Acórdão nº 1066/19.5T8VRL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 28 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução28 de Outubro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Relator: Des. José Cravo 1º Adjunto: Des. António Figueiredo de Almeida 2º Adjunto: Desª Maria Cristina Cerdeira *Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*1 – RELATÓRIO A. C.

, casado, e sua esposa, M. C.

, casada, residentes no Lugar …, Freguesia de …, Concelho do Peso da Régua, instauraram a presente ação declarativa de condenação (1), sob a forma de processo comum, contra Companhia de Seguros X, S.A.

, com sede na Rua … Lisboa, formulando a seguinte pretensão: ser a R. condenada a pagar aos AA., acrescidas dos juros legais desde a citação até integral e efetivo pagamento, as seguintes quantias indemnizatórias ou compensatórias, a saber: a) Pelos danos morais sofridos pelo R. M. antes do seu estado de coma e do seu falecimento, a quantia de € 30.000,00 (trinta mil euros); b) Pelo dano da morte do filho R. M., a quantia de € 200.000,00 (duzentos mil euros); c) Ao autor pai A. C. pelos danos morais por si sofridos, a quantia de € 100.000,00 (cem mil euros); d) À autora mãe D. M. C., pelos danos morais por si sofridos, a quantia de € 100.000,00 (cem mil euros); e) Aos autores, por todas as despesas tidas com as deslocações que tiveram de fazer aos hospitais e às instituições onde o filho R. M. esteve e ficou acamado e em estado de coma, ao longo de quase 11 anos, a quantia de € 18.547,00 (dezoito mil quinhentos e quarenta e sete euros).

*Alegaram para o efeito, em síntese, o seguinte: - que no dia, hora e lugar que referem, ocorreu um acidente, quando o seu filho R. M. se encontrava a trabalhar para a respetiva entidade patronal, no interior de uma quinta; - que na realização do trabalho que estava a ser efetuado, e que consistia na colocação de uma pedra padieira em granito, em cima das ombreiras laterais da porta do armazém da quinta, foi usada uma máquina retroescavadora propriedade da entidade patronal; - que sem que nada o fizesse prever, quando já tinha colocado a pedra, a retroescavadora fez um recuo, tocou na pedra em granito e provocou a sua queda, que acabou por atingir o R. M.; - que na sequência da factualidade descrita, o R. M. sofreu lesões que, após vários anos em coma, levaram à sua morte.

*Regularmente citada, a ré Companhia de Seguros X, S.A. apresentou contestação, excepcionando a sua ilegitimidade e a prescrição, e alegando que o acidente em causa configurou um acidente de trabalho, e não de viação, pelo que conclui pela improcedência da acção.

*Ocorreram prolongadas diligências de instrução, justificadas pela dificuldade em localizar documentos relativos a factos ocorridos há 14 anos, devidamente contraditadas, tendo sido admitido o A. a prestar declarações de parte e admitido o aditamento ao rol requerido pelo A.

*Tendo-se dispensado a realização de audiência prévia, no despacho saneador, depois de se conhecer da ilegitimidade e prescrição, excepções julgadas improcedentes, entendendo-se que o processo fornecia já todos os elementos para ser proferida decisão de mérito, passou-se de imediato a proferir sentença, que julgou a acção improcedente e absolveu a R. dos pedidos.

*Inconformados com essa decisão, apresentaram os AA. recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizaram com a apresentação das seguintes conclusões: 1º A situação descrita nos autos pelos autores ora recorrentes, configura um acidente de viação, por todas as razões e fundamentos legais supra referidos na nossa motivação de recurso que aqui damos por reproduzidos e por outras e outros ainda que V.ªs Ex.ªs mui superiormente sempre podem suprir. Se este tribunal considerar as nulidades processuais aqui invocadas, apela-se também para a vossa tomada de posição quanto a esta questão de ser ou não um acidente de viação, nomeadamente, por razões de gestão, economia e celeridade processual.

  1. O tribunal “a quo” fez errônea interpretação dos factos e da sua subsunção ao direito, ao não considerar a situação descrita nos autos pelos autores ora recorrentes como um acidente de viação, violando, entre outros, que V.ªs Ex.ªs mui superiormente sempre podem suprir, o disposto nos artigos 3º, nº 2, 12º, nº1 e 35º, nº 1 do Código da Estrada e nos artigos 483º, 487º, 496º, 503º e 562º e seguintes do Código Civil.

  2. Para o caso de V.ªs Ex.ªs entenderem que não estamos perante um caso de acidente de viação e confirmarem a decisão de que ora se recorre, e porque a decisão assim a proferir já não é suscetível de recurso judicial, requer-se a V.ªs Ex.ªs, e ao abrigo do art.º 267º (ex-artigo 234º TCE) do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que submeta esta questão ao Tribunal de Justiça da União Europeia.

  3. Sem prescindir, conforme, entre outros, se pode constatar através do requerimento dos autores de fls. 58 verso e carta dos autores de fls. 60 e seu verso, os autores ora recorrentes tiveram sempre a oposição da ré seguradora, que lhe criou grandes dificuldades na obtenção de elementos e documentos importantes para a presente ação, ainda antes da propositura da presente ação, por forma a que os autores se vissem impossibilitados de os alegar, como sucedeu, logo de inicio na sua petição inicial, nomeadamente, o acesso ao número da apólice da máquina retroescavadora que causou o acidente, bem como impossibilitados estavam de poder indicar o seu modelo e número de série, que só agora no decurso do processo e a pedido dos ora recorrentes e só através da imprescindível cooperação e força impositiva do tribunal foi possível serem pela ré e outras entidades juntos aos autos. Razão pela qual, e salvo sempre melhor entendimento, cremos estar-se perante um processo, em que se justificava e justifica, que o Meritíssimo Juiz “a quo” proferisse, não um despacho saneador, mas um despacho pré-saneador, destinado a providenciar pelo aperfeiçoamento da petição inicial, nos termos do nº4, do art.º 590º do CPC.

  4. Ao assim não ter feito, o tribunal “a quo”, entre outros, violou este nº4, do art.º 590º do CPC., e o despacho saneador/sentença é nulo por violação do disposto no nº 1 do art.º 195º do CPC, nulidade que aqui expressamente se invoca.

  5. Por outro lado ainda, tendo o tribunal “a quo” decidido sobre o mérito da causa, era obrigatória a realização da audiência prévia, nos termos do nº 1, al. b) do artº 591º conjugado com o nº 1 do art.º 593º, ambos do CPC, a sua não realização também determina a nulidade do saneador/sentença, que por cautela, também aqui se invoca, por força do disposto no nº 1 do art.º 195º do C.P.C., bem como violou o principio do contraditório, ao não dar oportunidade aos ora recorrentes de responderem às exceções invocadas pela ré na contestação, que só o poderiam fazer na audiência prévia ou no inicio da audiência de julgamento, conforme nº 4 do art.º 3 do CPC, o que gera igual nulidade processual que aqui e neste particular também se invoca nos mesmos termos, tendo também a sentença de que se recorre violado este dispositivo.

  6. Foi violado pelo tribunal “a quo” toda a legislação e normativos referidos na motivação e conclusões do presente recurso.

    Nestes termos e nos melhores de direito que V.ªs Ex.ªs mui superiormente sempre podem suprir, deve o presente recurso ser por V.ªs Ex.ªs julgado totalmente procedente com as devidas consequências legais, como ato de inteira e sã justiça.

    *Foram apresentadas contra-alegações, finalizadas com a apresentação das seguintes conclusões: 1.

    Salvo o devido respeito, a douta sentença de que os AA. ora recorrem não merece qualquer censura ou reparo. Devendo manter-se a decisão proferida, ou seja, manter a improcedência do pedido, absolvendo, em consequência, a Ré do mesmo.

    1. Questão Prévia – Das Conclusões do Recurso: o artigo 639º, n.º 1 do CPC delimita a forma como as conclusões de recurso devem ser realizadas. Entendendo a Recorrida que os Recorrentes não cumpriram com o prescrito em tal norma, pois que as conclusões apresentadas redundam numa remissão para todas as razões e fundamentos legais apresentados na motivação do recurso, tão só com indicação de algumas das normas que entendem ter sido violadas pela decisão em crise. Não realizando, assim, qualquer atividade dedutiva, de onde se concluísse pela relação de causa-efeito.

    2. Os Recorrentes tinham a seu cargo o ónus de concluir as suas alegações de recurso com conclusões das quais transparecessem os fundamentos desenvolvidos no corpo alegatório, ainda que de forma resumida, mas nunca por meio de mera remissão. Pois que, servem as mesmas para expor as questões controvertidas ao tribunal superior, viabilizando igualmente o exercício do contraditório.

    3. Se o recorrente alegar e não concluir (e entendem-se por inexistentes, salvo melhor opinião, as conclusões feitas por remissão, até porque a lei não prevê tal hipótese), o recurso deve ser indeferido pelo tribunal a quo logo no despacho que recair sobre o requerimento de interposição (artigo 641º, n.º 2, alínea b), in fine, o que se pede.

    4. Caso não se entenda pelo indeferimento liminar do recurso apresentado pelos AA., pugna a Recorrida pela improcedência do recurso em toda a linha.

    5. Começam os AA. as suas alegações desde logo afastando do objeto do seu recurso, e assim expressamente aceitando, as decisões proferidas no sentido da improcedência das exceções de ilegitimidade passiva e de prescrição invocadas pela recorrida na sua Contestação.

    6. Contudo, os mesmos vêm invocar a nulidade da decisão ora em crise por preterição da realização da audiência prévia, porquanto não lhes foi dada oportunidade de discutir, de facto e de direito, a causa, nem de responder às exceções invocadas pela Ré na sua contestação (vide artigo 591º, n.º 1, alínea b), conjugado com o n.º 1 do artigo 593º do CPC e artigo 3º, n.º 4 CPC).

    7. Ora, os recursos só podem ser interpostos por quem tenha ficado vencido, ou seja, a quem a decisão seja prejudicial diretamente. Dita o n.º 2 do artigo 632º do CPC determina que “Não pode recorrer quem tiver aceitado a decisão depois de proferida.” E o seu n.º 3 – “A aceitação da decisão pode ser expressa ou tácita; a aceitação...

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