Acórdão nº 00330/17.2BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Janeiro de 2022
Magistrado Responsável | H |
Data da Resolução | 14 de Janeiro de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: R.
Recorrido: Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, IP (IFAP) Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, que julgou improcedente a acção administrativa impugnatória da decisão do Presidente do Conselho Directivo do IFAP, que determinou a modificação unilateral do contrato de financiamento n.º 02022188/0 e a devolução da quantia de € 16.297,65 € (referente a 10% do total do investimento, a título de majoração por criação/manutenção de posto de trabalho), considerada como indevidamente recebida pelo Autor.
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, do seguinte teor: “
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O Tribunal a quo não necessitou de produzir prova antes de conhecer do mérito da ação, sendo que dos factos dados como provados não resultam como provados factos indicados na p.i. e que são essenciais para conhecer do mérito.
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Com efeito, na p.i. era invocado expressamente no artigo n.º 10: Na candidatura apresentada pelo Autor é absolutamente explícito quem iria ocupar o posto de trabalho que era proposto criar, conforme consta no quadro 3.10 (Postos de trabalho): “O quadro de recursos humanos da Casa da (...) será constituído por 1 pessoa, o promotor R. que assumirá um papel polivalente dentro da empresa, assegurando o bem-estar dos hóspedes e qualidade dos serviços prestados, as funções de gestão e contacto com os clientes, sendo que o seu envolvimento na atividade a tempo completo (1760 horas/ano).” C) A sentença é omissa quanto a este facto, assim como o é quanto ao cumprimento desse mesmo aspeto contratual.
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Assim, ao abrigo do disposto no artigo 662º, n.º 1, do CPC, deve acrescentar-se os seguintes factos essenciais: a. Artigo 10º da p.i.; b. O autor cumpriu esse aspeto contratual.
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Estes aspetos resultam expressamente do projeto apresentado, não sendo contestados pela entidade administrativa.
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De qualquer modo, se V.as Ex.as entenderem que os elementos de prova são insuficientes para dar como provados os dois factos referidos, sempre a sentença deve ser revogada de modo a que sejam definidos os correspondentes temas da prova e se possa produzir a correspondente prova.
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A candidatura apresentada no âmbito do PRODER, nos termos suprarreferidos, os quais contemplavam a criação do posto de trabalho do próprio empresário ou proponente, foi aprovada e validada pelas entidades competentes, designadamente pelo Réu IFAP, IP.
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E foi integral e escrupulosamente cumprida pelo Autor, também na vertente respeitante à majoração da ajuda concedida, ou seja, na vertente da criação do aludido posto de trabalho.
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O contrato de concessão de incentivos prevê, tal como o regulamento específico desta medida, que o promotor execute a operação nos termos da candidatura aprovada, o que foi feito pelo Autor.
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No decurso da execução do contrato de concessão, foram previamente verificados e validados pelo Grupo de Ação Local (GAL) os requisitos necessários ao deferimento dos pagamentos, nunca tendo sido levantada ao Autor qualquer objeção por a criação do posto de trabalho contemplada na candidatura ser o de si próprio.
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O próprio Réu reconhece que foi criado o posto de trabalho do Autor, no entanto passou a entender que só uma “relação de trabalho com uma entidade subordinada” é que preenche os requisitos para demonstrar a criação/ocupação líquida de um posto de trabalho.
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A própria sentença incorpora nos factos provados o entendimento expresso pelo IFAP na sua página internet.
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O que a sentença não faz constar, e que não deixaria de ser relevante, é quando o IFAP fez constar essa informação, por quem, em que circunstância e, sobretudo, quando a comunica ao autor.
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A sentença ignora o aspeto central do contrato e do projeto aprovado: o réu aprovou um projeto em que o autor se propunha criar o seu próprio emprego.
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Fruto de uma alteração interpretativa, o réu pretende, agora, dar o dito pelo não dito.
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A sentença, refere, acriticamente seguindo o réu a existência de um incumprimento contratual, mas não concretiza qualquer incumprimento contratual: não há nenhuma cláusula contratual ou qualquer aspeto do projeto apresentado que não tenha sido cumprida.
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O que existe é uma alteração da interpretação feita pela entidade administrativa: aprovou um projeto nos moldes apresentados (criação do próprio emprego) – nada disse nem nada objetou, porque entendia, na altura, que o projeto estava de acordo com a legalidade e as normas regulamentares e técnicas e agora pretende reaver dinheiro que se comprometeu a pagar ao autor porque entende, agora, a criação de emprego de outro modo.
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Por se discordar do entendimento do Réu porquanto tendo sido criado um novo posto de trabalho, anteriormente inexistente, in casu o do Autor, conforme vertido na candidatura aprovada, é devida a majoração que foi atribuída, foi intentada a competente ação judicial.
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Outrossim, ao Autor não poderia ser imputada uma alteração de entendimento por parte dos serviços para, vários anos após a execução do projeto, em termos materiais e financeiros, ser determinada unilateralmente uma modificação do contrato e exigida a devolução do montante de 16 297,65 € que, em devido tempo, foi atribuído ao Autor.
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Como é normal e razoável, tivesse o Réu rejeitado o projeto ou referido que a majoração não lhe seria atribuída para a criação do próprio emprego e o autor teria tido a oportunidade de reformular o projeto, ou até desistir do mesmo.
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O que não pode admitir-se, à luz dos princípios da boa-fé e da confiança, é que uma entidade administrativa aprove um projeto, celebre um contrato e depois venha solicitar o reembolso de montantes, não com base no acordo celebrado, mas numa alteração da interpretação de um conceito técnico – normativo.
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Tivesse o Autor, logo desde o início do projeto, contratado uma pessoa e estaria a ser acusado de incumprimento contratual por violação do projeto (quadro 3.10 relativo ao posto de trabalho).
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Como não contratou e assegurou o cumprimento escrupuloso do projeto, está a ser acusado de não ter criado um posto de trabalho.
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Assim a sentença ao sufragar a posição do réu permite a violação dos princípios da boa-fé e da confiança.
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A criação do posto de trabalho do próprio promotor do investimento permitiu que durante o tempo em que a Casa da (...) funcionou sem a admissão da trabalhadora subordinada funcionasse e fosse desenvolvido todo o trabalho inerente ao alojamento (limpeza, check-in e check-out de hóspedes…) Z) Não obstante o expendido, quando informalmente foi dado a conhecer ao Autor a possibilidade de alteração de opinião do IFAP relativamente ao apoio concedido pela criação do posto de trabalho, o Autor admitiu uma funcionária a tempo inteiro, com a qual celebrou um contrato de trabalho, em 15 de Julho de 2016, conforme doc. 4 junto com a p.i., funcionária que, desde então, permanece ao serviço do Autor (docs. 5 e 6 -primeiro e último recibos de vencimento).
A
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Aliás, a criação do posto de trabalho da funcionária é a prova mais cristalina da boa-fé e da colaboração do autor: o autor, apesar de saber que não era isso que tinham contratado, dispôs-se a ir ao encontro da invocação que a entidade administrativa lhe fez chegar pela primeira vez, vários anos após a aprovação do projeto e a celebração do contrato.
BB) Com efeito, não se pode sufragar o entendimento do Réu porquanto este aprovou a candidatura com um lapso, não tendo à priori detetado tal irregularidade e, posteriormente, quando a detetou, não permitiu ao Autor corrigi-lo, violando os princípios da confiança, justiça, transparência, boa-fé e...
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