Acórdão nº 22927/20.3T8LSB-A.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 04 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelVERA ANTUNES
Data da Resolução04 de Novembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa: I. Relatório: C… intentou processo especial de apresentação de coisas ou documentos contra B… pedindo que: 1) A Requerida seja citada e intimada a apresentar neste Tribunal a Informação Devida, de uma forma completa, verdadeira, clara, organizada e objetiva, com exceção dos 6 Documentos, em data, dia e hora a ser designada pelo Tribunal.

2) Seja fixada uma sanção pecuniária compulsória a pagar pela Requerida, de valor não inferior a € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento pontual e completo do requerido em 1), por cada elemento que fique em falta.

3) Remeter os resultados obtidos no presente processo para o Tribunal Arbitral.

Alegou, em resumo, que; Em 5 de Dezembro de 2012, o Requerente e a Requerida celebraram um acordo denominado por «Protocolo de Repartição de Direitos e Obrigações», no qual, na cláusula 18.ª, o Requerente e a Requerida estipularam uma convenção de arbitragem, nos termos da qual eventuais litígios seriam definitivamente resolvidos de acordo com o Regulamento do Tribunal Arbitral do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio e Indústria (doravante designada por «Convenção de Arbitragem»).

Em 7 de janeiro de 2019, a Requerida apresentou um requerimento de arbitragem ao abrigo da Convenção de Arbitragem, dando origem ao processo n.º 1/2019/INS/ASB do Centro de Arbitragem Comercial da Câmara de Comércio Indústria Em 5 de Abril de 2019, o Senhor Presidente do aludido Centro de Arbitragem Comercial proferiu o despacho de composição do Tribunal Arbitral e em 10 de Outubro de 2019, teve lugar a audiência prévia onde, entre outras matérias e com o acordo dos mandatários do Requerente e da Requerida, o Tribunal Arbitral determinou o seguinte: «b) Findos os articulados, o tribunal proferirá despacho sobre a produção de prova requerida nos articulados».

Nos respetivos articulados, o Requerente e a Requerida requereram mutuamente a junção de elementos e documentos na posse da parte contrária.

Findos os articulados, em 13 de Julho de 2020, o Tribunal Arbitral proferiu o Despacho n.º 6 pelo qual, entre outras matérias, o Tribunal Arbitral apreciou a pertinência dos requerimentos probatórios e ordenou à Requerida que juntasse os seguintes elementos e documentos (de ora em diante designada conjuntamente por «Informação Devida»): “1. Cópia dos mapas financeiros apresentados na Liga Portuguesa de Futebol Profissional respeitantes aos jogos em casa da Autora com o Benfica, Sporting e Porto nas épocas 2014/2015, 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018.

  1. Informação sobre o montante de IVA liquidado sobre os convites respeitantes a todos os jogos referidos no número anterior.

  2. Informação sobre os montantes recebidos ao abrigo do fundo/mecanismos de solidariedade da UEFA respeitantes às épocas 2016/2017 e 2017/2018, acompanhada da correspondente documentação de suporte; 4. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, que tenham sido celebrados com os atletas …, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.

  3. Cópia de todos os contratos, qualquer que seja a sua natureza, incluindo de transferência, agenciamento, comparticipação em negócio ou outro, que tenham sido celebrados com terceiros e que digam respeito aos atletas…, incluindo (mas sem limitar) os que digam respeito aos respetivos direitos de formação desportiva, direitos económicos, direitos de imagem, mesmo aqueles que já não estejam em vigor, nomeadamente por terem sido modificados ou revogados.

  4. Cópia de todas as faturas, recibos ou quaisquer outros elementos contabilísticos integrados na contabilidade da Autora, emitidas pela Autora ou por terceiras entidades e que digam respeito às realidades referidas em 4. e 5., independentemente de existir contrato escrito.

  5. Cópia de todos os contratos, de todas as faturas, de todos os recibos e referência de todas as datas de pagamento da correspondente contrapartida devida pela Autora, respeitante à utilização, pela Autora, do Complexo Desportivo .. (relvado principal e adjacentes, bem como zonas técnicas ou outras) e do Estádio … durante as épocas 2017/2018 e 2018/2019.

  6. Informação sobre os montantes recebidos pela participação na Liga Europa na época 2015/2016, acompanhada da correspondente documentação de suporte.” Na referida decisão contida no Despacho n.º 6, o Tribunal Arbitral considerou que os documentos e informações contidas na Informação Devida «são potencialmente relevantes para a decisão dos factos controvertidos que podem influenciar o desfecho da causa».

    Notificada do Despacho n.º 6, a Requerida nada disse e nada juntou, pelo que, em 1 de Setembro de 2020, o Tribunal Arbitral proferiu o Despacho n.º 7, constatando isso mesmo e solicitando ao Requerente para requerer o que tivesse por conveniente.

    Contudo, em 7 de Setembro de 2020, a Requerida requereu que lhe fosse concedida a possibilidade de juntar aos autos a Informação Devida até ao dia 16 de Setembro de 2020, pretensão à qual o Requerente não se opôs e que foi deferida pelo Tribunal Arbitral pelo seu Despacho n.º 8.

    Em 16 de Setembro de 2020, a Requerida procedeu à junção de apenas 6 (seis) documentos (numerados como A90 a A96, de ora em diante, os «6 Documentos»), recusando-se a juntar os restantes elementos.

    No seu requerimento, a aqui Requerida diz juntar um sétimo documento (a que atribuiu o número A97), mas não procedeu à sua efetiva junção e também não o fez posteriormente, quando processualmente foi indicada essa omissão.

    Em 9 de Outubro de 2020, o Requerente requereu autorização ao Tribunal Arbitral para solicitar a intervenção do tribunal estadual (artigo 38.º n.º 1 da Lei da Arbitragem Voluntária) e, em 21 de Outubro de 2020, o Tribunal Arbitral proferiu o Despacho n.º 10, reconhecendo o direito do Requerente em solicitar a intervenção do tribunal estadual na medida do necessário à produção da prova documental determinada e não cumprida pela Requerida, concedendo a sua autorização para esse efeito.

    Compete apenas ao Tribunal Arbitral (e não à Requerida ou a qualquer outra entidade) determinar a admissibilidade e a pertinência da prova a produzir (artigo 30.º n.º 4 da Lei da Arbitragem Voluntária e artigos 18.º n.º 1 e 31.º n.º 1 e n.º 3 alínea b) do Regulamento), o qual decidiu e ordenou legitimamente à Requerida a entrega da Informação Devida.

    O Requerente tem um interesse legítimo na entrega da Informação Devida, o qual foi reconhecido pelo Tribunal Arbitral que também exigiu essa entrega, no uso das suas atribuições legais.

    A Requerida, para além do dever de pontual entrega da Informação Devida, é responsável pelos danos causados pelo seu incumprimento (artigo 798.º do Código Civil), incluindo todos os custos e despesas decorrentes de procedimentos que não seriam iniciados se tivesse ocorrido uma situação de cumprimento.

    Adicionalmente, a Requerida demonstra uma vincada resistência em cumprir a determinação que legitimamente lhe foi dirigida pelo Tribunal Arbitral, pelo que se justificam a imposição de medidas visando o constrangimento ao cumprimento célere da obrigação incumprida e a cessação deste comportamento que desprestigia a administração e a realização da justiça.

    *** Citada, a Requerida contestou, referindo em primeiro lugar que: - Um Tribunal Arbitral constituído sob a égide do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio de Lisboa decidiu, por unanimidade dos 3 árbitros, incluindo o árbitro nomeado pelo A., que a atuação do A. para com a R. constituiu justa causa de resolução do acordo parassocial celebrado em 2012 entre o A. e a sociedade que tem uma posição de domínio da R. desde esse mesmo ano.

    - Levou já, também, a que os Juízos do Comércio de Lisboa considerassem legítima a recusa do Conselho de Administração da R. a prestar informação societária ao A. enquanto seu acionista, dizendo, por sentença transitada em julgado, o seguinte: - Não subsistem dúvidas, por tal estar demonstrado à saciedade (e à sociedade), que os órgãos sociais do C… atuam de forma a causar prejuízo relevante à SAD, não obstante aquele ser desta acionista enquanto clube fundador e, como tal, detentor de capital social mínimo previsto na lei: 10%.

    - Estão em causa, na presente ação, requerimentos probatórios produzidos pelo aqui A. numa arbitragem em curso que opõe as partes, os quais visam a apresentação dum conjunto de documentos impertinentes para a boa decisão da arbitragem, ou seja, com total irrelevância para o preenchimento dos factos constitutivos dos direitos alegados ou das exceções e que a aqui A. vislumbrou no meio de obtenção de prova da junção de documentos aos autos pela parte contrária a oportunidade de obter documentos que não têm rigorosamente nada a ver com o litígio, sendo o A. certamente movido por intenções como as que lhe foram travadas pelos Juízos do Comércio de Lisboa, justificaram a resolução do acordo parassocial e o motivaram a tentar burlar a aqui R.

    - Salvo o devido respeito pelos Senhores Árbitros, por quem a aqui R. tem a maior consideração pessoal e profissional, foi com surpresa que a R. viu serem deferidos requerimentos de prova totalmente impertinentes para a boa decisão da causa, sob qualquer solução plausível da questão de direito, estando também em causa, em certos casos, documentos que se reportam a matérias para a qual o Tribunal Arbitral não tem competência.

    - É patente, como se verá, que a maior parte dos requerimentos probatórios do A. que a R. não cumpriu não foram deduzidos para prova ou contraprova de factos relevantes para a resolução do litígio submetido ao Tribunal Arbitral.

    - A única explicação razoável para a atuação do A. é a de que este os deduziu para produção de efeitos alheios ao litígio submetido a arbitragem, daí tendo resultado a convicção da R. – frustrada – de que esses requerimentos seriam indeferidos pelo Tribunal Arbitral e a sua surpresa por não o terem...

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