Acórdão nº 53/19.8PAABT.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA MARGARIDA BACELAR
Data da Resolução25 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: No Tribunal Judicial da Comarca de ZU - Juízo Local Criminal de TI, mediante acusação do Ministério Público, foi julgado em processo comum, perante o tribunal singular, com documentação das declarações oralmente prestadas em audiência, e no que ora releva, o Arguido a seguir identificado: LA, filho de …, residente …..

A final, foi decidido julgar a acusação improcedente e, em consequência:

  1. Absolver o arguido LA da prática, em co- autoria material e na forma consumada, de um crime de furto simples, p. e p. pelo artigo 203°, n.º 1, do Código Penal, que lhe era imputado. Inconformado, o Ministério Público, interpôs recurso da referida decisão, formulando as seguintes conclusões: “1. O Ministério Público deduziu acusação contra os arguidos LA e CO imputando-lhe a prática, em coautoria material e na forma consumada, de um crime de furto, previsto e punido pelo artigo 203.º, n. º1 do Código Penal.

    1. Por sentença proferida nos presentes autos, no dia …, o Tribunal a quo, julgou improcedente a aludida acusação pública e absolveu os arguidos da prática do crime que lhes foi imputado, considerando que apenas resultou provado que na data, hora e local indicados na acusação os arguido eram os únicos hospedes da Pousada, que se dirigiram à receção para comprar pastilhas elásticas pagando as mesmas com uma nota de 10 euros, e que para efetuar o troco a funcionária teve que abrir o cofre onde detinha o dinheiro de caixa, procedimento que os arguidos assistiram.

    2. Relativamente à absolvição da arguida CO, nenhum reparo nos merece a Douta Sentença, por inexistência de qualquer prova da prática dos factos pela mesma.

    3. Mas, não se pode concordar com tal decisão relativamente ao arguido LA, uma vez que das declarações das testemunhas RU e EP, conjugados com a prova documental, nomeadamente com o auto de apreensão, os aditamentos de fls. 57 e 62, o termo de entrega de fls. 63, resulta inequivocamente, ter sido o arguido LA a praticar o crime dos autos.

    4. Foi a testemunha EP quem localizou e intercetou o arguido LA no dia da ocorrência dos factos, e após este lhe ter admitido a autoria dos factos, indicado a localização dos objetos furtados e se terem dirigido ao local, procedeu à recuperação e restituição da carteira e dos cartões pertencentes à ofendida RU.

    5. Tal resulta expressamente dos aditamentos de fls. 57 e 62 e do termo de entrega de fls. 63, com os quais foi a testemunha confrontada em sede de audiência, reiterando o seu conteúdo com as declarações ali prestadas.

    6. Não obstante, o Tribunal a quo desvalorizou o seu testemunho com base no facto de que a confissão prestada pelo arguido em inquérito não pode ser valorada fora dos casos legalmente previstos, e que o arguido LA apenas foi ouvido em inquérito um mês depois da ocorrência dos factos e por uma agente da PSP diferente.

    7. Contudo, esquecesse o Tribunal a quo que no decurso dos procedimentos cautelares de polícia que se sucederam imediatamente após a denúncia, no sentido de se tentar recuperar os bens furtados cfr. artigos 248.º a 251.º do CPP - foi o arguido LA localizado e no decurso da sua abordagem, admitiu informalmente os factos e indicou à testemunha EP o local onde havia abandonado a carteira e conduziu o agente ao local.

    8. Tudo por iniciativa e na presença do arguido LA, tendo o agente EP testemunhado presencialmente tais factos.

    9. Não se trata de valorar a confissão ou a admissão informal dos factos pelo arguido ao agente policial, porquanto o mesmo já era suspeito do crime. Trata-se sim, de valorar o facto diretamente testemunhado pelo agente, ou seja, a condução do agente ao local exato onde se encontrava a carteira e o modo como se alcançou obter tal informação.

    10. Tais factos, ainda que de forma indireta, permite-nos concluir que o arguido LA foi o autor material do crime, pelo menos no que respeita ao furto da carteira pertença da ofendida RU, porquanto se sabia indicar o local onde se encontrava a carteira furtada, e estando o objeto no local indicado, é porque teve implicação nos factos. Caso contrário, não saberia localizar o objeto, nem conduzir o agente policial ao local exato.

    11. Assim, tendo a testemunha EP atuado em conformidade com as medidas cautelares e de policia que se impunham- cfr. artigos 248.º e segs., designadamente o artigo 250º do C.P.P.- e tendo relatado ao Tribunal os factos que presenciou, impunha-se valorar favoravelmente o seu depoimento, por lícito.

    12. O depoimento da testemunha RU conjugados com as declarações da testemunha EP permitem-nos afirmar que o arguido era a única pessoa no local na data e hora dos factos. Que a porta da Pousada se encontrava fechada, e no instante em que a testemunha RU se dirige à lavandaria para buscar toalhas, o arguido acede ao interior da receção, retira as chaves do interior da mala da funcionária puxando pelo do porta chaves, abre o armário, de seguida o cofre, retira o dinheiro do cofre, retira a carteira de dentro da mala, e ausenta-se do local.

    13. Sendo perfeitamente plausível que o arguido tenha realizado a conduta em cerca de dois a três minutos, porquanto se tratava de um local conhecido do arguido, este sabia os passos que havia de fazer, sendo um local pequeno que permite uma rápida movimentação, onde os objetos estavam facilmente acessíveis. São as regras da experiência que nos permitem fazer tal conclusão.

    14. A inexistência de vestígios, nada revelam em sentido contrário, ou seja, de que o arguido não esteve em contacto com o cofre ou com o armário, uma vez que nem sempre é possível encontrar vestígios no local do crime pelas mais variadas razões, nem sequer foram encontrados vestígios da própria funcionária. E o facto de não ter sido encontrado na posse do arguido qualquer quantia monetária significativa, não pode servir, igualmente, para excluir a autoria do ilícito, porquanto, quando intercetado o arguido haviam decorrido mais de 5 (cinco) horas desde a ocorrência do furto, e o dinheiro, tratando-se de um bem fungível, é facilmente utilizável e alvo de troca.

    15. Não pode o Tribunal a quo concluir que a porta da Pousada se encontrava aberta, e com isto, fazer o entendimento de que qualquer pessoa poderia ter-se introduzido no local e assim afastando a responsabilidade do arguido, apenas com base nas declarações da testemunha COR, cujo depoimento não foi valorado.

    16. O Tribunal a quo, em clara violação das regras processuais e da experiência comum, julgou incorretamente os pontos a), b), c), d), e) e f) dos factos não provados e incorreu em erro de julgamento por violação do disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal, com incorreta decisão quanto à matéria de facto.

    17. Impondo-se uma decisão quanto à matéria de facto contrária à que foi proferida, dando-se como provados os pontos a), b), c), d), e) e f) da matéria dada como não provada.

    18. Encontram-se preenchidos os elementos objetivos e subjetivos do crime de furto, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 203.º, n. º1, por referência aos artigos 26.º e 71.º, todos do Código Penal, impondo-se a condenação do arguido LA, em coautoria material, pelo mesmo.

      Termos em que, dando-se provimento ao presente recurso, deverá a decisão proferida ser revogada e substituída por outra que proceda à alteração da matéria de facto provada nos termos supra expostos, e que condene o arguido LA pela prática de um crime de furto, na forma consumada, previsto e punido pelo artigo 203.º, n. º1, por referência aos artigos 26.º e 71.º, todos do Código Penal, assim se fazendo JUSTIÇA.” O Arguido respondeu, concluindo pela improcedência do recurso.

      Neste Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto teve Vista dos autos, emitindo parecer no sentido da procedência do recurso.

      Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência prevista no art.º 419º do CPP, cumpre agora apreciar e decidir.

      FACTOS CONSIDERADOS PROVADOS NA SENTENÇA RECORRIDA São os seguintes os factos que a sentença recorrida indica como estando provados: “ 1. No dia 03-02-2019, os arguidos eram os únicos hóspedes da Pousada TATA, sita na Avenida …., propriedade da sociedade MO, NIPC ….

    19. Nessa data, cerca das 12h00, os arguidos dirigiram-se à receção para comprar pastilhas elásticas, pagando as mesmas com uma nota de dez euros.

    20. Para lhes dar o troco, a ofendida RU teve que abrir a sua mala que se encontrava na parte interior do balcão da receção, de onde retirou a chave de um armário da receção, daí retirando um cofre portátil que tinha no interior o dinheiro em caixa no valor de 237,62€, tudo na presença e à vista de ambos os arguidos.

      DAS CONDIÇÕES PESSOAIS, FAMILIARES E ECNÓMICAS DOS ARGUIDOS 4. O arguido encontra-se a ser submetido a tratamento para consumo abusivo de produtos de estupefacientes.

    21. Encontra-se desempregado, mas está inscrito no centro de emprego.

    22. Não aufere qualquer rendimento.

    23. Não dispõe de qualquer apoio familiar.

    24. Tem o 12º ano.

    25. As condições pessoais, familiares e económicas da arguida não foram apuradas.

      DOS ANTECDENTES CRIMINAIS 10. Os arguidos não têm antecedentes criminais averbados.

      ” FACTOS CONSIDERADOS NÃO PROVADOS “

  2. Logo de seguida, os arguidos deslocaram-se para o quarto onde estavam hospedados e a referida ofendida voltou a colocar o cofre dentro do armário, fechando à chave, chave que voltou a guardar na sua mala e que colocou novamente na parte interior do balcão da receção.

  3. Ora, os arguidos que viram onde se encontrava a mala, o cofre e as respetivas chaves logo engendraram um plano em conjunto para se apoderaram de todos esses bens.

  4. Em conformidade, cerca de meia hora depois e aproveitando o facto de a ofendida RU ter-se ausentado da receção, tendo a porta da pousada ficado fechada, não sendo por isso acessível do exterior, ambos os arguidos em comunhão de esforços dirigiram-se à receção, remexeram na mala da ofendida, daí retirando diversos objetos, nomeadamente a chave que utilizaram para abrir o cofre, levando consigo: 1...

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