Acórdão nº 219/14.7TBBGC-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução28 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório S. G.

e M. C.

, executados nos autos de Execução Ordinária (Ag. Execução) do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança - JL Cível - Juiz 1 - instaurados pelo exequente X España de Inversiones, S.A. – Sucursal em Portugal, vieram recorrer do despacho proferido nos autos, em 04-11-2020 (ref.ª citius 22973948), com o seguinte teor: «(…) Ref.ª 1583641 de 09.06.2020: Indefere-se ao requerido pelos Executados porquanto, até trânsito em julgado da sentença supra proferida, a Exequente mantém a sua legitimidade processual e o encerramento do processo de insolvência n.º 205/18.8T8BGC – J1 nos termos do artigo 230.º, n.º 1, alínea b), do C.I.R.E.

(“[a]pós o trânsito em julgado da decisão de homologação do plano de insolvência, se a isso não se opuser o conteúdo deste”) não é fundamento para a extinção da instância executiva (cfr. artigo 88.º, n.º 3, do C.I.R.E.), podendo nesta ser requerida a cumulação sucessiva de execuções, mesmo com base em títulos executivos diversos (cfr. artigos 709.º e 711.º do C.P.C.), já que, nos termos do artigo 233.º, n.º 1, alínea c), do C.I.R.E., “[e]ncerrado o processo, e sem prejuízo do disposto no n.º 5 do artigo 217.º quanto aos concretos efeitos imediatos da decisão de homologação do plano de insolvência […] [o]s credores da insolvência poderão exercer os seus direitos contra o devedor sem outras restrições que não as constantes do eventual plano de insolvência […], constituindo para o efeito título executivo […] a sentença de verificação de créditos […], em conjugação, se for o caso, com a sentença homologatória do plano de insolvência” e o artigo 218.º, n.º 1, alínea a), do C.I.R.E. prescreve que “[s]alvo disposição expressa do plano de insolvência em sentido diverso, a moratória ou o perdão previstos no plano ficam sem efeito [q]uanto a crédito relativamente ao qual o devedor se constitua em mora, se a prestação, acrescida dos juros moratórios, não for cumprida no prazo de 15 dias após interpelação escrita pelo credor”.

*Considerando que a Exequente, por requerimento de 28.04.2020, através do qual junta a interpelação prevista no artigo 218.º, n.º 1, alínea a), do C.I.R.E. onde se precisa o montante que se mantém em dívida, após período de cumprimento do plano de insolvência, veio requerer o prosseguimento dos autos, que se mantêm pendentes, com fundamento no incumprimento do plano de insolvência homologado no âmbito do proc. n.º 205/18.8T8BGC – J1, logo tendo por base outro título executivo, verificados que estão os pressupostos legalmente previstos para a admissibilidade da cumulação sucessiva de execuções (cfr. artigo 711.º do C.P.C.), admite-se a mesma.

Notifique e dê conhecimento ao Agente de Execução.

*Por ser do meu conhecimento funcional, por dele ser sua titular, o estado do processo de insolvência n.º 205/18.8T8BGC – J1 (findo e arquivado), determino se instruam os presentes autos com certidão, a extrair do dito processo, da sentença de verificação de créditos e da sentença homologatória do plano de insolvência».

Inconformados com o assim decidido, vieram os executados apresentar o presente recurso de apelação, pedindo a revogação do despacho e a sua substituição por outro que considere extinta a presente instância executiva e em qualquer caso, não admita o requerimento de 28-04-2020 como requerimento executivo para cumulação de execuções e indefira a pretensão de prosseguimento da execução.

Terminam as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1ª) - Ninguém formulou nos presentes autos qualquer pedido de cumulação sucessiva de execuções.

  1. ) – A decisão recorrida foi muito mais além do que a pretensão formulada, ultrapassando consequentemente, os limites da condenação, nomeadamente, quanto ao seu objecto.

  2. ) – Além de constituir uma verdadeira decisão surpresa, com violação do contraditório.

  3. ) – Acresce que a cumulação de execuções está sujeita ao mesmo formalismo da apresentação do requerimento executivo, sob pena de recusa pela secretaria e de indeferimento liminar.

  4. ) – O Requerimento de 28/04/2020 não obedeceu ao modelo aprovado, não cumpre os requisitos estipulados, nomeadamente, quanto à identificação das partes, designação do Agente de Execução, indicação do fim da execução, da forma do processo e do valor da execução cumulada, nem sequer foi acompanhado do título executivo.

  5. ) – Acresce que quem formulou em 28/04/2020 a pretensão de prosseguimento da execução foi a então ainda Exequente, “X España, S.A.”, já depois de a “Y Finance ” ter requerido nos autos, em 30/01/2020, a sua habilitação, apresentando os documentos comprovativos da cessão de créditos.

  6. ) – Assim, tem necessariamente de se entender que por força da cessão de créditos, a pessoa que figura como credor à data daquele requerimento é a “Y Finance ” e não a “X España, S.A.”, carecendo, consequentemente, esta entidade de legitimidade para apresentar um Requerimento Executivo para cumulação de execuções.

  7. ) – Por outro lado, os Executados não incumpriram o plano de Insolvência homologado no âmbito do Pº nº 205/18.8T8BGC e se assim se entende, é naquele processo e não nesta execução, que deve ser discutido e decidido tal alegado e eventual incumprimento.

  8. ) – Acresce que a presente execução foi suspensa com fundamento na pendência de procedimento que derivou em processo de insolvência, no âmbito do qual foi apresentado plano de insolvência, homologado por sentença, à qual se seguiu despacho de encerramento.

  9. ) – Tal decisão de homologação do plano de insolvência constitui uma autêntica novação da obrigação dos Executados, implicando, consequentemente, a necessária extinção da obrigação aqui exequenda.

  10. ) – Foram violados ou mal interpretados os artigos 3º, nº 3; 53º, nº 1; 609º, nº 1; 725º, nº 1 e 726º, nº 2, alíneas a), b) e c), do C.P.C; os artigos 217º, nº 1 e nº 5; 218º, nº 1, alínea a); 222º-E, nº 1 e 233º, nº 1, alínea c), do CIRE e os artigos 857º, 859º e 861º do Cód. Civil».

A exequente/recorrida Y Finance, entretanto habilitada por sentença proferida na mesma data da decisão recorrida, em 04-11-2020, veio apresentar contra-alegações, sustentando a improcedência do recurso interposto e a consequente manutenção do decidido.

O recurso foi então admitido como apelação, com subida imediata e efeito em separado e com efeito meramente devolutivo.

Os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, confirmando-se a admissão do recurso nos mesmos termos.

II.

Delimitação do objeto do recurso Face às conclusões das alegações do recorrente, e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - cf. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC - o objeto da apelação circunscreve-se às seguintes questões: A) Aferir se as referências feitas pelos apelantes a propósito das questões decididas no despacho recorrido permitem consubstanciar a arguição de nulidade da decisão recorrida, e se a mesma se verifica; B) Reapreciação do despacho que indeferiu a pretensão dos executados no sentido da extinção da instância executiva e deferiu o prosseguimento dos autos pretendido pela exequente; se estão verificados os pressupostos da cumulação sucessiva de execuções.

Corridos os vistos, cumpre decidir.

  1. Fundamentação 1.

    Os factos 1.1. Os factos, as incidências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I.

    supra; atento o que se pode constatar mediante o acesso eletrónico ao processo através do sistema informático citius, relevam ainda para a decisão do objeto do recurso os seguintes factos que se consideram assentes nesta instância por estarem devidamente documentadas nos autos e que, por isso, o Tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções: 1.1.1. Os autos de Execução Execução Ordinária (Ag. Execução) do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança - JL Cível - Juiz 1 - foram instaurados em 26-03-2014 pelo exequente X España de Inversiones, S.A. - Sucursal em Portugal, apresentando como título executivo uma livrança, emitida em 09-07-2010, vencida em 17-02-.2014, avalizada pelos Executados, no valor de € 41.594,18.

    1.1.2. Os executados foram citados, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 726.º, n.º 6, e 728.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), não tendo deduzido oposição.

    1.1.3. Foram realizadas diversas diligências executivas, entre as quais penhoras e diligências destinadas à venda de bens penhorados sendo que, em 20-09-2017, o Agente de Execução (AE) proferiu decisão a declarar suspensa a execução em virtude de ter sido intentado um Processo Especial de Revitalização relativamente aos executados - p. 1037/17.6T8BGC, do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança, Juízo Local Cível - Juiz 1 - nos termos do artigo 17.º - E, n.º 1, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE).

    1.1.4. Por requerimento apresentado em 30-01-2020 (ref.ª citius 1519785) veio Y Finance , apresentar requerimento de habilitação de cessionário contra os executados e exequente, requerendo a respetiva habilitação no lugar da exequente para prosseguir o processo de execução, invocando ser a atual titular do crédito referente ao contrato n.º 021475970001 por força de contrato de cessão de créditos celebrado a 30-08-2017 e que a alegada cessão incluiu a transmissão de todos os direitos, garantias e acessórios inerentes ao crédito cedido.

    1.1.5. Por requerimento apresentado em 28-04-2020 (ref.ª citius 1565939) veio X España de Inversiones, S.A. - Sucursal em Portugal, na qualidade de exequente, requerer o prosseguimento dos autos de execução no sentido de realizar as diligências necessárias com vista à localização de bens/rendimentos suscetíveis de penhora, alegando o seguinte: «(…) Os Executados S. G. e M. C. foram declarados insolventes ao abrigo do Processo n.º 205/18.8T8BGC, o qual correu os seus termos no Juízo Local Cível de Bragança - Juiz 1 do Tribunal Judicial da Comarca de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT