Acórdão nº 02857/12.3BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA RUSSO
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO 1. Relatório 1.1.

“Lipor - Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto”, notificada do Acórdão desta Secção do Contencioso Tributário proferido nos presentes autos a 10 de Novembro de 2021, veio arguir a sua nulidade.

1.3.

A Recorrente, ora Requerida, optou por não se pronunciar.

1.4.

O Excelentíssimo Procurador-Geral-Adjunto neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de indeferimento da arguida nulidade.

1.5.

Cumpre, agora, decidir, o que fazemos com dispensa de vistos, atenta a simplicidade das questões a dirimir.

2 - Objecto da arguição de nulidade 2.1.

Conforme resulta do requerimento apresentado, para a Recorrente, em síntese nossa, «a decisão em apreço carece em absoluto de fundamentação de facto, porquanto simplesmente não se compreende qual a atividade exercida pela Recorrente que deve qualificar-se como uma atividade comercial», sendo que do «acórdão pura e simplesmente não constam fundamentos – de facto ou de direito – suscetíveis de sustentara conclusão de que a Recorrente exerce uma atividade comercial», concluindo, por isso, que o acórdão é nulo por violação do preceituado nas alíneas b) e c) do artigo 615.º do Código de Processo Civil (CPC).

2.2.

Neste contexto, importa desde já sublinhar que no acórdão que ora se aprecia ficou claramente delimitada a pretensão da Recorrente e o objecto do recurso.

2.3.

Na verdade, aí se deixou expresso «Precisando o quadro em que a Recorrente suporta a sua pretensão, podemos desde já adiantar que a Recorrente, pelo menos em recurso, não discute que não lhe é aplicável, nem enquanto sujeito, nem enquanto associação de municípios e tendo em conta a actividade que desenvolve, a isenção prevista na alínea a) do artigo 9.º do CIRC. Ou seja, a Recorrente aceita que às associações de municípios, como é o seu caso, não se aplica a isenção prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 9.º do CIRC, que, no capítulo dedicado à definição das isenções, prevê que estão isentos de IRC «O Estado, as Regiões Autónomas e as autarquias locais, bem como qualquer dos seus serviços, estabelecimentos e organismos, ainda que personalizados, compreendidos os institutos públicos, com exceção das entidades públicas com natureza empresarial» (ponto 3.2.5.).

2.4.

Tal como ficou explicito que «Com o que a Recorrente verdadeiramente se não conforma é com o julgamento no que concerne à inaplicabilidade, no caso, da isenção prevista na alínea b) do mesmo n.º 1 do artigo 9.º do CIRC - que dispõe que não beneficiam de isenção «As associações e federações de municípios e as associações de freguesia que não exerçam actividades comerciais, industriais ou agrícolas» - uma vez que, segundo o critério da destinação essencial da sua actividade, só pode concluir-se que não exerce a título principal actividade comercial ou industrial. E, assim sendo, está legalmente justificada a sua pretensão de que os resultados emergentes dessa actividade não sejam objecto de tributação, precisamente por dela estarem isentos ao abrigo do citado artigo 9.º, n.º 1 alínea b) do CIRC.» (ponto 3.2.6.).

2.5.

E, por fim, que o objecto do recurso se traduzia na questão de saber «se na sentença se incorreu em erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação do disposto no artigo 9.º, alínea b) do CIRC. Mais concretamente, se o Tribunal a quo, ao decidir que a Recorrente não beneficia da isenção de IRC no que respeita à sua actividade de natureza comercial errou na interpretação e aplicação do citado preceito legal» (ponto 2.2.) 2.6.

Significa, pois, que não obstante no acórdão ter sido realizado um amplo enquadramento jurídico do artigo 9.º do CIRC, o que nele se decidiu foi o que devia ser conhecido, isto é, a questão da subsunção dos factos ao disposto na alínea b) do artigo 9.º do CIRC, carecendo de fundamentação legal, por esta razão, a arguição de nulidade do acórdão por falta de fundamentação no que respeita a uma eventual subsunção do caso à alínea a) do referido normativo, e de sentido a invocação, nesta sede, de quaisquer depoimentos que terão sido produzidos em 1ª instância, que, diz-nos agora a Requerida, deviam ter conduzido ao apuramento de acrescida ou distinta factualidade.

2.7.

Regista-se ainda que, não obstante a Requerente tenha dirigido, pelo menos de forma explicita, toda a sua alegação para a previsão contida na referida alínea b) - terminando, de resto, a sua arguição, defendendo que «o Acórdão é nulo por falta de fundamentação nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º, ex vi do artigo 666.º do CPC ex vi da alínea e) do artigo 2 do CPPT») - considerando que no intróito do seu articulado invoca expressamente que o acórdão padece das nulidade prevista nas alíneas b) e c), do artigo 615.º do CPC, este Tribunal, privilegiando uma interpretação o mais abrangente possível do articulado em causa, procederá à apreciação do requerimento de arguição sob apreço incluindo as duas previsões normativas.

  1. Fundamentação de direito 3.1. Da nulidade do acórdão por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão: alínea b) do artigo 615.º do CPC.

    3.1.1.

    Como, de forma uniforme e reiterada vem sendo afirmado por este Supremo Tribunal Administrativo, a falta de fundamentação prevista como nulidade na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC apenas ocorre quando a fundamentação seja absolutamente inexistente e já não quando a fundamentação seja incorrecta ou meramente deficiente ou insuficiente (cfr. a título meramente exemplificativo e como sinal da constante jurisprudência neste sentido ao longo dos anos, os acórdãos desta Secção e Tribunal de 28-1-2009, de 28-10-20220 e de 5-2-2014, proferidos, respectivamente, nos processos n.ºs 667/08, 365/18.8BEVIS e 1846/13).

    3.1.2.

    É também este, de resto, o sentido que a doutrina atribuiu desde sempre à referida expressão legal, citando-se, por todos, e ainda com indiscutível actualidade, o que já ensinava Alberto dos Reis: «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade» (Código de Processo Civil Anotado, volume V, pág. 140. No mesmo sentido, agora numa aplicação directa às nulidades em processo tributário, pode consultar-se Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, II volume, anotações 7 e 8 ao artigo 125.º, págs. 357 a 360.).

    3.1.3.

    Aplicando o quadro legal, doutrinal e jurisprudencial ao caso, parece-nos evidente, 9independentemente de a Recorrente dissentir da solução nele firmada, que o acórdão não padece da nulidade ora em apreço.

    3.1.4.

    Na verdade, como já dissemos, a única questão colocada à nossa apreciação neste recurso...

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