Acórdão nº 1137/19.8T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 1137/19.8T8PTM.E1 Acordam na 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório 1. (…) – Mediação Imobiliária, Lda., com sede na Rua do (…), n.º 3, Carvoeiro, instaurou contra Rio (…), Lda., com sede em Apartamentos Turísticos (…), Estrada da (…), Lote 1, em Lagos, (…) e (…), Lda., com sede na Casa (…) – Vale (…), Carvoeiro, (…), viúva, com morada em Apartamentos Turísticos (…), Estrada da (…), Lote 1 – Apartado (…) – em Lagos, por si e em representação de seus filhos menores, (…) e (…), consigo residentes, ação declarativa de processo comum.

Alegou, em resumo, haver celebrado como a ré (…) e (…), Lda., em 23 de junho de 2015, um contrato de mediação imobiliária destinado à venda do bar “(…) Bar”, sito na praia de Lagos, pelo preço de € 1.200.000,00, mediante o pagamento de uma remuneração de 6%.

Entre 25 de março de 2009 e 4 de abril de 2017 e com exceção do período que decorreu entre 10 de novembro de 2016 e 15 de fevereiro de 2017, o capital social da ré (…) e (…), Lda. foi integralmente detido pela ré Rio (…), razão pela qual a transmissão do (…) Bar teria que ocorrer por via da cessão das quotas representativas do capital social da ré (…) e (…), Lda., integralmente detidas pela ré Rio (…).

A A. identificou alguns interessados na compra, entre eles, (…), o qual, em 24 de fevereiro de 2017, veio a celebrar com a ré Rio (…), na qualidade de única sócia da ré (…) e (…), Lda., um contrato-promessa mediante o qual esta prometeu ceder ao primeiro, ou a duas sociedades que por este viessem a ser indicadas, a totalidade do capital social da ré (…) e (…), Lda., pelo valor de € 800.000,00, deduzido de dívidas e quantias ainda por apurar.

O contrato definitivo da cessão de quotas foi realizado em 31 de março de 2017 e não foi pago à A. a remuneração acordada, reduzida para 5,5% na sequência de negociações havidas com (…), sócio e gerente da ré Rio (…).

A ré Rio (…), apesar de não figurar como parte no contrato de mediação, é responsável pelo pagamento da remuneração, uma vez que sempre solicitou de forma ativa a intervenção da A. na venda das quotas que detinha no capital social da ré (…) e (…), Lda., reconheceu a responsabilidade pelo pagamento da remuneração e o negócio resultou em seu benefício.

A ré (…), por si e enquanto herdeira de (…), e os réus (…) e (…), enquanto herdeiros de (…), são responsáveis pelo pagamento da remuneração da A., por força das obrigações que a primeira e (…), assumiram no contrato-promessa celebrado entre (…) e a ré Rio (…), ao garantirem pessoalmente todas as obrigações assumidas pela promitente cedente.

Concluiu pedindo a condenação solidária dos Réus no pagamento da quantia de € 54.120,00, acrescido de juros vencidos e vincendo, calculados à taxa comercial, aqueles no montante de € 9.394,59.

Contestou a ré (…) e (…), Lda., argumentando, em resumo, que o contrato de mediação celebrado com a Autora foi desenhado e concebido tendo em vista o trespasse do estabelecimento de restauração (…) Bar e que o negócio realizado não teve estes contornos uma vez que comportou um contrato de cessão de quotas mediante o qual a ré Rio (…), Lda., detentora da totalidade do capital da ré (…) e (…), Lda., cedeu a integralidade deste capital social a duas sociedades – (…) Participações, SGPS, Lda. e (…) Participações – SGPS, Lda. – indicadas por (…), identificado pela Autora como interessado na compra.

Assim e não obstante a ré (…) e (…), Lda. constar como segunda outorgante no contrato de mediação, a cessão de quotas teve como exclusiva beneficiária a ré Rio (…), o que revela que o objeto do negócio de mediação se alterou por forma a que a ré (…) e (…), Lda. passou a ser o seu objeto e deixou de ser seu sujeito, não podendo ser responsabilizada pelo pagamento de uma remuneração devida pela realização de um negócio cujo ganho se gerou num terceiro.

Aliás, ficou expressamente acordado, tanto no contrato-promessa, como no contrato definitivo de cessão de quotas, que todas e quaisquer dívidas, taxas, contribuições e despesas devidas a terceiros pela (…) e (…), Lda., até à data da outorga definitiva de cessão de quotas, seriam da responsabilidade da cedente Rio (…), razão pela qual a responsabilidade pelo pagamento da remuneração reclamada pela A. sempre seria da responsabilidade desta e da sua sócia gerente, (…), que prestou garantia pessoal pelo cumprimento de todas as obrigações assumidas pela cedente.

Concluiu pela improcedência da ação na parte que lhe respeita.

Contestaram as rés Rio (…), Lda. e (…), esta por si e em representação dos seus filhos menores, (…) e (…) defendendo, em resumo, que a Autora celebrou o contrato de mediação sabendo que a sociedade (…) e (…), Lda., nunca poderia vender, permutar, arrendar ou trespassar o (…) Bar – (…), porquanto instalado numa construção em madeira edificada ao abrigo de um contrato de concessão de utilização do domínio público hídrico para implantação e exploração de apoio de praia e, assim, insuscetível de alienação, que o objeto do contrato realizado, a cessão das quotas da sociedade (…) e (…), Lda., integralmente detidas pela ré Rio (…), se mostra excluído do âmbito da atividade de mediação imobiliária, não sendo devida à Autora a remuneração peticionada, que os réus (…), (…) e (…), nada devem à Autora, uma vez que nem a primeira, nem o seu falecido marido (…), pai dos últimos, intervieram no contrato de mediação, nem assumiram, por qualquer forma, qualquer responsabilidade perante a Autora e que, para o caso de se entender que a Autora terá direito a remuneração por ter apresentado à ré Rio (…) o adquirente das quotas, tal remuneração deverá ser limitada a 5,5% sobre a quantia de € 348.992,60 por corresponder ao valor efetivamente recebido pela cessão de quotas.

Concluíram pela absolvição do pedido no que respeita aos réus (…), (…) e (…) e pela procedência parcial da ação relativamente à ré Rio (…) por forma a que a remuneração da Autora incida sobre a quantia de € 348.992,60.

A Autora respondeu por forma a defender a improcedência da defesa das Rés na parte em que estas a qualificaram como defesa por exceção.

  1. Foi proferido despacho saneador, identificado o objeto do litígio e enunciados os temas da prova.

    Teve lugar a audiência de discussão e julgamento e depois foi proferida sentença em cujo dispositivo designadamente se consignou: “(…) decide-se, julgando procedente a ação, condenar solidariamente os Réus Rio (…), Lda., (…) e (…), Lda., (…), (…) e (…), no pagamento à Autora da quantia pecuniária de € 54.120,00 (cinquenta e quatro mil, cento e vinte euros), acrescida de juros de mora comerciais, vencidos, no valor de € 9.394,59 (nove mil, trezentos e noventa e quatro euros e cinquenta e nove cêntimos) e vincendos até efetivo e integral pagamento à demandante.” 3. As Rés recorrem da sentença concluindo, assim, as motivações dos recursos: - a ré (…) e (…), Lda.: “I - A atividade de mediação imobiliária reporta-se à intermediação, angariação e facilitação de negócios sobre bens imóveis, ou relativamente a bens imóveis e não a transmissões de participações sociais; II - Tal é mais evidente quando se trata de estabelecimento comercial detido por sociedade concessionária de bens do domínio público e é o capital social da sociedade o objeto do negócio; III - No presente caso, nunca poderia o contrato outorgado entre a Recorrente e a Recorrida ser a fonte de comissão devida, porque apesar de tal contrato prever a possibilidade de cessão de quotas, esta não pode ser objeto da atividade de mediação imobiliária; IV - Sem prescindir, ainda que tal fosse admissível, nenhum negócio foi outorgado pela Recorrente, e o contrato que teve as suas participações sociais como objeto não foi outorgado nos termos previstos no contrato de mediação, não só porque ela não interveio, mas igualmente porque o preço não foi o previsto no contrato; V - O contrato de mediação previa o dever de pagamento por um preço de € 1.200.000,00, o preço do contrato outorgado foi de € 800.000,00, não se prevendo ali que existisse obrigação de pagamento da comissão com preço diverso do previsto; VI - A sociedade Recorrente, para além de não ter tido intervenção no negócio que teve por objeto a cessão das suas participações sociais (quota detida pela sociedade Rio …, Lda.), também não teve nenhum interesse particular, além da injeção que a sua sócia fez dos valores necessários aos pagamentos das dívidas apuradas; VII - Mas nem a Recorrente estava insolvente e tais pagamentos eram necessários para a retirar dessa situação, nem tais pagamentos foram mais que o cumprimento do dever da sócia em injetar na sua participada, os fundos necessários a solver as suas obrigações; VIII - Os fundos entraram na Recorrente, mas não sob a forma de pagamento de dívidas desta por terceiro, porque se o fosse, então tal parte teria que ser excluída do preço da cessão, e como tal, também teria que ser excluído do valor da comissão; IX - Uma coisa é ter sido conveniente para a Recorrente a injeção dos valores necessários à solvabilidade das dívidas pendentes ter ocorrido, outra é isso representar algum “mais” em relação à sua situação e aos deveres da sua sócia para com ela; X - Tivesse a sócia obtido os capitais necessários a ser injetados por qualquer outra forma, ou qualquer outro negócio, e também a Recorrente seria responsável pelos custos ou consequências decorrentes desse negócio, só porque o mesmo se destinava a obter liquidez para cumprir os deveres de sócia para consigo? Certamente que não, porque tal extravasa a individualidade da sociedade em relação aos seus sócios e a limitação dos poderes e deveres da sociedade para que confusão de patrimónios, direitos ou deveres não exista com os seus sócios.

    XI - A douta sentença reconhece um negócio de mediação entre a Ré Rio (…), Lda. e a Recorrida, ainda que nulo por falta de forma, mas inoponível essa nulidade sob pena de abuso de direito, nos pressupostos do Meritíssimo Juiz a quo, percebe-se a lógica e o raciocínio, mas então a...

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