Acórdão nº 164/20.7T8PRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelMARGARIDA ALMEIDA FERNANDES
Data da Resolução28 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório D. F.

, residente na Rua …, Lote 26…, Peso da Régua, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra X - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A.

, com sede no Largo … Lisboa, pedindo: a) a condenação da ré a pagar ao autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 20.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde de a citação até integral e efectivo pagamento; b) a condenação da ré a pagar ao autor, devido a sequelas que lhe determinaram uma incapacidade permanente parcial, a indemnização pela perda da capacidade de ganho, que se relega para liquidação em momento ulterior do processo, ou, caso assim não se entenda, cuja liquidação se relega para execução de sentença, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento; c) a condenação da ré a pagar ao autor os juros de mora no dobro da taxa prevista na lei aplicável, ao abrigo do disposto no artigo 38º, nº 3 da Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto.

  1. a condenação da ré a pagar ao autor a quantia de € 95,00, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento, a título de danos patrimoniais com o pagamento da certidão da participação do acidente.

    Alega, em síntese, que o veículo que conduzia foi embatido frontalmente por outro – seguro na ré - por culpa exclusiva do condutor deste último, daí tendo resultado diversos danos.

    *A ré contestou impugnando os factos que imputam a ocorrência do acidente à condução do seu segurado e os factos atinentes aos danos resultantes do acidente.

    *Foi realizada audiência prévia, onde foi fixado o valor da acção, foi identificado o objecto do litígio e foram enunciados os temas de prova, bem como foram admitidos os requerimentos probatórios.

    *Após a junção aos autos do relatório pericial, o qual concluiu por um défice funcional permanente de integridade físico-psíquica do autor de três pontos, este requereu a liquidação do pedido formulado sob a alínea b) pedindo a condenação da ré no pagamento ao autor, a título de danos decorrentes do mencionado défice, a quantia de € 10.000,00, acrescida de juros de mora desde a notificação do incidente de liquidação (09/12/2020) até integral e efectivo pagamento, pelo dobro da taxa prevista na lei aplicável, ao abrigo do artigo 38º, nº 3, da Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto.

    A ré opôs-se e pugnou pela rejeição do presente incidente.

    *Procedeu-se a audiência de julgamento, após a qual foi proferida sentença, cuja parte decisória, na parte que interessa, reproduzimos: “Em face do exposto, decido julgar parcialmente procedente a presente acção e, em consequência:

  2. Condenar a ré no pagamento ao autor, a título de compensação dos danos não patrimoniais, da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros).

  3. Condenar a ré no pagamento ao autor, a título de indemnização do dano biológico, da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros).

  4. Condenar a ré no pagamento ao autor de juros de mora no dobro da taxa prevista na lei sobre € 16. 769,87 (dezasseis mil, setecentos e sessenta e nove euros e oitenta e sete cêntimos), contados desde 27 de Julho de 2019 até à data da decisão judicial.

  5. Condenar a ré no pagamento ao autor de juros de mora à taxa legal em cada momento em vigor quanto ao remanescente, desde a citação até integral e efectivo pagamento.

  6. Absolver a ré do demais peticionado pelo autor. (…)”*Não se conformando com esta sentença veio a ré dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “1ª- A recorrente restringe o seu recurso da douta sentença quanto aos montantes atribuídos ao autor a título de danos não patrimoniais e dano biológico, à duplicação dos juros de mora e à não dedução do adiantamento por conta da indemnização efectuado pela Ré ao Autor.

    1. - Quanto aos danos não patrimoniais deve ponderar a equidade e “o seu montante deve ser proporcional à gravidade do dano, ponderando-se, para tal, nas regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas” e do criterioso sopesar das realidades da vida; 3ª- Estes princípios impõem que sejam tratados e indemnizados de modo razoável e justo situações idênticas, devendo seguir-nos por critérios e medidas padrão, em que se obtenha, tanto quanto possível um modelo indemnizatório que permita uma maior certeza jurídica, de igualdade e socialmente justa.

    2. - Resultou provado que o autor ficou com Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica é fixável em 3 pontos, e que as sequelas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares; 5ª- Além de 10.000,00 € arbitrados a titulo de danos não patrimoniais e 10.000,00 € a titulo de dano biológico simultaneamente, quando os danos não patrimoniais que estão contabilizados a titulo de quantum doloris/sofrimento físico e psíquico já contemplam, salvo o devido respeito todos os danos não patrimoniais, incluindo in casu o dano biológico, não se justificando in casu a sua autonomização.

    3. - Foi atribuído o valor de 10.000,00 € a titulo de danos patrimoniais e simultaneamente a quantia de 10.000,00 € pelo dano biológico traduzido do défice funcional de 3 pontos o que nos parece, salvo o devido respeito, manifestamente exagerado, sem que se justifique e fundamente minimamente tais valores, e in casu se traduz numa duplicação.

      Isto porque, 7ª- Em consequência do sinistro o autor apenas ficou a sofrer de uma incapacidade de 3 pontos, que não é impeditiva do exercício de qualquer actividade como é manifesto, público e notório, pelo que tal défice é in casu irrelevante, e só pode ter efeitos em termos de danos não patrimoniais, e não em termos de “dano patrimonial futuro”.

    4. - É certo que se discute a questão de saber se este dano deve ser indemnizado a título de dano não patrimonial e a título dano biológico, quando se verifica que a incapacidade permanente parcial não implica uma perda de ganho do rendimento auferido, pelo que deve, casuisticamente, oscilar entre dano patrimonial ou dano não patrimonial, porque de facto o Autor pode exercer a profissão habitual, eventualmente com algum esforço suplementar.

    5. - O simples facto de ver reduzida a capacidade física ou intelectual para o trabalho só se traduzirá em “dano patrimonial futuro” se aquele a quem acontece deixar de conseguir as vantagens económicas que conseguiria com a sua plena capacidade para o trabalho intocada, se só conseguir tais vantagens aplicando mais tempo.

    6. - Atento o teor da matéria de facto assente – três pontos , compatível com a profissão habitual e implicação de esforços complementares- à luz daquele entendimento por corresponder à interpretação dos normativos invocados neste matéria, integra-se o referido dano em termos da sua ressarcibilidade nos danos de natureza não patrimonial .

    7. - Assim, por o défice físico e psíquico ser tratado unitariamente e globalmente, a situação ser compatível com o exercício da atividade habitual, é que podemos e devemos à semelhança da mais moderna jurisprudência do S.T.J. arbitrarmos uma indemnização a englobar todos os danos sofridos pelo A.; 12ª- Por isso, salvo o devido respeito, não é de atribuir ao demandante qualquer quantia a título de “indemnização por dano biológico”, devendo tão só ser valorizada em termos de danos não patrimoniais.

    8. - Face aos factos expostos, a compensação global a atribuir ao demandante e correspondente aos danos efectivamente sofridos e de acordo com os valores normalmente atribuídos em casos análogos, deve situar-se nos 10.000,00 euros que nos parece a quantia justa, equilibrada e equitativa para a situação em apreço.

    9. - Caso se entenda não haver lugar a compensação global, mas autonomizar dano não patrimonial/dano biológico, justo e adequando será reduzir tais montantes ao valor de 5.000,00 € cada.

    10. - Pelo exposto e salvo o devido respeito, a douta sentença recorrida fez errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 483º e 496º do CC aos factos provados.

    11. - Foi a Recorrente condenada a pagar ao autor “juros de mora no dobro da taxa prevista na lei sobre € 16.769,87 contados desde 27 de julho de 2019 até á data da decisão judicial”, isto alegadamente ao abrigo do disposto no art. 38º, nº 3 da Lei nº 291/2007 de 21.08.

    12. – Porém, salvo o devido respeito, tal condenação não tem in casu fundamento legal e aplicação, e vai até além do pedido formulado pelo Autor, o que constitui uma nulidade prevista no art. 615º, nº 1, al. e) e nº 4 do CPC.

    13. - Efectivamente, como consta da douta p.i., o autor formulou um pedido liquido de 10.000,00 € e outro ilíquido, e só posteriormente, em 19.12.2020 formulou o pedido de liquidação de fls … dos autos, peticionando a condenação da Ré no “pagamento ao autor da quantia de 10.000,00 € … acrescida de juros de mora desde a notificação deste incidente até efectivo pagamento, sendo que os juros de mora são devidos no dobro da taxa prevista na lei aplicável” – vidé pag 2 do Relatório da douta sentença.

    14. - Assim, a condenação no pagamento de juros de mora pelo dobro da taxa legal prevista só podia incidir sobre 10.000,00 € desde 19.12.2020 até à data da decisão judicial, e não desde 27 de julho de 2019, pelo que a condenação foi além do pedido.

    15. - Se o autor só peticionou juros pelo dobro da taxa legal sobre 10.000,00 € desde a liquidação – e bem, pois não podia peticionar sobre uma quantia ilíquida – não podia a douta sentença condenar desde 27.07.2019, pelo que foi além do pedido, o que constitui uma nulidade nos termos do disposto no art. 615º, nº 1, al. e) e nº 4 do CPC, o que expressamente se invoca.

    16. - De qualquer forma, a condenação no pagamento dos juros no dobro da taxa legalmente prevista nos termos do art. 38 da Lei nº 291/2007 não tem aplicação in casu, pois que não se verificam os respectivos pressupostos.

    17. - A Ré cumpriu escrupulosamente o que está...

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