Acórdão nº 2093/18.5T8PTM-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelTOM
Data da Resolução11 de Novembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 2093/18.5T8PTM-A.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Competência Cível – J2 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Na presente acção declarativa de condenação proposta por (…), (…) e (…) contra (…) e outros, o primeiro Réu veio interpor recurso do despacho datado de 23/06/2021.

* Os Autores pediram a condenação do Réu e da “Companhia de Seguros (…)” no pagamento aos Autores da quantia € 115.000,00 (cento e quinze mil euros), a título de danos não patrimoniais sofridos por (…) durante a cirurgia por via laparoscópica e posteriormente, no pós-operatório, bem como pelo dano morte daquela e a título de danos não patrimoniais sofridos pelos Autores e ainda pelo seu abrupto falecimento, acrescido de juros de mora vincendos desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

* O Hospital (…) de (…) é interveniente passivo nos autos, por chamamento promovido pelo primeiro Réu.

* O Recorrente é médico e interveio na cirurgia ali identificada, tendo junto com a sua contestação um DVD com gravação vídeo que diz reproduzir o acto médico em causa.

* Os Autores foram notificados da junção de tal DVD com gravação vídeo e pronunciaram-se sobre o mesmo.

* Por despacho de 20/03/2019 foi admitida a junção do referido documento.

* A 13/02/2020, os Autores apresentaram um articulado superveniente, que continha uma declaração do Hospital (…) de (…), datada de 22/01/2020.

* Neste documento o Interveniente Hospital declara que: «(…) a gravação de cirurgias não é procedimento normal no bloco operatório da unidade explorada em (…).

A estrutura acionista e administração da Sociedade foi alterada no final de 2017, não sendo do conhecimento da atual administração se à data dos factos se processava a gravação de cirurgias.

Não obstante, esclarece-se que não foi descoberta nos arquivos do Hospital qualquer gravação da cirurgia a que foi sujeita a Sra. Dona (…), não existindo qualquer registo da mesma ter sido feita».

* No referido articulado superveniente os Autores colocam em causa a autenticidade e a veracidade do DVD com gravação vídeo.

* Em sede de audiência prévia, ocorrida em 13/02/2021, a “Companhia de Seguros (…)” respondeu imediatamente ao articulado superveniente, defendendo a sua não admissão.

* O primeiro Réu pronunciou-se no dia 19/02/2020 e defendeu que a declaração do Hospital era extemporânea e que a mesma configurava uma tentativa tardia de impugnar a autenticidade e veracidade da gravação vídeo contante do DVD. E termina pugnando pela não admissão do articulado superveniente, na medida em que não traz autos qualquer novo facto constitutivo, modificativo ou extintivo do direito, nos termos do disposto no artigo 588.º do Código de Processo Civil e, ao mesmo passo, impugna a referida documentação hospitalar.

* Em 27/02/2020, a “Companhia de Seguros (…)” aderiu à resposta oferecida pelo aqui recorrente.

* No âmbito da audiência prévia foi requerida pelo Réu (…) a emissão de um parecer técnico pelo Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, IP, que foi objecto de decisão de deferimento.

* Entretanto, foi junta aos autos diversa documentação clínica remetida pelas entidades hospitalares envolvidas.

* A 02/07/2020, foi proferido despacho com o seguinte conteúdo: «Os documentos juntos avulsamente – processo de informação clínica, resumo de informação clínica e relatório histalógico referentes a (…) – não consubstanciam, a nosso ver, um “parecer técnico” cuja realização foi determinada nestes autos e que se trata de um relatório médico condensado que responda às questões de facto colocadas pelas partes e subscrito por banda de alguém com conhecimentos aprofundados em determinadas áreas do saber, dando uma opinião ou um conselho qualificados, uma vez que o julgador não os possui.

Deste modo, com cópias dos articulados, do despacho saneador e de fixação do objecto do litígio e os temas da prova, bem como da documentação supra referida, e do presente despacho, solicite ao INML a emissão de parecer técnico nos termos determinados em 13 de Fevereiro de 2020, concedendo o prazo de 15 dias para o efeito».

* Em 14/10/2020, o Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, IP informou que o parecer técnico solicitado se enquadrava numa consulta técnico-científica da sua competência.

* A 11/11/2020, o Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, IP informou que deveriam ser apresentadas as questões concretas para pronuncia daquele Conselho Médico-Legal.

* Nessa sequência, foi proferido despacho no sentido de as partes formularem e juntarem aos autos tais questões.

* Os Autores e Réu (…) apresentaram as questões concretas a submeter ao Conselho Médico-Legal do Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, IP.

* No âmbito do seu requerimento o R. (…) solicitou que fosse fornecido ao Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, IP o DVD com gravação vídeo da cirurgia.

* Os Autores opuseram-se ao envio da gravação vídeo, por requerimento de 24/05/2021.

* Em 02/06/2021, o Réu Recorrente reiterou que a documentação em causa deveria ser remetida ao Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses, por ser um elemento relevante da defesa.

* A 23/06/2021, foi proferido o despacho recorrido, cujo teor é o seguinte: «Sem prejuízo da formulação ampla do despacho proferido em sede de audiência prévia (13/02/2020, a fls. 313), constata-se – relativamente à suposta gravação em vídeo da cirurgia a que foi submetida a Sr.ª D. (…) – o certo é que o Hospital de (…), de (…), declara não ter encontrado nos seus arquivos tal gravação (fls. 299). Por outro lado, mais se declara desconhecer-se se esse procedimento era utilizado à data.

Tais factos põem em causa a própria autenticidade de tal gravação vídeo, pelo que se decide não a remeter ao INMLCF.

Remeta-se a tal instituição o conjunto de quesitos formulados pelas partes, a fim de ser produzida prova pericial».

* A recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações de recurso continham as seguintes conclusões: «1. Recorre-se do Despacho de 23 de Junho de 2021 (ref.ª 120538147), que, embora não seja totalmente claro, parece admitir o Articulado Superveniente apresentado pelos Autores Recorridos, a junção do documento respetivo, a alegação de falta de autenticidade e genuinidade de um elemento de prova, privando, em consequência, a pronuncia em sede de consulta técnico-científica pelo Conselho Médico-Legal do INMLCF sobre o elemento de prova junto pelo 1.º Réu na sua Contestação, com o que o Recorrente discorda em absoluto.

  1. O Articulado Superveniente apresentado pelos Autores Recorridos não preenche a disposição contida no artigo 588.º do Código de Processo Civil, atento que não foram apresentados quaisquer factos constitutivos, modificativos ou extintivos relativos aos pedidos ou defesa apresentados.

  2. No Articulado superveniente foi tão-só apresentado um documento que foi emitido em momento superveniente aos articulados na ação, sem que fosse alegado qualquer facto superveniente ou qualquer facto com relevância para este efeito, referindo-se a um elemento de prova, e não a qualquer facto em si mesmo.

  3. Logo, o Articulado superveniente não pode ser admitido enquanto tal, como, ao que se alcança, terá sido pelo Despacho de que ora se recorre, pelo que o mesmo é ilegal por violação do referido artigo 588.º do CPC, devendo ser revogado em conformidade.

  4. Sem prescindir, mesmo que se admita o Articulado superveniente enquanto mero requerimento de junção de documento emitido em momento posterior ao fim dos articulados, há que considerar que o douto Despacho recorrido deve ser revogado.

  5. O DVD com gravação vídeo foi junto ao processo pelo 1.º Réu Recorrente consubstanciando o documento n.º 1 da Contestação, tendo os Autores Recorridos impugnado o mesmo de forma geral no prazo de 10 dias que dispunham para o efeito, sem colocar em causa a respetiva autenticidade ou veracidade.

  6. Por Despacho posterior, de 20 de Março de 2019, ref.ª 112547112, foi admitida a junção do DVD com gravação vídeo, devendo o mesmo ficar nos autos (fls. 246 dos autos), despacho este que não foi objeto de recurso.

  7. Um ano depois, aproveitando o ensejo de um suposto Articulado Superveniente, os Autores Recorridos juntam aos autos uma declaração emitida pelo Interveniente HSGL, na qual este refere que a gravação de cirurgias não é procedimento normal no bloco operatório, a atual administração não sabe se à data dos factos se processava a gravação de cirurgias, inexiste qualquer gravação da cirurgia a que foi sujeita a Sra. D.ª (…) nos arquivos do Hospital e que não existe qualquer registo da mesma ter sido feita, por fim, os Autores Recorridos invocam a falta de autenticidade e veracidade do DVD com gravação vídeo.

  8. Em primeiro lugar, tal declaração poderia ter sido emitida em momento anterior e junta no momento em que os Autores Recorridos foram notificados da junção do DVD com a gravação vídeo, não tendo sido alegada ou produzida prova de qualquer circunstância que fundamente a respetiva emissão e junção após o fim dos articulados.

  9. Deste modo, o Tribunal a quo não devia ter admitido como elemento de prova dos factos em causa na presente ação tal declaração, por total falta de alegação e prova da impossibilidade de apresentação da mesma na altura própria, devendo o douto Despacho recorrido ser revogado na parte em que admite a apresentação de tal declaração do Hospital, ou pelo menos, quando o faz sem qualquer consequência, por violação do disposto no artigo 423.º do Código de Processo Civil.

  10. Em segundo lugar, a junção extemporânea de tal declaração do Hospital não pode fundamentar a invocação da falta de veracidade ou autenticidade de um documento junto um ano antes, pelo que dúvidas não há de que tal invocação é igualmente extemporânea, em violação do disposto nos artigos 444.º e 446.º do Código de Processo Civil, devendo o douto Despacho recorrido ser...

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