Acórdão nº 15359/17.2T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Outubro de 2021
Magistrado Responsável | NUNO PINTO OLIVEIRA |
Data da Resolução | 28 de Outubro de 2021 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1.
BB propôs acção declarativa de condenação contra AA, advogada, pedindo a condenação da Ré: I. — a restituir-lhe a documentação por ele entregue ou, em caso de impossibilidade de entrega, indemnizar o Autor em € 17.935,25, correspondente ao valor dos documentos em causa; II. — a pagar ao Autor a quantia de € 20.514,28, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral pagamento; III. — a pagar ao Autor a quantia de € 15.000 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa de 4% desde a citação até integral pagamento.
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A Ré AA defendeu-se por impugnação e por excepção: I. — deduziu as excepções dilatórias de incapacidade judiciária, de irregularidade de representação e de ilegitimidade do Autor BB; II. — deduziu ainda a excepção peremptória de prescrição.
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O Tribunal de 1.ª instância julgou improcedentes as excepções dilatórias e procedente a excepção peremptória de prescrição — em consequência, absolveu a Ré do pedido.
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Inconformado, o Autor BB interpôs recurso de apelação.
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Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: I. O Douto Acórdão considerou procedente a exceção peremptória de prescrição, por se terem passado mais de cinco anos sobre a ocorrência dos factos constitutivos da causa de pedir, não tendo ocorrido qualquer facto suspensivo ou interruptivo da prescrição, absolvendo a Ré do pedido.
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De acordo com o Douto Acórdão, os factos constitutivos do direito do Autor reportam-se ao período de 2005 a 2008 e “.... o Autor tem "coleccionado" numerosos pedidos de apoio judiciário os quais, sendo deferidos, lhe têm permitido a propositura de, pelo menos na área da jurisdição cível, dezenas de acções judiciais com dispensa do pagamento de custas judiciais e de encargos com Advogado; este facto é, aliás, conhecido oficiosamente por este Tribunal, dadas as variadas acções que já foi chamado a conhecer nestas circunstâncias”.
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Na situação dos autos, de acordo com o Douto Acórdão, o comprovativo de concessão de apoio judiciário que o Autor apresentou se destinou a "Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor Acção", e não a uma acção de condenação como a presente.
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Conclui o Douto Acórdão que, para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33°, n.° 4 da Lei do Apoio Judiciário incumbia-lhe demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efetivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação, o que não fez, tendo-se antes "refugiado" no facto de apenas ter na sua posse o documento já referido, junto com a petição inicial; V. O apoio judiciário de que o Autor é beneficiário foi requerido com a finalidade de instaurar a presente acção de condenação.
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A Lei n.° 34/2004, de 29 de julho não impõe qualquer obrigação de indicar o tipo de acção a ser intentada, ou que a mesma deve ser intentada contra determinada pessoa.
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A interpretação do Douto Acórdão de que, para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33°, n.° 4 da Lei do Apoio Judiciário, incumbia-lhe demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação viola o art.°20°da Constituição da República.
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Ao Autor cabia somente demonstrar que foram constituídas vicissitudes para prorrogação do prazo de propositura da acção, nos termos do n.° 2 do art.° 33° da Lei do Apoio Judiciário, o que foi realizado na petição inicial.
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Pelo que deve assim improceder a exceção de prescrição.
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Pelo exposto, o Douto Tribunal a quo violou o artigo 33° da Lei do Apoio Judiciário, art° 323°do Código Civil, e o art° 20° da Constituição da República Portuguesa.
Pelo exposto, e com o douto suprimento de V. Exas., deve ser concedido provimento ao presente recurso, e, por via disso, ser proferido acórdão que revogue o Douto despacho recorrido, substituindo-se por outro que ordene o prosseguimento dos autos, com o que se fará a costumada JUSTIÇA! 6.
A Ré AA contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso.
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Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões: I - No recurso que interpõe o Autor/Recorrente não se conforma com o Despacho Saneador que conheceu do mérito da causa e julgou improcedente a acção.
II - Delimitado pelas suas conclusões, o A. ora recorrente não se conforma com o entendimento vertido no Saneador-Sentença de que "para que o Autor se pudesse valer do disposto no artigo 33°, n.° 4 da Lei do Apoio Judiciário, já citado, incumbia-lhe demonstrar que o concreto pedido de apoio judiciário foi efectivamente requerido para instaurar a presente acção declarativa de condenação, o que não fez" - defendendo, no recurso que apresenta, que o apoio judiciário de que é beneficiário foi requerido com a finalidade de instaurar a presente acção de condenação, que a Lei n.° 34/2004, de 29 de Julho não impõe qualquer obrigação de indicar o tipo de acção e que tal entendimento viola o artigo 20° da CRP.
Não lhes assiste qualquer razão no recurso que apresenta, como seguidamente se enuncia e expõe. Assim, III. - Por via da acção declarativa de condenação que deduziu pediu o A. a condenação da R. no pagamento da quantia global de €53.449,53, a titulo de indemnização por alegada perda de chance de concretizar objectivos pretendidos no âmbito de 9 processos judiciais em que a Ré foi Patrona Oficiosa e reportados ao ano de 2005 a 2008.
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- Na contestação que apresentou a Ré defendeuse, na parte que ora importa, por excepção, alegando a prescrição do direito do Autor, e para tanto impugnando que o pedido de apoio judiciário, requerimento APJ 21538/2010, apresentado em 22.12.2010 junto dos serviços da Segurança Social competentes, e conferido por despacho de 03.01.2011 -na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, nomeação e pagamento da compensação de patrono - utilizado para os presentes autos, intentados cm 05.07.2017 tenha, efectivamente, sido requerido para o palruuínio e propositura dos presentes autos de condenação, o que aduziu sob o pressuposto táctico e alegação de que o Autor é "grande" litigante, beneficiário recorrente do apoio judiciário -sendo inúmeras as acções que intenta e para as quais requer a concessão do apoio judiciário.
V - Nos termos do disposto no artigo 33°, n.° 4, da Lei 34/2004, de 29.06, quando o Autor seja beneficiário de apoio judiciário na modalidade de nomeação e pagamento da compensação de patrono - como é a modalidade do apoio nos autns "APJ 215387/2010" - a acção considera-se proposta na data em que foi apresentado o requerimento pedindo a nomeação de patrono - que no caso seria em 22.12.2010; VI - Resulta do artigo 6° n° 2 da Lei 34/2004, de 29.06, que "a protecção jurídica é concedida para questões ou causas judiciais concretas ou susceptíveis de concretização em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos directamente lesados ou ameaçados de lesão”.
VII - Por força do artigo 22° n° 7 da referida lei "é da competência dos serviços da segurança social.… a identificação precisa do fim a que se destina o apoio judiciário". - Identificação que há-de resultar da finalidade indicada pelo Requerente no seu requerimento de protecção jurídica.
VIII - O benefício de apoio judiciário é sempre concedido tendo em vista uma determinada causa (a propor ou já pendente) e não para a satisfação de um determinado direito ou pretensão do requerente, independentemente do número e tipo de processos e procedimentos que a satisfação daquele direito ou pretensão possa envolver.
IX - Uma decisão que concede tal benefício apenas pode ser invocada na causa cujo objecto se enquadre no fim para o qual o apoio judiciário foi requerido e concedido, não produzindo qualquer efeito no âmbito de outras acções cujo objecto não se enquadre naquele fim para o qual foi requerido e concedido.
X - Assim, para que a acção possa ser considerada proposta na data em que foi apresentado o requerimento pedindo a nomeação de patrono, nos termos do disposto no artigo 33°, n.° 4, da Lei 34/2004, de 29.06, a acção proposta terá de corresponder e enquadrar na finalidade para a qual o apoio judiciário foi requerido e concedido - o que não sucede nos presents autos, não podendo a acção ser considerada proposta em 22.12.2010.
XI - Com efeito, do comprovativo de concessão de apoio judiciário (referência APJ 215387/2010) junto aos autos pelo Autor, consta como fim a que se destina: “-Acção Declarativa de Simples Apreciação - Propor acção”; XII.- Por seu turno, a presente acção é uma Acção Declarativa de Condenação, pela qual peticiona o Autor a condenação da Ré a pagar-lhe uma indemnização fundada na "perda de chance" - com evidente finalidade diferente da que resultaria de uma acção de simples apreciação.
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- Factualidade que por si só determina que a acção não possa ser considerada como proposta em 22.10.2010, porque não se destinando aos presentes autos o apoio judiciário requerido e concedido e aos mesmos junto.
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- Acresce que, em cumprimento do despacho judicial que deferiu as diligências de prova requeridas pela A., no seu requerimento probatório junto com a sua contestação, a Ordem dos Advogados, veio informar os autos, que 1. Correm termos no Conselho Regional de Lisboa cerca 240 processos de nomeação de patrono em que é beneficiário do Apoio Judiciário, BB, por deferimento do apoio judiciário pelos Serviços da Segurança Social, no período compreendido entre 2008 e até ao presente [21.06.2019]"; (sublinhado nosso); Acrescentando-se no aludido oficio da OA que "2. Refira--se ainda que não obstante o número mencionado, correm, igualmente termos no Conselho Regional de Lisboa processos de nomeação de patrono de data anterior a 2008." E do, assim, oficiado pela OA, resulta demonstrado que "o A. é "grande" litigante, beneficiário recorrente do apoio judiciário - sendo inúmeras as acções que intenta e para as quais requer a concessão do apoio...
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