Acórdão nº 162/22 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 162/2022

Processo n.º 479/21

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e são recorridos o Ministério Público e B., Lda., o primeiro veio interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), da decisão proferida por aquele Tribunal no dia 28 de abril de 2021.

O arguido foi condenado em 1.ª instância numa pena única conjunta de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão. Interpôs recurso desta decisão para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, por acórdão datado de 17 de fevereiro de 2021, negou provimento ao recurso. Inconformado, o arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, recurso que não foi admitido, com base no disposto no artigo 400.º, n.º 1, alínea f), 414.º, n.º 2, 420.º, n.º 1, alínea b) e 432.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal (cf. as fls. 51 ss. dos autos).

2. Foi desta última decisão que o arguido veio interpor recurso de constitucionalidade, o que fez nos seguintes termos:

«A., Recorrente melhor identificado nos autos supra referenciados, tendo sido notificado do indeferimento da reclamação (do despacho que não admitiu o recurso interposto), apresentada junto deste Egrégio Supremo Tribunal de Justiça, e, não se conformando com aquela douta Decisão de indeferimento, vem da mesma interpor o presente Recurso, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo (artigo 78º, n.º 4 da L.T.C), para o

EGRÉGIO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ao abrigo do disposto no art. 70º, n.º 1, al. b) da L.T.C. - inconstitucionalidade suscitada durante o processo, mormente, em sede de Reclamação apresentada da rejeição do Recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça,

Por entender que os arts. 400º, n.º 1, al. f) e 432º, n.º 1, al. b) do C.P. Penal foram interpretados de forma inconstitucional na decisão da reclamação apresentada, na medida em que, e conforme referido nessa reclamação, a interpretação dos mesmos no sentido da não admissibilidade do recurso interposto na parte respeitante a uma eventual Inconstitucionalidade verificada no Acórdão objeto, sempre viola o direito do ora Reclamante ao recurso, direito esse constitucionalmente consagrado no art. 32º da Constituição da República Portuguesa.

Porquanto, por não estarmos perante uma qualquer Inconstitucionalidade já anteriormente julgada por este Egrégio Tribunal Constitucional, essa não admissão de recurso sempre poderá redundar numa recusa, por parte deste Egrégio Tribunal, em tomar conhecimento do seu recurso no que a tal matéria respeita, caso V. Exas. sejam de entender não haver tal Inconstitucionalidade sido suscitada, de forma formalmente válida, durante o processo, tendo-se colocando assim em "xeque", desde logo o preceituado no art. 205º da C.R.P. e, o direito do Recorrente de vir perante este Egrégio Tribunal Constitucional discutir, via recurso próprio para o efeito, a constitucionalidade de um Acórdão condenatório e atentatório da sua liberdade pessoal e enquanto cidadão.

Ademais, ao se decidir pela inadmissibilidade do Recurso interposto para o STJ, sempre se estará a coartar o direito ao ora Recorrente de, em sede recursiva, poder "discutir" a legalidade do Acórdão proferido em sede de Recurso pelo Tribunal da Relação (o qual humildemente se entende como "ferido" de ilegalidade), não sendo, por isso, "alvo" de reapreciação e sancionamento de Tribunal distinto, mormente, superior, não sendo, por isso" "respeitado" e observado o direito constitucionalmente consagrado no art. 32º, n.º 1 da C.R.P., do ora Recorrente poder "reagir", legalmente por via de recurso, à confirmação da sua condenação resultante de Acórdão proferido por Tribunal Superior que, como referido, se entende como "ferido" de ilegalidade.

Do exposto, entende o Recorrente ser de concluir, no caso presente, pela inconstitucionalidade da norma resultante da conjugação dos artigos 432º, n.º 1, al. f) e 400º, n.º 1, al. e), ambos do C.P.Penal, na interpretação segundo a qual não é admissível recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, de Acórdãos proferidos em Recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1.ª Instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 (Oito) anos, quando essa segunda decisão não se mostre devidamente fundamentada, seja, como integralmente cumpridora do preceituado no art. 205º da C.R.P., por violação do art. 32º, n.º 1 dessa Constituição da República Portuguesa.»

3. Através da Decisão Sumária n.º 496/2021 decidiu-se não conhecer o recurso na parte respeitante à alínea e) do n.º 1 do atrigo 400.º do Código de Processo Penal, por não ter constituído ratio decidendi da decisão recorrida e por a questão em causa não apresentar o necessário caráter normativo, e negar-lhe provimento na parte respeitante à alínea f) do mesmo preceito, julgando-a não inconstitucional na dimensão em que estabelece a irrecorribilidade de decisões proferidas em recurso pelas relações que confirmem decisões condenatórias proferidas em primeira instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos. Foi a seguinte a fundamentação apresentada na Decisão Sumária reclamada:

«3. O recorrente invoca a inconstitucionalidade de duas normas distintas: (i) Em primeiro lugar, daquela que decorre dos artigos 400.º, n.º 1, alínea f), e 432.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, interpretados «no sentido da não admissibilidade do recurso interposto na parte respeitante a uma eventual Inconstitucionalidade verificada no Acórdão objeto»; em segundo lugar, dos artigos 400.º, n.º 1, alínea e), e 432.º, n.º 1, alínea f), do Código de Processo Penal, «na interpretação segundo a qual não é admissível recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, de Acórdãos proferidos em Recurso, pelas Relações, que confirmem decisão de 1.ª Instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 (oito) anos, quando essa segunda decisão não se mostre devidamente fundamentada».

4. No que diz respeito à segunda questão de constitucionalidade indicada pelo recorrente, não pode a mesma ser conhecida, pelas seguintes razões. Em primeiro lugar – e descontando o facto de não existir uma alínea f) no n.º 1 do artigo 432.º do Código de Processo Penal –, pela razão de que a alínea e) do n.º 1 do atrigo 400.º do Código de Processo Penal não foi, de todo, aplicada na decisão recorrida. Aplicada na decisão recorrida foi única e exclusivamente a alínea f) do mesmo preceito, como pode verificar-se a partir da decisão recorrida, constante de fls. 51 e ss. dos autos. Depois, porque a norma formulada pelo recorrente inclui um elemento que não apresenta caráter normativo, mais especificamente o de que a segunda decisão condenatória – a proferida pelo Tribunal da Relação – «não se mostra devidamente fundamentada». Trata-se de um elemento que pressuporia uma apreciação da decisão recorrida em si mesma considerada, que não de uma norma que aí tenha sido aplicada, pelo que nunca o Tribunal Constitucional poderia conhecer de tal questão, sob pena de ingerência numa esfera de competências que, no nosso ordenamento jurídico, estão exclusivamente confiadas a outros tribunais.

5. Sobra a questão relativa à constitucionalidade artigos 400.º, n.º 1, alínea f), e 432.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, interpretados «no sentido da não admissibilidade do recurso interposto na parte respeitante a uma eventual Inconstitucionalidade verificada no Acórdão objeto». Sucede que este preceito foi já, em diversas das suas dimensões normativas, apreciado por este Tribunal em inúmeras ocasiões. Bastará atentar no entendimento acolhido pelo Tribunal Constitucional, v.g. nos Acórdãos n.º 207/2021, de 14 de abril, n.º 96/2021, de 4 de fevereiro, n.º 699/2020, de 26 de novembro, n.º 232/2018, de 2 de maio, n.º 659/2018, de 12 de dezembro, n.º 212/2017, de 2 de maio, n.º 687/2016, de 14 de dezembro, n.º 239/2015, de 29 de abril, n.º 107/2015, de 11 de fevereiro, n.º...

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