Acórdão nº 0111/21.9BECTB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelADRIANO CUNHA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – RELATÓRIO 1. A............

, Agente da P.S.P., interpôs o presente recurso de revista do Acórdão de 20/10/2021 do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), a fls. 321 e segs. SITAF, que concedeu provimento ao recurso interposto pelo “MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA (MAl)”, revogou a sentença proferida, em 19/5/2021 (cfr. fls. 249 e segs. SITAF) pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco (TAF/CBranco) - que havia julgado procedente a pretensão cautelar deduzida pelo ora recorrente contra o mesmo “MAI” e suspendera os “atos de (re)colocação do Requerente no Comando Metropolitano de Lisboa” – julgando totalmente improcedente a providência cautelar peticionada.

  1. O Requerente, ora Recorrente, terminou as suas alegações com as seguintes conclusões (cfr. fls. 352 e segs. SITAF): «1- com o presente recurso, não está em causa a situação concreta do recorrente, mas todas as situações futuras em que sejam colocadas em juízo a concretização do que são os conceitos de “expectativa jurídica” e “expectativa de facto”, por um lado, e por outro, o de “acto administrativo” e de “acto administrativo impugnável”, de modo a fazer-se uma melhor aplicação do direito; 2- aqueles conceitos e suas concretizações não devem ser geradoras de ambiguidades na jurisprudência, pela sua importância fundamental e pela confiança que sobre essa matéria deve ser gerada nos administrados, de modo a que as decisões judiciais, com o devido respaldo jurídico, se possam, também, impor socialmente; 3- A “expectativa jurídica” é uma posição de expectação à qual o Direito confere protecção, designadamente através de permissões, atribuídas ao sujeito expectante, em ordem à defesa da probabilidade de efectivação do seu “direito a haver”; 4- mantendo-se estável a matéria de facto dada como provada, entende o recorrente que houve um claro e ostensivo erro na aplicação do direito no douto acórdão recorrido, que revogou a decisão de 1ª instância, porquanto, se a protecção da expectativa jurídica é aquela que é conferida, designadamente, através de permissões, atribuídas ao sujeito expectante, o caso dos autos é um desses, urgindo a intervenção deste Tribunal de cúpula; 5- o direito à colocação a título excepcional é conferido pelo disposto no art.º 102º, nº 1 do EPSP, mediante o cumprimento de requisitos ali exigidos, e que o recorrente cumpre na íntegra, conforme a factualidade provada; 6- a situação do recorrente cumpre o referido conceito expectativa jurídica, pois que ficou provado que o recorrente manteve-se “desde 16 de Março de 2018, a exercer funções policiais na Esquadra de ......... da PSP, cumprindo, nomeadamente os horários que lhe são fixados e outras determinações emanadas dos superiores;”, ou seja, recebeu as “permissões”; 7- mais do que permissões, o recorrente recebeu ordens e determinações de forma legal e legítima, regular e constante durante 2 anos e quatro meses, pelo que, mais do que uma expectativa, o recorrente tinha uma situação jurídica estável, mantida activa e passivamente pelos seus superiores hierárquicos, mantendo-o em ......... e não o chamando a Lisboa, respectivamente; 8- a factualidade provada não pode ser ignorada, pois era do conhecimento de toda a estrutura hierárquica do recorrido/PSP; 9- dizer o contrário, era afirmar o comportamento ilegal dos superiores hierárquicos do recorrente, por tolerarem ilegalidades; 10- a interpretação feita pelo douto acórdão recorrido é, no entender do recorrente, uma interpretação manifestamente errada e ostensivamente violadora da factualidade e do Direito, e que urge ser corrigida por este Supremo Tribunal; 11- a recorribilidade do acto administrativo deve ser matéria que não pode gerar dúvidas aos administrados, nem sequer ao julgador, pelo que, tendo merecido nas duas instâncias dos autos respostas diametralmente opostas, exige o superior esclarecimento, para melhor aplicação do direito; 12- o acto suspendendo produziu efeitos próprios na esfera jurídica do requerente, devendo ser qualificável como acto administrativo suspendendo, pelo que ao decidir de forma diversão, o tribunal recorrido fez incorrecta aplicação do direito, violando o disposto nos art.ºs 148º do CPA, 51º, nº 1 do CPTA; 13- ao abrigo do art.º 150º, nº 1 e 2 do CPTA, a admissão do presente recurso é necessária para uma melhor aplicação do direito, e justifica-se porquanto, sendo a factualidade dos autos simples, estável e provada por acordo e documentalmente, os conceitos de expectativa jurídica e de acto administrativo não podem ter uma concretização tão díspar como aconteceu nas instâncias, aplicando critérios díspares e que aparenta erro ostensivo em 2ª instância, de tal modo que é manifesto que a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa seja reclamada para dissipar dúvidas acerca da determinação, interpretação ou aplicação do quadro legal que regula certa situação, no caso, os art.ºs 148º do CPA e 51º, nº 1 do CPTA; 14- ao ter, de forma imprescindível, de prestar auxilio diário e permanente ao seu agregado familiar, não pode o recorrente deslocar-se para Lisboa, pelo que, a manter-se o efeito meramente devolutivo do presente recurso o recorrente terá deixar a sua actividade profissional, o que é gerador de danos em si mesmo, pois é dela que extrai o sustento do seu agregado familiar; 15- nestas circunstâncias, provadas nos autos, ao abrigo do disposto no referido nº 4 do art.º 143º do CPTA deve decretar-se como providência necessária a evitar a ocorrência daqueles danos, o efeito suspensivo da decisão recorrida, até prolação da decisão por este Tribunal; 16- tendo em conta toda a factualidade indiciariamente provada, a expectativa do recorrente na continuidade de prestação de serviço em ........., merece a tutela do Direito, porque, mais do que tolerada, foi-lhe conferida através de permissões, ordens e determinações, durante 2 anos e 4 meses, que não podem ser ignoradas; 17- o direito à colocação a título excepcional é conferido pelo disposto no art.º 102º, nº 1 do EPSP, mediante o cumprimento de requisitos ali exigidos, e que o recorrente cumpre na íntegra; 18- a actuação do recorrido, mantendo o recorrente em ........., dando-lhe ordens e pagando-lhe o salário, foi determinante e promoveu a situação de facto do recorrente, na sua afectação e vinculação jurídica àquele comando; 19- ao ter mantido o recorrido em ......... durante 2 anos e 4 meses, o recorrido criou uma expectativa tutelável pelo Direito, pois se assim não fosse, os seus superiores hierárquicos do recorrente não tolerariam a sua permanência em situação ilegal; 20- o recorrente não se conformou com a não resposta ao pedido de prorrogação da colocação, antes apenas agiu como era timbre em casos similares na PSP, pelo que, se intentasse a respectiva acção judicial, estaria a gerar conflitualidade onde ela não existia; 21- não cabe na lógica e nas regras da experiência comum, que a PSP estivesse em omissão ilegal ao fim de 2 anos e quatro meses sem decidir o pedido de prorrogação, pois que a instrução do processo estava já feita há mais de 2 anos, havendo aqui, claramente, um acto tácito de deferimento, não reduzido a escrito; 22- o acto suspendendo é um acto administrativo que visou produzir efeitos jurídicos externos na situação individual e concreta do recorrente, e contendeu com as suas expectativas tuteladas pelo Direito, que se foram consolidando pelo decurso do tempo e por um pedido de prorrogação da colocação a título excepcional oportunamente formulado e ainda não decidido, sendo por isso susceptível de ser suspenso; 23- a manter-se o decidido no douto acórdão recorrido, estar-se-ia a premiar o infractor, que, bem conhecendo a situação familiar do recorrente, tem pendente uma tomada de decisão escrita sobre um pedido efectuado e já completamente instruído desde 02.11.2018, algo que o Direito não pode consentir; 24- o recorrente cumpre os requisitos legalmente exigidos para que seja decretada a suspensão de eficácia do acto em crise, o que deve ser feito conforme foi decidido na douta sentença de 1ª instância, cujos termos e fundamentos nesta matéria se secundam e aqui se dão por reproduzidos para os devidos e legais efeitos, por razões de economia processual; 25- não foi cumprido o direito de audiência prévia do Requerente, pelo que se afigura muito provável que o pedido anulatório proceda na acção principal, verificando-se o requisito do fumus boni iuris; 26- a imediata execução do acto que determinou a apresentação no Comando de Lisboa, a ser cumprida, obrigará o recorrente a deixar a sua actividade profissional, porque o impossibilitará de prestar o apoio aos dois membros do seu agregado familiar, perdendo assim o único sustento da família, dano esse que não se pode conceder seja verificado; 27- o recorrente não possui alternativa à sua manutenção em ........., fazendo a execução do acto perigar a tutela que o Requerente procura, tornando os danos eventualmente verificados, numa situação de facto consumado na pendência dos autos, o que faz preencher o requisito do periculum in mora; 28- considerando os interesses do recorrente e da recorrida em questão, entende-se que prevalecem os interesses da integridade física e psíquica dos familiares daquele, em detrimento dos desconhecidos interesses que a recorrida visa acautelar, preenchendo-se assim o requisito do nº 2 do art.º 120º do CPTA; 29- deve, pois, ser revogado o douto acórdão recorrido, mantendo-se o decidido na douta sentença de 1ª instância, decretando-se a providência cautelar de suspensão de eficácia do acto, melhor dizendo, de suspensão dos actos, que pretendem concretizar a alteração da situação funcional do recorrente, assim se fazendo JUSTIÇA».

  2. O Requerido “MAI”, ora Recorrido, apresentou contra-alegações, que terminou com as seguintes conclusões (cfr. fls. 408 e segs. SITAF): «1. O recurso de revista perante o Venerando...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT