Acórdão nº 00619/16.8BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução19 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO F. instaurou ação administrativa contra o Instituto da Segurança Social, I.P., ambos melhor identificados nos autos, com vista à impugnação do ato praticado pela Diretora da Segurança Social do Centro Nacional de Pensões, que ordenou a devolução do montante de €13.509,00, ou a dedução mensal do montante de €50,54 da pensão, até à regularização do montante a restituir.

Por sentença proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada procedente a acção e anulado o ato administrativo datado de 19.05.2015, praticado pelo Centro Nacional de Pensões, com as consequências legais.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Réu formulou as seguintes conclusões: 1- Os actos verdadeiramente impugnados nestes autos, os actos lesivos da A., foram a anulação do Enquadramento e a anulação do subsídio de Desemprego, e não o acto que decide a compensação do débito com a pensão de reforma da A, pelo que é em relação a estes actos que deveremos aferir as questões de validade 2-Pelo que, ao condenar a administração, como o fez, com base no vício formal de Falta de audiência prévia, o tribunal fez uma incorrecta aplicação do artº 100 do CPA, e fez tábua rasa dos princípios de direito administrativo que dispensam a audiência prévia no caso em que o interessado já teve por diversas vezes ocasião de se pronunciar sobre a intenção da administração no decurso do processo, como foi o que aconteceu.

3- Ao considerar que não existiu um acto final mas apenas várias propostas de actos nunca consumadas, o tribunal desconsidera o artº 121 do C.P.A., e ignora por completa a jurisprudência dos actos praticados sob condição suspensiva, que é precisamente o caso dos autos, onde se diz, se nada disser capaz de mudar a proposta de decisão nos autos, esta converte-se em definitiva; 4- Finalmente, ainda que se admita a existência de irregularidades formais nos actos impugnados, nunca a decisão final poderia ser a invalidade, já que esses vícios, a existirem nunca seriam, face aos factos apurados, formalidade essencial, e a decisão sendo vinculada nunca poderia ter sido outra, tendo existido violação flagrante do n 5 º artº 163 do C.P.A.

5- Em qualquer dos casos, esses eventuais vícios formais, apenas poderiam levar a uma condenação à repetição do acto, e nunca poderiam ter a potencialidade de permitir a condenação da administração a restituir as quantias que indevidamente retiradas à A., e ao fazê-lo, a sentença violou os limites da decisão do acto, nos termos do art. 95 do CPTA, e ainda o princípio da execução de sentenças de anulação de actos administrativos prevista no artº 173 do CPTA.

6- Na verdade, à questão de saber se numa acção anulatória, como a que nos ocupa, a procedência de vícios formais [falta de audiência prévia e de fundamentação], do acto de anulação de uma condição de atribuição de uma prestação de desemprego, o Enquadramento, com a necessária cessação do pagamento e criação do débito, poderá, sem mais, levar à condenação da entidade demandada à efectivação desse pagamento, - ou à impossibilidade de recuperar o que já prestou terá, necessariamente, de obter resposta negativa.

7- Essa condenação não poderá ocorrer, porque ela retira do efeito repristinatório da decisão de anulação mais do que ele pode dar, confundindo repristinação do status quo ante com reconstituição da situação actual hipotética. E a verdade é que, no caso, nada impedirá o ISS de proferir novo despacho, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, e até eventualmente no mesmo sentido dos despachos anulados, mantendo-se, nesse caso, portanto o débito e a possibilidade de compensação.

8- E esta possibilidade, legal, da entidade administrativa poder optar, em face dos dados de que dispõe, e no cumprimento legal e correcto das suas funções, por partir para a reconstituição da situação actual hipotética da recorrida, ou para a renovação válida da decisão de invalidade e cessação de pagamentos, impede o tribunal, por respeito ao «princípio da separação de poderes» [artigo 2° da CRP e por respeito aos «limites da decisão» [artigo 95º, n° 3, do CPTAJ de condenar a entidade ora recorrente nos termos em que o fez - acórdão do STA de 7 de Junho de 2016, -TCA/Norte-Proc.3534/11.8BEPRT, 1 Secção, Recurso 1074/15.

9 -Caso se assim não entenda, este tribunal deverá, pelo menos, devolver o processo à primeira instância para assim poder ser conhecido o pressuposto da validade substancial do acto, a ausência (ou não) da prestação efectiva de trabalho que será, no fundo, aquilo que determina o direito ao recebimento (ou não) do subsídio de desemprego em questão, já que parece desproporcionado avançar para a «condenação no pagamento» num caso em que a ilegalidade, formal, se louva no cumprimento da legalidade, substantiva.

10-Impondo, portanto, o princípio da legalidade que se conheça da legalidade substantiva do acto e não se baste com a mera constatação duma eventual ilegalidade formal , e em que se poderá estar a impor pagamento emergente de ilícito criminal.

Assim, julgando-se inteiramente procedente o recurso e revogando-se a sentença recorrida fará o tribunal Justiça Ou, se assim se não entender, deverá, pelo menos revogar a sentença recorrida na parte em que condena a administração a restituir as quantias que entende que foram indevidamente retiradas à A., permitindo à Administração a repetição dos actos em causa sanando os eventuais vícios formais que lhe são apontados.

Ou, se assim não se entender, deverá pelo menos o tribunal devolver o processo à primeira instância, ordenando que se proceda à análise e produção de prova destinada a apurar os pressupostos materiais do acto de Enquadramento e da anulação do mesmo, decidindo depois em conformidade com o que vier a ser provado nos autos relativo à efectiva prestação ou não de trabalho pela A. à dita entidade, dando pelo menos uma oportunidade ao princípio da Justiça e da verdade material em detrimento duma justiça meramente formal, sobretudo quando existe uma suspeita fundada da prática de ilícito criminal.

A Autora juntou contra-alegações e concluiu: 1º A Recorrente inconformada com a decisão proferida em primeira instância Apela concluindo por três pedido subsidiários.

2º Primeiramente a Recorrente pugna pela revogação da sentença recorrida subsidiariamente requer que, pelo menos revogue a sentença recorrida na parte em que condena a administração a restituir as quantias que entende que foram indevidamente retiradas à A., permitindo à Administração a repetição dos atos em causa sanando os eventuais vícios formais que lhe são apontados e por último pelo menos o tribunal deverá devolver o processo à primeira instância ordenando que se proceda à análise e produção de prova destinada a apurar os pressupostos materiais do ato de Enquadramento e da anulação do mesmo, decidindo depois em conformidade com o que vier a ser provado nos autos relativo à efetiva prestação ou não de trabalho pela A. à dita entidade.

3º As pretensões da Recorrente no presente recurso assentam em ideias estruturantes que na verdade não se verificam.

4º o primeiro dos quais no facto da ação judicial proposta ter como finalidade a impugnação da decisão de anulação do acto de Enquadramento, o que é manifesto que assim não o é; de facto o objeto de apreciação da presente ação são os pressupostos do acto de execução que deveria ser subsequente a uma decisão administrativa anterior, como bem enquadra a sentença recorrida.

5º Insiste, a Recorrida, que a questão sub iudice diz respeito a um vício formal sanável, em concreto de não verificação da audiência prévia, o que de facto também não é verdade, uma vez que, a Recorrente, por estranho que pareça, durante o procedimento administrativo teve que se pronunciar mais do que uma vez em sede de audiência prévia, o que sucede é que a defesa nunca foi considerada e nunca foi proferida decisão que demonstrasse concluído o procedimento.

6º Por último, a Recorrente ainda alega ter tomado decisão definitiva e nessa medida inexistir ilegalidade do acto, o que por si só é uma falácia que procura fazer do direito administrativo algo que não é, nomeadamente alheio a principio tão fundamentais como o do contraditório, da participação e da cooperação e da decisão.

7º O tribunal a quo diz ainda " Acresce referir que, contrariamente ao que alega a Entidade Ré, não estamos aqui perante a preterição de uma mera formalidade legal que possa determinar o aproveitamento do ato, pelo facto do mesmo ser de conteúdo vinculativo (aliás entendendo-se como preterição de formalidade, haverá que se considerar como uma formalidade essencial).

Desde logo, não se pode afirmar com certeza suficiente, que o ato a praticar esteja reduzido a discricionariedade zero. Reconhece-se que, de acordo com o art.º 78º da Lei nº 4/2007, de 16 de janeiro, “os atos administrativos de atribuição de direitos ou de reconhecimento de situações jurídicas, baseados em informações falsas, prestadas dolosamente ou com má-fé, são nulos e punidos nos termos da legislação aplicável.” No entanto, saber se existiram ou não falsas informações depende de uma análise da concreta factualidade em presença, onde a avaliação subjetiva e discricionária tem o seu campo de ação. Tal significa que, a declaração de nulidade de um ato de atribuição de direitos (dos concretos direitos em causa nos autos – subsidio de desemprego) não, in casu, tem um conteúdo vinculado. Aliás, a Entidade Ré, apesar de tentar demonstrar que outro não poderia ser o sentido do ato, nunca afirma que sopesados os...

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