Acórdão nº 98/21.8T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelJORGE MANUEL LOUREIRO
Data da Resolução17 de Novembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 6.ª secção social do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório O autor propôs contra a ré a presente acção especial de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, mediante apresentação do correspondente formulário legal, no qual conclui requerendo que se declare a ilicitude ou a irregularidade do despedimento de que foi alvo por parte da ré, com as legais consequências.

A ré apresentou articulado motivador do despedimento, sustentando que o despedimento do autor foi lícito, porque decidido com fundamento em factos integradores de justa causa subjectiva de despedimento, no termo de um procedimento disciplinar regularmente tramitado para o efeito.

O autor contestou e deduziu reconvenção no qual concluiu pela forma seguidamente transcrita: “Conclusão Um. Deve o douto Tribunal: a) Condenar a RÉ, EE, a reintegrar o AUTOR no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; b) Condenar a RÉ, EE, no pagamento das retribuições que o AUTOR deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento; c) Ordenar a notificação do AUTOR para, querendo, no prazo de 15 dias, apresentar articulado no qual peticione quaisquer outros créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho.

SEM PRESCINDIR: Conclusão Dois. Deve o douto Tribunal: a) Decretar a nulidade do procedimento disciplinar e da decisão de despedimento; b) Condenar a RÉ, EE, a reintegrar o AUTOR no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; c) Condenar a RÉ, EE, no pagamento das retribuições que o AUTOR deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento; d) Ordenar a notificação do AUTOR para, querendo, no prazo de 15 dias, apresentar articulado no qual peticione quaisquer outros créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou da sua cessação, incluindo a indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho.

SEM PRESCINDIR: Conclusão Três. Deve o douto Tribunal: a) Decretar que os factos dados como provados não são suficientemente graves nem têm consequências suficientes para colocarem em causa a relação laboral; b) Condenar a RÉ, EE, a reintegrar o AUTOR no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; c) Condenar a RÉ, EE, no pagamento das retribuições que o AUTOR deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento; RECONVENÇÃO: Conclusão Quatro. Deve o douto Tribunal: a) Condenar a RÉ, EE, no pagamento duma indemnização de 3.000,00€, pelos danos não patrimoniais já verificados; b) Condenar a RÉ, EE, no pagamento duma indemnização de 500,00€ por cada mês pelo qual perdure a medida disciplinar de despedimento, quanto aos danos não patrimoniais futuros – a liquidar; AINDA, RECONVENÇÃO: Conclusão Cinco. Deve o douto Tribunal: a) Condenar a RÉ, EE, no pagamento duma indemnização de 3.625,55€, pelos danos patrimoniais já verificados; b) Condenar a RÉ, EE, no pagamento duma indemnização equivalente às retribuições a partir de 03/03/2021, aos correspondentes dias de Subsídio de Natal de Natal, aos correspondentes dias de Subsídio de Férias e às férias proporcionais a tais dias, quanto aos danos patrimoniais futuros – a liquidar.

”.

Sustentou, em resumo, que se verifica a falta de junção do procedimento disciplinar por parte da ré, que o procedimento disciplinar é nulo e que não ocorre justa causa subjectiva que suporte o despedimento de que foi alvo por parte da ré.

A acção prosseguiu os seus regulares termos, tendo sido proferida sentença de cujo dispositivo consta, designadamente, o seguinte: “Por todo o exposto, julgo improcedente a presente acção de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, intentada pelo trabalhador, ora autor, José Carlos Ribeiro Silva, contra a entidade empregadora, ora ré, A… e absolvo esta última dos pedidos efetuados pelo primeiro.

Custas pelo autor, atenta a improcedência da acção e o disposto no art. 527.º do CPC.

”.

No tocante ao valor da acção, decidiu-se na sentença em causa pela sua fixação em €2.000.

Não se conformando com o assim decidido, apelou o autor, rematando as suas alegações com as conclusões seguidamente transcritas:*II - Principais questões a decidir Sendo pelas conclusões que se delimita o objecto do recurso (artigos 635º/4 e 639º/1/2 do Código de Processo Civil aprovado pela Lei 41/2013, de 26/6 – NCPC – aplicável “ex-vi” do art. 87º/1 do Código de Processo do Trabalho – CPT), integrado também pelas que são de conhecimento oficioso e que ainda não tenham sido decididas com trânsito em julgado, são as seguintes as questões a decidir: 1ª) saber se a sentença recorrida fixou indevidamente o valor da acção; 2ª) saber se a matéria de facto foi incorrectamente julgada, devendo ser alterada; 3ª) se a ré não cumpriu a obrigação de juntar aos autos o procedimento disciplinar pela circunstância de aquele que juntou não conter a decisão de suspensão preventiva do autor; 4ª) se o procedimento disciplinar é nulo pela circunstância de não existir notícia da infracção reduzida a escrito; 5ª) se o autor incorreu em comportamento integrador de justa causa subjectiva de despedimento.

*III – Fundamentação A) De facto Factos provados O tribunal recorrido deu como provados os factos seguidamente transcritos: “1. O trabalhador desempenhava funções no sector administrativo da ré A…, sendo o seu local de trabalho um gabinete no rés-do-chão da sede.

  1. No dia 21 de Setembro de 2020, o trabalhador foi chamado à sala de reuniões da Mesa Administrativa, estando presentes o Dr. B…, que presidia, C…, D… e E…, para aí discutir com eles assuntos de trabalho.

  2. Tinha sido o trabalhador a pedir para ser ouvido sobre essas questões.

  3. Chegado o trabalhador à sala, e depois de ter exposto algumas dessas questões, foi-lhe pedido por vários membros da Mesa que pusesse a sua máscara de protecção facial pois não a tinha colocada.

  4. Nesse momento o trabalhador disse “Foda-se!” e, dirigindo-se aos membros da mesa administrativa, “Sois todos uma cambada!” e “Ide todos à merda!”.

  5. Logo de seguida, o trabalhador saiu da sala e bateu a porta com força.

  6. No dia seguinte, aquando da entrega ao trabalhador, na sede da empregadora, da comunicação de suspensão preventiva e de lhe ser pedido que abandonasse as instalações ele recusou-se a fazê-lo, acedendo a sair apenas alguns minutos depois, quando foi chamada a PSP e saindo poucos segundos antes de os agentes chegarem.

  7. Quando se foi entregar ao trabalhador a notificação de prevenção preventiva este estava sem máscara, mantendo-se sem ela até ao momento em que abandonou as instalações.

  8. Sabia e sabe o trabalhador que tem por obrigação tratar com respeito todos os funcionários da entidade empregadora e todos os seus superiores hierárquicos, assim como sabia e sabe que tem de manter a máscara de protecção facial colocada sempre que esteja dentro das instalações da A….

  9. Tinha já o trabalhador sido condenado em três processos disciplinares nas sanções de repreensão escrita (em 26 de Janeiro de 2017 por ter chamado uma colega de “burra” e de lhe ter dito “vá à merda”), de perda de dois dias de férias (em 1 de Junho de 2017, também por violação do dever de respeito) e de 7 dias de suspensão (em 21 de Julho de 2017 por, ao ter-lhe sido entregue a segunda nota de culpa ter dito “foda-se, estou farto disto tudo).

  10. Foi emitida nota de culpa pela empregadora, tendo a sua ilustre mandatária da altura solicitado por e-mail de 9 de Outubro de 2020 ao instrutor que lhe remetesse o processo disciplinar em pdf, por email, de modo a evitar-lhe a deslocação à A….

  11. Em resposta, datada de 13 de Outubro de 2020, o instrutor remeteu a ficha de funcionário e os antecedentes disciplinares do arguido, esclarecendo serem esses os elementos constantes do processo, uma vez que a participação e a nomeação como instrutor foram verbais.

  12. O trabalhador respondeu à nota de culpa, pedindo a inquirição de testemunhas (sobre a matéria da defesa) que foram ouvidas em 24 de Novembro de 2020.

  13. Juntou três documentos com a resposta à nota de culpa.

  14. Em 7 de Dezembro de 2020 foi proferido relatório final, sendo comunicada ao trabalhador a decisão de o despedir com justa causa e efeitos imediatos em 15 de Dezembro de 2020, por ofício acompanhado do relatório final.

    *16. A ré não juntou aos autos a missiva pela qual suspendeu preventivamente o autor.

  15. No caso dos autos, a notícia da infracção não foi reduzida a escrito 18. A ré tem a incumbência legal de promover o uso da máscara e não proibiu o acesso do autor às suas instalações pelo não uso da máscara.

  16. O autor entrou na reunião com a máscara colocada, a qual começou a escorregar, durante a exposição que estava fazendo e acabou por retirá-la.

  17. O autor utilizou um impropério e dirigiu-se à Mesa com expressões inadequada.

  18. O autor havia visto o seu desempenho profissional colocado em causa, sem motivo, quanto à sua pontualidade e ao seu desempenho.

  19. O autor, no dia seguinte, na sede da ré, no momento em que lhe foi entregue a comunicação da suspensão preventiva, recebeu um pedido para abandonar as instalações, tendo recusado fazê-lo de imediato.

  20. “Caindo em si”, ainda antes da recepção da comunicação da suspensão preventiva, dirigiu ao Exmo. Sr. Vice-Provedor e aos membros da Mesa Administrativa da ré, um pedido de desculpas, que não foi tomado em consideração como circunstância atenuante.

  21. A ré declarou o autor como um funcionário meritório, aumentando-lhe a sua retribuição regular em 9,52% (de 1.050,00€ para 1.150,00€).

  22. À data do despedimento trabalhava na ré há quase 23 anos.

  23. É, reconhecidamente, pela ré, um trabalhador competente, tendo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT