Acórdão nº 1434/10.2T8CVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelM
Data da Resolução09 de Novembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra RELATÓRIO J...

intentou a presente ação declarativa com processo comum contra D... – Administração de Condomínios, Lda., pedindo a condenação desta a pagar-lhe: a) - A quantia de €3.677.60, a título de indemnização pelos danos havidos no seu automóvel; b) A quantia de €1.680,00, a título de indemnização pela privação do uso do veículo; c) Os juros legais, contados desde a data da citação até integral pagamento.

Para o efeito, alegou em síntese: -é proprietário do veículo de marca Mercedes-Benz, classe A, 200 CDI, com a matrícula ...; -no ano de 2018 emprestou-o ao seu filho, P..., que estava a usá-lo para as suas deslocações diárias para o Hospital da ..., onde trabalhava como médico; -Em 01 de janeiro de 2019 o seu filho P... iniciou o arrendamento da fração autónoma correspondente ao 3º-A do prédio urbano sito na Av. ..., correspondente a um T2 e lugar de estacionamento, sito no rés-do-chão, delimitado por linhas demarcadas no chão, onde guardava o referido veículo; -a ré era a empresa responsável pela administração do condomínio; -o chão da garagem em que se situava o aludido estacionamento existiam várias aberturas redondas, com cerca de 15 centímetros de diâmetro, que permitiam a ligação ao exterior do prédio, aparentemente destinadas a escoamento de águas, as quais se encontravam sem qualquer tampa, rede ou filtro; -no dia 20 de janeiro de 2019, quando o seu filho circulava com o veículo matricula ..., à saída da garagem da fração de que era arrendatário, deu conta de o carro demonstrar um comportamento anormal, nomeadamente com a perda do líquido do “limpa para brisas” e dureza e grande resistência no pedal do travão, que impedia a realização de travagens e a normal utilização do veículo; -chamou a Assistência em Viagem, que enviou um técnico/mecânico ao local, o qual verificou, após abrir o capot do carro, que se encontravam roídos por roedores o tubo de vácuo do servofreio à bomba de vácuo e diversos cabos/tubos, em face do que o mecânico procedeu à substituição dos “cabos dos travões”, de molde a permitir que o filho do autor pudesse chegar ao seu local de trabalho; -no dia 24 de janeiro de 2019 o filho do autor, igualmente à saída da garagem quando se dirigia para o Hospital, notou novamente grande dureza no pedal do travão, grande dificuldade em efetuar travagens, concluindo que o automóvel não apresentava condições de circulação em segurança: -telefonou de novo para o serviço de Assistência em Viagem, o qual enviou, de imediato, um reboque, tendo sido o automóvel transportado para a oficina C..., S.A.,onde foi realizado o diagnóstico completo dos problemas que o automóvel apresentava, tendo sido novamente detetados vários componentes do automóvel roídos por roedores, designadamente o tubo de vácuo do travão e componentes no interior do capot; -carecendo o veículo de reparação, foi solicitado à oficina em causa um orçamento que na data de 31 de janeiro de 2019 era de €6.352,38, impossibilitando tais danos a circulação do veículo; -o veículo em causa esteve imobilizado desde 24 de janeiro de 2019 até maio de 2019, altura em que o autor entregou o veículo na oficina para reparação, tendo o conserto tido um custo de €3.677,60.

-o veículo ficou reparado em 18 de maio de 2019 (data da entrega do veículo ao autor), pelo que a privação do uso do veículo deverá ser calculada durante esse período a €15,00/dia: -o autor foi obrigado a pedir a um familiar um automóvel emprestado que substituísse aquele, já que a reparação que era necessária obrigava a um dispêndio monetário de que o autor não dispunha de imediato, o que lhe provocou ansiedade, desgaste emocional, irritação e incomodo; -os ratos que provocaram os citados danos no veículo do autor entraram para o interior da garagem do prédio através das aberturas suprarreferidas, existentes no chão da garagem, provenientes do exterior, ao que se supõe na sequência do início de obras em terrenos contíguos, uma vez que foram avistados vários ratos a circular nas garagens em causa, bem como fezes desses animais, designadamente, junto a essas aberturas, quer em momento anterior ao surgimento dos problemas no carro do autor, quer ainda em dias seguintes a tais ocorrências, tendo sido roídos - para além dos componentes do veículo do autor - bens de outros condóminos, nomeadamente roupas, peças de mobiliário, produtos de limpeza e garrafões de água, existentes nas garagens; -embora tenha sido advertida, de imediato, da situação, apenas no mês de fevereiro de 2019, a ré procedeu à colocação de tampas metálicas perfuradas e ajustadas com silicone em todas as aberturas de escoamento de água existentes na garagem, assim impedindo a entrada de animais através dos sobreditos buracos, tendo igualmente procedido à colocação, em determinados pontos da garagem, de caixas próprias para desratização; Concluiu, dizendo que a ré declinou qualquer responsabilidade pelo sucedido, pese embora fosse à mesma que incumbisse a administração do prédio e, consequentemente, a tapagem ou proteção das aludidas aberturas, em momento anterior ao surgimento dos problemas aqui em apreço, o que não fez, numa atitude culposamente negligente, para além de que, pese embora os roedores tenham-se manifestado no mês de janeiro de 2019, apenas em fevereiro desse ano procedeu à tapagem dos buracos por onde os mesmos se introduziram, o que é, igualmente, evidenciador da sua conduta negligente.

A ré contestou sustentando em síntese que: -pese embora tenha sido contactada pelo filho do autor sobre a matéria em apreço na petição inicial, declinou a sua responsabilidade pelo sucedido por entender que essa responsabilidade não recai sobre ela, - já que, por um lado, o prédio em apreço nos autos está edificado em conformidade com as normas legais e regulamentares vigentes; - por outro lado, nunca nenhum dos condóminos se havia manifestado quanto à falta de tapagem das aberturas em causa, até às circunstâncias verificadas em janeiro de 2019; - sendo que tais aberturas se destinam ao escoamento de águas (nomeadamente de águas de lavagem das garagens), sendo vulgar não se encontrarem tapadas, sob pena de não realizarem adequadamente a função a que se destinam; - para além de que o prédio em causa se situa em plena zona urbana consolidada da cidade da Covilhã, não sendo de representar como um evento normal, provável e previsível a existência de grandes quantidades de roedores em tal zona, pelo que nunca as aludidas aberturas foram configuradas como uma fonte de perigo; por fim, - não se verifica o pressuposto da culpa da ré pelo sucedido, uma vez que não é possível imputar a entrada de ratos na garagem a qualquer comportamento da ré, muito menos a qualquer comportamento ilícito, atendendo a que foram as diversas obras em terrenos próximos do prédio em apreço nos autos que terão estado na origem do surgimento de uma quantidade inusitada e imprevisível de roedores, pelo que não era previsível a entrada dos roedores na garagem, reconduzindo-se a mesma a um acontecimento fortuito, inesperado e alheio ao comportamento da ré.

- a tapagem dos aludidas aberturas não corresponde a um acto de conservação ou manutenção das garagens, sendo que logo que teve conhecimento da possibilidade de estarem a entrar roedores pelas aberturas em apreço a ré cuidou de resolver, ou pelo menos de acautelar, tal possibilidade, tendo solicitado a deslocação ao local de uma empresa especializada em serviços de desinfestação que, de imediato, levou a cabo uma desratização em 24 de janeiro de 2019.

- a ré procedeu de imediato à tapagem das aberturas com uma rede, ainda que de carácter provisório, e que se revelou ser a solução possível no momento pois os fornecedores que contactou para o efeito não tinham tampas e grelhas metálicas disponíveis nessa ocasião, as quais vieram a ser fornecidas e colocadas em fevereiro, - participou ainda nesse dia a situação à seguradora com quem o condomínio celebrou contrato de seguro tendo por objeto o prédio em apreço nos autos, a qual não assumiu a responsabilidade pelo sucedido por considerar, por um lado, que os danos então invocados pelo filho do autor estavam excluídos das garantias da apólice e, por outro lado, por não se verificar igualmente qualquer responsabilidade por parte do condomínio, em virtude do sucedido resultar de um acontecimento exterior e alheio ao comportamento do mesmo.

- a quantia peticionada pelo autor, a título de indemnização por alegada privação do uso do veículo, sempre teria que ser desconsiderada, uma vez que foi o filho do autor que sofreu com a privação do mesmo, por ser ele que utilizava a viatura, pelo que apenas este teria legitimidade para formular tal pedido ou, caso assim não se entenda, sempre teria a mesma de ser reduzida por absoluta falta de fundamento, por não terem sido alegados factos que permitam aferir o montante diário peticionado de 15,00€, tal como também não foram alegados pelo autor quaisquer motivos para não ter reparado de imediato o veículo, para além de que a ré só foi interpelada pelo filho do autor em 25 de março de 2019, pelo que o período de privação invocado não poderia ser atendido.

Concluiu pugnando pela improcedência da ação, com a absolvição da ré dos pedidos, em virtude de a ré não ser responsável pela ocorrência dos danos que o autor invoca, quer porque...

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