Acórdão nº 063/20.2BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução24 de Novembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Arguição de nulidade do acórdão proferido pelo Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo no recurso para uniformização de jurisprudência da decisão proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 408/2019-T Requerente: “A…………, S.A.” Requerida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) 1.

1.1 Notificada do acórdão por que a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo pretendeu decidir o recurso para uniformização de jurisprudência de decisão arbitral proferida pelo CAAD acima identificada – concedendo provimento ao recurso e anulando a decisão arbitral recorrida – veio a sociedade Recorrida, ao abrigo do disposto no 125.º do Código do Procedimento e do Processo Tributário (CPPT), da alínea d) do n.º 1 do art. 615.º, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT, arguir a nulidade desse aresto, por nele, por erro manifesto, se ter considerado outra factualidade que não a que foi dada como assente na decisão arbitral recorrida e pedir que, declarada que seja essa nulidade, a mesma seja suprida, com a prolação de novo acórdão.

Para a eventualidade de se considerar que o referido erro não constitui nulidade, pediu, subsidiariamente, que se proceda à reforma do acórdão, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 2 do art. 616.º do CPC.

1.2 A AT – Recorrente e ora Requerida – não respondeu.

1.3 Cumpre apreciar e decidir em conferência (como o impõe o n.º 2 do art. 666.º do CPC, subsidiariamente aplicável) do Pleno desta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

  1. 2.1. É manifesta a razão da Requerente quanto ao invocado erro na indicação da matéria de facto, que manifestamente não respeita à decisão arbitral recorrida. Por incorrecta utilização dos meios informáticos, a matéria de facto aí transcrita é de uma outra decisão arbitral que não a sob recurso.

    2.2 Independentemente da qualificação jurídica desse erro e das suas repercussões sobre a fundamentação jurídica do acórdão, é manifesto que cumpre supri-lo, anulando o acórdão recorrido e substituindo-o por outro.

  2. Em face do exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em deferir a reclamação, anular o acórdão proferido nestes autos em 21 de Abril de 2021 e substituí-lo, o que passamos a fazer de imediato: Processo n.º 63/20.2BALSB Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 408/2019-T Recorrente: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) Recorrida: “A…………, S.A.” 1. RELATÓRIO 1.1 A AT veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, para uniformização de jurisprudência, da decisão arbitral proferida em 23 de Março de 2020 pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) no processo n.º 408/2019-T (Disponível em https://caad.org.pt/tributario/decisoes/decisao.php?listOrder=Sorter_data&listDir=DESC&id=4712.), por oposição com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo proferido em 15 de Novembro de 2017 no processo com o n.º 485/17 (Disponível em http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/-/306d68b8ec0b1c8b802581df004ee563.). Alegou o recurso, com conclusões do seguinte teor: «A. O Recurso Para Uniformização de Jurisprudência previsto e regulado no artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos tem como finalidade a resolução de um conflito sobre a mesma questão fundamental de direito, devendo o STA, no caso concreto, proceder à anulação da decisão arbitral e realizar nova apreciação da questão em litígio quando suscitada e demonstrada tal contradição pela parte vencida.

    1. Ora, desde logo, quanto ao estabelecido pelas regras que determinam os requisitos de admissibilidade deste tipo de recursos, resulta que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos, é necessário que i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas; ii) haja identidade na questão fundamental de direito; iii) se tenha perfilhado nos dois arestos uma solução oposta; e iv) a oposição decorra de decisões expressas e não apenas implícitas.

    2. No que concerne ao requisito das situações de facto substancialmente idênticas, temos, subjacente ao acórdão recorrido, a factualidade melhor descrita nas alegações, para cuja leitura se remete.

    3. Subjacente ao Acórdão Fundamento, encontrava-se factualidade também descrita nas alegações, e para cuja leitura igualmente se remete.

    4. Aqui chegados, e considerando a factualidade supra aludida, fica, desde logo, demonstrado que entre o acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento existe uma manifesta identidade de situações de facto.

    5. Estava em causa em ambos os processos aferir da determinação da percentagem do IVA dedutível, resultante dos custos suportados pelo sujeito passivo com serviços de utilização mista, afectos tanto a operações tributadas como a operações isentas.

