se entendendo, o art. 615.º, n.º 1, al. b) do CPC (ex vi art.º 4.º do CPP).

  3. Não deveria ter sido declarada a nulidade, pois o arguido foi ouvido em sede de inquérito quanto aos factos que constituíam objecto do processo nessa altura, sendo que o posterior acrescentar de novos factos ao objecto do processo não obriga a interrogatório complementar do arguido, uma vez que o art.º 272.º, n.º 1 do CPP estabelece a obrigação de interrogatório por referência ao inquérito e não por referência a factos ou crimes.

  4. Ainda que existisse a nulidade, dela não resultaria a invalidade de qualquer acto, pois na instrução teve lugar a audição do arguido, tendo o arguido tido aí e no seu requerimento de abertura de instrução oportunidade para se pronunciar sobre os factos acrescentados.

  5. Mesmo que assim não fosse, ainda assim deveria ter sido aplicada a 2.ª parte do artigo 122.º, n.º 2 do CPP, ordenando a Mm.ª JIC que fosse praticado o acto em sede de instrução (ou remetendo o processo para inquérito para haver lugar a essa prática).

    Nestes termos e nos melhores de Direito, deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser alterada a decisão no sentido de declarar não verificada a nulidade declarada no douto despacho, e, decorrentemente, extirpar o douto despacho da decisão de não pronúncia, para, em consequência, ser proferido despacho de pronúncia do arguido pela prática do crime de ameaça agravada e do crime de injúria relativamente aos quais foi proferido despacho de não pronúncia assente em fundamento incorrecto.

    Assim se fazendo JUSTIÇA.” * O MP respondeu ao recurso, concluindo: “1º - Em 08.12.2020 a Juiz de Instrução Criminal exarou decisão instrutória, no âmbito da qual decidiu não pronunciar o arguido B. pelos factos que se encontram identificados na acusação pública e na acusação particular por referência ao dia 22 de dezembro de 2918, subsumíveis a um crime de injúria e a um crime de ameaça agravada, declarando verificada a nulidade sanável prevista no artigo 120°, n°. 2, al. d) do CPP.

    É sobre esta decisão instrutória que recai o presente recurso.

    1. - Defende a assistente que não deveria ter sido declarada a nulidade pois o arguido foi ouvido em sede de inquérito quanto aos factos que constituíam objeto do processo nessa altura. Assim, tendo sido acrescentados novos factos ao objeto do processo não havia a obrigatoriedade de realizar interrogatório complementar do arguido, em virtude do art.º 272.º, n.º 1 do CPP estabelecer a obrigação de interrogatório por referência ao inquérito e não por referência a factos ou crimes. Afirma ainda que se existisse a nulidade, dela não resultaria a invalidade de qualquer ato pois verificou-se a audição do arguido na fase da instrução, tendo aí sido dada oportunidade aquele para se pronunciar sobre os factos acrescentados.

    2. - Analisando o presente caso cabe referir que, em 26.06.2019, o arguido foi sujeito a interrogatório na fase de inquérito, tendo nesse ato sido confrontado com os factos de 6 de julho de 2018 e 15 de março de 2019. Mais resulta que não foi, no entanto, confrontado com a facticidade ocorrida no dia 22 de dezembro de 2018 e que se verificava essa possibilidade em momento anterior à dedução da acusação.

    3. - Ora, em conformidade com o preceituado nos artigos 118°, 120° e 122º, todos do CPP, verificou-se o cumprimento das normas legais quando a Juiz de Instrução Criminal considerou ser obrigatória a constituição de arguido e o interrogatório como arguido da pessoa contra a qual corre inquérito, não podendo haver a dedução da acusação sem que tal ato tivesse lugar. E idêntico raciocínio se fará quando se entendeu que a violação do disposto nas normas supracitadas constitui a nulidade sanável prevista no art.º 120º, nº. 2, al. d) do CPP, a qual terá como efeitos os previstos no artigo 122º do CPP.

    4. - Assim sendo e porque a nulidade referida foi invocada por quem tinha legitimidade para tal e a mesma foi arguida em tempo (art.º 120º, nº. 1 e 3º, al. c) do CPP), bem andou a Juiz de Instrução Criminal ao declarar verificada a nulidade sanável prevista no artigo 120º, nº. 2, al. d) do CPP, decorrente da verificação da omissão apontada e, em conformidade, declarada a nulidade parcial da acusação pública por referência ao facto 3º e da acusação particular por referência aos facos 1º a 4º.

    5. - No caso em apreço a Juiz de Instrução Criminal explanou todo este raciocínio aqui exposto em síntese, fundamentando devidamente a sua convicção e, em consequência, o teor da sua decisão.

    6. - Deste modo, dadas as considerações que aqui se deixaram tecidas e aderindo na íntegra à argumentação plasmada na decisão ora posta em crise, entendemos que a mesma se mostra em conformidade com a lei, não se verificando a violação de quaisquer princípios ou preceitos legais, designadamente os mencionados pela recorrente.

    Porém, decidindo, V.Exª farão a costumada JUSTIÇA.” * Nesta Relação, o Exmo. Procurador Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer: “(…) 2. Consideramos assistir razão à recorrente quando alega não se verificar a nulidade prevista no art. 122º, nº 2, al. d), do C. P. Penal, pois que o arguido foi interrogado durante o inquérito, ainda que não...

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