Acórdão nº 00534/19.3BEBRG-S1 de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Apar |
Data da Resolução | 25 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Nos presentes autos em que é Autora M., S.A. e Réu o Município (...), ambos neles melhor identificados, foi proferido saneador-sentença que julgou improcedente a exceção de caducidade do direito à reposição do equilíbrio financeiro invocada.
Deste vem interposto recurso.
Alegando, o Réu formulou as seguintes conclusões: 1. Impugna-se neste Recurso a decisão proferida no Douto Despacho Saneador, que julgou improcedente a exceção de caducidade do direito à indemnização pedida pela Recorrida nestes autos, por entender que o evento que constitui o direito à reposição do equilíbrio financeiro ocorreu em 25 de julho de 2017 e a Recorrida apresentou a correspondente reclamação no dia 7 de agosto de 2017, cumprindo o prazo de 30 dias previsto no n.º 2 do artigo 354.º do CCP.
-
Essa decisão incorre em erro de julgamento, porquanto fez uma errada aplicação do direito aos factos, e, além disso, violou o disposto quer no número 13.4 do Caderno de Encargos, quer nos nºs 2 e 3 do artigo 354.º do CCP.
-
De facto, logo no dia 25 de julho de 2017, aquando do início da execução pela Recorrida dos trabalhos da empreitada na Zona 2 - Troço 10 (Z2T10), a execução da obra nesse troço foi interrompida devido ao embargo extrajudicial da obra.
-
No dia 7 de agosto de 2017 a Recorrida apresentou um requerimento reclamando a reposição do equilíbrio financeiro, mas dizendo que desconhece integralmente a extensão dos danos, cujo cálculo será oportunamente apurado e enviado ao Recorrente.
-
Aqui deteta-se o primeiro erro de julgamento da decisão do Tribunal a quo, ao ignorar o disposto no número 13.4 do Caderno de Encargos, segundo a qual: “Ocorrendo facto que deva ser considerado caso de força maior, o empreiteiro deverá, nos 8 (oito) dias de calendário seguintes àquele em que tome conhecimento do evento, requerer ao dono da obra que proceda ao apuramento do mesmo.”.
-
Aplicando esta norma aos factos provados, rapidamente se conclui que o prazo de 8 dias não foi cumprido, uma vez que a obra foi parada logo no dia 25 de julho de 2017, e a Recorrida só apresentou a reclamação no dia 8 de agosto de 2017.
-
Por outro lado, essa parte da obra esteve suspensa até ao dia 22 de dezembro de 2017, mas só no dia 23 de abril de 2018 é que a Recorrida apresentou ao Recorrente o requerimento em que identificou a suspensão ocorrida na obra como facto gerador de sobrecustos e os danos causados por essa suspensão.
-
Aqui deteta-se o segundo erro de julgamento da decisão do Tribunal a quo, ao determinar que a Recorrida cumpriu o prazo de 30 dias previsto no n.º 2 do artigo 354.º do CCP, quando apresentou a reclamação para reposição do equilíbrio financeiro da empreitada no dia 7 de agosto de 2017.
-
De facto, no dia 7 de agosto de 2017, a Recorrida apresentou um requerimento onde apenas diz que a obra foi suspensa naquele troço a 1 de agosto de 2017, e reclama a reposição do equilíbrio financeiro, adiantando que desconhece integralmente a extensão dos danos, cujo cálculo será oportunamente apurado e enviado ao Recorrente.
-
Note-se que nem sequer foi identificado o dano mais evidente que poderia equacionar-se naquela altura, que seria o custo acrescido de estaleiro, e que não podia ser por esta ignorado.
-
Ora, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 354.º do CCP: “O direito à reposição do equilíbrio financeiro previsto no número anterior caduca no prazo de 30 dias a contar do evento que o constitua ou do momento em que o empreiteiro dele tome conhecimento, sem que este apresente reclamação dos danos correspondentes nos termos do número seguinte, ainda que desconheça a extensão integral dos mesmos.” 12. E o n.º seguinte (n.º 3) estabelece muito claramente que o pedido deve ser efetuado “(…) por meio de requerimento no qual o empreiteiro deve expor os fundamentos de facto e de direito e oferecer os documentos ou outros meios de prova que considere convenientes.”.
-
O direito à reposição do equilíbrio financeiro pressupõe, assim, que o pedido ou reclamação, provida dos fundamentos de facto e de direito acompanhada dos correspondentes meios de prova (conquanto não exaustivos), requisitos que a reclamação de 7 de agosto de 2017 não cumpre.
-
Isto apesar de a Recorrida saber e conhecer em 7 de agosto de 2017 que ia permanecer em obra para além dos 180 dias previstos no contrato e na sua proposta, com eventual agravamento de custos.
-
Além disso, a suspensão acabou por durar mais do que os 90 dias previstos no auto de vistoria lavrado a 1 de agosto de 2017 e com base no qual a Recorrida apresentou aquela reclamação de 8 de agosto.
-
No entanto, quando essa suspensão terminou, em dezembro de 2017, a Recorrente também não apresentou qualquer reclamação no prazo de 8 dia previsto no ponto 13.4 do Caderno de Encargos, ou nos 30 dias posteriores, conforme manda o n.º 2 do artigo 354.º do CCP.
-
Não menos relevante é o facto de o pedido de indemnização para reposição do equilíbrio financeiro da empreitada, apresentado em abril de 2018 e agora nesta ação, dizer respeito a sobrecustos alegadamente incorridos entre 4 de novembro de 2017 – data prevista para a conclusão da empreitada – e 22 de fevereiro de 2018 – data da alegada conclusão da empreitada.
-
A verdadeira causa de pedir nesta ação reporta-se, assim, à permanência em obra após o dia 4 de novembro de 2017, radicando aí o também alegado evento causador do desequilíbrio da equação económico-financeira a que a Recorrida se refere.
-
No entanto, a Recorrente também não apresentou qualquer reclamação no prazo de 8 dia previsto no ponto 13.4 do Caderno de Encargos, ou nos 30 dias posteriores a 4 de novembro de 2017, conforme manda o n.º 2 do artigo 354.º do CCP.
-
Novamente, apesar de saber e conhecer em 4 de novembro de 2017 que ia permanecer em obra para além dos 180 dias previstos no contrato e na sua proposta e que isso lhe podia causar sobrecustos na execução da empreitada.
-
A decisão do Tribunal a quo incorre, assim, num erro de facto e de direito, que se traduz numa aplicação errada quer do ponto 13.4 do Caderno de Encargos, quer dos nºs 2 e 3 do artigo 354.º do CCP, ao aproveitar a reclamação de agosto de 2017, para factos que ocorreram depois dessa data e fora do objeto visado por essa reclamação (os tais 90 dias de suspensão previstos no auto de suspensão parcial).
-
Nestes termos, conclui-se que o Tribunal a quo decidiu erradamente julgar improcedente a exceção de caducidade do direito à indemnização pedida pela Recorrida.
-
A correta aplicação dos n.ºs 2 e 3 do artigo 354.º do CCP conduzirá inexoravelmente à procedência da exceção de caducidade invocada pelo Recorrente na sua Contestação, uma vez que a Recorrida não exerceu tal direito nos termos previstos naquelas normas legais, nos 30 dias subsequentes ao dia 4 de novembro de 2017, quando terminou o prazo de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO