Acórdão nº 01233/09.0BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução19 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 . O MUNICÍPIO (...), inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Braga, datada de 30 de Março de 2021, que julgando procedente a acção administrativa comum instaurada pela A./Recorrida “S., SA”, com sede do Lugar (…), sendo interveniente principal “A., SA”, com sede no Lugar (…), condenou o recorrente ao pagamento: a) - à A./Recorrida “S., S.A.”, a quantia de € 317.655,72, acrescida de juros legais; b) - à A. “S., S.A.” e Interveniente “A., SA”, Recorridas, na qualidade de associadas em consorcio externo, dos danos emergentes sofridos entre 28/02/2007 e 13/06/2007, reconduzíveis a custos com escoramento, cofragem, pessoal, equipamentos, estaleiro e estrutura, valor a apurar em fase de liquidação, ao qual deverão acrescer juros legais; c) - à A. “S., S.A.” e Interveniente “A., SA”, Recorridas, na qualidade de associadas em consórcio externo, dos danos emergentes e lucros cessantes ao longo de 355 dias em que permaneceram em obra, valor a apurar em fase de liquidação, ao qual deverão acrescer juros legais; e, d) - à Interveniente “A., S.A.”, a quantia de € 227.544,44, acrescida de juros legais.

* Nas suas alegações, o recorrente formulou as seguintes conclusões: "São 3 os momentos da douta sentença recorrida que o recorrente coloca aqui em crise. Concretamente: Primeiro A – Decorre da supra identificada alínea c) do “Objecto do Recurso”, que a douta sentença condenou o aqui Recorrente a pagar às ora Recorridas uma indemnização por danos emergentes, bem como por lucros cessantes, resultantes da necessidade de as empreiteiras permanecerem mais 355 dias em obra, por força da verificação de “outros atrasos na execução da obra.” B – Esta condenação extensível a estes lucros cessantes pressupõem que existiu culpa por parte do aqui Recorrente relativamente à verificação de tais atrasos.

C – No rol desses “outros atrasos”, que perfazem um total de 355 dias, a Mma. Juíza a quo incluiu aqueles que deram origem à concessão às empreiteiras de 80 dias de prorrogação legal, e que foram determinados por “condições climatéricas adversas”.

D – Na base legal desta decisão está o artigo 196º do RJEOP (entretanto revogado), o qual estabelecia no seu n.º 1, que: «[S]e o dono da obra praticar ou der causa a facto donde resulte maior dificuldade na execução da empreitada, com agravamento dos encargos respetivos, terá o empreiteiro direito ao ressarcimento dos danos sofridos».

Ou seja, para que sejam atribuídos estes lucros cessantes, existe um pressuposto de culpa na actuação do dono da obra/recorrente.

E – Contudo, constata-se que relativamente a uma outra situação análoga, respeitante a 3,5 meses de atraso na obra, e que ficaram analisados no contexto da precedente alínea b) do “Objecto do Recurso”, não se deu ali por verificada essa “culpa” relativamente à actuação do dono da obra, ou quiçá melhor dito, não se considerou existir um “nexo causal” que permitisse a condenação do Município em sede desses lucros cessantes.

F – Ora, sob a égide desta outra alínea c), tendo-se por objecto, pelo menos parcialmente, o mesmo período de tempo (3,5 meses), concluiu-se, implicitamente, que já se verificaria essa “culpa”, ou esse “nexo causal”, a onerar o dono da obra, responsabilizando-o, em consequência, - também - pelo pagamento de lucros cessantes.

G – Desta forma, a douta sentença, considerou, num primeiro momento, que os preditos 3,5 meses de atraso não eram imputáveis ao dono da obra (Município/Recorrente), eximindo-o, por isso, de efectuar o pagamento de lucros cessantes, para, logo de seguida, na alínea c), incluir esse mesmo período temporal como justificante dos 80 dias de prorrogação legal devidos às condições climatéricas adversas, determinando-se, paradoxalmente, neste caso, o pagamento de lucros cessantes.

H – Ora, se aqueles 3,5 meses não deram origem ao pagamento de lucros cessantes no contexto daquele primeiro trecho da douta Decisão, não deveriam, depois, noutro trecho subsequente da mesma, serem contabilizados de forma a originarem o pagamento de lucros cessantes.

I – Assim e no mínimo, esse concreto hiato temporal não poderia ser contabilizado para efeitos dessa responsabilização do Município pelo pagamento de lucros cessantes às empreiteiras.

J – Posto isto, parece verificar-se a situação preconizada no artigo 615º, nº 1, alínea c), do Código de Processo Civil, pois estar-se-á perante uma contradição interna, uma decisão antitética, ou uma ambiguidade, verificada no seio do douto aresto, motivo pelo qual não deixa de suscitar-se aqui uma nulidade da douta sentença.

K – Caso assim não se entenda, sempre deverá considerar-se que estaremos perante o que constituirá um erro de julgamento, a carecer da devida rectificação, tudo por forma a sintonizar as consequências jurídicas de, necessariamente, se ter por não verificado o predito nexo causal em ambas as situações em apreço.

L – Assim, aos 355 dias enunciados naquela alínea c), há-de, proporcionalmente, subtrair-se (no que aos lucros cessantes diz respeito) a quota-parte dos mencionados três meses e meio que, somados ao mês de prorrogação legal (estes por erro de implantação de projeto), ditaram, por sua vez, os 80 dias de atraso que integram aquele total de 355 dias Segundo M – Por sua vez, numa relação umbilical com a situação precedente, verifica-se que a douta sentença escora-se, pelo menos parcialmente, em fundamentos que se vêm a revelar de teor conclusivo, padecendo, por isso, de uma insuficiência em relação à respectiva fundamentação de facto.

N - Essa situação, por sua vez, é também ela determinante da nulidade da douta decisão, desta feita em virtude de ferir o disposto na alínea b), do mencionado nº 1, do artigo 615º do CPC.

O – Assim, no capítulo relativo à fundamentação fáctico-jurídica (fls. 54 da douta sentença), escreveu-se: [provada]: “«ii) oitenta dias seguidos de prorrogação legal devido às baixas temperaturas sentidas, extensos nevoeiros verificados, chuvas e ventos constantes que originaram perdas de rendimento, devido a sucessivas paragens com trabalhos em altura e inúmeras paragens de obra.» P - Nessa sequência, conclui-se de seguida na douta sentença: «Extrai-se da matéria de facto que, por força de dois períodos de suspensão de obra (um mês por erro de implantação e três meses e meio devido ao acidente), verificou-se uma retardação da execução de determinados trabalhos que reclamavam condições climatéricas adequadas, sem as quais não era possível realizá-los com êxito – negrito nosso.

Q – E acrescentou-se ali: «Provou-se que os períodos de suspensão e o necessário reajuste do plano de trabalhos deixou de fazer coincidir certos e determinados trabalhos em épocas propícias para a execução dos mesmos.» R – Face a tal redacção, não se logra compreender, desde logo, o que poderiam ser, em termos teóricos, essas condições climatéricas adequadas.

S – Apenas com algum tipo de concretização do que pudesse constituir um clima padrão, ou – digamos – “normal”, face à concreta época do ano em que tiveram lugar os diferentes trabalhos, nomeadamente em termos de pluviosidade, vento, ou nevoeiro, se poderia depois concluir por essa eventual “adequação”.

T – Assim, o facto de chover “muito”, numa determinada época do ano pode ser considerado “normal” e, pelo contrário, um fenómeno fora do comum ocorrendo em épocas de habitual estio.

U – Apenas com uma concretização da específica época do ano em que se terão verificado os alegados fenómenos meteorológicos, dotada, por sua vez, de algum tipo de mensurabilidade, e conjugada depois com os concretos trabalhos que estivessem então a decorrer, seria possível tirar conclusões da índole daquela aqui colocada em crise (condições climatéricas adequadas).

V – Objectiva-se pois, além do mais, que a enunciação na douta sentença da verificação de “baixas temperaturas sentidas, extensos nevoeiros verificados, chuvas e ventos constantes”, não é por si passível de uma concreta de uma aferição e/ou sindicância, pois, como disse, constituem fenómenos meteorológicos que podem constituir uma situação comum em determinadas épocas do ano e que, além disso, deverão ser mensuráveis para permitir quaisquer conclusões.

W – É que o recurso a adjectivações do cariz de “baixas” (temperaturas), “extensos” (nevoeiros), ou “constantes” (chuvas e ventos) não aporta factos aferíveis ou mensuráveis, revelando-se antes como meramente conclusivos, ademais porque surgem desacompanhados de qualquer referenciação a uma concreta época do ano.

X – Tampouco se indica na douta sentença qual seria, afinal, a época do ano favorável, ou a priori propícia à realização dos trabalhos e quais os trabalhos que estariam, concretamente, em causa Y – Posto o que se acaba de explanar, tem-se por verificada a predita insuficiência relativamente à fundamentação de facto, determinante da nulidade do douto aresto, por força do disposto na alínea b), do mencionado nº 1 do artigo 615º do CPC.

Terceiro Z – Por sua vez, coloca-se também aqui em crise a condenação do Réu decorrente da supra enunciada alínea b) do “Objecto do Recurso”, e que é relativa ao tempo de paralisação da obra aqui em apreço que resultou, neste caso e em suma, de um acidente relativo à queda de uma asna do cimbre.

AA – Para o efeito, e sem quaisquer considerações prévias que estribem tal conclusão, diz-se na página 50 do douto aresto que: «[…] forçoso será convocar o artigo 190.º do RJEOP que dispõe: “Se, por facto não imputável ao empreiteiro, for ordenada qualquer suspensão parcial de que resulte perturbação do normal desenvolvimento da execução da obra, de acordo com o plano de trabalhos em vigor, terá o empreiteiro direito a ser indemnizado dos danos emergentes.”» - Negrito nosso.

AB – Contudo, não se descortina em parte alguma do douto acórdão um qualquer trecho que consinta esta conclusão, ou seja, a de que a queda da “asna do...

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