Acórdão nº 69/22 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. Afonso Patrão
Data da Resolução20 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 69/2022

Processo n.º 424/2021

3ª Secção

Relator: Conselheiro Afonso Patrão

Acordam, em conferência, na 3.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), foi interposto o presente recurso pelo arguido A. ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na redação que lhe foi conferida, por último, pela Lei Orgânica n.º 1/2018, de 19 de abril (Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional [LTC]).

Ao longo do requerimento de interposição de recurso, o recorrente enunciou catorze questões de constitucionalidade.

2. Através da Decisão Sumária n.º 570/2021, decidiu-se, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso.

Dessa decisão extrai-se a seguinte fundamentação:

«Da análise do requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade (supra transcrito em I, 2.) resulta também que são catorze as questões de constitucionalidade que o recorrente pretende ver apreciadas pelo Tribunal Constitucional.

Vejamos, atendendo à análise feita no Acórdão do STJ, ora recorrido, de cada um dos recursos interpostos pelo arguido, ora recorrente.

A) Questões de constitucionalidade formuladas no recurso das decisões de 11/2/2020

7. As questões de constitucionalidade formuladas no recurso interposto pelo arguido, ora recorrente, das decisões proferidas na audiência de discussão e julgamento no dia 11/2/2020 correspondem às enunciadas nos pontos 3.º, 4.º, 11.º, 12.º e 13.º (num total de cinco questões) do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional com a seguinte formulação:

3.º

A norma aplicada pelo acórdão recorrido e extraída dos artigos 63.°/ 1 e 340.°/1 e 4 alínea d) do CPP, inconstitucional, por violar as garantias de defesa e de assistência, consignadas no artigo 32.°/1 e 3 da Constituição, na interpretação de que o tribunal pode indeferir o requerimento de produção de prova da facticidade da contestação, por haver considerado suficiente a confissão integral e sem reservas, por crime que não a admite e condenar o arguido em taxa de justiça sancionatória, -(invocada na conclusão W do recurso interposto do despacho de 11.02.2020).

4.º

A norma aplicada pelo acórdão recorrido e extraída do artigo 340.° n.° 1 e 4 alínea c) do Cód. Proc. Penal, inconstitucional, por violar o artigo 32.° n.° 1 da Constituição, na interpretação de que, mesmo nos casos de confissão dos factos constantes na acusação, por crime punível com pena de prisão superior a 5 anos, é de indeferir o requerimento formulado na subsequente sessão de julgamento de correção/retificação da confissão e inerente produção de prova dos fatos constantes na contestação e que têm a ver com as circunstâncias, modo e realização dos fatos imputados ao arguido. - (invocada na conclusão X do recurso interposto do despacho de 11.02.2020). (...)

11.º

Da norma aplicada pelo acórdão recorrido e extraída dos artigos 356.° e 357.° do CPP, inconstitucional, por violar as garantias de defesa e de direito ao recurso, plasmadas no artigo 32.° n.° 1 da Constituição, na interpretação de que a preterição do contraditório, quanto à justificação da reprodução em audiência de julgamento das declarações anteriormente prestadas pelo arguido detido constitui mera irregularidade a arguir no próprio ato e por essa via não é recorrível, (conclusão e) do recurso interposto do despacho de 11.02.2020).

12.º

Da norma aplicada pelo acórdão recorrido e extraída dos artigos 63.°/1 e 340.°/ 1 e 4 alínea d) do CPP, inconstitucional, por violar as garantias de defesa e de assistência, consignadas no artigo 32.°/1 e 3 da Constituição, na interpretação de que o tribunal pode indeferir o requerimento de produção de prova da facticidade da contestação, por haver considerado suficiente a confissão integral e sem reservas, por crime que não a admite e condenar o arguido em taxa de justiça sancionatória, (conclusão x) do recurso interposto do despacho de 11.02.2020)

13.º

Da norma aplicada pelo acórdão recorrido e extraída do artigo 340.° n.° 1 e 4 alínea c) do Cód. Proc. Penal, inconstitucional, por violar o artigo 32.° n.° 1 da Constituição, na interpretação de que, mesmo nos casos de confissão dos factos constantes na acusação, por crime punível com pena de prisão superior a 5 anos, é de indeferir o requerimento formulado na subsequente sessão de julgamento de correção/retificação da confissão e inerente produção de prova dos fatos constantes na contestação e que têm a ver com as circunstâncias, modo e realização dos fatos imputados ao arguido, (conclusão y) do recurso interposto do despacho de 11.02.2020).”

7.1 As questões foram colocadas pelo ora recorrente no recurso interposto para o STJ de decisões proferidas na sessão de audiência de discussão e julgamento que teve início no dia 11/2/2020, nas quais foi: i) indeferido o requerimento de retificação da confissão e ii) determinado a reprodução das declarações prestadas perante o juiz de instrução criminal pelo arguido detido. Assim concluiu as respetivas alegações (reproduzidas em III., 7.1, do Acórdão do STJ de 7/4/2021, págs. 193 a 198, correspondentes a fls. 9933 a 9938):

“a) Vem o presente recurso interposto das decisões/deliberações exarada em ata da sessão do dia 11.02.2020 e mediante as quais foi decidido indeferir o requerimento de produção de prova do arguido e o condenou em taxa de justiça excecional e da decisão que decidiu reproduzir em plena audiência as declarações prestadas pelo arguido em interrogatório judicial de arguido detido.

b) Começando por esta última e s. d. r., o tribunal a quo proferiu a decisão recorrida sem que ao arguido e demais sujeitos processuais fosse concedida a possibilidade de exercem o contraditório sobre tal questão, pelo que a mesma é ilegal e inquina todo o julgamento como se vai procurar demonstrar.

c) Importa ter em conta que o processo penal tem estrutura acusatória, sujeito a vários princípios entre os quais avulta o contraditório o qual significa que nenhuma decisão, mesmo nenhuma decisão, ainda que interlocutória, pode ser tomada sem que ao sujeito processual (arguido) lhe seja concedida efetiva e ampla possibilidade de discuti-la e isto em condições de plena liberdade e igualdade com os restantes atores processuais, designadamente, o Ministério Público, que é o titular da ação penal.

d) Ao decidir-se pela reprodução das declarações do arguido prestadas em primeiro interrogatório judicial de arguido detido, sem que previamente tenha facultado ao arguido e demais sujeitos processuais a oportunidade de se pronunciar sobre a questão, o tribunal a quo preteriu um dever fundamental de assegurar o contraditório sobre toda e qualquer questão que possa influir na sua defesa, pelo que a decisão recorrida é ilegal. 

e) É inconstitucional a norma extraída dos artigos 356.° e 357.° do CPP, por violar as garantias de defesa e de direito ao recurso, plasmadas no artigo 32.° n.° 1 da Constituição, na interpretação de que a preterição do contraditório, quanto à justificação da reprodução em audiência de julgamento das declarações anteriormente prestadas pelo arguido detido constitui mera irregularidade a arguir no próprio ato e por essa via não é recorrível.

f) Acresce que a decisão de reproduzir as declarações prestadas pelo arguido em interrogatório judicial de arguido detido é ilegal, porque se não verificaram as condições exigidas pelos artigos 356.° e 357.° do CPP, dado que, quanto mais não fosse, se não verifica qualquer discrepância entre as referidas declarações e o requerimento de correção da confissão e consequente produção de prova.

g) Ademais, o fato do arguido em sede do referido interrogatório judicial ter sido informado, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.° 4 do artigo 141.°, não dispensa que se verifique a justificação legal da necessidade de audição em audiência de julgamento das anteriores declarações, a qual, aliás, tem de constar em ata, nos termos do artigo 356.º/9 ex vi art. 357.º/3 ambos do CPP, o que não aconteceu nestes autos.

h) Desde logo, é bom de ter em conta que a valoração de declarações e depoimentos prestados em fase processual anterior ao julgamento, dependente de estarem reunidos os pressupostos dos artigos 356.° e 357.° do C.P.P."

i) De modo que a leitura, em julgamento, de declarações prestadas em fase anterior do processo contraria os princípios da imediação, da oralidade e do contraditório, princípios de derrogação excecional e sempre justificada por valor conflituante segundo um critério de concordância prática.

j) Não havendo nem constando em ata qualquer justificação para a necessidade de reprodução das declarações prestadas pelo arguido em sede de interrogatório judicial de arguido detido, a decisão recorrida é ilegal posto que violou o disposto nos mencionados artigos 356.° e 357.° do CPP.

k) Impugna-se ainda a decisão que indeferiu o requerimento de produção de prova e concomitantemente condenou o arguido em taxa de justiça sancionatória por considerar o tribunal a quo que os requerimentos se afiguram manifestamente dilatórios e entorpecedores do normal andamento e marcha dos autos.

1) Antes do mais, a admissibilidade do presente recurso quanto a esta decisão é fundada no artigo 399.° do CPP, na medida em que "… se a produção do meio de prova tiver sido requerida e o tribunal indeferir por despacho tal requerimento, a impugnação deve ser feita por via de interposição de recurso desse despacho", conforme acórdão supra citado. 

m) A fase de julgamento da produção de prova, em audiência de julgamento, é a fase "nobre" do processo penal já que ela visa oferecer ao tribunal as condições necessárias para que este forme a sua convicção sobre a existência ou inexistência dos factos e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT