Acórdão nº 154/14.2T8OLH.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MATOS
Data da Resolução11 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 154/14.2T8OLH.E1 Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Évora: I.

Relatório 1. Nos autos de insolvência de pessoa singular em que é insolvente (…), foi proferido despacho inicial de admissão do pedido de exoneração do passivo restante e apresentado relatório anual pelo fiduciário, segundo o qual se mostrava em dívida a quantia de € 13.831,04, referente rendimento disponível nos primeiros 4 anos da cessão, vieram os credores (…) Credit, SARL e (…), SA, requerer a cessação antecipada do procedimento de exoneração.

  1. Seguiu-se decisão que dispôs a final: “Face ao exposto, nos termos do disposto no artigo 243.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, declaro a cessação antecipada do procedimento de exoneração e, em consequência, recuso a exoneração do passivo restante ao devedor (…)”.

  2. O Insolvente recorre deste despacho e conclui assim a motivação do recurso: «1. Por despacho datado de 24-06-2021 o tribunal a quo declarou a cessação antecipada do procedimento de exoneração e, em consequência, recusou a exoneração do passivo restante ao devedor, ora Recorrente.

  3. O devedor, ora Recorrente, não se conforma com o despacho que ora se recorre.

  4. Encontra-se incorretamente julgada a factualidade vertida no artigo 4º.

  5. O ora Recorrente está e sempre esteve disponível colaborar com o Sr. Fiduciário, assim como a facultar todo e qualquer documento que se afigure necessário, não tendo recebido nenhum contacto através de correio eletrónico ou mensagens escritas, tendo apenas sido contactado telefonicamente uma ou duas vezes, chamadas essas recebidas no ano de 2017, tendo o devedor ora Recorrente sempre colaborado e encontrando-se disposto a colaborar e a facultar toda e qualquer documentação que se afigure necessária.

  6. A decisão recorrida não consagra nenhum facto que consubstancie que a conduta do devedor foi dolosa ou com grave negligência.

  7. Não tendo o ora Recorrente violado nenhuma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º do CIRE.

  8. Não se encontrando preenchidos os requisitos para a cessação antecipada da exoneração do passivo.

  9. No caso dos autos, entendeu-se que o devedor violou a obrigação contida na alínea c), n.º 4 do artigo 239.º do CIRE – entregar imediatamente ao fiduciário, quando por si recebida, a parte dos seus rendimentos objeto de cessão, porém, a factologia apurada nos autos, não permite concluir que o devedor tenha incumprido de forma dolosa ou gravemente negligente aquela obrigação.

  10. Veja-se que o devedor não consegue fazer face às suas despesas mensais fixas, nomeadamente à renda de casa e que o valor que paga a título de renda de casa faz com que não lhe reste mais rendimento disponível, motivos pelos quais o insolvente desesperadamente requereu junto dos Serviços da Ação Social da Câmara Municipal de Tavira candidatura ao Programa Municipal de Apoio ao Arrendamento e, bem assim, ao concurso por inscrição para atribuição de uma habitação em regime de arrendamento apoiado.

  11. Não tendo o ora Recorrente atuado dolosamente ou com negligência grave, pois o insolvente não entregou a parte do seu rendimento a que estava obrigado porque não tinha.

  12. Em bom rigor o insolvente ora Recorrente não consegue com os rendimentos que aufere suportar todas as despesas do quotidiano.

  13. Por outro lado, a requerente da cessação antecipada não faz qualquer prova da atuação dolosa ou gravemente negligente e, muito menos, do prejuízo para os credores, devendo ser considerando que o devedor se encontra exatamente nas mesmas circunstâncias que conduziram à exoneração.

  14. O mero incumprimento de um dever, sem se apurar se foi doloso ou não, não pode sem mais conduzir à cessação antecipada da exoneração do passivo.

  15. Não se encontrando preenchidos os requisitos para a cessação antecipada da exoneração do passivo restante, devendo o despacho recorrido ser revogado.

  16. A cessação antecipada do procedimento de exoneração do passivo restante depende da verificação de prejuízo para a satisfação dos créditos sobre a insolvência, não bastando a violação das obrigações previstas no artigo 239.º, n.º 4, do CIRE.

  17. O prejuízo para a satisfação dos créditos não decorre automaticamente da violação das obrigações previstas no artigo 239.º, n.º 4, do CIRE, tendo que ser demonstrado de modo próprio, o que não sucedeu in casu.

  18. A decisão do tribunal a quo violou o disposto nos artigos 239.º, n.º 4 e 243.º, n.º 1, alínea a) e n.º 3, do CIRE e a nossa jurisprudência dominante, nomeadamente o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, processo n.º 779/14.2TBOLH.E1, datado de 22-10-2020 e o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proc. 279/13.8TBPCV.C1.S2, datado de 09-04-2019, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.

  19. Termos em que, e face ao supra exposto, deverá ser julgado procedente o recurso apresentado e em consequência deverá a decisão recorrida ser revogada, mantendo-se a decisão de exoneração do passivo restante ao devedor (…).

    Nestes termos e nos melhores de direito deverá V. Exa. dar provimento ao presente recurso e, em consequência, determinar-se a revogação do despacho recorrido, assim se fazendo JUSTIÇA!» Não houve lugar a resposta.

    Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    II.

    Objeto do recurso Tendo em conta que o objeto dos recursos é delimitado pelas conclusões nele incluídas, salvo as questões de conhecimento oficioso (artigos 635.º, n.º 4 e 608.º...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT