Acórdão nº 00304/19.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalh
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP [devidamente identificada nos autos], Ré nos autos contra si instaurados por F. [na qual formulou pedido atinente à anulação do despacho proferido pela Direcção da Caixa Geral de Aposentações, datado de 09 de maio de 2019 e à condenação da CGA a aceitar e a instruir o seu processo nos termos dos artigos 127.º, 38.º c), 112.º e 118.º, n.º 2 do EA, por ser a entidade com competência legal para o efeito, designadamente a submete-lo a Junta Médica, nos termos do artigo 119.º do EA, com a consequente atribuição de pensão de invalidez ao abrigo do n.º 3, do artigo 54.º do EA], inconformada, veio apresentar recurso da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, datada de 24 de março de 2021, pela qual julgou procedente a acção e, consequentemente, condenou a Caixa Geral de Aposentações a praticar novo acto administrativo que decida o pedido de atribuição de pensão de invalidez formulado pelo Autor, retomando o procedimento administrativo iniciado com o recebimento do ofício identificado no ponto 17 do probatório e a tramitá-lo com observância do disposto no Estatuto da Aposentação, na versão anterior à conferida pelo Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, com todas as consequências legais daí advindas, nomeadamente a submissão do Autor a junta médica].

*No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES: 1. Salvo o devido respeito, a sentença recorrida não interpreta nem aplica corretamente o disposto nos artigos 127º, 38º, alínea c), 112º e 118º, nº2, todos do Estatuto da Aposentação, nem tão pouco os artigos 24º, nº 1, e 56º do Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de novembro.

  1. Nos autos está em causa um acidente de viação ocorrido em 24 de maio de 1977, quando o Autor se encontrava no cumprimento do serviço militar, o que deu origem ao processo por acidente em serviço n.º 06.457/77 nos serviços da Região Militar de Lisboa.

  2. Sendo que só em 2016-11-04 é que o Autor requereu Chefe do Estado Maior do Exército a “organização de processo sumário por acidente, a fim de lhe ser atribuído um grau de desvalorização em virtude da diminuição da sua capacidade geral de ganho (…) e ser-lhe atribuída uma pensão de invalidez”, conforme nº 9 dos Factos Provados.

  3. Tendo o referido processo apenas sido remetido à Caixa Geral de Aposentações pelo ofício, com a ref.ª SRP.SR-2019-008355, em 2019-04-03, pela Direção de Administração de Recursos Humanos do Comando do Pessoal do Exército Português, conforme nº 17 dos Factos Provados.

  4. Ora, importa ter presente que o regime legal cuja aplicação foi peticionada pelo Autor, ora Recorrido, e foi reconhecido pela sentença recorrida, encontra-se revogado desde 2000-05-01, pelo nº 2 do artigo 57º do Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de novembro.

  5. Muito embora o regime transitório constante no nº 2 do artigo 56º daquele diploma preveja que “as disposições do Estatuto da Aposentação revogadas ou alteradas mantêm-se em vigor em relação às pensões extraordinárias de aposentação ou reforma, bem como às pensões de invalidez atribuídas ou referentes a factos ocorridos antes da entrada em vigor do presente diploma”, a verdade é que a jurisprudência tem definido consistentemente a existência um prazo de caducidade que importa respeitar.

  6. Com efeito, tal como tem vindo a ser considerado na jurisprudência, o artigo 24º, nº 1, do Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de novembro, estabelece um prazo de caducidade a contar da data da alta para o sinistrado requerer a reabertura do processo de acidente em serviço ou doença profissional – prazo que não existia no domínio da anterior legislação de reparação de acidentes de trabalho e doenças profissionais - pelo que os sinistrados de acidentes de trabalho cuja alta tenha sido atribuída em data anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei nº 503/99, dispunham do prazo de 10 anos contados desde 2000-05-01 para proceder à eventual reabertura do processo de acidente de trabalho ou doença profissional.

  7. Como exemplo dessa jurisprudência, refira-se o Acórdão do STA, proferido no âmbito do recurso de revista n.º 920/12, de 19 de dezembro, e o Acórdão do TCAN, proferido no âmbito do recurso jurisdicional nº 440/08, de 21 de outubro de 2011.

  8. De acordo com a referida orientação, a aplicação do regime transitório – de reparação dos acidentes de acordo com as disposições do Estatuto da Aposentação referentes a factos ocorridos antes da entrada em vigor do Decreto-lei nº 503/99, de 20 de novembro –, cinge-se aos processos cuja revisão ou reabertura tenha sido requerida na entidade empregadora pública até 2010-04-30.

  9. Nessa medida, não há dúvidas o direito reclamado pelo Autor, ora Recorrido, já caducou, uma vez que, na data em que requereu à entidade militar a abertura de um processo por acidente – somente em 2016-11-04 –, tinha já sido ultrapassado o prazo de caducidade previsto no artigo 24º, nº 1, do Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de novembro Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deverá ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e revogada a decisão recorrida, com as legais consequências.

    ** O Recorrido F. apresentou Contra alegações, tendo a final elencado as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES: 1. O presente recurso interposto pela Recorrente visa a revogação da decisão da sentença proferida pelo Tribunal A Quo, condenou a Ré a aceitar e a reapreciar o processo de “reforma por invalidez” do Autor nos termos e para os efeitos previstos no Estatuto da Aposentação “ex vi” n.º 2 do artigo 56.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, designadamente submetendo-o a competente Junta Médica tendente à atribuição de «pensão de invalidez».

  10. Pois, entende a Recorrente que o Tribunal A Quo não interpretou nem aplicou corretamente a lei, ao concluir que não estamos perante uma situação de «recidiva, agravamento ou recaída» e como tal, não considerou o regime de caducidade previsto no n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro.

  11. Segundo toda a prova documental, a mesma desmistifica um quadro clínico de “recidiva, agravamento e recaída” que a ora Recorrente pretende fazer crer a este douto Tribunal.

  12. Ora, o Recorrido foi presente a Junta Hospitalar de Inspecção, no dia 27/06/2018, a qual o considerou “incapaz de todo o serviço militar (…) com uma desvalorização de 15%” e que estabeleceu o nexo de causalidade entre tal incapacidade e o serviço militar por si prestado, o que determina que o ora Recorrido terá direito à requerida pensão de invalidez com base no regime excepcional previsto no n.º 2, do Art.º 56.º do Decreto-Lei n.º 503/99.

  13. Pois, o Recorrido entende que o Decreto-Lei n.º 503/99 não é aplicável ao requerimento de atribuição de desvalorização por doença que apresentou, uma vez que de acordo com a al. b) do n.º 1 do art.º 56.º desse diploma, o mesmo só se aplica às doenças profissionais cujo diagnóstico final se faça após a data da sua entrada em vigor, ou seja, após 1-05-2010.

  14. Assim, a respeito do previsto na al. b) do n.º 1 do art.º 56º do Decreto-Lei n.º 503/99 e de o diagnóstico final se fazer depois da data da entrada em vigor desse diploma, como é o caso, “sempre que nesse exame se determine, a posteriori, que os factos causalmente relevantes que foram condição da doença profissional ocorreram, todos eles, antes do início da vigência da referida lei nova, a situação é enquadrável na previsão excepcional da parte final do nº 2 do mesmo preceito e a pensão relativa à doença profissional deve decidir-se de acordo com as disposições do Estatuto da Aposentação na versão anterior à daquele Decreto-Lei.” 7. É o que se verifica na situação em apreço, porquanto, os factos relevantes que foram condição da doença profissional ocorreram, todos eles, antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 503/99, mais precisamente durante o cumprimento do serviço militar, como recrutado.

  15. Este é também o entendimento adotado no recente acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 13-03-2020, proc. n.º 00841/17.0BEPRT, que se debruçou sobre uma factualidade aproximada àquela em análise.

  16. Desta forma, o pedido não do Recorrido pode ser regido pelo disposto no Decreto-Lei n.º 503/99, sendo-lhe aplicável, nos termos do n.º 2 do art.º 56.º desse diploma, as disposições do Estatuto da Aposentação vigentes até à data da entrada em vigor daquele diploma.

  17. Pelo que, por todos os motivos supra indicados, a Douta Sentença ora recorrida, não é merecedora de qualquer censura, nem se aferindo a mesma violadora de qualquer norma legal, aferindo-se a mesma sensata, ponderada e adequada aos factos discutidos nestes autos.

    Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, deve negar-se inteiramente provimento ao presente recurso e, em consequência, manter-se a Douta Sentença recorrida, com todas as legais consequências.

    Ao julgardes assim, Exmos. Juízes Desembargadores, estareis uma vez mais a fazer a costumada JUSTIÇA! ” *O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos.

    *O Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu parecer sobre o mérito do presente recurso jurisdicional.

    *** Com dispensa dos vistos legais [mas com envio prévio do projecto de Acórdão], cumpre apreciar e decidir.

    ***II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente CGA, IP, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 144.º, n.º 1 do CPTA, e artigos 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º, ambos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigos 1.º e 140.º, n.º 3 do CPTA [sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem deva conhecer oficiosamente], sendo que, de todo o modo, em caso de procedência da pretensão recursiva, o Tribunal ad quem não se...

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