Acórdão nº 212/15.2T8BRG-B.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 30 de Novembro de 2021
Magistrado Responsável | TOMÉ GOMES |
Data da Resolução | 30 de Novembro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. BB deduziu contra AA, por apenso aos autos de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativa ao menor CC, filho de ambos, incidente de incumprimento, alegando, em síntese, o seguinte: .
Foi estabelecido na regulação do exercício das responsabilidades parentais que o requerente poderia passar 10 dias de férias com o seu filho CC, extensíveis a 15 dias, se o menor assim o pretendesse.
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Para tal efeito, o requerente informou a requerida de que estaria de férias com o filho de 22 de agosto a 3 de setembro de 2017, em Portugal, tendo-se deslocado propositadamente da ... para esse fim.
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Chegou a Portugal no dia 22 de agosto, reservou 2 noites no ..., em ..., estando programado seguir depois para o ... (..., ...) onde permaneceria de 26 de agosto a 3 de setembro, do que deu conhecimento à requerida.
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Todavia, esta impediu o requerente de pernoitar com o menor nas duas primeiras noites, alegando que o menor não estava habituado a dormir com o pai, ao que o requerente anuiu porque no dia 26-9 seguiria para o ... com o filho.
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Em 24-08, quando o requerente se encontrava a levantar o carro que alugara no aeroporto, a requerida apareceu, agarrou-se ao filho e pretendeu levá-lo consigo, tendo sido solicitada a intervenção policial e da Magistrado do Ministério Público.
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Após várias peripécias, a requerida fugiu com o menor, deixando o requerente sozinho no aeroporto, e depois de ela ter conseguido falar a sós com a criança, fez com que esta, dantes bem-disposta, se apresentasse chorosa.
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Atendendo a que a requerida impediu as duas pernoitas anteriores, existindo, por isso, incumprimento, mas, uma vez que o menor já encontra bem, deve estar com o requerente de férias, sendo que este, vivendo na ..., tem de regressar ao seu país no dia 4 de setembro.
Pediu o requerente que se diligenciasse pela efetivação dos meios para que o menor lhe seja entregue, determinando-se as medidas urgentes necessárias ao cumprimento do regime de visitas e férias.
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De imediato foi determinada a notificação da requerida, para, no prazo de 24 horas, proceder à entrega do menor ao pai, sob pena de o Tribunal determinar medidas mais gravosas, nomeadamente o recurso à intervenção policial. No mesmo dia, o requerente, informou que a requerida continuava a recusar-se a entregar o menor, retendo-o, não obstante os sucessivos pedidos do requerente.
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Notificada do despacho que determinou a entrega do menor ao pai, a requerida opôs-se, continuando a recusar a entrega o menor para passar uns dias de férias com o pai, invocando que, na sequência da observação do mesmo no Hospital, os médicos recomendaram repouso, medicação e vigilância e que, sendo vontade expressa do menor ir para casa com a mãe, levou-o para casa; e ainda que só concede que as férias de Verão que estavam a decorrer fossem passadas na cidade de ... ou concelhos limítrofes.
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O requerente respondeu a impugnar os factos por alegados pela requerida, descrevendo o comportamento dela nos dias 25, 26 e 27, razão pela qual desmarcou as férias no ....
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A requerida contestou o requerimento inicial a impugnar a factualidade alegada, defendendo, em síntese, que o requerente não a avisou, com a devida antecedência, sendo este lapso de tempo fundamental para que ela conversasse e convencesse o menor, que nunca foi para o ....
E concluiu no sentido da improcedência do incidente de incumprimento das responsabilidades parentais e pela eventual condenação do requerente como litigante de má fé.
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Teve lugar a conferência a que aludem os artigos 42.º, nº 5, e 35º, nº 1, do RGPTC, no decurso da qual não foi alcançado qualquer acordo, tendo as partes, subsequentemente, apresentado alegações e prova.
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Realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 401-439, de 13/07/2020, decidindo: a) – Julgar procedente o incumprimento das responsabilidades parentais no respeitante ao regime de visitas, por parte da requerida, condenando esta no pagamento de uma multa de 12 UC; b) – Julgar improcedente o pedido de condenação da requerida em indemnização a favor do menor, bem como no pedido de condenação do requerente como litigante de má-fé.
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Inconformada, a Requerida interpôs recurso desse segmento condenatório para o Tribunal da Relação de ..., em sede de impugnação de facto e de direito, tendo sido proferido o acórdão de fls. 546-580, de 27/05/2021, aprovado com um voto de vencido no sentido da absolvição da requerida, a julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida.
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Novamente inconformada, a Requerida veio pedir revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª – Não se sufraga, de todo, o entendimento vertido no acórdão recorrido, porquanto a subsunção do direito à matéria de facto dada como provada viola a lei substantiva, nomeadamente, art.º 41.º do RGPTC, e existe um erro na apreciação das provas por ofensa de uma disposição expressa de lei que fixa a força de determinado meio de prova.
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- No que concerne ao episódio ocorrido no Aeroporto ..., no dia 24/08/2017, não se pode, de forma alguma, condenar a conduta da Recorrente em se dirigir de imediato para aquele local após receber uma mensagem de texto (sms) do seu filho a referir: “Este autocarro vai ao aeroporto. Tenho medo.”; 3.ª - O comportamento do Recorrido foi claramente omissivo e “enganoso”, suscetível de despoletar receio na Recorrente, ao dirigir-se ao aeroporto, no dia 24-08, na companhia do CC, sem que tal tenha dado conhecimento àquela, nem àquele, para levantar o carro reservara.
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– Nunca foi indiferente para a Recorrente o meio de transporte utilizado pelo Recorrido para se deslocar com a criança para o ..., já que, de acordo com o email remetido por aquele à Recorrente no dia 15/08/2017, constante da matéria de facto dada como provada sob o n.º 9, a hipótese de viajar de avião com o CC para o ... seria, nos termos do que foi por aquele escrito no seu email, uma hipótese remota ou a ter em linha de conta em último lugar e, por isso, aquela foi surpreendida com a notícia de que ambos se dirigiam para aquele local.
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– Pelo que a Recorrente, no que respeitante ao episódio ocorrido no Aeroporto ..., não desrespeitou dolosamente, de forma alguma, a sentença e acórdão que regulam o exercício das responsabilidades parentais da criança, nem tão pouco desencadeou naquela com a sua conduta naquele local, ansiedade ou medo de ser “raptado” pelo pai, ao contrário do que vem afirmado no acórdão recorrido, já que foi o CC quem demonstrou à mãe que se encontrava com medo perante aquela situação e, indiretamente, solicitou o seu socorro.
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- No tocante aos dias que se seguiram ao episódio anteriormente referido, ocorrido no Aeroporto, a Recorrente também nunca impediu o contacto entre o Recorrido e a criança.
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– Resulta da matéria de facto dada como provada pelo Tribunal “a quo” que a Recorrente procurou o contacto e o fortalecimento dos laços familiares entre a criança e o Recorrido, resultando também da matéria de facto dada como provada que, em grande parte das vezes, a progenitora tentava contactar o progenitor para estar com o CC, o mesmo ou não atendia as chamadas telefónicas por aquela efetuadas, ou não respondia à mensagens de texto que lhe eram enviadas pela mãe, ou recusava-se pura e simplesmente a comparecer nos locais onde a criança se encontrava.
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- Para além disso, sempre que a Recorrente esteve e ficou com a criança em dias destinados ao Recorrido, foi porque este o aceitou.
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- Por isso, o Recorrido concordou que o CC pernoitasse com a mãe, mesmo quando este deveria pernoitar consigo e, por essa razão, não se verifica qualquer incumprimento do exercício das responsabilidades parentais.
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- A Recorrente, de forma alguma, transmite para a criança qualquer receio ou medo em que este pernoite com o pai, e está empenhada no contacto entre o Recorrido e filho, bem como, colaborar no desenvolvimento da confiança e dos laços afetivos entre aqueles.
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– A Recorrente nunca se negou a que a criança estivesse com o pai e, se porventura, esta quisesse manipular o CC para este se recursar a pernoitar com aquele, por certo não se limitaria esta vontade ao período da noite.
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- O incumprimento do regime de férias e visitas ocorrido foi provocado única e exclusivamente pela criança.
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- A Recorrente pretendeu sempre colaborar com o Recorrido no sentido de atender ao bem-estar e superior interesse da criança, sendo essa colaboração entre progenitores um dever associado ao direito de visitas e férias.
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- Para além disso, e no que ao regime de visitas concerne, a recusa ou o atraso na entrega da criança ao progenitor, só têm relevância se forem significativos, se tais condutas, pela sua gravidade, demonstrem uma verdadeira rutura na relação que, habitualmente, a criança tem com os seus progenitores.
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- Resulta claramente das mensagens trocadas entre a criança e a Recorrente que já se encontram juntas aos autos, e foram referidas supra, que o CC tem medo de pernoitar com o pai, na medida em que teme que aquele o leve consigo para a ... e nunca mais veja a sua mãe, e obrigar aquela a ir de férias com o pai, e a pernoitar com este, mesmo que fosse totalmente contra a sua vontade, seria nefasto ao seu superior interesse.
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– Recorrente e o Recorrido apenas atenderam aos desejos e vontades superiores da criança, e limitaram-se a não contrariar o seu pedido, ou seja, o de não passar férias com o pai no ..., bem como não pernoitar com o mesmo.
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- No caso presente, o grau de dolo da Recorrente é inexistente, não tendo aquela incumprido de forma alguma o regime de férias e visitas da criança.
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- Desta forma, e atento o exposto, mal andou o Tribunal “a quo” em julgar improcedente a apelação da Recorrente e, consequentemente, manter a condenação da Recorrente no pagamento de uma multa num total de 12, tendo por isso violado o disposto no art.º 41.º RGPTC.
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- A violação dessa disposição impõe a revogação do acórdão recorrido, e a...
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