Acórdão nº 9317/18.7T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Janeiro de 2022
Magistrado Responsável | MARIA JOÃO VAZ TOMÉ |
Data da Resolução | 18 de Janeiro de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, I - Relatório 1. O Novo Banco, S.A.
(doravante NB), intentou, a 21 de abril de 2018, ação executiva contra AA e BB, com base numa livrança datada de 19 de julho de 2005, vencida a 16 de fevereiro de 2018, no montante de € 1.036.087,79.
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Por despacho de 23 de julho de 2018, foi admitida a prestação de caução pela Executada/Embargante, BB, mediante garantia bancária no valor de € 1.305.589,22, ficando as custas a cargo da Requerente/Executada.
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Também por despacho foi a referida caução julgada validamente prestada.
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No decurso da ação executiva, e na sequência do despacho proferido a 7 de outubro de 2019, foi reconhecida a habilitação da Ares Lusitani – STC, S.A.
(doravante AL), mediante cessão do crédito do NB.
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A 6 de maio de 2020, a AL desistiu do pedido executivo.
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A Senhora Agente de Execução, CC, a 7 de maio de 2020, apresentou o apuramento de responsabilidades/nota discriminativa, indicando ser-lhe devido o total de € 52.813,17, em que o montante de € 42.673,06 dizia respeito a valor recuperado ou garantido antes da 1.ª penhora.
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Por despacho de 11 de maio de 2020, foi decidido o seguinte: “Por apenso à respetiva execução, veio a aqui executada deduzir os presentes embargos.
Sucede que, entretanto, após a sentença proferida nestes embargos, como se retira dos autos, a exequente veio desistir da execução e do pedido executivo, o que é válido e relevante, estando já na fase de extinção a execução, como foi pedido/acordado pelas partes.
No caso vertente, aquando da junção da desistência do pedido executivo, a sentença aqui já proferida ainda não tinha transitado em julgado, pelo que é considerar tal desistência ainda tempestiva e eficaz.
Conclui-se, pois, que se tornou inútil/impossível a continuação dos presentes autos, dado já não subsistir o litígio e a instância sobre os quais versavam os embargos, impondo-se a sua extinção.
Pelo exposto, ao abrigo do preceituado no art.º 277.º, al. e), do CPC, declaro extinta a presente instância de embargos de executado por inutilidade/impossibilidade superveniente da lide.
Atenta a desistência do pedido executivo e o acordo das partes, por impossibilidade/inutilidade/desistência, julgo ainda prejudicada e extinta a instância de recurso aqui pendente.
Custas pela embargada/exequente e como acordado - cfr. os arts. 536.º, n.º 3, e 537.º, n.ºs 1 e 2, do CPC.
Notifique e registe.
Comunique de imediato à Sra. AE.
Oportunamente, arquive estes autos, dando-se a devida baixa.
DN.
” 8.
A Executada, BB, apresentou, entretanto, o seguinte requerimento: “BB nos autos de prestação de caução, à margem referenciados, em que é requerido Novo Banco, S.A., vem, em face do requerimento de desistência do pedido com referência nº. ..., apresentado pela Exequente nos autos principais, e do requerimento com a referência nº. ..., apresentado pelas partes no apenso de Embargos de Executado, requerer a V. Exa. se digne a ordenar a imediata devolução do original da garantia bancária nº. ..., prestada a favor do tribunal”.
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A 12 de maio de 2020, a Senhora Agente de Execução, CC, informou do seguinte: “CC, Agente de Execução nos presentes autos tendo sido notificada do douto despacho de 11-05-2020, nos autos do apenso de Caução, Proc. nº 9317/18...., referência ... vem, junto de Vª. Exa. informar que, as custas ainda não se mostram pagas.
” 10.
A Executada, BB, a 13 de maio de 2020, reclamou da nota de honorários e despesas apresentada pela Senhora Agente de Execução, invocando o disposto no art. 50.º, n.º 5, al. a), da Portaria nº. 282/2013, de 29 de agosto (n.º 6.º), o seu preâmbulo (n.º 9.º), assim como jurisprudência do Tribunal da Relação do Porto (n.
os 12.º, 15.º e 20.º).
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A Senhora Agente de Execução respondeu à reclamação.
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A 3 de junho de 2020, o Tribunal de 1.ª Instância decidiu o seguinte: “Pelo exposto, por ilegitimidade e por falta de fundamento, indefiro o requerimento de reclamação da conta/nota discriminativa.” 13.
Não conformada, a Executada interpôs recurso de apelação, pugnando pela revogação e substituição dessa decisão por outra que “declare a inexistência do direito da Senhora Agente de Execução ao recebimento dos montantes por si peticionados a título de remuneração adicional e, em consequência, ordene a retificação da nota de honorários e despesas apresentadas”.
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A Senhora Agente de Execução apresentou contra-alegações.
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Por acórdão, a 16 de dezembro de 2020, o Tribunal da Relação ... decidiu o seguinte: “Nos termos e fundamentos expostos, concede-se provimento ao recurso interposto pela Executada BB e, em consequência, revoga-se a decisão recorrida de modo que os honorários da Agente de Execução não integrem a remuneração adicional que foi impugnada recursivamente.
Custas deste recurso a cargo da Senhora Agente de Execução.
Notifique”.
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Inconformada, a Senhora Agente de Execução, CC, interpôs recurso de revista, apresentando as seguintes Conclusões: “1. A remuneração do agente de execução encontra-se presentemente regulamentada na Portaria n.º 282/2013, de 29 de Agosto.
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Nos termos do n.º 5 do artigo 50.º do referido diploma, nos processos executivos para pagamento de quantia certa, no termo do processo é devida ao agente de execução uma remuneração adicional, que varia em função: a) do valor recuperado ou garantido; b) do momento processual em que o montante foi recuperado ou garantido; c) da existência, ou não, de garantia real sobre os bens penhorados ou a penhorar.
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O n.º 6 estabelece, por sua vez, que para este efeito se entende por “valor garantido” o valor dos bens penhorados ou da caução prestada pelo executado, ou por terceiro ao exequente.
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Por fim, o n.º 12 estatui que nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que haja lugar a citação prévia, se o executado efetuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução não há lugar ao pagamento de remuneração adicional.
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Note-se que o legislador estabeleceu expressamente uma única situação em que não há lugar ao pagamento da remuneração adicional ao Agente de Execução, que é a estatuída no parágrafo anterior.
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A questão que se coloca nos autos consiste em saber se esta remuneração adicional apenas é devida quando a recuperação da quantia tenha tido lugar na sequência de diligências promovidas pelo agente de execução e não é devida quando a dívida seja satisfeita ou garantida de modo voluntário, sem a intermediação do agente de execução.
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O Tribunal da Relação ... julgou procedente o recurso da executada negando o direito da Agente de Execução à retribuição adicional.
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No entanto afigura-se que mal andou o tribunal a quo.
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A nosso ver, resulta da redação do artigo 50.º da Portaria que desde que haja produto recuperado ou garantido a remuneração adicional é sempre devida, exceto numa situação, a de nos processos executivos para pagamento de quantia certa em que há lugar à citação prévia do executado este efetuar o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução (n.º 12).
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O critério da constituição do direito à remuneração adicional é a obtenção de sucesso nas diligências executivas, sucesso que nos termos do n.º 6 ocorre com a prestação de caução para garantia da quantia exequenda.
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Ou seja, afigura-se que a constituição do direito à retribuição adicional da Agente de Execução ocorreu aquando da prestação de caução para garantia da quantia exequenda.
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O legislador apenas excluiu a remuneração adicional nos casos em que a citação antecede a realização as penhoras e o executado efetua o pagamento integral da quantia em dívida até ao termo do prazo para se opor à execução.
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Em todas as demais situações em que haja valor recuperado ou garantido, a remuneração adicional é devida, ainda que a extinção da execução decorra de ato individual do devedor (pagamento voluntário), de ato conjunto de credor e devedor (acordo de pagamento) ou mesmo de um acto do próprio credor (desistência da execução, cf. n.º 2 do artigo 50.º).
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É esse, cremos, o sentido do que se fez constar na exposição de motivos da Portaria.
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Neste sentido veja-se a título de exemplo o Acórdão da Relação do Porto de 11.01.2007, relatado por Amaral Ferreira, o Acórdão da Relação do Porto de 11.01.2018 em que é Relator Paulo Dias da Silva e o Acórdão da Relação do Porto de 02.06.2016, em que é Relator Aristides Rodrigues de Almeida, todos disponíveis in www.dgsi.pt.
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Descendo ao caso dos autos vejamos, o Exequente instaura a competente ação executiva ordinária, com citação prévia, 17. A Executada, após a citação prévia deduz os seus Embargos de Executado, e de forma a suspender a Execução, evitando que a Agente de execução procedesse às competentes penhoras, presta caução à ordem do processo, onde inclui na quantia exequenda as despesas e honorários prováveis.
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Sendo que, depois de julgados totalmente improcedentes os Embargos de Executado, e estando a quantia exequenda totalmente garantida pela caução prestada, ou seja, nada impedindo que a Exequente obtivesse o pagamento total nos autos, vem a Exequente desistir da execução.
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E, socorrendo-se do argumento de se tratar de uma desistência e não de uma recuperação, vem a Executada insurgir-se contra a retribuição adicional da Agente de Execução, em manifesto abuso de direito! 20. Quando prestou caução a Executada incluiu o valor em crise no cálculo.
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Os Embargos de Exequente foram julgados totalmente improcedentes, em consequência a Exequente tinha garantido o recebimento da quantia exequenda, pelo produto daquela garantia. E, correlativamente, nessa situação seria inquestionável o direito da Agente de Execução à retribuição adicional.
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A Exequente desistiu sem receber? Não se afigura credível a um homem médio. Aliás, a Exequente, devedora única das custas e despesas e honorários da Agente de Execução, nem reclamou da conta apresentada pela Agente de Execução.
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O único interveniente que se viu prejudicada foi a Agente de Execução...
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