Acórdão nº 2152/15.6BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Dezembro de 2021

Magistrado ResponsávelLUÍSA SOARES
Data da Resolução07 de Dezembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I – RELATÓRIO Vem a Fazenda Pública interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou procedente a oposição à execução fiscal nº 3522201401062409 deduzida por J. M. C. C.

revertido na execução fiscal instaurada originariamente à sociedade E. P. – C., SA., por dívidas de IVA de 2011 no montante de € 4.921,63.

A Recorrente, nas suas alegações, formulou conclusões nos seguintes termos: “I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição deduzida por J. M. C. C. à oposição à execução fiscal n.º 3522201401062409, instaurada no Serviço de Finanças de Oeiras – 3 (Algés), originariamente contra a sociedade “E. P. – C., S.A.”, para cobrança coerciva de dívida proveniente de IVA, de 2011, no valor de € 4.921,63.

  1. Com efeito, da própria certidão permanente extrai-se que o Oponente era o administrador único da sociedade devedora originária antes e após o termo legal de pagamento da dívida ora em cobrança, só tendo renunciado em 20-08-2014, sendo que, da mesma forma, por perscrutação do § 2.º da p.i., é o próprio Oponente que assume, de forma exclusiva, o comando dos destinos da sociedade originária executada.

  2. Tais factualidades merecem dignidade de constar dos factos assentes da Sentença recorrida, pois que reputam relevantes para a decisão da causa e devem ser aditadas ao probatório, nos termos do disposto no artigo 640.º do CPC, ex vi da alínea e) do artigo 2.º do CPPT.

  3. Pois que, “[t]endo o revertido articulado na sua p.i. de oposição à execução fiscal que exerceu as correspondentes funções de gerente da sociedade originária devedora, irreleva que a AT lhe não impute em concreto o exercício das mesmas e nem que as não prove”, cfr. Acórdão do TCA Sul de 10-01-2012, proc. n.º 5066/2011 e Acórdão do TCA Sul de 21-05-2015, proc. n.º 08445/15.

  4. No fundo o Oponente não impugna que o seja; ele é o administrador de facto, simplesmente em termos de direito (juridicamente) entende que estaria impossibilitado de a exercer por poder conflituar com as funções do próprio administrador de insolvência.

  5. Contudo, o facto de ter sido nomeado um administrador de Insolvência não significa que o administrador se deva demitir ou dispensar das suas funções; e isto porque o administrador de insolvência é exactamente, como o próprio nomen indica, um administrador judicial, estando as suas funções determinadas e limitadas pela natureza da insolvência.

  6. Neste seguimento e porque dentro dos vários actos praticados pelos administradores em representação da sociedade devedora originária, estão os típicos actos de gestão ou administração corrente, actos nos quais o administrador de insolvência não se deve imiscuir, postula o n.º 1 do artigo 82.º do CIRE que, “os órgãos sociais do devedor mantêm-se em funcionamento após a declaração de insolvência, não sendo os seus titulares remunerados, salvo no caso previsto no artigo 227.º”.

  7. Nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 4 do artigo 81.º do CIRE, a declaração de insolvência priva de imediato o insolvente e respectivos administradores dos poderes de administração e disposição dos bens integrantes da massa insolvente. Não se afirma que a declaração de insolvência priva, tout court, os respetivos administradores dos poderes de administração e disposição como é afirmado na Sentença recorrida.

  8. E, tendo presente o disposto no artigo 65.º do CIRE, existe, em nosso modesto entendimento, uma deliberada intenção do legislador em estabelecer uma separação entre aquelas que são as obrigações e deveres do Administrador da Insolvência por referência à própria massa falida, daquelas que persistem na esfera do administrador da devedora originária ainda que insolvente, em tudo o que não colida com os deveres e funções do primeiro X. Assim sendo, como foi dado por provado na Sentença recorrida, a dívida é posterior à declaração de insolvência, pelo que a discussão sobre a gestão patrimonial é inócua, tanto mais que o órgão de execução fiscal está impedido de reclamar os créditos no processo de falência. Se assim não fosse e ao arrepio do n.º 6 do artigo 180.º do CPPT, seria a massa insolvente quem ilegalmente responderia pelos créditos objeto da presente oposição.

  9. Afigura-se-nos, assim que a coexistência dos dois Administradores (o da sociedade e o administrador da massa falida) não é ilegal. Inexiste, aliás, disposição legal que o proíba.

    Pelo contrário.

  10. Por manifestamente conclusivo para o que ora nos ocupa, convidamos à leitura do entendimento postulado no Acórdão do TCA Sul, de 21-05-2015, proc. n.º 06381/13, segundo o qual “[a] qualidade de gerente de uma sociedade ou as funções que do ponto de vista da legislação comercial lhe estão cometidas por força da sua nomeação nessa qualidade, não se confundem com a qualidade de administrador de insolvência nem com as funções a este atribuídas nos termos do Código de Insolvências e Recuperação de Empresas (cfr., em especial, artigos 252.º e 259.º do Código das Sociedades Comerciais e artigo 55.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas).

  11. Portanto, não corresponde à verdade que o Oponente se encontrava impedido juridicamente de exercer a administração da sociedade devedora originária por força da nomeação do Administrador da Massa Insolvente, precisamente porque a Administração da sociedade ainda que insolvente e a sua Massa não se confundem e, nesta conformidade, impunha-se ao Douto Tribunal a quo, perante a causa de pedir esgrimida, o comportamento processual do Oponente e a prova produzida pela Fazenda Pública, que não logrou ser contrariada pelo Oponente, convencer-se que este foi seu administrador de facto e que, como tal, a reversão operada pelo órgão de execução fiscal recaiu sobre pessoa responsável pelo pagamento da dívida.

  12. Assim sendo, comprovado que ora se encontra que o Oponente exerceu a administração da sociedade no prazo legal de pagamento voluntário da dívida ora em cobrança, era sob a égide da disciplina legal prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT que importava fundamentar a presente reversão, pois que foi este o regime jurídico no qual o órgão de execução fiscal fundamentou a reversão, cfr. alínea H) do probatório fixado na Sentença recorrida.

  13. Portanto, era ao abrigo de tal regime legal que a Sentença recorrida deveria ter ponderado a disciplina jurídica relativa à culpa do Oponente na insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária. Assim não diligenciou o Douto Tribunal a quo; pelo contrário: o que fez foi furtar-se ao aprofundamento da apreciação da questão relativa à administração de facto da sociedade devedora originária após a declaração de insolvência para, de forma muito singela, inverter o regime jurídico constante do n.º 1 do artigo 24.º da LGT e proceder à apreciação de matéria jurídica que não consta do mecanismo de reversão.

  14. Destarte, com o devido e muito respeito, a Sentença sob recurso, ao decidir como efectivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de facto e de direito relevante para a boa decisão da causa, tendo violado o disposto nas supra mencionadas disposições legais.

  15. Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correcta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à aplicação do artigo 24.º da LGT.

    TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA! * * O Recorrido apresentou contra-alegações, tendo formulado conclusões nos seguintes termos: “i. Através de sentença proferida em 30 de julho de 2020, o douto Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou totalmente procedente a Oposição Judicial deduzida pela ora Recorrido contra o processo de execução fiscal n.° 3522201401062409, instaurado para cobrança coerciva de dívida de IVA, referente ao ano de 2011, no valor de € 4.921,63, em que era devedora originária a sociedade devedora originária a sociedade “E. P. – C., S.A.”; ii. Inconformada com aquela douta Sentença, a Recorrente interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul sustentando, em síntese, que a declaração de insolvência não privou o Recorrido da administração de facto da sociedade devedora originária; iii. Ficou demonstrado nos autos que a sociedade devedora originária, “E. P. – C., S.A.” nunca teve dívidas tributárias até à sua declaração de insolvência, a qual foi declarada através de sentença proferida a 9 de agosto de 2011, no âmbito do processo n.° 1105/11.8 TYLSB, que correu termos no 3.° Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa, foi declarada a insolvência da sociedade devedora originária e nomeado administrador da insolvência, J. C...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT