Acórdão nº 0129/19.1BEPDL-S3 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelFONSECA DA PAZ
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: 1.

B…………, S.A., com sede na Av. ………, n.º ……, …..., em Ponta Delgada, intentou acção de contencioso pré-contratual contra a C…………, S.A.

, e em que eram contra-interessadas a A…………, SOCIEDADE UNIPESSOAL, LDA, e a D…………, SOCIEDADE UNIPESSOAL LDA, para impugnação da deliberação, de 28/5/2019, do Conselho de Administração da entidade demandada, que, no âmbito do Lote 7 (Imunologia), adjudicou à contra-interessada “A…………” o concurso público para celebração de contrato de aprovisionamento relativamente ao fornecimento de reagentes e consumíveis, com colocação de equipamentos, às Unidades de Saúde de ilha da Região Autónoma dos Açores.

Após o TAF ter indeferido a produção de prova pericial requerida pela A., esta interpôs recurso desta decisão para o TCA-Sul, o qual, por acórdão de 7/10/2021, concedeu-lhe provimento, determinando a baixa dos autos ao TAF para aí ser proferido despacho a admitir esse meio de prova.

A contra-interessada “A…………” interpôs deste acórdão recurso de revista para este STA, tendo, na respectiva alegação, formulado as seguintes conclusões: ”A.

O presente Recurso de Revista vem interposto do Acórdão proferido pelo TCAS em 07.10.2021, que concedeu provimento ao âmbito do Recurso Jurisdicional interposto pela Autora/Recorrida, do Despacho proferido pelo Tribunal de 1.ª instância em 28.04.2021, através do qual esse Tribunal indeferiu a realização da Prova Pericial requerida pela Autora/Recorrida, tendo ficado demonstrada a necessidade/imperiosidade de admissão do Recurso de Revista, quer em face da relevância jurídica e social da questão, quer para uma melhor aplicação do direito, justificando-se esta última nos erros de julgamento, e na nulidade, em que incorreu o TCAS no Acórdão sob impugnação.

B.

Demonstrou-se relevância jurídica fundamental das questões submetidas a Revista porquanto está em causa a aplicação e concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos: artigo 20.º, da Constituição da República Portuguesa, artigo 388.º, do Código Civil, artigo 476.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, artigo 90.º, n.º 3, do CPTA, assim como está em causa, também, apurar e decidir quanto à susceptibilidade e momento da produção de Prova Pericial em sede de Acções de Contencioso Administrativo onde a Tutela é Urgente, a que acresce a circunstância de estarmos perante questões que suscitam dúvidas sérias quer ao nível da Jurisprudência quer ao nível da Doutrina, uma vez que não se encontra tratada mas urge clarificar, com fundamentos comuns aos do critério da relevância social fundamental.

C.

Quanto à relevância social fundamental, a mesma ficou evidenciada e demonstrada em face da especial capacidade de repercussão no tecido social e expansão do interesse orientador da intervenção do Supremo Tribunal Administrativo relativamente a futuros casos análogos ou apenas do mesmo tipo, mas em que a utilidade da decisão se antevê com condições para ultrapassar os limites do caso concreto e das partes envolvidas no litígio.

D.

Como ficou evidenciado, uma das questões essenciais a dilucidar nesta Revista prende-se com a admissibilidade da realização/produção de Prova Pericial no âmbito de Acções Urgentes de Contencioso Pré-Contratual, em casos em que o Tribunal de 1.ª instância – inteirado e conhecedor do Processo – considera que o apuramento dos factos que relevam para a boa decisão da causa não demanda este concreto meio de prova, uma vez que a prova produzida é suficiente e bastante para concluir pela desnecessidade da Prova Pericial.

E.

Igualmente relevante é a questão de saber se a Prova Pericial em sede de Acções de Contencioso Pré-Contratual não deve estar reservada para situações em que se encontre demonstrado, pelo Autor/Impugnante, que a Decisão sob Impugnação Jurisdicional padece de “erro grave”, “erro grosseiro” e/ou “erro manifesto”, o que não ocorre no caso vertente, conforme se evidenciou de artigos 81.º a 92.º, da Contestação apresentada pela Contra-Interessada aqui Recorrente, os quais, por economia processual, aqui se dão por integralmente reproduzidos e articulados.

F.

Como evidenciado, é sabido que, hoje em dia, as Acções de Contencioso Pré-Contratual constituem o grosso das Acções Administrativas que correm termo junto dos Tribunais Administrativos, razão pela qual, de resto, existam já Juízos de Competência Especializada em Matéria de Contratação Pública (Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa e Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto), para fazerem face ao crescente e permanente aumento da/na instauração destas Espécies de Acção, aos quais compete conhecer de todos os Processos relativos à validade de actos pré-contratuais e interpretação, à validade e execução de contratos administrativos ou de quaisquer outros contratos celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública, por pessoas colectivas de direito público ou outras entidades adjudicantes, e à sua formação, incluindo a efectivação de responsabilidade civil pré-contratual e contratual, e das demais matérias que lhe sejam deferidas por lei.

G.

Estas Acções de Contencioso Pré-Contratual têm, por força da aplicação conjugada dos artigos 3.º, n.º 3, 36.º, n.º 1, alínea c), n.º 2 e n.º 3, 97.º, n.º 1, alínea c), 100.º e seguintes, do CPTA, natureza urgente, no âmbito das quais, como referido pelo artigo 3.º, n.º 3, do CPTA, são assegurados “os meios declarativos urgentes necessários à obtenção da tutela adequada em situações de constrangimento temporal”.

H.

Ora, ainda que essa natureza urgente não afaste a susceptibilidade de recurso aos meios de prova legalmente admissíveis, tal como admitido pelo artigo 90.º, n.º 3, do CPTA – entre os quais se inclui a Prova Pericial –, a verdade é que a produção de Prova Pericial, atenta a sua natureza, introduz nos Processos Urgentes de Contencioso Pré-Contratual, onde existem típicos constrangimentos temporais, uma delonga que pode colocar em causa a tutela urgente associada a esta Espécie de Acção.

I.

A Prova Pericial tem sido sucessivamente invocada em sede de Acções de Contencioso Pré-Contratual – do qual o presente caso é exemplo – e é uma decorrência da reconhecida vastidão, complexidade e especificidade das normas que, hoje, compõem o ordenamento jurídico-administrativo, e a crescente especialização e tecnicidade da vida económico-social contemporânea, razão pela qual, e como já referido supra, foi considerado que a criação de estruturas jurisdicionais especializadas nos Tribunais Administrativos em determinados sectores do direito apresentava inequívocas vantagens do ponto de vista da celeridade processual, da qualidade das decisões e da uniformidade jurisprudencial.

J.

Perante o sobredito – crescente número de Acções de Contencioso Pré-Contratual, aumento da respectiva complexidade e tendência no sentido da convocação da realização/produção de Prova Pericial –, é evidente e manifesto que, in casu, se verifica o pressuposto da relevância social fundamental, já que a questão da admissibilidade da realização/produção de Prova Pericial no âmbito de Acções Urgentes de Contencioso Pré-Contratual, em casos em que o Tribunal de 1.ª instância – inteirado e conhecedor do Processo – considera que o apuramento dos factos que relevam para a boa decisão da causa não demanda este concreto meio de prova, assume essa relevância.

K.

Esta é uma questão que revela especial capacidade de repercussão no tecido social, assim como é uma questão susceptível de se verificar não só em casos do mesmo tipo, como, ainda, em futuros casos análogos, o que evidencia a expansão do interesse orientador da intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo, já que a utilidade da decisão se antevê com condições para ultrapassar os limites do caso concreto e das Partes envolvidas no litígio, permitindo, designadamente, fixar uma orientação para futuros casos, o que trará a necessária clarificação a um domínio tão importante do Contencioso Administrativo, que é o da articulação/conjugação do Direito à Tutela Jurisdicional Efectiva – na vertente do Direito à Prova (Pericial) – e a necessidade de garantir e assegurar que a Tutela Urgente das Acções de Contencioso Pré-Contratual não é frustrada pelo recurso à Prova Pericial quando a mesma não se afigura como necessária ao apuramento dos factos que relevam para a boa decisão da causa.

L.

Em face da demonstração levada a cabo, dúvidas não podem subsistir de que questão em apreço tem susceptibilidade de alcance geral no que respeita ao regime material e processual da Prova Pericial, sendo susceptível de ser recolocada em casos futuros, e cuja dilucidação quanto aos aspectos dubitativos e no contexto apurado carecem também de melhor análise/ponderação por parte deste Supremo Tribunal Administrativo, verificando-se, assim, o pressuposto/requisito da relevância social fundamental, circunstância atestada, de resto, pela ausência de decisão conforme das instâncias quanto à sua necessidade.

M.

Acresce, ademais, que, in casu, se verifica o pressuposto da necessidade de melhor aplicação do direito para efeitos de admissibilidade da Revista, porquanto é não só evidente que a quaestio juris foi tratada pelas instâncias de forma contraditória, já que a Prova Pericial requerida pela Autora foi rejeitada em 1.ª instância, mas admitida pelo Tribunal Central Administrativo Sul – o que desde logo justifica a admissibilidade da Revista para melhor aplicação do direito –, como, ainda, é evidente – e assim se demonstrou – que o Tribunal Central Administrativo Sul incorreu em manifestos Erros de Julgamento – e em nulidade – no Acórdão sob impugnação, os quais exigem a intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo para melhor aplicação do direito, tendo-se, também por esta via, verificado este pressuposto de admissibilidade.

N.

Quanto à Nulidade, a mesma advém da Falta de Fundamentação do Acórdão sob Revista, porquanto são absolutamente inexistentes motivos/fundamentos pelos...

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