Acórdão nº 0589/15.0BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelPAULA CADILHE RIBEIRO
Data da Resolução09 de Dezembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório 1.1.

A………. - COMUNICAÇÕES, S.A., interpõe recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou totalmente improcedente a ação administrativa especial tendente à anulação do despacho proferido pela Diretora de Serviços da Direção dos Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) da Direção-Geral dos Impostos do Ministério das Finanças, mediante o qual foi indeferido o pedido de dedução dos prejuízos fiscais, que formulou ao abrigo do disposto no artigo 52.º, n.º 9, do Código do IRC, concluindo da seguinte forma as suas alegações de recurso: 1. Ao considerar o pedido “vazio” de objeto e, consequentemente, ao arquivá-lo, a AT violou os princípios do acesso à justiça tributária (previstos nos artigos e 95º da Lei Geral Tributária – LGT) e da tutela jurisdicional efetiva (plasmado, em primeiríssima instância, no n.º 4 do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa, e também naquele artigo 9.º da LGT).

  1. Com efeito, resulta dos princípios aludidos que a reação processual judicial perante um ato tributário deverá inevitavelmente conter o efeito útil de o contribuinte lograr impedir a efetivação na sua esfera jurídica desse ato, bem como de qualquer outro dele resultante, enquanto se processar o meio de reação espoletado, sob pena de se perder essa discricionariedade na esfera da entidade cuja esfera patrimonial é por ele afetado.

  2. Assim, na verdade, a lei oferece ao sujeito passivo prerrogativas formais com vista à materialização de um seu direito, prerrogativas estas que se esgotam num determinado prazo, findo o qual fica precludido o exercício do direito de requerer. Não havendo neste momento qualquer decisão definitiva sobre as impugnações judiciais apresentadas, e, nesta medida, sobre se estão ou não disponíveis os prejuízos fiscais cuja transmissão vem solicitada, nunca à AUTORA poderá ser recusada a apreciação do pedido de transmissão dos prejuízos fiscais – independentemente daquela questão –, desde logo porque não está consagrada na lei um outro momento/expediente para a verificação deste desiderato.

  3. É certo que o artigo 100.º da LGT obriga a AT à imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto de um litígio, em caso de procedência de reclamação, impugnação judicial ou recurso a favor do contribuinte, mas essa reconstituição implica, neste caso, a reposição dos prejuízos fiscais na esfera do sujeito passivo que neles incorreu e já não, certamente, a sua transmissibilidade nos termos que vêm requeridos, até porque, para todos os efeitos, esta não foi autorizada.

  4. É que, por um lado, apesar daquela obrigação de imediata e plena reconstituição da legalidade do ato ou situação objeto de um litígio, tal não implica que, reconhecida a existência dos prejuízos fiscais, a AT se obrigue a autorizar a sua transmissão, sem que para tal esteja pendente um procedimento administrativo próprio, no âmbito do qual deva ser feita uma específica invocação e demonstração de pressupostos e uma própria apreciação de legalidade por parte das autoridades administrativas.

  5. Com efeito, a tese defendida pelo Tribunal recorrido – de que, caso as ações sejam procedentes, a AT fica obrigada à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade – apenas produz, no presente caso, o efeito por si pretendido na medida em que se acredite que a AT praticou um ato administrativo de aceitação da transmissão dos referidos prejuízos fiscais e que o mesmo não poderá vir a ser posto em causa no momento em que seja confirmada a efetiva subsistência dos referidos prejuízos fiscais.

  6. Mas não é isso realmente o que se passa. Os Réus abstiveram-se de conhecer o pedido, invocando – erradamente – a consolidação na esfera jurídica da sociedade incorporada pela AUTORA daquelas correções, e, ao contrário do que afirma o Tribunal a quo (que, como vimos, perentoriamente assume que o direito de deduzir prejuízos fiscais a que se arroga a Impugnante foi reconhecido pela AT), nunca assumiram o compromisso de vir a aceitar – ou se pronunciam sobre a aceitação – a transmissão dos prejuízos da sociedade incorporada para a AUTORA no pressuposto de vir a ser judicialmente declarada a sua ilegalidade, limitando-se a determinar o arquivamento do procedimento iniciado com vista a garantir a referida transmissibilidade (por alegadamente não existirem prejuízos fiscais disponíveis para aquela transmissão).

  7. Significa isto que, caso venha a revelar-se impróprio o invocado consumo dos prejuízos fiscais na esfera da sociedade incorporada, não está autorizada a sua transmissão para esfera da AUTORA, estando esta já nesse momento impossibilitada de o solicitar nos termos legais: o efeito retroativo da anulação do atos tributários de liquidação, referentes aos exercícios supra identificados – desaparecimento da ordem jurídica, como se nunca tivesse existido e sem deixar quaisquer marcas ou rasto, em consequência do que vier a ser decretado pelo Tribunal – determinará, como é bom de ver, a reposição dos prejuízos fiscais, mas não necessariamente a sua transmissão, uma vez que esta está dependente de um ato administrativo autónomo de autorização, que, quando oportunamente requerido, não foi praticado.

  8. Caso o Tribunal entendesse que não seria de determinar a ilegalidade do despacho de arquivamento objeto da presente ação, por justamente não existir ainda uma decisão definitiva no domínio das ações de impugnação dos atos de liquidação relativos àquelas correções, seria, pelo menos, expetável que ordenasse a suspensão da instância até decisão transitada em julgado dos processos de impugnação judicial em crise, ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 276º e no n.º 1 do artigo 279º, ambos do Código de Processo Civil, aplicável por força da alínea e) do artigo 2º do CPPT. O reconhecimento da legalidade do despacho de arquivamento ou indeferimento do pedido de autorização para transmissão dos prejuízos fiscais depende, sem margens para dúvidas, da questão de saber se os prejuízos estão ou não disponíveis para serem transmitidos, algo a que será dada resposta definitiva nas ações de impugnação pendentes.

    TERMOS EM QUE, COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V. EXAS., DEVE SER ADMITIDO E JULGADO PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO E REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA, NOS TERMOS E COM OS FUNDAMENTOS SUPRA DESCRITOS, SUBSTITUINDO-A POR OUTRA QUE JULGUE INTEGRALMENTE PROCEDENTE A IMPUGNAÇÃO JUDICIAL, COM TODAS AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.

    » 1.2.

    A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou contra-alegações que concluiu da seguinte forma: «

    1. A sentença, a fls…, ao ter julgado improcedente a acção e ao ter considerado manter na ordem jurídica o despacho de indeferimento, por arquivamento, do pedido de dedução de prejuízos fiscais e, bem assim, ao julgar improcedente o pedido de suspensão por falta de causa prejudicial, fez uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos, pelo que, deve ser mantida.

    2. A matéria de facto dada como provada pela sentença ora recorrida não foi impugnada pela ora recorrente, pelo que, há que concluir que esta se conformou com a mesma e que o presente recurso se restringe a matéria de direito.

    3. Como resulta da matéria de facto dada como provada pela sentença recorrida, a AT, entendeu indeferir liminarmente o pedido da ora recorrente, arquivando-o por ter constatado que, fruto das correcções efectuadas pela AT aos resultados fiscais declarados e apurados pelo sujeito passivo, o valor dos prejuízos fiscais que foram objecto do pedido, foram consumidos na íntegra no período de 2011, donde, para a AT, resulta da matéria de facto dada como provada, não existem prejuízos susceptíveis de autorização para dedução, na esfera individual da requerente, para os períodos futuros.

    4. Por outro lado, como também resulta da matéria de facto dada como provada, no requerimento que a ora recorrente apresentou, esta pedia a autorização para deduzir os prejuízos, nos termos do nº 1 do art. 52º do CIRC, apenas quanto aos prejuízos declarados em 2009.

    5. Ora o que se passou e que a sentença recorrida, e bem, considerou foi que, efectivamente, a AT considerou o montante de prejuízos a deduzir conforme, não aquilo que a ora recorrente tinha pedido, mas aqueles que resultaram de correcções efectuadas pela AT (que diminuíram substancialmente aquele montante de prejuízos cuja dedução foi pedida).

    6. Neste sentido considerou, e bem, a sentença recorrida que tendo a liquidação referente a tal correcção sido impugnada e sendo os actos tributários definitivos quanto à fixação dos direitos dos contribuintes, sem prejuízo da sua eventual revisão ou impugnação nos termos da lei, a correcção da decisão da AT de incluir o valor dos prejuízos fiscais de 2009 na liquidação de 2011 será feita com a decisão das impugnações acima descritas.

    7. De facto, estando pendentes impugnações judiciais contra liquidações que reflectem as correcções efectuadas pela AT, designadamente ao nível do montante dos prejuízos fiscais como é o caso da de 2009, daí resultam duas conclusões: 1) que a decisão da AT de arquivamento está correcta porque a então A. não tinha prejuízos a deduzir 2) que caso as decisões das impugnações judiciais venham a implicar uma alteração daquelas correcções acrescendo mais prejuízos, a AT vai ter que retirar daí as devidas consequências a nível do seu dever de execução de julgado.

    8. Daí que a ora recorrente não tenha qualquer razão devendo a sentença recorrida manter-se quando decide pela manutenção da decisão de indeferimento da AT, porquanto, inquestionavelmente, o Tribunal não podia deixar de considerar correcta, naquele momento, a posição da AT de que não havia prejuízos a deduzir e de que só uma decisão da impugnação judicial iria, eventualmente, alterar essa circunstância. Contudo, caso essa decisão implicasse um aumento dos...

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