Acórdão nº 492/18.1BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 18 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelPAULA FERREINHA LOUREIRO
Data da Resolução18 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. RELATÓRIO ESPAP- Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, IP.

(Recorrente), vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa em 16/12/2018 que, no âmbito da ação de contencioso pré-contratual proposta contra si por N...- ..., Ld.ª (Recorrida), julgou a ação procedente e, em consequência, no que concerne ao concurso limitado para o fornecimento de refeições confecionadas (publicitado através do anúncio n.º 6421/2017 no Diário da República, 2.ª série, n.º 143, parte L, de 26/07/2017 e através do anúncio n.º 2017/S 143-294721, publicado em 16/11/2013 no Jornal Oficial da União Europeia): - declarou a invalidade das normas constantes dos art.ºs 9.º e 10.º do Programa do Concurso; - declarou a invalidade do art.º 13.º do Caderno de Encargos; - declarou a invalidade do concurso limitado; e - anulou, subsequentemente, as decisões de exclusão de candidaturas e de qualificação, notificadas a 09,02,2018, de adjudicação dos lotes do procedimento, aprovada pela deliberação de 24.05.2018, bem como de todos os demais atos entretanto praticados no procedimento e de eventuais contratos que venham a ser celebrados.

As alegações do recurso apresentado pela Recorrente culminam com as seguintes conclusões: “CONCLUSÕES:

  1. A douta decisão recorrida, eivada de erro de direito, desconsidera, juridicamente, que ambos os procedimentos concursais em causa no caso sub iudice – o procedimento anulado e o procedimento respeitante à execução do julgado anulatório – foram abertos na vigência do Código dos Contratos Públicos de 2008 (Decreto-Lei n.º18/2008, de 29 de Janeiro), o qual se considera imperativamente aplicável “aos procedimentos de formação de contratos públicos iniciados após a data da sua entrada em vigor e à execução dos contratos que revistam natureza de contrato administrativo celebrados na sequência de procedimentos de formação iniciados após essa data” (n.º 1 do artigo 16.º daquele Decreto-Lei).

  2. À data do procedimento de execução do julgado anulatório aquele Código encontrava-se plenamente em vigor e, simultaneamente, ainda estava em curso o processo de transposição da Directiva 2014/24, que conduziria à revisão da versão originária do mesmo Código, que só viria a entrar em vigor em 1 de Janeiro de 2018, e conforme o determinado no n.º 1 do artigo 12.º do Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31/8 (“o presente decreto-lei só é aplicável aos procedimentos de formação de contratos públicos iniciados após a sua data de entrada em vigor, bem como aos contratos que resultem desses procedimentos”).

  3. E foram as disposições legais do Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31/08, que transpuseram para do direito Nacional o regime da Directiva 2014/24/EU; no plano do direito em vigente, tal só viria a suceder com a entrada em vigor do Código dos Contratos Públicos revisto, o que só ocorreu em 1 de Janeiro de 2018.

  4. Ao contrário do que decide a douta Sentença recorrida, até àquela data, não se afigura, constitucional e legalmente, correcto concluir (e decidir) que a Directiva 2014/24, na parte II do seu Anexo XII, para onde remete o seu artigo 58.º, e na parte I do seu Anexo XII, já se encontrava em vigor no direito interno português, fundamentado, só por si, a invalidação judicial dos artigos 9.º e 10.º do Programa do Concurso.

  5. O excurso da douta Sentença recorrida poderia levar a consequências que poderiam ser havidas como inaceitáveis pelos demais interessados no procedimento de execução do julgado anulatório.

  6. Caso algum dos contra-interessados não viesse a preencher os novos critérios de qualificação técnica e financeira, actualizados por força do efeito vinculativo automático que a Sentença recorrida concede à Directiva 2014/24, a Recorrente poderia ser obrigada à prática de actos de exclusão de candidaturas com base em fundamentos que não encontravam expressava previsão na legislação interna portuguesa; e G) Em tal situação, ser confrontada com a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, que já anulou procedimentos concursais de contratação pública, por as entidades adjudicantes terem proferido decisões de exclusão com fundamento em razões que não encontravam acolhimento no Código dos Contratos Públicos.

  7. A douta Sentença recorrida procede a uma errada aplicação da lei processual administrativa quanto à relevância e limites da execução do julgado anulatório e a uma errada subsunção dos factos ao direito pertinente.

  8. No caso sub iudice, o Acórdão do STA (transitado em julgado em 2017),declarou a invalidade de normas vertidas n.º 1 do artigo 9.º do Programa do Concurso, com fundamento na violação do artigo 165.º do Código dos Contratos Públicos, relativo à adequação dos requisitos de capacidade técnica, e declarou a validade de outras normas do mesmo n.º 1 daquele artigo, mantendo, no demais, o Acórdão do TCA Sul (de 2016) e o mais decidido pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (2015), em particular a condenação da Recorrente a «retomar o procedimento, de forma a prosseguir com os procedimento, sem que se verifiquem os vícios acima apontados».

  9. No respeito pelo julgado e a conformidade com o conteúdo da decisão do TAC de Lisboa e o Acórdão do STA, a Recorrente veio dar-lhe execução, expurgando as invalidades e retomando o procedimento que havia sido anulado com os critérios de qualificação técnica desse procedimento originário, repondo a situação de facto e de direito nos termos em que deveria ter ocorrido no momento em que as ilegalidades foram cometidas; a Sentença recorrida, igualmente pelo efeito direto que concede à Directiva 2014/24, determina a actualização desses critérios a 2017, declarando a invalidade do Programa do Concurso do procedimento de execução do julgado anulatório.

  10. Esta interpretação da Sentença, pela errada aplicação do direito aos factos e da subsunção destes às normas processuais e substantivas de execução de julgados, poderia ainda conduzir a situações discriminatórias e, que, no limite, poderiam redundar que só a Recorrida cumprisse os novos critérios de qualificação actualizados a 2017 e os demais contra-interessados cumprissem os de 2013 (data a que se reporta o concurso originário).

  11. A Recorrente, mesmo não sendo legalmente obrigada, procede à identificação das entidades que poderão vir a ser entidades adquirentes ao abrigo do acordo quadro: a douta Sentença recorrida insistindo, com erro de direito, no efeito directo de directivas não transpostas para o direito interno português, conclui que o procedimento de execução do julgado anulatório padece do vício de omissão de identificação das entidades adquirentes ao abrigo de acordo-quadro, violando o disposto no artigo 33.º, n.º 2, § 2.º, da Directiva n.º 2014/24.

  12. No momento em que os procedimentos foram lançados nem a Directiva 2004/18, nem o Código dos Contratos Públicos faziam qualquer referência a tal obrigação, e o Código revisto, com entrada em vigor em 1-1-2018, apenas vem exigir uma identificação suficiente nos casos em que se permita a adesão posterior de novas entidades adjudicantes (cf. n.º 4 do artigo 257.º).

  13. Ao contrário da Sentença recorrida, aquela disposição da Directiva 2014/24 padece de ausência de efeito-direto e, mesmo que o tivesse, a mesma deve ser interpretada apenas no sentido de exigir a indicação das entidades que podem utilizar o acordo quadro nos procedimentos a celebrar após a celebração do acordo quadro (os “call-offs”).

  14. E, havendo alguma inobservância da Directiva 2014/24, a mesma não deverá ser assacada à Recorrente, mas ao próprio Códigos dos Contratos Públicos, estando reunidos requisitos que justificam um reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia, nos termos do disposto no 3.º parágrafo do artº. 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

  15. A douta Sentença recorrida, por erro de direito, concluiu pela ilegalidade do artigo 13.º do Caderno de Encargos do procedimento de execução do julgado anulatório, por aí se prever uma causa de suspensão do acordo quadro que não encontra correspondência nas causas legais de suspensão do contrato administrativo previstas no regime do Código dos Contratos Públicos, por violar os parâmetros legais definidos para a autonomia pública contratual, por não se fixar limite temporal à suspensão e pela previsão da inexistência de qualquer compensação ou indemnização.

  16. Para a douta decisão recorrida, laborando em erro de direito, o acordo quadro, por ser um contrato, tem de valer para ele plenamente o regime de execução do contrato administrativo, pautando-se por um critério de identidade ao nível da qualificação e ao nível do regime, incluindo ao nível indemnizatório/compensatório, de modificação e (re)equilíbrio económico-financeiro do contrato.

  17. Ainda que os acordos quadro se possam reconduzir à figura de contrato público, é inultrapassável a distância que resulta entre um contrato que apenas visa disciplinar relações contratuais futuras e contratos administrativos que têm por objecto directo e imediato a execução de prestações, sendo a estes que se dirige o regime da Parte III do Código dos Contratos Públicos.

  18. Na senda da identidade de regimes, a Sentença recorrida olvida que, no âmbito do Código dos Contratos Públicos, a Administração dispõe de um grau de autonomia pública contratual (seja em termos suspensão ou de modificação dos contratos apenas com fundamento em razões de interesse público) que não é menor do que o conferido à Recorrente pela proteção da “cláusula de interesse público” do artigo 13.º do Caderno de Encargos.

  19. A douta Sentença recorrida, por erro de direito, fazendo plena similitude com o regime substantivo do contrato administrativo, incluindo no regime de modificação e de equilíbrio económico-financeiro do contrato, declara inválido o artigo 13.º do Caderno de Encargos, por excluir a indemnização ou...

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