Acórdão nº 425/18.5T8ALR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 425/18.5T8ALR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo de Competência Genérica de Almeirim – J1 * I – Relatório: Na presente acção declarativa de condenação proposta por “(…), Tecnologias e Serviços para Economia de Energia, Unipessoal, Lda.” contra “(…) – Rectificação Mecânica de Precisão de (…), Lda.”, a sociedade Autora veio interpor recurso da sentença proferida.

* A sociedade Autora pedia a condenação da Ré no pagamento de € 11.286,40 (onze mil e duzentos e oitenta e seis euros e quarenta cêntimos), acrescidos de juros desde a citação, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes da reparação defeituosa do seu veículo automóvel, por aquela realizada.

* Em seu benefício, a sociedade Autora disse ser proprietária do veículo da marca SAAB, modelo 9.3 2200 TDI, matrícula (…) e ter contratado a Ré para realizar uma reparação especializada de rectificação e que esta, por errada intervenção técnica, deu origem a diversos prejuízos.

* Devidamente citada, a Ré contestou, excepcionou a sua ilegitimidade (a qual foi julgada improcedente na audiência prévia) e a caducidade do direito (cujo conhecimento aí foi relegado para a sentença), como por impugnação, refutando a sua responsabilidade pelos danos alegados pela Autora e pelo pagamento da indemnização peticionada.

* Em sede de audiência prévia foi proferido despacho saneador e foram identificados o objecto do litígio e os temas da prova.

* Realizada a audiência final, o Tribunal a quo decidiu julgar a acção improcedente e, em consequência, absolveu a Ré do pedido.

* A sociedade Autora não se conformou com a referida decisão e as suas alegações continham as seguintes conclusões: «A – Veio o Tribunal afirmar que, apesar de ter sido feita a prova de várias avarias no veículo da Autora, estas não chegam a configurar defeitos atendíveis para efeitos de cumprimento defeituoso da obrigação, por não ter sido demonstrada a existência de nexo de causalidade entre as intervenções da Recorrida no bloco do motor da viatura e as diversas avarias ocorridas na viatura.

B – Foi também dado como provado que após a primeira avaria do motor no veiculo da Autora, este veio a ser intervencionado pela Ré, seguindo-se sucessivas avarias sem que, no entendimento do Tribunal, a Autora tenha demonstrado o nexo de causalidade, pressuposto essencial da existência de defeitos imputáveis à prestadora do serviço, concluindo assim que, não sendo possível apurar a existência de cumprimento defeituoso da obrigação contratual da Ré, não poderia a mesma ser responsabilizada pelos prejuízos invocados pela Autora.

C – A exclusão da responsabilidade da Ré foi feita por se entender que apenas uma perícia técnica poderia confirmar que o encamisamento seria o motivo causador para todas as avarias subsequentes à primeira avaria.

D – Perícia técnica que veio efetivamente a ser solicitada pelo Tribunal a quo e cuja realização se revelou ser impossível pelo facto de o objeto do motor do veículo não mais estar na posse da Recorrente tendo sido – segundo afirma a sentença – desmontados e alienados pela Autora.

E – Na verdade, o bloco, mesmo depois de testado, nunca chegou a ser devolvido à ora recorrente, nem tão pouco os componentes que o integravam o e que não estavam danificados, por forma a, possivelmente, ocultar meio de prova que pudesse responsabilizar a Ré judicialmente.

F – De facto, o objeto do motor do veículo da Recorrente já não estava efetivamente na sua posse, mas tal apenas aconteceu porque a Recorrida assim o quis, porquanto pretendeu ficar com a posse do bloco do motor – tal facto é confirmado pela ausência de qualquer indicação contrária por parte da Recorrida quando foram enunciadas as questões a provar com a perícia (requerimento de 21 de setembro de 2020) e a mesma nada afirmou no sentido de que não estaria na posse do bloco. Aliás, competia-lhe a ela, recorrida, preservar o bloco que não era de sua propriedade, o que manifestamente não fez (vide relatório da perícia ou impossibilidade dela – 16 de fevereiro de 2021) – facto que determina a inversão do ónus da prova (artigo 344.º, n.º 2, do Código Civil).

G – O Tribunal a quo deu como provado o ponto n.º 4 dos factos provados que menciona que “Em 12.06.2017, o veículo da Autora acima identificado sofreu uma avaria que implicou a substituição do turbo”, alegado por lapso na petição inicial, quando na verdade foi o cilindro número 2 que gripou conforme se constata por declaração de parte de (…) e depoimento da testemunha (…).

H – O que verdadeiramente esteve na origem das muito avultadas despesas suportadas pela ora Recorrente foi o procedimento denominado “encamisamento” efetuado no bloco da viatura, “encamisamento” esse que se veio a verificar não ser possível ser efetuado naquele veiculo automóvel propriedade da Recorrente.

I – Deu-se como provado que a testemunha (…), à data dos factos dono da oficina (…), que recomendou à Autora que o motor fosse retificado na oficina da Ré (…) e que nas instalações desta procedeu-se antes ao “encamisamento” – (Factos provados n.º 7 e 9 da sentença); J – A testemunha … (antigo funcionário da Ré) e a …, sócia gerente da Ré, deram a entender que os motivos para as sucessivas avarias se deviam a alterações no turbo da viatura, o que é falso, porquanto o turbo apenas foi substituído aquando da terceira reparação da viatura, segunda ao bloco efetuado pela Ré, e que foi originada pelas limalhas metálicas que ao misturarem-se com o óleo foram desgastando todas as outras peças metálicas levando a danos no próprio turbo, bomba de agua, bomba de óleo.

K – Na verdade, o que levou às sucessivas avarias do bloco do motor foi o “encamisamento” num motor que não poderia ser encamisado, uma vez que a ficha técnica não permite que que os cilindros fossem retificados mais do que 0,50 milímetros, sendo necessário para encamisar, desbastar 3 a 4 milímetros.

L – Nas palavras de (…), sócio gerente da Recorrente, corroboradas pela testemunha (…), a Ré assumiu que suportaria os custos associadas às despesas extraordinárias tidas em virtude da deficiente intervenção ao bloco do motor.

M – Verifica-se à saciedade que o depoimento (…), além de credível, está em consonância com as declarações prestadas pelo sócio gerente da Recorrente, no que ao motivo das sucessivas avarias ocorridas após o encamisamento efetuado pela Ré diz respeito – fissura do bloco originado pelo encamisamento sem observar as especificações de retificação, porquanto, os cilindros apenas podem ser retificados (debastados) no máximo 0,50 milímetros, sendo que a Ré, para introduzir as camisas, retificou (desgastou) muito acima desse valor. O mesmo se pode dizer quanto à assunção da responsabilidade por parte da Ré uma vez que a testemunha (…) e as declarações de parte de (…) demonstram que a (…), na figura da sua sócia gerente, manifestou que estaria na disposição de assumir os prejuízos que a Recorrente teve após as sucessivas intervenções efetuados ao bloco.

N – Não se consegue perceber como foi possível o Tribunal a quo considerar como não provados os seguintes factos, a saber:

  1. Os prejuízos sofridos pela Autora são consequência direta e necessária das reparações efetuadas pela Ré, que o rebentamento interno do bloco; B) O rebentamento interno do bloco do motor ficou a dever-se ao facto de o encamisamento ter sido realizado sem observar as especificações de retificação – já que tais cilindros somente devem ser retificados (desbastados) no máximo 0,50 milímetros, sendo que a Ré (…) para introduzir as novas camisas retificou (desgastou) muito acima desse valor; C) Tendo todas as avarias posteriores ocorrido na sequência desta e como consequência da conduta da Ré, que não cumpriu os procedimentos necessários nas referidas reparações; D) A Ré atuou com negligencia ao não proceder, nomeadamente, à verificação dos limites máximos de retificação permitidos para o bloco específico; E) A Ré não desempenhou com zelo e diligência os serviços para os quais foi contratada pela Autora.

    O – Pela prova enunciada (devidamente identificada supra – e para que se remete – seja quanto a quem depôs ou declarou, seja quanto a passagens objeto de gravação, nos termos previstos no artigo 640.º do Código de Processo Civil) deveria o Tribunal a quo, salvo melhor entendimento, ter dado como provados os factos não provados nas alíneas A), B), C), D) e E), quanto mais não fosse, até pela própria conjugação dos factos dados como provados e pela inversão do ónus da prova. Ou seja, se é dado como provado que o dono da oficina (…), (…), recomendou que levasse o motor para a oficina da Ré (…), a fim de ser retificado, que nas instalações da Ré, procedeu-se, antes, ao denominado “encamisamento” do motor e que pela Ré (…) foi sugerido que a Autora comprasse outro bloco que eles assumiriam essa despesa e fariam a retificação sem mais encamisamentos – o que foi feito (factos provados 7, 9 e 20) não se percebe então como se pode vir afirmar, como o veio fazer o Tribunal a quo, que o encamisamento não deu origem a sucessivas avarias. Isto porque, como parece ser por demais evidente, ninguém viria a assumir um prejuízo nem alterar o serviço que se propôs a fazer inicialmente (do encamisamento para apenas a retificação) se não entendesse ser o responsável por toda aquela panóplia de avarias sucessivas que a Recorrente veio a sofrer.

    P – A fiabilidade da testemunha arrolada pela Ré, (…), é muitíssimo falaciosa, porquanto, a mesma não se encontrava na sala das testemunhas, sendo este local o apropriado por forma a evitar que as testemunhas tenham conhecimento dos depoimentos prestados por outras testemunhas, evitando que a espontaneidade que deve pautar cada depoimento seja colocado irremediavelmente em causa.

    Q – A parte contra a qual for produzida a testemunha pode impugnar a sua admissão com os mesmos fundamentos por que o juiz deve obstar ao depoimento (artigo 514.º do Código de Processo Civil).

    R – Não sendo possível a...

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