    6. O acórdão fundamento entendeu que, de acordo com o decidido pelo TJUE, C-183/12, o artigo 23.º, n.º 2, 3 e 4 do CIVA constitui a transposição do artigo 17.º, n.º 5, terceiro parágrafo, alínea c), da Sexta Directiva, desembocando na conclusão, de que os Estados-Membros podem obrigar um banco que exerce, nomeadamente, actividades de locação financeira, a incluir no numerador e no denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos.

    7. Mas, enquanto no Acórdão Fundamento se entendeu, na senda do Processo C-183/13, os Estados-Membros «podem obrigar um banco que exerce, nomeadamente, actividades de locação financeira, a incluir no numerador e no denominador da fracção que serve para estabelecer um único e mesmo pro rata de dedução para todos os seus bens e serviços de utilização mista, apenas a parte das rendas pagas pelos clientes, no âmbito dos seus contratos de locação financeira, que corresponde aos juros, quando a utilização desses bens e serviços seja sobretudo determinada pelo financiamento e pela gestão desses contratos», I. Concluindo que “não ocorre, pois, violação do disposto neste apontado art. 23.º do CIVA, nem dos invocados arts. 74.º a 76.º da LGT, nem ilegalidade decorrente de violação dos invocados princípios (neutralidade fiscal do IVA, igualdade de tratamento entre sujeitos passivos, segurança jurídica, protecção da confiança legítima dos sujeitos passivos), nem se vislumbrando inconstitucionalidade por violação do princípio da separação de poderes (arts. 2.º e 111.º), do princípio da legalidade (art. 112.º, n.º 5), do princípio de reserva de lei [arts. 103.º e 165.º, n.º 1, al. i)] e do princípio do acesso aos tribunais e da tutela jurisdicional efectiva (arts. 20.º e 268.º, n.º 4), todos da CRP.

      ” J. Já no acórdão recorrido se entendeu em sentido oposto, tendo o Tribunal arbitral entendido que a possibilidade conferida pelo artigo 173.º, n.º 2, c) da Directiva n.º 2006/112/CE do Conselho, de 28-11-2006, aos seus Estados Membros de «obrigar o sujeito passivo a efectuar a dedução com base na afectação da totalidade ou de parte dos bens e dos serviços», i.e., a possibilidade de aplicação de uma percentagem de dedução diferente da que se indica no n.º 4 do artigo 23.º não foi transposta para o Código do IVA nacional.

    8. Em suma, entre a decisão recorrida e o Acórdão fundamento existe uma patente e inarredável contradição sobre as mesmas questões fundamentais de direito que importa dirimir mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação da decisão recorrida, com substituição da mesma por novo acórdão que decida definitivamente a questão controvertida acolhendo o decidido no acórdão Fundamento.

      L. Sobre esta matéria já esse douto tribunal teve oportunidade de se pronunciar no sentido por nós defendido, vejam-se os Acórdãos de 29.10.2014 (proc. n.º 01075/13), 03.06.2015 (proc. n.º 0970/13), 07.06.2015 (proc. n.º 01874/13), 27.01.2016 (proc. n.º 0331/14), 5.11.2017 (proc. n.º 0485/17) 09.10.2019, (proc. n.º 0401/14.7BEPRT), de 04.03.2020 (proc. n.º 52/19.0BALSB) e (proc. n.º 7/19.4BALSB).

    9. Neste mesmo sentido, aliás, também se pronunciaram os árbitros vencidos nos processos arbitrais n.ºs 442/2019-T (Professor Sérgio Vasques) e processo arbitral n.º 408/2019-T (Dra. Sofia Borges).

    10. Termos em que é de concluir, também relativamente a esta matéria, dever esse Tribunal Superior acolher o entendimento perfilhado no Acórdão Fundamento.

    11. De tudo o que acima se deixou, decorre encontrar-se o acórdão recorrido em desconformidade com todos os preceitos e princípios acima referidos, não merecendo, por isso, ser mantido na ordem jurídica.

      Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas. deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência: - ser admitido, por verificados os respectivos pressupostos; e - ser julgado procedente, nos termos e com os fundamentos acima indicados e, consequentemente, revogada a decisão arbitral recorrida, sendo substituída por outra consentânea com o quadro jurídico vigente, como é de Direito e Justiça».

      1.2 O recurso foi admitido.

      1.3 A Recorrida apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor: «I. Perante decisão desfavorável à AT...

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