Acórdão nº 106/20.0T8VLS.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelSÉRGIO ALMEIDA
Data da Resolução27 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa RELATÓRIO Autora (A.) e recorrida: AAA Ré (R.) e recorrente: BBB A A. intentou esta ação alegando que foi contratada para desempenhar a atividade de Ajudante Sócio Familiar sob as ordens, direção e fiscalização da Ré, mas tem vindo a exercer as funções inerentes à categoria de Agente de Educação Sócio Familiar, pelo que tem direito à classificação profissional e às diferenças salariais correspondentes. Pede que a Ré seja condenada (i) a reconhecer-lhe a categoria profissional de Agente de Educação Sócio Familiar desde Janeiro de 2017, e, consequentemente (ii) a pagar-lhe diferenças salariais entre Janeiro de 2017 até à data da sentença transitada em julgada, incluindo o subsídio de férias e subsídio de Natal (iii) a pagar-lhe juros de mora desde a data em que os pagamentos deveriam ter ocorrido até efectivo e integral pagamento (iv) numa sanção pecuniária compulsória de € 10,00 (dez euros) diários, por cada mês de incumprimento da sentença condenatória.

*** Não havendo acordo a Ré contestou, defendendo (i) não haver contrato de trabalho entre a Autora e a Ré, porquanto a A. encontra-se ligada, na prestação do seu trabalho, ao Instituto da Segurança Social dos Açores, pelo que, apesar de formalmente ligada à Ré, é este Instituto o seu empregador, pelo que se verifica ilegitimidade passiva (art.º 577º, e), do Código de Processo Civil), devendo ser a Ré absolvida da instância; (ii) a A. não exerce funções correspondentes à categoria profissional de Agente de Educação Sócio Familiar, mas sim correspondentes a Ajudante Sócio Familiar (iii); a Autora não reúne os pressupostos para aceder à categoria de Agente de Educação Sócio Familiar prevista na Convenção Colectiva de Trabalho aplicável.

*** A Autora respondeu às excepções (dilatória e peremptórias) deduzidas pela Ré, defendendo a sua improcedência.

*** Realizada audiência prévia e saneados os autos, o Tribunal declarou improcedente a arguida ilegitimidade passiva da Ré.

Efetuado o julgamento, o Tribunal julgou a ação "procedente, por provada, a presente acção, e, em consequência a.-Condena-se a ré BBB a reconhecer, em favor da Autora AAA, desde Janeiro de 2017, a titularidade da categoria profissional de Agente de Educação Sócio-familiar; b.-Condena-se a ré BBB a pagar à AAA a quantia de € 7.900,52 (sete mil novecentos euros e cinquenta e dois cêntimos), a título de diferenças salariais vencidas desde Janeiro de 2017 até à data da entrada da presente acção; c.-Condena-se a ré BBB a pagar à Autora AAA as diferenças salariais vencidas desde 30 de Junho de 2020 até à presente data e as vincendas até ao trânsito em julgado da sentença (calculados nos mesmos termos); d.-Condena-se a ré BBB a pagar à Autora AAA juro de mora devidos sobre cada uma das prestações supra referidas, calculados à taxa legal para os juros civis, desde a data do vencimento de cada uma até definitivo e integral pagamento".

*** Não se conformando, a R. apelou, apresentando motivação e concluindo: (…) Remata pedindo o total provimento do recurso e que, em consequência: a)-a Decisão seja declarada nula, com todas as legais consequências, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. b), do CPC, por absoluta falta de fundamentação; subsidiariamente, b)-a decisão seja revogada, com todas as legais consequências, por violação do previsto na Cláusula 3.ª, n.º 3, do Anexo I da CCT n.º 50/2019 e na Cláusula 15.º, n.º 1, do mesmo Anexo; c)-a Decisão seja revogada por violação do o Anexo I da CCT de 2019, já que a Recorrida não reúne os requisitos para ser reclassificada exigidos pela CCT de 2019, sc. licenciatura ou formação profissional específica com uma duração mínima de 700 horas ou 1000 horas.

*** A A. contra-alegou e pediu a improcedência do recurso, concluindo: (…) *** O MºPº teve vista, pronunciando-se no sentido da confirmação da sentença.

A recorrente respondeu ao parecer.

Foram colhidos os vistos legais.

FUNDAMENTAÇÃO Cumpre apreciar neste recurso – considerando que o seu objeto é definido pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, e excetuando aquelas cuja decisão fique prejudicada pela decisão dada a outras, art.º 635/4, 608/2 e 663, todos do Código de Processo Civil – se (1) a sentença padece de nulidade por falta de fundamentação; (2) as funções desempenhadas pela A. não correspondem ao declarado na sentença recorrida mas às da categoria de ajudante.

Da nulidade da sentença Verifica-se nulidade por falta de fundamentação e contradição quando a sentença incorre em absoluta falta de fundamentação, e não quando a fundamentação é parca ou mesmo deficiente, e muito menos quando não agrada ao recorrente (o "putativo desacerto da decisão" de que falam Abrantes Geraldes e aut. in CPC anotado, I, 763/10) nota ao art.º 615/1/b. É nula a sentença que “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”. Esta disposição radica, em última análise, no artigo 205º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa. Também como reflexo desta exigência constitucional, o artigo 154.º do Código de Processo Civil, estabelece que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo, carecem de ser fundamentadas (n.º 1), não podendo a justificação da decisão consistir na simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição, “salvo quando, tratando-se de despacho interlocutório, a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade” (nº 2). O que está causa aqui é a violação do dever de fundamentação das decisões judiciais. Ou seja, é preciso deixar claro que a decisão não é um ato arbitrário do tribunal, mas pelo contrário algo motivado, que busca arrimo nos critérios da lei (ainda que possa haver erro de julgamento ou de aplicação do direito, o que é coisa diversa). Por isso, só se verifica quando a decisão omite absolutamente a fundamentação, e não quando a fundamentação é escassa, deficiente ou mesmo medíocre (neste sentido, por todos, tratando-se de jurisprudência firme, cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.04.2008, in www.dgsi.pt). Porém, a omissão de fundamentar a decisão há de ser total, sendo pacífica a jurisprudência no sentido de que “a nulidade prevista na al. b) do n.º 1 do art.º 668.º do CPC verifica-se, apenas, nos casos em que há falta absoluta de motivação, excluindo-se da sua previsão todos os outros casos em que a fundamentação é deficiente, extremamente concisa mas, ainda assim, bastante à compreensão da decisão” – cfr. por todos os Ac. do STJ de 10-10-2013 e de 10.4.2008, disponíveis, como todos os citados sem menção da fonte, em www.dgsi.pt); e outrossim, no mesmo sentido, a doutrina (cfr., por todos, Fernando Amâncio Ferreira, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 6.ª Edição, Almedina, páginas 52 e seguintes: “A falta de motivação suscetível de integrar a nulidade de sentença é apenas a que se reporta à falta absoluta de fundamentos quer estes respeitem aos factos quer ao direito (…)”; e Jaime Octávio Cardona Ferreira, “Guia de Recursos em Processo Civil – o novo regime recursório civil”, Coimbra Editora, Novembro de 2007, página 54: “Omissão dos fundamentos de facto e de Direito que justificam a decisão (cfr. art.º 158.º); não é o mesmo que fundamentação insuficiente, inadequada ou, até, errada (…)”.).

Entende a recorrente que inexiste qualquer fundamentação.

Porém, a sentença afirma, como a recorrente reconhece: "Atendendo à matéria de facto dada como provada, entendemos ser inevitável concluir que a Autora, não obstante se encontrar qualificada como Ajudante Sócio-Familiar, exerce funções que, manifestamente, integram o conteúdo familiar de uma outra categoria, a de Agente de Educação sócio-familiar, a qual tem um objecto distinto e está inserida, inclusivamente num outro grupo de pessoal (grupo dos trabalhadores sociais, enquanto que o Auxiliar se encontro no grupo dos trabalhadores de apoio). O confronto da matéria dada como provada com o conteúdo funcional constante do Anexo I da Convenção...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT