Acórdão nº 058/10.4BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução12 de Janeiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional pela Representante da Fazenda Pública, visando a revogação da sentença de 21-05-2021, do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a impugnação intentada por Lipor – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto, melhor sinalizada nos autos, relativa ao indeferimento da reclamação graciosa que apresentara contra a autoliquidação de IRC, referente ao exercício de 2006, que resultou no valor a pagar de € 68.552,92.

Irresignada, nas suas alegações, formulou a recorrente Representante da Fazenda Pública, as seguintes conclusões: A. Assim, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento em matéria de direito quanto à interpretação e aplicação do artigo 9º alínea a) e alínea b) do Código do IRC.

  1. A Lipor – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto, ora impugnante, é uma pessoa colectiva de direito público, constituída como Associação de Municípios de Espinho, Gondomar, Maia, Matosinhos, Porto, Póvoa de Varzim, Valongo e Vila do Conde, através de escritura pública outorgada em 12.11.1982, cfr. estatutos da LIPOR publicados no D.R. n.º 284 de 10.12.1982, III Série, fls. 17216 a 17221 e republicados no D.R. n.º 130 de 05.06.2001, III Série, fls. 12158 – (24) a 12158- (29), que constam de fls….

  2. De acordo com o artigo 2º dos Estatutos da Impugnante republicados no D.R. n.º 130 de 05.06.2001, III Série “1. A associação tem por objecto imediato a reciclagem, valorização, tratamento e aproveitamento final dos resíduos sólidos entregues pelos municípios associados, e por outras entidades que a associação venha a admitir, bem como a gestão, manutenção e desenvolvimento das infra-estruturas necessárias para o efeito.

    1. A associação pode ver ampliado aquele seu objecto imediato e vir a prosseguir quaisquer fins compreendidos nas atribuições dos municípios associados, com excepção daqueles que, pela sua natureza ou por disposição legal, devam ser exercidos directamente por eles.

    2. Pode ainda, a associação, por si ou associada a terceiros, dedicar-se: a) Ao tratamento de resíduos sólidos; b) Ao tratamento de resíduos industriais ou hospitalares; c) À exploração de actividades de natureza energética conexas com o seu objecto.(…) D. No que concerne ao enquadramento da impugnante em sede de sujeição e isenção ou não a IRC, a Fazenda Pública propugna, salvo o devido respeito, que a sentença recorrida não pondera devidamente os regimes legais aplicáveis nem as razões atendíveis para afastar a impugnante das normas de isenção al. a) e al. b) do artigo 9º do Código do IRC.

  3. A Lei n.º 11/2003, de 13/ 05, invocada pela impugnante, designadamente o seu artigo 36º, dispunha assim: “As comunidades e as associações beneficiam das isenções fiscais previstas na lei para as autarquias locais.” F. A Fazenda Pública rejeita a afirmação que admite que a remissão do artigo 36º da Lei n.º 11/2003, de 13/05, é realizada para os termos previstos na al. a) do art. 9º, n.º 1, do CIRC, ““– por mais discutível que seja opção legislativa ou a redacção da norma remissiva e da norma de isenção. (…)”.

  4. Esta conclusão não apresenta qualquer raciocínio que torne congruente a norma daquele artigo com o CIRC.

  5. Valem aqui as razões adiantadas no parecer n.º 85/2006 emitido pelo Centro de Estudos Fiscais, referido na informação n.º 1399/2006 da Direcção de Serviços do IRC, segundo o qual a interpretação daquele artigo 36, como uma remissão para a alínea a) do n.º 1 do artigo 9º do CIRC, subtrai todo o efeito útil à alínea b) desse mesmo artigo.

    I. Até porque, se o legislador pretendesse que as associações de municípios beneficiassem da isenção prevista para as autarquias locais a que se refere a al. a), mesmo quando exercessem actividades comerciais, industriais ou agrícolas e delas obtivessem rendimentos, J. Não só não restaria espaço para a aplicação da alínea b), como teria até que considerar-se a mesma implicitamente revogada, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 11/2003.

  6. Tal como refere o supra citado parecer, não existem razões para pensar que o legislador tenha pretendido, com a Lei n.º 11/2003, proceder à revogação implícita de todas as normas que se referissem, de modo especial às associações de municípios, L. Mas sim que tenha querido salvaguardar a aplicação das normas especiais que fixem tratamento especial para essas associações preservando o efeito útil destas – assim a remissão genérica do artigo 36º da Lei n.º 11/2003, não prejudica a aplicação de normas especiais, como seja alínea b, do n.º 1, do artigo 9º, do CIRC, tributando e não isentando os rendimentos empresariais destes entes.

  7. O inciso decisório entende ainda que "(..) se se entender que a remissão da Lei nº 11/2003, de 13 de Maio é realizada para os termos previstos na alínea b) do artigo 9º, nº 1 do CIRC, a mesma encontra-se abrangida pela tal isenção uma vez que, na opinião deste Tribunal, não se pode concluir que a impugnante exerce uma actividade comercial, industrial ou agrícola." N. Com o devido respeito por diferente opinião não pode a Fazenda Pública, conformar-se com o doutamente decidido.

  8. De acordo com o artigo 9º, alínea b) do Código do IRC, ficam isentos de IRC “As associações e federações de municípios e as associações de freguesia que não exerçam actividades comerciais, industriais ou agrícolas.” P. Esclarece o artigo 3º, n.º 4, que para efeito de Código de IRC, “são consideradas de natureza comercial, industrial ou agrícola todas as actividades que consistam na realização de operações económicas de carácter empresarial, incluindo as prestações de serviços.” Q. A isenção de IRC das associações de municípios está condicionada ao caracter não comercial, industrial ou agrícola de quaisquer actividades por elas desenvolvidas, independentemente de serem desenvolvidas a título principal ou acessório.

  9. O artigo 9º alínea b) do Código do IRC, refere o exercício de actividades comerciais, industriais ou agrícolas, sem distinguir se se trata de uma actividade exercida a título principal ou a título acessório.

  10. É a própria recorrida que admite que e passamos a citar “(…) que a actividade empresarial da LIPOR se resume à recolha e tratamento de resíduos hospitalares(…)” T. Sustentando que o desenvolvimento desta actividade empresarial, que qualifica como acessória, surge como meio de financiamento da actividade principal, sem distribuição de lucros.

  11. Decorre, implicitamente, da alínea b) do artigo 9º do CIRC, que basta o exercício de uma qualquer daquelas actividades, seja a título principal, seja a título acessório para que a associação de municípios não se mantenha abrangida pela isenção aqui prevista.

    V. Para efeitos de enquadramento na isenção de IRC prevista no artigo 9º, do Código de IRC, releva o não exercício das actividades ali discriminadas e não o destino (distribuição de lucros /investimento na actividade principal) ao resultado obtido pelo exercício dessas actividades.

  12. Nestes termos, contrariamente ao doutamente decidido, concluindo e acompanhando o parecer do Digno Magistrado do Ministério, Público datado de 22.04.2015,"(…) de acordo com os elementos recolhidos em sede inspectiva, parece-nos evidente que a impugnante exerce efectivamente uma actividade de natureza comercial e industrial, aliás, ela própria o refere, donde, atento os normativos supra indicados, está excluída do âmbito de aplicação da isenção de IRC." X. Assim, decidindo como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de erro de julgamento em matéria de direito quanto à interpretação e aplicação da lei ao caso em apreço, designadamente, enquadrando a recorrida nas isenções previstas nas alíneas a) e b) do artigo 9º do Código do IRC.

    Termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

    A recorrida Lipor – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto apresentou contra-alegações, que finalizou com as seguintes conclusões: A. Inconformada com a decisão a Fazenda Pública interpôs o presente recurso, a cujas alegações se apresenta agora resposta.

  13. Entende a recorrida que a decisão de que vem interposto o presente recurso não merece censura, não lhe sendo imputável qualquer erro de julgamento de direito, por a mesma se encontrar em conformidade com as exigências de fundamentação impostas pelo artigo 123º do CPPT e pelos nº 2 e 3 do artigo 659º do CPC, ou, bem assim, qualquer nulidade das previstas no artigo 125º do CPPT e no artigo 668º do CPC..

  14. Pelo contrário, a recorrente limitou-se a uma vez mais reiterar aquele que é o seu posicionamento originário – impugnado – face às questões jurídicas suscitadas.

  15. A Fazenda Pública limitou-se, enfim, a repetir nesta sede, os mesmos dogmas ou preconceitos que já tinha tornado públicos no relatório que fundamenta o acto tributário impugnado, basicamente assentes em falsos pressupostos, num incompreensível desconhecimento da matéria de facto e numa profunda ignorância do alcance das funções e do serviço públicos.

    E.

    O regime que se deve aplicar à situação ora em análise é o do artigo 36º da Lei n.º 11/2003, de 13 de Maio, o qual estabelece que as associações de municípios beneficiam das isenções fiscais previstas na lei para as autarquias locais, entre as quais se conta a isenção de IRC, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 9º do respectivo Código.

  16. A respeito da questão central dos presentes autos, a de saber se a LIPOR exerce ou não, a título principal, uma actividade comercial e industrial, o Tribunal a quo não hesita em responder negativamente. E falo com a consciência de que, como consta dos estatutos da Impugnante publicados em Diário da República e não colocado em causa pela AT, o objecto imediato da LIPOR é a reciclagem, valorização...

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